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ções caracteristicas da civilisação de qualquer paiz, se por ella se revela a condição social de um povo, o regimen politico do seu governo, e a indole e tendencias da sua administração, devemos confessar que a organisação do imposto é tal entre nós, que póde co-existir com todos os regimens, sendo absurda com todos elles.

Aqui, a par da contribuição predial temos as terças dos concelhos, esse imposto desproporcional na sua distribuição, absurdo na sua base, e injustificavel de certo perante todos os principios de administração e economia publica. E entretanto conservâmo-lo, como uma das verbas de receita do nosso orçamento.

Temos o imposto sobre o pescado, esse imposto pelo qual vamos roubar ao homem que affronta diariamente a morte para ganhar o pão que o sustenta, as migalhas de uma subsistencia ganha Ião honrada como laboriosa e afadigadamente.

Ha mais; lemos ainda os dizimos nas ilhas adjacentes, depois de abolidos no continente ha já tantos annos. Ficou essa disposição do antigo regimen economico a protestar contra* a reforma economica tentada por um homem, que dotado de uma intelligencia elevada, versado com proficiencia no complicado labyrintho da nossa legislação, perito sobremodo na lição dos auctores que haviam preparado, dirigido e tornado proficuo o espirito do progresso nos outros paizes, soube aproveitar a indole essencialmente reformadora da revolução liberal, cobrando com ella animo para derrocar temerariamente o magestoso edificio do regimen antigo. A camara terá comprehendido que fallo de Mousinho da Silveira.

Sr. presidente, o nosso systema tribulario compõe-se de todos estes tão heterogéneos elementos, e v. ex.ª e a camara comprehenderão facilmente que n'estas anomalias que apontei, e em muitas outras que poderia apontar, não está ainda o maior de todos os vicios do nosso systema tribulario; esse todos o conhecemos; não ha consciencia illustrada que o não accuse, accusa-o tambem a consciencia publica do paiz: é a desigualdade por que são affectados pelo imposto os differentes elementos, em que naturalmente se divide a materia collectavel: a terra, os capitaes e o trabalho.

A propriedade é flagellada pelo imposto; deixa porém de o ser a industria, e os capitaes moveis, esses escapam absolutamente á acção do fisco. Pois tributadas assim e tão desigualmente as forças productivas do paiz, ha systema de finanças perfeito ou será possivel que o haja?

Em taes circumstancias porém o que faz o governo para prover de remedio a este mal, a esta necessidade publica, cuja satisfação é tão instantemente reclamada! Promette de futuro a reforma do imposto, mas vem aggravar na actualidade a pessima distribuição d'elle,

Eu bem sei que os srs. ministros me poderão dizer: esta medida nada tem com a reforma do imposto, é um expediente de que o governo se serve para poder dotar convenientemente as obras publicas, é um recurso de que lançámos mão sem questão de preferencia, porque não temos outro melhor.

V. ex.ª e a camara sabem que, por parte do governo, se declarou com effeito que este emprestimo era um mero expediente; que por elle não julgava o governo organisará fazenda publica, mas que para o emprestimo se poder levantar com condições favoraveis era necessario dota-lo convenientemente, e que para isso se recorrera áquelle imposto, Eu direi que se tem feito o contrario estes ultimos annos, e que não era muito para admirar que se fizesse hoje o mesmo; mas como eu concordo no principio de que este emprestimo não póde deixar de ser senão um mero expediente, o que se deduz das proprias declarações Ião explicitas do sr. ministro da fazenda, entendo que é facil substituir n'este sentido os encargos que por este imposto vão pesar sobre o paiz, por uma medida que nos leva ao mesmo fim sem trazer comsigo os inconvenientes que d'esta se hão de necessariamente derivar. Apresento por isso a seguinte substituição: « É o governo auctorisado a contratar com o banco de Portugal a capitalisação dos fundos que constituem a consignação dos 300:000$000 réis, destinados ao pagamento dos juros e amortisação do emprestimo dos 4.000:000$000 réis, deduzindo d'essa quantia a importancia dos juros correspondentes ao capital em divida, reduzidos a tres quintos da sua importancia, conforme o decreto de 18 de dezembro de 1852, e os juros da referida capitalisação, segundo o que entre o governo e o dito banco se convencionar. »

Ora, sr. presidente, ha uma objecção muito facil e muito simples a esta minha proposta: essa objecção esta em duas palavras: é possivel e mesmo provavel que o banco ponha duvidas em contratar com o governo a capitalisação d'esses fundos destinados á amortisação do emprestimo dos réis 4 000:000$000; por isso que o interesse do banco esta em amortisar o mais cedo possivel esse emprestimo, cujo juro é com effeito muito inferior ao que elle poderá obter no mercado.

Mas, sr. presidente, essa difficuldade vence-se de certo sem grande repugnancia por parte do banco, logo que os juros da referida capitalisação forem superiores aos do emprestimo, e estiverem em proporção com os que o banco poderia receber em qualquer negociação que com esses fundos realisasse na praça.

Por consequencia lemos assim chegado ao nosso fim, creando os meios necessarios para fazer face aos encargos do emprestimo, recorrer ao expediente, pouco aproveitável na minha opinião, de aggravarmos os vicios do nosso systema tribulario, não tendo ainda assim a certeza de que o resultado venha justificar essa violenta medida; porque, devemos declarar abertamente, o governo não sabe nem póde saber se este imposto, a que recorre, lhe ha de dar a receita que suppõe, e que está orçada em 170:000$000 réis. Este resultado é conjectural, não ha calculo nenhum seguro em que elle se firme: e é com effeito de notar que o illustre ministro das obras publicas dissesse, voltando-se para a opposição: «Qual é o expediente que propondes para substituir este que o governo adoptou?» É continuar o nobre ministro a reforma nas pautas, diminuindo os direitos de importação em certos artigos! Facil expediente para fazer face aos encargos de qualquer emprestimo. Ora, eu direi ao illustre ministro que o expediente de que o governo se serve tem a mesma simplicidade. O que diz o governo? Augmentem se os direitos sobre as alfandegas, ao passo que outros dizem diminuam-se; mas o resultado que se pretende obter é mais conjectural na primeira hypothese que na segunda, segundo Iodas as indicações da sciencia e da pratica mesmo.

Deixo de apresentar outras observações, porque não quero que v. ex.ª e a camara se persuadam que pedi a palavra sobre a ordem para fallar sobre a materia, produzindo algumas considerações alheias á substituição que vou mandar para a mesa. Concluo pois reservando-me o direito de as apresentar quando me chegar a palavra sobre a materia.

Discurso que devia ler-se a pag. 355, col. 2.ª, lin. 48 da sessão n.° 26 d'este vol.

O sr. Sebastião José de Carvalho (sobre a ordem): — Sr. presidente, confesso com franqueza que não tencionava tomar parte n'esta discussão, e não era porque não julgasse a materia bastante importante, mas por considerar, com justissima rasão, que havendo, no seio d'esta assembléa tantos e tão distinctos economistas, a elles mais do que a mim cabia de certo a honra de occupar o logar distincto em uma discussão a que são chamados pela especialidade de seus conhecimentos. O sr. Presidente:'-'Vamos á moção de ordem.