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Discurso que devia lêr-se a pag. 175, col. 1.ª, lin. 54, da sessão n.º 11 d'este vol.
0 sr. Paulo Romeiro (sobre ordem): — Sr. presidente, principio por declarar a V. ex.ª que pedi a palavra sôbre a ordem para apresentar uma substituição, ou como em direito regimental melhor haja e deva ser, ao projecto em discussão. Faço esta declaração para que algum dos illustres zeladores do regimento me não tolha o uso da palavra, de que aliás não desejo abusar em prejuizo dos nobres deputados que se acham inscriptos sobre a materia.
Vou ler a substituição, e depois a fundamentarei com algumas das muitas considerações que me occorrem sobre o assumpto que se debate, e a que elle se refere. (Leu.)
(O orador foi vivamente apoiado e frequentes vezes interrompido durante a leitura da substituição).
(Continuando): — Sr. presidente, eu ligo muita importancia a esta questão. Não pedi a palavra sobre a materia, por que vi tanto empenho em esclarecer o debate, que me julguei dispensado da necessidade de entrar n'elle. A camara sabe por experiencia que em assumptos d'esta gravidade, eu só uso da palavra quando os meus illustres collegas entendem dever guardar silencio. É porque o meu intuito é sempre o de esclarecer-me e não o de esclarecer a camara. Quando vejo os seus membros mais distinctos, os talentos que mais a ennobrecem, empenhados na discussão, o meu dever é ouvi-los com o respeito e considerarão a que elles têem direito, e em cuja homenagem eu sou o primeiro a lucrar, porque ninguem mais do que eu precisa aproveitar-se da luz que ss. ex.ª sabem e costumam derramar sempre na discussão. Louvo sinceramente, não direi este monopolio, mas este enthusiasmo de inscripção que se ergueu d'esle lado da camara, e deploro agora mais do que nunca que elle não apparecesse ha poucos dias, quando aqui se debateu um negocio infinitamente mais grave do que este que nos occupa, pelo seu alcance economico e pela responsabilidade que nos impunha para com o futuro. (Apoiados.)
Sr. presidente, na leitura que fiz á camara da minha substituição manifestei quaes são as minhas idéas a respeito d'este negocio. Quero a régie, quero mais do que isso, quero a livre cultura e o livre commercio do tabaco, mas não me parece que seja esta a occasião de adoptar qualquer d'estes systemas. Ve-se portanto que o motivo que me separa de alguns dos meus illustres collegas e amigos, é o de inopportunidade de occasião. Peço agora aquillo que elles já pediram e em que convieram n'outra occasião: peço o adiamento, e parece-me que peço o mais racional e o mais conveniente. (Muitos apoiados.) Quero a arrematação, porque tenho para mim que ella se póde fazer pelos meios que proponho, sem desfalque para o thesouro. Posso estar em êrro, mas declaro ingenuamente que me não convenço da necessidade nem do proveito fiscal d'esse luxo estupido e excepcional da oppressão que se acha consignado nas condições do actual contrato, e que é tão inutil e odioso que até os proprios contratadores, por interêsse e dignidade sua, entenderam não o dever nunca pôr em execução na sua maior parte. (Apoiados.) Voto pela arrematação, mas pela arrematação sem algumas das condições actuaes; essas rejeito-as, porque são aviltantes para o decoro do paiz e do systema representativo que nos rege. (Prolongados apoiadas de todos os lados daca-mara.)
Tem-se dito aqui: « estão em luta dois grandes principios, o principio de administração, e o principio da arrematação.» Esta asserção não me parece exacta. Não pretendo entrar na questão, não só porque pedi a palavra sobre a ordem, mas porque fôra uma temeridade pouco justificavel emprehender essa tarefa, depois do eloquente discurso que acaba de proferir o illustre relator da commissão e meu sympathico amigo o sr. Antonio de Serpa. Estão em lula dois grandes principios. Quaes são elles? Pois a arrematação e a administração não significam ambos o principio do monopolio contra o principio de liberdade? Não amesquinhemos a questão a estas proporções improprias da sua gravidade. (Apoiados.) Não ha n'este caso senão dois grandes principios, que são o principio do monopolio e o principio da liberdade. O monopolio fica sempre, quer se adopte a arrematação, quer se adopte a administração, e ficára em ambos os casos com o mesmo apparato de oppressão e de uma odiosa impopularidade, quer seja exercido pelos agentes do governo quer pelos contratadores, uma vez que não modifiquemos as regras por que elle se ha de executar. (Muitos apoiados. — Vozes: — É verdade, é verdade.) Para que é sophismar esta verdade? Para que é invocar as vantagens de liberdade, quando ellas são excluidas pelo principio do monopolio que se adopta, porque as circumstancias economicas do nosso paiz nos forçam a adopta-lo? E a este respeito permitta-me o meu nobre e eloquente amigo, o sr. Antonio de Serpa, que lhe diga, que não concordo inteiramente com a opinião que ha pouco emittiu. O principio da liberdade, a adoptar-se, deve adoptar-se sem restricções. Se elle vier, deve vir para tudo e para todos, para o commercio, para a industria e para a cultura. Só a cultura pela creação de novos valores, póde compensar-nos do desfalque que soffreriamos na receita publica, adoptado o principio de liberdade. (Muitos apoiados.) Não comprehendo o que seja meio principio, nem meia verdade.
Mas esta não é a occasião de adoptar esta indicação do progresso. Não queiramos ír mais depressa do que têem ido outros paizes que nos antecedem sempre nas boas regras de administração. (Apoiados.) Temos que acabar ainda com muito monopolio antes de acabar com este. (Apoiados.)
E quando vejo agora alguns dos meus illustres amigos e collegas, por quem me preso de ler a maior consideração e respeito, cheios de um santo horror pelo monopolio, não posso deixar de sentir que s. ex.ª entendessem não dever levantar a sua voz ião auctorisada e energica, contra o maior monopolio que selem votado n'este paiz, e que passou ha poucos dias n'esta camara, quasi sem discussão, no meio do mais incomprehensivel silencio d'este lado; silencio apenas quebrado por mim, e por alguns dos meus amigos, todos novos nas lides parlamentares, e todos inexperientes dos negocios publicos. (Muitos apoiados.)
Aonde estava então esse fogo sagrado contra o monopolio que se não via, que se não combalia, e contra o qual se não protestava, não obstante a grandeza do seu vulto, o alcance das suas consequencias economicas e politicas? Pois não se tremeu na presença de um monopolio concedido a uma potencia estrangeira e a uma potencia monetaria europea, e pelo tempo de cem annos, e compromettendo a liberdade economica dos nossos filhos e netos, a liberdade de duas ou tres gerações, e estremece-se agora na presença de um monopolio de tres annos que podemos modificar á nossa vontade, e que se ha de conceder a dois ou tres concidadãos nossos? Não hesitaram em comprometter o seu voto pelo monopolio de um seculo, e vacillam agora em votar o monopolio de tres annos, que podemos revogar ainda n'esta legislatura? (Apoiados.)
E permitta-me um dos mais distinctos ornamentos d'esta camara, que disse que se condoía sinceramente do descredito em que incorriam os nomes que votaram pela arrematação, que pela minha parte, agradecendo muito o zêlo que toma pela minha reputação, não possa todavia aceitar o seu conselho de precaução. Não declino nunca a responsabilidade do meu voto. Dou-o sempre tão conscencioso, quanto m'o dita a minha rasão, que de certo é inspirada por motivos tão nobres como o é a do illustre deputado, embora a sua seja mais, e muito mais, esclarecida pela sua illustração e pela sua superior intelligencia. (Apoiados—Toses: — Muito bem.) Não me atterram argumentos d'esta ordem. (Apoiados) Devo conta do meu voto ao paiz, aos meus constituíra