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N.º 14. Sessão em 18 de Maio 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 48 Srs. Deputados.

Abertura — Ao meio dia.

Acta — Approvada.

CORRESPONDENCIA.

Officios. — 1.º Do Ministerio da Fazenda, participando que Sua Magestade houve por bem deferir, por portaria de 14 do corrente, a pretenção que tinha a camara municipal da cidade de Lagos sobre as ruinas do Convento, Igreja, e logradouros, que foram dos frades Capuchos da mesma cidade; respondendo assim ao officio desta Camara de 30 de março do corrente anno. — Para a secretaria.

2.º Do Sr. vice-Presidente da Camara, participando que tendo fallecido seu irmão Manoel Ramos Pinto Vaz Preto, não póde assistir ás sessões no decurso desta semana. — Inteirada com sentimento.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Secretarios, na fórma do Regimento, terão de ir desanojar o Sr. vice-Presidente.

Tambem se mencionou na Mesa

Representação. — Do juiz e mesarios da confraria do corpo santo da real casa do compromisso maritimo da cidade de Faro, apresentada pelo Sr. Assis de Carvalho, queixando-se da prisão que se fez de quatro pescadores matriculados, para servirem no exercito, contra a excepção 8.ª do artigo 17.º da lei de 9 de julho de 1842, e pedem providencias sobre este objecto. — Á commissão de Infracções, ouvida a de Administração Publica sendo preciso.

O Sr. Secretario Corrêa Caldeira: — Fez constar na Mesa o Sr. Deputado Pereira de Mello, que não comparece á sessão de hoje por incommodo de saude.

O Sr. Costa Lobo: — Sr. Presidente, vou apresentar um projecto de lei para o pagamento do papel moeda. (Leu, e é o seguinte)

Projecto de lei n.º 59 A. — Senhores: O papel moeda, creado pelo alvará de 13 de julho de 1797 pagavel no fim de um anno, com o juro de seis por cento, de curso forçado como dinheiro de metal em todos os pagamentos entre particulares, e estações publicas, sem excepção, com as penas a quem o recusasse, comminadas aos que engeitavam moeda do Rei, foi pelo decreto de 23 de julho de 1834 privado da qualidade de moeda, e reduzido a um simples titulo de divida publica, promettido o seu pagamento desde logo com o abatimento de vinte por cento, e por inteiro do seu nominal, nos primeiros 15 dias de janeiro de 1848; nem uma, nem outra cousa foi cumprida; debalde tem esperado os que confiaram na palavra da auctoridade publica. Quinze annos são passados, sem interesse, ou renda alguma deste capital em todo este espaço: encon-

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tram hoje apenas como refugio o preço do mercado igual a dez por cento do seu valor nominal.

Um papel de credito publico assegurado por tantos titulos, considerado na sua creação como divida consolidada, vencendo juros, confundido mesmo em sua numeração com as apolices da Junta dos Juros, com especiaes garantias e hypotheca, esta hoje quasi sem valor, porque uma lei disse — não seja moeda! Disse outra — espere-se pelo pagamento!!

Muitos projectos de lei foram apresentados ao Parlamento em varias épocas, muitos nomes illustres se encontram na lista dos que se tem empenhado neste objecto: os Srs. Agostinho Albano, Passos Manoel, Conde do Tojal, Faustino da Gama, por differentes vezes levantaram a sua voz no Parlamento, mas debalde; um somno eterno tem succedido a estes clamores; que esperanças posso eu ter?

Movido porém das representações e apertadas instancias dos possuidores deste papel, dos quaes uma boa parte são estabelecimentos pios, e de caridade, forçado do meu dever como procurador do Povo, tenho a honra de vos apresentar o seguinte:

Projecto de lei. — Artigo 1.º Os titulos de divida publica denominados papel moeda, ou conservem a sua fórma originaria de apolices do Erario, ou estejam convertidos em novos titulos na conformidade dos artigos 3.º e 4.º do decreto de 23 de julho de 1834 — serão pagos aos possuidores que assim o quizerem, com inscripções de cinco por cento ao par de réis em inscripções a réis de papel moeda.

Art. 2.º A importancia do capital se accrescentara a somma dos juros vencidos na razão de cinco por cento, contados desde o primeiro de janeiro de 1838, até á publicação desta lei, os quaes serão igualmente pagos em inscripções de cinco por cento ao par com a somma dos juros vencidos.

§ unico. Os possuidores do indicado papel que acceitarem esta fórma de pagamento, ficam sem direito de reclamar qualquer indemnisação, que por ventura possa deprehender-se de quaesquer provisões consignadas nas leis e decretos, com o fim de favorecer estes credores do Estado.

Art. 3.º E designado o espaço de seis mezes aos referidos credores para poderem acceitar esta fórma de pagamento.

Art. 4.º São augmentadas em dois por cento todas as imposições cobradas nas alfandegas do Continente e Ilhas adjacentes: o seu producto é pura e exclusivamente destinado ao pagamento dos juros e amortisação das inscripções creadas em virtude da presente lei.

§ unico. São unicamente excetuados desta contribuição os vinhos e agoardentes de producção nacional, que forem embarcados para o estrangeiro.

Art. 5.º A Junta do Credito Publico directa e mensalmente receberá das alfandegas o producto desta contribuição, e no fim de cada anno, tendo primeiro pago os juros respectivos, applicará todo e excedente na compra ao menor preço do mercado, das inscripções creadas em virtude desta lei, as quaes fará queimar era acto publico, e com as solemnidades do costume.

Art. 6.º Fica revogada toda a legislação em contrario. — O Deputado pelo Douro — Francisco José da Costa Lobo.

(Continuando.) Sr. Presidente, á vista das muitas representações que tem vindo a esta Camara, de diversas corporações que possuem esta moeda; avista dos prejuizos que ellas apresentam terem recebido na mora do pagamento, e tanto mais lamentavel quanto que uma grande parte deste capital esta em estabelecimentos pios, cujas rendas são applicadas ao sustento dos pobres, o dos miseraveis, e ao curativo dos enfermos, e os seus capitaes emprestados aos lavradores com juro limitado: eu pedia a V. Ex.ª que consultasse a Camara para dispensar a segunda leitura, a fim de ser com urgencia remettida á commissão de Fazenda; e juntamente para satisfação desta Camara, para que os povos conheçam, que ella toma, como sempre tem tomado, em toda a consideração os seus interesses, que elle seja impresso no Diario do Governo.

Foi approvada a urgencia por 50 votos contra 9, e remettido ás commissões de Fazenda, e Especial do Orçamento.

Impressão no Diario do Governo — rejeitada por 41 votos contra 15.

O Sr. Pereira dos Reis: — Apresentei ha mais de 15 dias a esta Camara, a planta do terreno carbonífero da freguezia de S. Pedro da Cova, trabalho que a commissão de Administração Publica reputava quasi sufficiente para interpor o seu parecer sobre a questão, e agora o possuidor deste trabalho pede a restituição delle.

Por esta occasião seja-me licito pedir á illustre commissão de Administração Publica, se sirva dar o seu parecer sobre o objecto que lhe esta commettido. Eu não faço censura alguma á commissão; excito o seu reconhecido zêlo: a questão não é de meu e teu, tracta-se de uma questão publica, que é muito importante, porque já na cidade do Porto, se começa a sentir a falta daquelle combustivel, e é necessario decidir-se este objecto quanto antes. Já digo, reconheço o zêlo da commissão: mas vou conforme com o meu dever excitando-o.

O Sr. Albano Caldeira: — Sr. Presidente, o objecto, a que o illustre Deputado se refere, é da maior importancia e gravidade, como elle mesmo reconhece. A commissão tem dedicado todo o seu cuidado a este objecto, já têem havido quatro sessões para tractar delle, e esta accorde no parecer, que ha de apresentar; e nessa occasião a Camara terá de observar que elle involve muitas e variadas questões, o que justifica a demora que tem havido a esse respeito.

Quanto ao mappa a commissão prescinde, não carece delle para sustentar o seu parecer; mas talvez a Camara o não considere assim, e julgue que o precisa para a discussão.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, a commissão de Administração Publica, cujo zêlo o nobre Deputado vem de suscitar, tem, como o illustre relator acaba de dizer, dado a este objecto a maior attenção; a Camara precisa ainda de uma conferencia para chegar a um accordo a este respeito, e creio não será imprudencia asseverar, que em poucos dias, se o Governo concorrer á ultima sessão, em que deve ser ouvido, esta habilitada a apresentar esse parecer, e talvez por unanimidade: o Sr. Ministro do Reino já foi convidado a uma ultima reunião: a commissão procurou obter do Governo algumas informações da primeira vez que se reuniu, e aconteceu apparecer alli um official da secretaria d'Estado dos Negocios do Reino, mandado por S. Ex.ª para dar essas informações. Mas agora o que a commissão precisa é

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de saber a opinião de S. Ex.ª sobre os trabalhos já feitos, porque como o negocio involve questões gravissimas, é preciso que a commissão saiba qual é a opinião do Governo.

O Sr. Pereira dos Reis — Sr. Presidente, ninguem mais do que eu respeita a classe dos officiaes de secretaria, pertenci a ella por muito tempo, e desejo elogia-la sempre que fôr possivel; mas por mais habilitado que seja o official de secretaria, a que se alludiu, estes negocios não se tractam por procuração, devem ser tractados pelo Ministerio, competem exclusivamente ao Sr. Ministro do Reino: e eu sinto que negocios taes não sejam tractados directamente por quem compete. Não e occasião para me occupar deste objecto largamente; reservo-me para quando vier ao conhecimento da Camara. Entretanto seja-me licito repetir, que objectos taes não devem ser tractados por interpostas pessoas: nós não conhecemos officiaes de secretaria, conhecemos o Ministerio. Este negocio é importante, interessa particularmente até a honra do Ministerio, e admira que não tenha em S. Ex.ª o primeiro procurador.

Pelo que respeita ao mappa, não terei duvida, interpretando a vontade do seu possuidor, de ceder da pertenção de o haver já, se a Camara entender que necessita delle para a discussão; isto é, se o negocio vier á Camara, como promettem os membros da commissão. Por agora limito-me a isto, estranhando muito que um negocio, em que interessa directamente o credito do Ministerio, não tenha no proprio Ministerio o primeiro procurador.

O Sr. Albano Caldeira: — Sr. Presidente, depois da resposta que eu dei ao illustre Deputado, depois de dizer que a commissão se occupava deste negocio, que era um pouco delicado, e que brevemente apresentaria o seu parecer, julgava que devia ter terminado esta questão. Mas como o illustre Deputado, apresentando o que dissera o Sr. Deputado Rebello da Silva, de que um official de secretaria se apresentára na commissão para dar alguns esclarecimentos de facto, estranhou este procedimento, eu sobre isso direi só duas palavras: o Sr. Ministro do Reino foi convidado a assistir á commissão, mas não póde comparecer, e entendendo que a commissão carecia de explicações de facto, enviou-lhe um official da secretaria para lhe dar essas explicações: a commissão ouviu esse empregado, quanto a esses esclarecimentos. Nada acho aqui de incurial, nem de deshonroso para a commissão, ou para o Governo, o qual a commissão ha de ouvir necessariamente sobre o objecto.

O Sr. Presidente: — Este negocio não póde continuar, mas tenho a advertir, que a Camara tem direito a chamar ao seio das suas commissões os Srs. Ministros quando assim seja preciso, para assistirem ás suas reuniões. Na outra Camara até ha o costume de lhes indicar dia e hora para elles comparecerem. Em todo o caso não se póde admittir, que o Governo delegue o seu podér de intervenção e informação em officiaes de secretaria, que não tem authenticidade alguma, que não podem ser admittidos no seio de qualquer commissão, nem intervir nestes assumptos.

Em quanto á planta, visto que é reclamada, entendo que se deve entregar ao seu proprietario.

O Sr. Corrêa Caldeira — Mando para a Mesa duas representações, uma da Camara Municipal de S. Thiago do Cacem, pedindo a restituição da cadeira de grammatica latina, que existia n'aquelle concelho: e outra dos escrivães do juizo de paz da comarca de Ponte de Lima, pedindo providencias com que se occorra á penuria a que ficaram reduzidos pela ultima reforma da tabella dos emolumentos judiciaes.

E aproveito a occasião paro declarar que o Sr. Pereira de Mello não póde comparecer á sessão por incommodo de saude.

O Sr. Ferreira Pontes. — Pedi a palavra para chamar a attenção da illustre commissão Especial do Orçamento sobre a necessidade de apresentar com a brevidade possivel o eu parecer sobre as propostas, que lhe foram remettidas relativamente a consignar-se no orçamento do Ministerio da Justiça verba necessaria para dar auxilios aos conventos das religiosas.

O Sr. Poças Falcão: — A commissão do Orçamento não se tem esquecido deste objecto, porém precisa de certos esclarecimentos do Governo para dar um parecer com conhecimento de causa, e logo que tenha esses esclarecimentos, apresentára o resultado dos seus trabalhos.

ORDEM DO DIA.

Continua a discussão do projecto n.º 42.º — Orçamento da despeza do Ministerio dos Negocios do Reino — capitulo 3., e proposta do Sr. Moniz. (Vid. sessão de hontem.)

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, eu não posso deixar de me conformar com o voto do nobre Deputado que sustentou, que nós não podemos, nem devemos reconhecer ordenado algum que não esteja baseado em disposição legal. Tracta-se do ordenado para o archivista da Universidade junto ao govêrno civil de Coimbra: primeiro é muito para admirar que sendo este um logar a que se tem ligado tanta importancia, elle tão facilmente podesse escapar quando se confeccionou o orçamento: não posso descobrir a razão porque se propõe agora aqui o ordenado para esse empregado. Se esse ordenado esta fundado em lei apresente-se o titulo de disposição legislativa pelo qual se mostre que a esse empregado foi designado um certo vencimento, e eu então não terei duvida em o admittir; do contrario, não posso consentir que se introduza aqui uma verba que não esta reconhecida no orçamento anterior, nem no deste anno: e não estamos nós tão ricos que possamos fazer obsequios a qualquer individuo, e generosamente repartir os dinheiros da nação.

Ora, Sr. Presidente, eu sinto, na verdade ver a fórma por que este anno se encarou a questão financeira pelo lado do orçamento da despeza: este estado de prodigalidade de despeza que nos temos adoptado, estando a mãos largas augmentando ordenados, e restabelecendo gratificações, não é possivel continuar, depois dos sacrificios que exigimos o anno anterior: mudaram por ventura as circumstancias do anno passado para este anno? Se mudaram, foi para peior; o orçamento de receita e despeza e comparação dela, não nos dá grandes esperanças, nem offerece uma perspectiva lisongeira para que nós possamos dizer que as finanças hão de melhorar, e muito menos que hão de melhorar continuando nós no systema de restabelecer todas as gratificações, e

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concorrer directamente para o estabelecimento de todas as sinecuras que deviam ser banidas em presença da crise em que nos achamos, e de que precisamos sair infallivelmente. Vi que o anno passado se seguiu um systema bem pouco conveniente a respeito da questão economica, mas vejo que este anno ainda é mais fatal o que se vai seguindo. Sr. Presidente, eu voto contra a proposta para o estabelecimento d'um ordenado que não é fundado em lei, para o estabelecimento d'uma verba que não foi designada nem no orçamento do anno passado, nem no deste anno; e voto contra todas estas prodigalidades que se estão fazendo.

O Sr. Lopes de Lima (Sôbre a ordem): — Vou tractar de fazer uma moção sobre a ordem para que essa proposta, que esta sobre a Mesa, seja mandada á commissão para esta indagar o que ha neste caso.

Sr. Presidente, permitta-me V. Ex.ª que eu diga duas palavras em sustentação deste meu pedido. Quando na ultima sessão se tractou deste negocio, eu não emitti opinião alguma, dei simplesmente algumas explicações, com relação ao tempo em que estive governador civil em Coimbra Sr. Presidente, eu tenho idéa, mas não posso affirmar, que o empregado de que se tracta, que esta exercendo as funcções d'archivista no importante cartorio dos bens da Universidade, e addido ao govêrno civil de Coimbra, tem direito a um titulo de renda vitalicia, como empregado das repartições extinctas, e por isso que esta em exercicio, vence por inteiro o seu ordenado no valor de 600 mil réis, esta é a idéa que eu tenho, não digo que seja exacto, e por isso mesmo que não tenho certeza, e no estado de duvída em que todos nós estamos a este respeito, parece-me que o negocio deve ir á commissão, sem prejuizo da discussão do orçamento, para que, indagando o que ha no caso, proponha o que deve fazer-se a este respeito; podem dar-se direitos adquiridos, que devem ser mantidos. Se se tractasse de crear ordenados, outra seria a minha opinião, na discussão deste orçamento tenho mostrado bem que não sou advogado das sinecuras, nem de prodigalidades (apoiados) tenho proposto mais economias que nenhum outro; por consequencia não acceito, por maneira alguma, o titulo de partidario das liberalidades, não as quero com o dinheiro que é da nação. Faço esta proposta por que me parece que ha direitos adquiridos, e havendo-os é necessario que sejam attendidos; é a commissão pois que póde e deve indagar o que ha sobre o objecto em questão, e depois vir aqui propor o que julgar mais conveniente, e por isso eu vou mandar para a Mesa a seguinte

Proposta. — «Proponho que a proposta vá á commissão para colhêr esclarecimentos, e dar o seu parecer sobre o objecto em questão.» — Lopes de Lima.

Sendo apoiada entrou em discussão.

O Sr. J. L. da Luz. — Sr. Presidente, na sessão passada tinha eu pedido que a proposta do Sr. Deputado pela Madeira, fosse remettida á commissão para me illustrar ácerca do seu conteudo; porém depois procedendo ao exame dos orçamentos do anno passado, e deste anno em nenhum delles encontrei verba ou nota alguma a respeito deste emprego, nos capitulos — governos civis, nem no d'instrucção publica aonde vem contempladas todas as verbas de despeza da Universidade de Coimbra; por consequencia isto faz-me crer que não existe este logar, ou que se o ha, o vencimento do respectivo empregado é satisfeito por algum meio que não consta do orçamento. Se o emprego é necessario, a quem compele julgar da sua utilidade é ao Governo, e em tal caso que faça a proposta da sua creação, porque é ao Governo, que compete averiguar as necessidades do serviço publico, e pedir ás Côrtes que se estabeleçam ordenados. Não acho necessidade de que a proposta vá á commissão, porque a este respeito já estou completamente esclarecido.

O Sr. Moniz — Não me opponho a que o negocio seja investigado com toda a cautela; eu o que desejo é que o empregado não fique fóra como estava, ou em peior estado. Não posso porém deixar de observar, que eu tenho visto combater a minha proposta julgando-se que eu, com ella, quero crear um emprego novo, e um novo ordenado: não foi essa a minha intenção; o que eu propuz foi que se restabelecesse a verba omissa da gratificação ou ordenado para um empregado, que existe ha muitos annos. Este empregado foi primeiro deputado secretario da junta de fazenda da Universidade: depois de extincta a junta foi mandado continuar na guarda e direcção do cartorio dos bens da Universidade; ha differentes portarias e decretos a respeito deste empregado e seu emprego, elle tinha vencido até o penultimo anno o ordenado de 600$000 réis, que lhe fôra assignado por aquelles documentos officiaes em compensação de um conto de réis de ordenado, e duzentos mil réis de emolumentos que perdera pela suppressão do seu antigo emprego: compensação que de certo não peccou por generosa esta consignação andava já confirmada em alguns orçamentos, e não ha duvida que estava fundada em toda a justiça; porque alem da sua origem era a remuneração de um fuccionario mui antigo; e bem conhecido por seus relevantes serviços, não só naquella importante repartição, mas até no Ultramar como secretario do governador e capitão general do Pará, o Sr. Conde de Villa Flor, hoje Duque da Terceira. Quem tiver tido occasião de ter investigado este negocio, ha de ter achado, que tudo o que eu tenho dicto, assim a respeito da importancia do emprego, como dos direitos, e qualidades do empregado, é exactissimo. A. mesma lei para a venda dos bens da Universidade que aqui tivemos nesta Camara o anno passado, mandou conservar aquelle cartorio como um thesouro de preciosos documentos; e por este modo quiz de certo a conservação do archivista; pois quem quer o fim, ha de querer os meios: só o que escapou, foi marcar-se no orçamento a mesma verba já existente do ordenado do empregado. Aqui tenho na minha mão uma minuta do logar da lei, e das peças officiaes e mais circumstancias relativas a este negocio (leu) a qual offereço á consideração da Camara.

Por esta disposição da lei é evidente que ella reconhece a necessidade da continuação deste cartorio, e havendo necessidade do cartorio, elle não se conserva por si, ha necessidade de quem o conserve: e dada a necessidade do conservador, nenhum outro individuo poderá desempenhar tambem estas funcções, como aquelle que por tão longos annos tanta capacidade e experiencia tinha manifestado no mesmo exercicio. Se ha empregados que com razão se devam considerar como valiosas especialidades, são estes formados por largos annos de laborioso e assiduo estudo de antigos documentos: Sr. Presidente,

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em materias desta natureza, eu confesso que sou grande partidista dos empregados mais antigos; e estou intimamente persuadido de que nenhum empregado sendo mandado de novo para aquelle cartorio póde fazer o serviço com as mesmas vantagens com que este de que tracto o tem feito, e é capaz de fazer. Eu lembro-me até de ter visto excellentes memorias feitas por elle, e publicadas em um jornal de Coimbra. Mas pondo de parte isto, e até sem avaliar muitas outras considerações relativas á pessoa, tendo em vista só o serviço, o que eu desejo é que se preencha o fim da lei, e que para se marchar em conformidade com os bons principios não se abandone o serviço que a lei teve em vista, e não se lance á margem no ultimo quartel da vida um empregado que ha tantos annos serve, e que sem duvida é uma especialidade, e uma preciosa especialidade naquelle ramo de serviço.

Eis-aqui quaes foram as minhas intenções, quaes foram as razões com que eu procedi. Não sei que um Deputado, tendo vindo ao seu conhecimento de uma ommissão no orçamento de uma verba que estava fundada em lei, esteja por principio algum inhibido de propôr na occasião de se tractar do mesmo orçamento a sua restituição! Se fosse objecto novo, então não era esta a maneira de proceder, havia de ser por uma proposta de lei, mas não se tracta disso, o objecto não é novo.

Eu conheci este empregado quando estive em Coimbra, conheci o mesmo no exercicio do seu logar, vi-o no quadro dos empregados, foi abonado o seu vencimento no meu tempo, aqui estão illustres Deputados que tambem o conheceram no mesmo logar, e sei que no anno passado este mesmo objecto deu logar a serias considerações na outra Camara; e que em favor delle oraram o Ex.mo Cardeal Patriarcha, e o digno Par o Sr. Serpa Machado com todo o conhecimento de causa.

Espero que á vista de todas estas circumstancias que tenho exposto, a Camara ficára satisfeita, eu cumpri um dever, e os Srs. Deputados sabem que não houve da minha parte intenção alguma de surprehender a sua boa fé: não sou eu asado a isso: não póde alguem com razão arguir-me de tal. Eu logo de principio disse, que quanto ao modo não fazia questão de que fosse este, ou por meio dos creditos supplementares, ou por outro qualquer que parecesse mais conveniente, e mais proprio: em todo o caso eu insisti, e ainda insisto em que quando a justiça é inquestionavel, não deve ella ser sacrificada a meros ápices de forma; e a conveniencia quanto ao serviço, e justiça quanto ao empregado, tenho eu para mim que estão fóra de toda a duvida; e por isso confio em que a Camara ha de proceder como altamente pedem uma e outra

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, o illustre Deputado reconheceu que em muitas das reflexões que apresentou, estava fóra da ordem, porque presentemente tracta-se do adiamento, e não se tracta de justificar a proposta, nem os motivos que o illustre Deputado teve para a fazer. Ninguem duvida das intenções do illustre Deputado, (O Sr. J. L. da Luz — Apoiado) e muitos dos que aqui fallaram na sessão precedente, declararam desde logo que reconheciam a rectidão de principios com que apresentava a proposta; mas o facto é aquillo que nós temos aqui a considerar; o facto é o que nós temos a attender, e o facto e que se apresentava uma proposta que não era justificada na presença dos principios. Não se queira dizer que ella assentava no principio de legalidade, eu perguntarei ao illustre Deputado aonde esta esse principio de legalidade, qual é a lei que creou esse emprego? O illustres Deputado não o ha de dizer, porque não existe. Existe no orçamento, que era a unica parte aonde devia ir buscar secundaria ou subsidiariamente o motivo da sua proposta? O orçamento é contra, porque o illustre Deputado mesmo reconheceu que o orçamento do anno passado não fez menção nem deste logar, nem desta verba. Ora a lei do orçamento é annual, é verdade, mas tem o caracter de lei, e nessa lei revoga-se tudo o que não esta comprehendido nella; logo ainda mesmo que tivesse existido, visto que a lei de 26 de agosto declara que tudo o que alli não esta determinado, fica como não existente, era preciso que houvesse uma providencia especial para se tornar a restabelecer. Mas a quem pertencia restabelecer essa verba, e este emprego, se existiam? Ao Governo. E o Governo apresentou com effeito esta verba, e este emprego como necessario? Não: no orçamento vem novamente esta omissão, se omissão se podesse chamar, porque no orçamento não se refere este empregado em sentido algum; logo os factos do Governo, e a disposição da lei excluem inteiramente a proposta do illustre Deputado. E eis ai como o illustre Deputado esta convencido de que não assenta nem remotamente no principio de legalidade a sua proposta. Mas quer mais outra razão? Veja o proprio facto do governador civil de Coimbra. Pois não tem o illustre Deputado aqui a relação official dos empregados dos quadros das differentes repartições? Pois não tem aqui mencionados um por um os empregados desde o governador civil até ao porteiro? O governador civil que devia dar as informações ao Governo que devia proceder em virtude dessas informações do governador civil a respeito de todos os empregados, não o mencionam; logo elle não é empregado de govêrno civil de Coimbra, porque se o fosse havia de vir aqui mencionado. Eu leio ao illustre Deputado os nomes de todos esses empregados, e verá que não ha o que faz o objecto da sua proposta, (leu)

Eis aqui exactamente o quadro que foi mandado pelo governador civil de Coimbra, eis aqui esta o quadro, sobre o qual se estabelece toda a acção do Governo para confeccionar nesta parte do orçamento; logo para que havemos de aqui dizer — esta lá? Não esta, não póde estar, porque os documentos officiaes provam que não esta Ora é possivel que a Camara se queira regular por um dicto de um, ou outro Deputado, e que não acredite as informações officiaes do governador civil, nem do Governo? É impossivel; logo torno a dizer — os factos da lei, os factos officiaes do Ministerio, e os factos officiaes do proprio governador civil excluem a proposta do illustre Deputado

Mas esta não é hoje a questão, agora a questão é — deve ir a proposta á commissão para se tractar deste negocio, ou não? — Para mim não era necessario ír á commissão, eu havia de votar, e estou perfeitamente informado, á vista destes dados officiaes, para rejeitar a proposta, primeiro porque traz um augmento de despeza, e em segundo logar porque se não funda em lei primitiva; e mesmo quando esse archivista fosse necessario, eu havia de querer que

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esse logar fosse creado por uma lei especial, porque quero seguir rigorosamente os principios.

Já ve vê pois, que eu hei de rejeitar esta verba em quanto se não derem estas circumstancias, e muito mais quando ordinariamente o logar de archivista nos governos civis e um logar que é exercido por um empregado da repartição de fazenda dos mesmos governos civis, e é muito natural que seja em consequencia disso que não vem aqui esse logar, por que os empregados de fazenda nos governos civis sendo empregados subordinados ao Ministerio da Fazenda, de la é que isto depende; e então podiamos nós aqui estabelecer-lhe a gratificação, e elle estar como empregado da fazenda recebendo essa mesma gratificação; e isto é que não póde ter logar, nem as cousas desta natureza se podem decidir de uma maneira circumstanciada e positiva, sem ser por uma providencia especial, e com todos os conhecimentos que a commissão de Fazenda deve pedir ao Governo, e não sómente pela Secretaria do Reino, mas pela Secretaria de Fazenda para saber se existe este empregado, e em que qualidade já se vê que não existe no quadro pela relação do governador civil, como vence, e ate que ponto. Ora sobre isto nós não temos esclarecimentos nenhuns, e só por esta razão é que voto pelo adiamento, para que vá o negocio á commissão de Fazenda, e se competentemente obtenha esclarecimentos, a fim de informar a Camara, a qual, depois de informada, poderá votar com conhecimento de causa.

O Sr. Moniz: — O illustre Deputado que acaba de fallar, com toda a sinceridade devo dizer, suscita-me agora uma idéa que talvez dê a explicação da razão porque não veio esta verba no quadro do govêrno civil de Coimbra: como este empregado existiu já antes de se crearem as repartições de fazenda juntas aos governadores civis, e como tem havido tantas mudanças, tantas alterações, tantas trasladações dos ramos do serviço de umas para outras repartições e até da Universidade para o govêrno civil, e do governo civil para a Universidade, póde muito bem acontecer, ou para melhor dizer, o que exactamente acontece e que elle esta na repartição de fazenda junta ao govêrno civil. O que desejo, Sr. Presidente, é que a Camara esteja muito certa de que eu não venho aqui fazer esta proposta de leve, nem por simples informações particulares, nem por outros motivos estranhos aos meus deveres como Deputado. — (O Sr. Silva Cabral e mais vozes: — Apoiado).

Não ha duvída nenhuma que o emprego deste funccionar o existia, eu lá o achei quando estive em Coimbra; e elle o exercia muito dignamente, como já expuz; e foi mettido em folha por mais de uma vez nesse mesmo exercicio, torno a dizer que tenho aqui uma nota das citações de todas as peças officiaes, e actos legislativos concernentes aquelle empregado e a todo este negocio: por elles consta tudo quanto tenho allegado: por ellas infiro que o não apparecer este empregado no quadro do govêrno civil que o illustre Deputado citou, procede de elle estar na repartição de fazenda junta ao govêrno civil, ou em uma aggregada a ella. Mas em toda a boa fé, como me parece que na verdade, pelo que acaba de occorrer-me, é de esperar que elle esteja no quadro da repartição de fazenda, eu desejando que as cousas se façam com todo o aceio, concordo em que o negocio vá á commissão do orçamento; e que ella examine e pese bem todas as circunstancias; mas quanto ao facto appello para todos os Srs. Deputados que serviram em Coimbra, que poderão fazer-me a mercê de attestar que elle é exacto... (O Sr. Corrêa Caldeira: — Sim, Senhor; é exacto), este passo de ir o negocio á commissão para mim não seria necessario: mas como a Camara esta disposta a que o negocio vá á commissão, para conciliar as opiniões; e em respeito á Camara, concordo como que ella teve por mais curial.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para apoiar o adiamento, porque na verdade no estado em que esta a questão, não ha meio nenhum de sair della senão o que propoz o illustre Deputado, auctor do adiamento. Tracta-se de restabelecer o vencimento a um empregado que não apparece no orçamento; mas era necessario que se podesse aqui apresentar a lei, em virtude da qual aquelle empregado deve perceber o vencimento que se propõe, e em segundo logar era necessario tambem vermos a razão porque foi eliminado do orçamento passado, e estas duas proposições carecem de um desenvolvimento tal, que só a commissão de Fazenda, pedindo informações ao Governo póde chegar ao conhecimento cabal do que ha neste negocio O que posso dizer á Camara é, que este empregado de que se tracta, é um empregado distinctissimo (apoiado de muita probidade, de muita intelligencia, e de 42 annos de serviço, e a quem o paiz deve a conservação do archivo da Universidade, archivo importante, e archivo que não póde ser tirado do local em que existe sem perigo de o perder, como tem acontecido a excellentes archivos, porque, confundindo-se, não ha meio senão muito despendioso de o tornar a collocar na sua ordem. Todos sabem que no archivo da Universidade existem documentos de muita importancia seja para a historia, seja mesmo para a fazenda publica; nelle estão os titulos de muitos bens e bens importantissimos, e todos os dias, não só particulares, mas o Governo esta carecendo de informações e de certidões tiradas daquelle archivo.., Ora, Sr. Presidente, pondo de parte todo o passado anterior á lei que aqui se votou o anno passado, pela qual se mandou proceder á venda dos bens da Universidade, devo ponderar, que essa lei no art. 12.º, se bem me lembro, mandou que o cartorio da Universidade continuasse a ser conservado como archivo publico, de sorte que já esta Camara reconheceu não só a importancia do archivo, mas a inconveniencia que havia em o deslocar do estado em que se acha; e, pergunto eu, lendo a Camara reconhecido a necessidade da existencia do archivo, a quem se havia de confiar a sua direcção? Havia de ser a uma pessoa estranha, ou áquelle empregado que nunca desmereceu do serviço... (O Sr. J. L. da Luz: — Não se tracta disso) bem sei que não se tracta disso, mas é uma observação que vem para o objecto. Concluo por tanto pedindo á Camara, que por estas considerações approve o adiamento, para que a commissão examine bem o titulo que aquelle empregado tem para a sua conservação, e vencimento, e depois traga á Camara o seu parecer sobre o objecto.

O Sr. J. L. da Luz: — Sr. Presidente, não tracto da capacidade do empregado, cujo vencimento se discute; estou persuadido de que tem todo o mere-

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cimento que o illustre Deputado acabou de indicar; o que não posso perceber é como sendo o archivo da Universidade, que tem uma administração distincta e separada, que é um pequeno estado no Estado, porque ella não só administra tudo que diz respeito a magisterio publico, mas administra tambem objectos da fazenda que lhe são especiaes, não posso perceber, digo, como o archivo esta collocado fóra da esfera administrativa da Universidade... (O Sr. Corrêa Caldeira: — Esta dentro da Universidade); então a Universidade é que o administra, e se é verdade que não tem os meios necessarios para isso, compete ao Governo propo-los á Camara. Eu tinha-me opposto, Sr. Presidente, a que a proposta fosse á commissão, porque estava devidamente esclarecido; mas depois das declarações que se acabaram de fazer, vejo que é indispensavel que a commissão examine a proposta do illustre Deputado, a fim de que ouvindo o Governo altere ou deixe subsistir o capitulo como esta. Approvando-se esse novo vencimento ha de ser inserido onde o Governo entender, porque é o Governo quem deve designar as situações do orçamento, onde os vencimentos devem ser postos. Quando o illustre Deputado auctor da proposta se levantou a primeira vez, eu entendi que elle queria na Camara, e na discussão do orçamento, crear um logar; a isso me oppunha eu para não alterar o que se acha a este respeito estabelecido.

Julgou-se discutida a materia unanimemente. E pondo-se á votação a

Proposta de adiamento — foi approvada unanimemente.

Continua a discussão do capitulo. O Sr. Silva Cabral: — Desejo dirigir uma pergunta ao Sr. Ministro do Reino: é de pequena entidade de certo pela quantia, mas pelos principios a que eu sempre obedeço, é de gravidade. No art. 10.º secção 1.ª vem para o governo civil de Lisboa, dois correios a pé, e um dito a cavallo: perguntarei a S. Ex.ª se são estes unicamente os correios que estão ás ordens do governo civil de Lisboa, ou se por ventura não tem estado mais tres correios a cavallo, e um a pé da repartição dos correios? E se S. Ex.ª, quando o facto seja verdadeiro, deixa de reconhecer, que isto importa um augmento de despeza para a fazenda publica? Eu admitto que n'um caso da do se possam fazer essas requisições ao Correio Geral, mas não posso deixar de levantar a minha voz contra os abusos que se estão commettendo neste sentido, não digo só pelo govêrno civil de Lisboa, mas por todas as secretarias, ou quasi todas. S. Ex.ª não póde ignorar que os correios que se chamam a pé, estando no Correio Geral vencem unicamente 200 réis por dia, e que desde o momento em que são transportados (deixe-se-me assim explicar) para as secretarias, sendo a pé, ficam logo vencendo 600 réis, e sendo a cavallo 1600 réis. Ora, quer S. Ex.ª saber qual a grande differença que ha só nesta verba? Pelos correios extraordinarios que se teem chamado ás secretarias, e que estão no govêrno civil de. Lisboa, elevou-se a quantia a 6 contos de réis, e diminuindo-se os 200 réis por dia que legalmente lhes pertenciam, ainda ficam contra a fazenda 5 contos e tanto. Isto é sómente em correios que as mais duas vezes se pedem para satisfazer não a uma urgencia immediata do serviço, mas unicamente a uma especie de luxo, que se tem agora estabelecido a respeito de correios, Espero pois que S. Ex.ª que dê os esclarecimentos que pedi com relação a esta verba especial do govêrno civil de Lisboa.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros, e Ministro do Reino: — O que acabei de dizer o illustre Deputado quanto ao numero de correios que estão no governo civil de Lisboa, é exacto; mas estão alli já ha muito tempo; é costume antigo: entretanto tômo nota da quantia a que S. Ex.ª disse que montava essa despeza, e verei se é possivel que o serviço se faça sem esse numero de correios.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Sr. Presidente, devo dar algumas explicações a este respeito, porque o facto a que se allude, é respectivo á repartição a que pertenço. Não ha duvida nenhuma que é exacto o que disse o Sr. Deputado, que no govêrno civil fazem serviço extraordinariamente, não sei se tres correios a cavallo e um a pé, além dos correio? que pertencem áquella repartição; mas isto não é de agora; pelo menos desde que tenho a honra de servir o govêrno civil de Lisboa, nunca o serviço daquella repartição, mesmo em tempos ordinarios, nunca o serviço daquella repartição póde ser feito só pelos correios pertencentes ao quadro, que são dois correios a pé e um a cavallo, e sempre estiveram alli ora dois, ora tres correios do Correio Geral em serviço extraordinario, porque todos sabem qual é o expediente daquella repartição, e a necessidade que ha quasi todos os dias de que esse expediente seja entregue immediatamente. Ha além disso a necessidade de ficar todas as noites um correio no govêrno civil, e o correio que perde assim a noite, não póde ser obrigado a fazer serviço no dia seguinte; e ou se ha de expor aquella repartição a não ter um correio, que leve as» ordens necessarias n'um momento de perigo, n'uma occasião de incendio, ou de desordem, ou ha de continuar-se na practica até agora seguida, embora essa practica custe dinheiro, porque não sei que se descubrisse até agora o meio de fazer o serviço publico com promptidão e actividade, sem se gastar com elle. Por consequencia termino declarando que é verdadeiro o facto, e que entendo que é justificavel pelas circumstancias; se assim não fosse, de certo que os dignos magistrados que têem estado á testa daquella repartição, não teriam requisitado ou conservado esses correios; por mais de uma vez se tem ponderado a necessidade de elles serem restituidos ao Correio Geral, e cessarem os seus vencimentos extraordinarios e outras tantas vezes se tem reconhecido a impossibilidade de fazer similhante economia, sem se arriscai o serviço publico a soffrer por essa falta de communicação prompta um damno muito maior, do que a despeza que se faz com esses correios.

O Sr. Silva Cabral. — Esta verificado o facto, é certo que existem tres correios a cavallo, e um a pé, no governo civil, fóra do quadro: agora o que convem saber é se as urgencias do serviço pedem ou não este avultadissimo numero de correios, tanto a pé, como a cavallo, perfazendo ao todo o numero de sete. Ora eu entendo que sete correios, quatro a cavallo, e tres a pé, não eram necessarios, nem para duas secretarias, quanto mais para o governo civil! Não estejamos a fallar aqui com o que se tem practicado; nem tambem queiramos confundir as circumstancias extraordinarias com as circumstancias ordinarias. É verdade que em 1844, havendo alli só um correio, se requisitaram mais dois, mas porque razão se fez isto!

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Fez-se porque estavamos debaixo de uma revolta nessa occasião; e se estes correios continuaram a fazer serviço por mais algum tempo naquella repartição, foi porque então por motivos extraordinarios tinha crescido o serviço; mas logo que cessaram estas circumstancias, deu-se ordem para elles voltarem á respectiva repartição; até veio uma portaria da secretaria dos Negocios Estrangeiros a este respeito, ponderando que não era possivel que a repartição do Correio Geral ficasse sobrecarregada com aquella despeza, por isso mesmo que ella não estava auctorisada por lei alguma, nem estava incluida no orçamento. Se o Governo vir que para circumstancias ordinarias tem necessidade de mais algum correio, deve ponderar á Camara esta necessidade; mas a seu livre arbitrio augmentar a despeza do Estado, isto não se póde tolerar. Por isso é que eu digo que o orçamento é uma inteira decepção; porque diz aqui — um correio a cavallo e dois a pé, para o governo civil — e quando vamos observar o negocio, encontra-se uma cousa extraordinariamente differente. E como é possivel que o Corpo Legislativo nestas circumstancias possa deixar de attender a um abuso similhante?!... Eu entendo que para um caso extraordinario se póde fazer uma requisição: se por ventura ha um serviço extraordinario de dois, tres, ou mais correios, mas acabado este serviço devem voltar immediatamente á sua repartição; porém não, acontece assim, porque depois que são requisitados, elles continuam alli a fazer serviço, e até estes mesmos correios têem empenho nisto, porque differente é ganhar 200 réis, ou 600 réis, ou 1$600 réis, em quanto alli estão. Portanto eu chamei a attenção do Sr. Ministro do Reino sobre este objecto, a fim de se conhecer se o facto era verdadeiro; agora que se sabe que elle existe, o que compete vêr, é se acaso se deve ou não legalisar este mesmo facto. Se não é bastante um correio, venha S. Ex.ª pedir dois, mas não seja por meio de um abuso que se estabeleça uma despeza publica. E unicamente neste sentido que eu chamo a attenção do Sr. Ministro.

O Sr. J. L. da Luz: — Eu pedi a palavra unicamente para dizer á Camara que no orçamento não vai lançada senão a verba necessaria para tres correios, que se pedem para o governo civil; ora se em logar de tres correios, ha cinco, não sei eu quem paga esta despeza: aqui no orçamento não esta auctorisada a despeza senão para tres correios, e nada mais.

O Sr. Corrêa Caldeira: — Eu pedi a palavra para

dar mais uma pequena explicação. Quando eu me referi ao que se passou a este respeito no governo civil de Lisboa desde 1844, foi para mostrar que nunca foi possivel fazer o expediente daquella repartição com o numero de correios, que esta estabelecido no orçamento: e agora devo accrescentar, que os correios que o orçamento dá ao govêrno civil de Lisboa, são dois a pé, e um a cavallo; ora se o governo civil tivesse estado dependente do serviço destes empregados, todo, ou quasi todo o expediente de urgencia teria sido impossivel; porque os dois correios a pé já são homens velhos, e não estão em circumstancias de desempenhar o serviço daquella repartição, principalmente n'uma cidade aonde as distancias são tão grandes; e o correio a cavallo tem estado ha muito doente, e em circumstancias de não montar a cavallo, e só ha mez e meio que tem podido fazer serviço. Ora se o govêrno civil não tivesse requisitado correios para irem servir alli extraordinariamente, não tinha tido por quem mandar fazer o serviço daquella repartição. Eu já mostrei que não só por ter de se mandar a correspondencia a todos os bairros de Lisboa, mas attendendo mesmo aos pontos a que ella tem de ser dirigida, não é possivel que os dois correios a pé possam entregar n'uma tarde os officios de expediente; e mesmo o correio a cavallo não póde fazer este serviço, porque tem de ficar de piquete para acudir a alguma desordem, ou incendio (o que é muito commum n'uma cidade desta ordem), e ir avisar as auctoridades, ou levar outra qualquer ordem que seja necessaria. Eis aqui a razão porque lendo-se requisitado, em circumstancias extraordinarias, mais dois correios, estes teem continuado a fazer serviço até agora; e será muito difficil que o governo civil possa prescindir destes correios, sem se sujeitar a grandes inconvenientes. A Camara todavia resolverá na sua sabedoria como julgar mais vantajoso ao bem do Estado.

Julgou-se a materia discutida por 60 votos contra 4. E pondo-se á votação o Capitulo 3.º — foi approvado por 57 votos contra 7.

O Sr. Presidente do Conselho: — (Sôbre a ordem) Antes de se passar ao capitulo immediato, julgo dever dar á Camara a explicação que hontem prometti sobre o governador civil de Vianna. O governador civil de Vianna, como hontem disse, ainda não tomou posse do seu logar, nem recebeu cousa alguma do seu ordenado.

Passou-se ao seguinte

Capitulo 4.º — Instrucção publica.

[VER DIARIO ORIGINAL]

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[VER DIARIO ORIGINAL]

O Sr. Corrêa Leal: — Na secção 4.ª deste capitulo vem estabelecida uma verba de 400$000 réis para uma aula de Tachygrafia, que deve ter a sua cadeira n'um dos lycêos desta Capital. Ora eu não assevero que não exista lei: mas não me consta que a haja creando esta cadeira, nem os orçamentos anteriores traziam a verba para esta disciplina: e se ella existiu, como todos sabem, dentro deste mesmo edificio, creio que isso foi por uma resolução da Camara dos dignos Pares, incumbindo ao primeiro tachygrafo daquella Casa (já defuncto) o Sr. José Sérvulo da Costa a cadeira daquella arte. Ora é possivel que a illustre commissão me possa tirar da duvida em que estou, a respeito da existencia ou não existencia da lei que creasse esta cadeira; porque se a lei não existir, a verba não póde tambem existir; e não ha de ser porque ella vem no orçamento, que ha de ser sanccionada: e no caso de existir a lei, ainda assim não basta, porque eu hei de propor á Camara uma economia, que ella na sua sabedoria não recusará, segundo as razões que para isso tiver a honra de apresentar-lhe. Por ora limito-me a perguntar ao illustre relator da commissão se é fundada em lei a verba, que vem aqui de 400$000 réis? Segundo a resposta que S. Ex.ª der, então tomarei a palavra, se me convier.

O Sr. J. L. da Luz: — Respondendo ao nobre Deputado digo, que é do Governo que deve sollicitar a resposta á pergunta que dirigiu á commissão; porque a commissão não teve tempo de comparar todas as verbas de despeza pedidas pelo Governo, com a legislação do Paiz; isto seria um trabalho immenso a que a commissão não podia ter-se dedicado com toda a exactidão; eu declaro que o não fez na maior parte das verbas; fe-lo a respeito de algumas, em que sentiu alteração notavel em relação á lei de 22 de agosto do anno passado, mas não nas verbas vulgares. Por tanto não posso dizer se ha legislação respectiva a esta verba; o Sr. Ministro poderá responder; não obstante se o nobre Deputado quer propor alguma economia, e o Governo entender que se póde fazer sem prejuiso do serviço publico, a commissão não duvída acceita-la.

O Sr. Forjaz,: — Sr. Presidente, a discussão do orçamento é, em toda a parte, a mais importante de quantas se apresentam: cabe nella a noticia dos melhoramentos, de que o paiz necessita. Fallarei em relação ao capitulo da instrucção publica.

Sr. Presidente, o instrumento mais efficaz da ventura publica, a fonte mais fecunda da prosperidade dos povos, a origem de todo o bem, é, sem questão, a instrucção, e sobre tudo a instrucção primaria, que chega ao maior numero, e deve aproveitar á massa total do paiz, derrama-la deve ser um dos primeiros deveres do Parlamento, e das Côrtes, e entretanto talvez tenha sido o ultimo, a que se tem attendido!...

A falla de educação primaria, o barbarismo em que se acha a maxima parte da Nação, a carencia de alimentos de instrucção, é esta, e nenhuma outra, a primeira causa do atraso em que estamos, pois sem essa educação é impossivel que o povo compreenda e avalie os beneficios que lhe resultam da liberdade; sem essa instrucção é inexequivel qualquer systema eleitoral por mais perfeito que seja, por maiores garantias, que offereça a independencia, e liberdade do direito eleitoral, sem essa sciencia são absolutamente perdidas quaesquer reformas, que se façam nos differentes ramos de administração.

Divaguemos pelas provincias, e encontraremos as provas das minhas asserções!...

Que espectaculo tocante não é vêr, a troco d'inauditos esforços, os lavradores pagando uma contribuição onerosissima — o subsidio litterario — para viverem na ignorancia?......

Sr. Presidente, revolta o animo vêr freguezias, aliás grandes, pagando centos de mil réis para o subsidio, e não tendo para os empregos parochiaes meia duzia de homens que saibam lêr?...... Como querem

que os povos se instruam no sublime das idéas liberaes, se os privam da conveniente instrucção?.....

O fim principal da instrucção primaria é ensinar ao povo a ler, a escrever, e contar, (dizia ao Parlamento Mr. Guisot, Ministro do Reino em França em 1840) mas ao adquirir estas noções fundamentaes, deve tambem receber salutares lições de moral, de patriotismo, e de economia domestica — em uma palavra, importa, que explicações simples e claras lhe sejam subministradas sobre as maravilhas da natureza, sobre os fenomenos, que fazem nascer, e conservar a maior parte dos prejuizos populares, sobre os processos das artes uteis, e de agricultura, sobre os factos mais notaveis da historia nacional.

Sr. Presidente, o nosso atraso, esse mal, que todos sentem, e todos lamentam, provém do desleixo das auctoridades — da falta de bons mestres de primeiras letras — da carencia de parochos dignos; e por isso a dois pontos cardiaes deve o Parlamento, e o Governo attender — mestres, e parochos — porque da sua completa reforma, da sua inteira melhoria, depende essencialmente a ordem publica, o desenvolvimento da Constituição, o progresso das artes, e das sciencias, a ventura e prosperidade dos povos.

Sr. Presidente, todos os legisladores da antiguidade eram mais solicitos, e mais filosoficos, que os modernos — os antigos tomavam o homem ainda no berço para desde aí o irem amparando, dirigindo, cultivando, e indireitando para a virtude, e para bem servir a patria — assim procederam Lycurgo, Platão, Sólon, e outros na Grecia — e Numa, e outros em Roma; os modernos porém abandonam o homem ao desleixo, ao capricho, e peior que tudo, aos máos exemplos!....

Sr. Presidente, á vista da immensa importancia deste ramo de instrucção publica, envergonha lêr-se, que para que se destine apenas a imperceptivel somma de 98 contos de réis!....

Em França, no tempo da realeza, votaram-se sem hesitar, um milhão de francos, em poucos annos esta quantia subiu a dois milhões, e comtudo essas sommas enormes foram sempre consideradas como muito escassas; e a Republica, querendo apoiar-se seguramente na sua larga base democratica, tem já ampliado, e estenderá cada vez mais a instrucção. (Uma

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Voz — Não e verdade, olhai ás instrucções dadas por...) O Orador: — Alludo ao actual govêrno da Republica, e não ao governo da Republica Vermelha. (apoiados)

Sr. Presidente, se tivessemos tido Governos organisadores, ter-nos-ía acontecido o que aconteceu em França, e não dariamos hoje ainda um documento vergonhoso de ignorancia indisculpavel.

Sr. Presidente, applicar unicamente 98 contos para instruir um povo, e que paga de impostos milhões, e um êrro — mais do que um êrro — um crime!

A França tinha em 1810 mais de 37.000 escólas nacionaes, alem de umas 800 escolas primarias particulares, em quanto nós temos hoje apenas pouco mais de 1:000 escólas, das quaes a maior parte estão desprovidas de mestres, porque os ordenados, e os atrazos de pagamento, não convidam, (apoiados) ou providas em individuo, que salvas honrosas excepções, são inteiramente ineptos!....

Sr. Presidente, as estatisticas litterarias ai estão publicadas no relatorio do Ministerio do Reino, e na verdade causa dôr vêr, que talvez teremos apenas um escola para cada 2:900 habitantes.

A proporção é atterradora! É verdade, que das escalas estatisticas publicadas sobre instrucção, não podémos argumentar com dados certos, pois são assaz imperfeitas, ate mesmo, porque muitos director e mestres de taes estabelecimentos, diz o nobre Ministro do Reino, desconhecendo os interesses proprios, e os da sociedade, teem procurado subtrair se ao cumprimento da lei, que os obriga a declarações sobre o objecto e collocação das suas escólas, e a mostrarem a sua proficiencia, intellectual, e moralidade necessaria para o ensino, e educação dos alumnos.

Sr. Presidente, mas se e aterradora a proporção a que alludo, que direi da comparação das verbas votadas para a instrucção superior?.... Das destinadas para as escólas de meninas?.... Das despendidas com outros ramos de admnistração publica?

Não e possivel encontrar nada mais absurdo, do que o modo porque são distribuidos os dinheiros publicos em Portugal — as inutilidades absorvem tudo — para as cousas de verdadeiro prestimo fica quasi nada.

Com a instrucção superior, que só póde ser aproveitada por um muito pequeno numero de individuos, e que se deve considerar por isso mesmo como menos util, de que as outras, gasta-se acima de 140 e tantos contos de réis!...

Com a instrucção secundaria, que deve estar ao alcance de todos aquelles, que, gosando de uma mediana fortuna, podem dedicar ao aperfeiçoamento da intelligencia mais alguns, annos de que os filhos do povo, gasta-se pouco mais de 50 e tantos contos de réis!

Com a instrucção primaria que deve ser para todos, que é a unica, a que o povo póde alcançar, a unica, que melhores, e maiores resultados póde dar, gasta-se apenas 98 contos de réis?

Com as escólas practicas, com o ensino professional — com o ensino agricola — gasta-se apenas a insignificante quantia de 1 conto de réis, applicado para o conservatorio de artes e officios!....

Sr. Presidente, reconhece-se, que um dos caminhos mais faceis para se moralisarem, e adoçarem os costumes do povo, domar seus instinctos, e dar lhe o amor do trabalho, é o fazer boas mais de familias, e a educação das mulheres do povo, abrindo-se para ellas escolas, onde se lhes aperfeiçoe o coração, dando se-lhes ao mesmo tempo cultura a intelligencia, e quer V. Ex.ª saber, quanto se gasta com este importante ramo, quasi o mesmo que se despende com o ordenado de um Ministro d'Estado?....

Deixo outras comparações assaz salientes, e assaz espantosas, bastara dizer, que em quanto se gastam milhões com os militares, e contos e contos com a arrecadação, e administração fiscal, abandona-se inteiramente a instrucção, e educação popular!....

Desejo todas as possiveis reducções, todas as economias convenientes, unico caminho a seguir para salvai o paiz, porem reducções nos tribunaes desnecessarios, nos pessoaes das secretarias, economias nas despezas publicas, e nas verbas superfluas, reducções, e economias em tudo, e para indo, menos para a educação, e instrucção do povo, (apoiados) pois quaesquer sacrificios pela multiplicação, e melhoramento das escólas primarias ficarão de sobejo compensados com as vantagens, que do ensino dellas deve resultar ao Estado? (apoiados)

Sr. Presidente, com esse ramo do serviço publico tem inteira ligação as casas de Asylo. Estes estabelecimentos de beneficencia ressentiram-se, é verdade, dos estragos e consequencias das nossas dissensões politicas, e o Governo tem dever imperioso de lhes dar a necessaria protecção, a vista da sua importancia, que abrange toda a esfera dos socorros, publicos, devidos á humanidade desvalida, no estado de infancia, de doença, e de extrema velhice.

Tenho toda a confiança nos desejos, nas palavras, e nas promessas do nobre Ministro do Reino, mas com a franqueza, e lealdade, de que uso, peço licença para perguntar a S. Ex.ª, se os desejos do Governo são proteger estas casas, regularisar o seu serviço, augmental-as, animal-as, como retarda a informação solicitada pelo Parlamento, sobre a pertenção do Asylo de infancia desvalida da cidade de Coimbra, pedindo o uso gratuito do extincto collegio de Santo Antonio da Pedreira 7..... Por que, não da na expedição desta informação uma prova irrecusavel da sua protecção a similhante casa, digna de toda a consideração, pelo seu progresso, e tambem por ser a unica, que a excepção do Porto existe nas provincias 7..

Sr. Presidente, tambem com este ramo de administração publica tem ligação a distribuição de Livros Elementares, sendo este, um dos objectos, que deve merecer ao Governo especial attenção, para o qual entretanto não vejo votada somma alguma, quando é certo, que convem organisar uma boa collecção de bons livros elementares para dar impulso efficaz ao progresso e melhoramento do ensino pre-primario, cuidando em fazei traduzir os melhores modelos, que ha em outros paizes, e por esta occasião chamo a attenção do nobre Ministro do Reino sobre a conveniencia de se recommendar ao Conselho Superior de Instrucção a traducção de Manual das Salas de Aylo de Mr. Chochim, ultima edição; convindo, que fosse impresso por conta do Estado, para se repartir pelas camaras municipaes e freguezias, a fim de se obterem em Portugal os mesmos felizes resultados, que se obtiveram em França, fazendo-se conhecer e apreciar a instituição, e guiando assim a fundação e direcção destes excellentes institutos.

Concluo dizendo, que me parece inconveniente a

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eliminação do ordenado de Reitor da Universidade, que d'um para outro momento póde ser necessario nomear, não obstante a dignidade do actual Prelado dessa corporação scientifica; bem assim peço explicações sobre o augmento do ordenado d'um outro substituto extraordinario em Direito.

O Sr. Presidente do Conselho: O illustre Deputado pelo Douro fez allusão á verba de 400 mil réis destinada para a aula de Tachygrafia, dizendo que não lhe constava que houvesse auctorisação de lei a este respeito; eu torno a dizer que todas as minhas instancias e trabalhos foi para que no orçamento não apparecesse nada que não estivesse decretado por lei; e digo ao illustre Deputado que o art. 44.º do decreto de 17 de novembro de 1836 diz:

Nos lyceus de Lisboa, Porto, e Coimbra haverá a mais duas cadeiras, uma de lingua Grega, outra de lingua Allemã. N'um dos lyceus de Lisboa «haverá mais as disciplinas de Diplomatica, Paleografia, e Tachygrafia.

E o art. 53.º do decreto de 20 de setembro de 1814 que diz:

As cadeiras de Diplomatica e Tachygrafia creadas em Lisboa, considerar-se-hão annexas ao lyceu, para o fim sòmente de serem inspeccionadas pela mesma auctoridade.»

Porém antes desta Legislação publicou-se o Decreto de 5 de maio de 1834, que restabeleceu a cadeira da aula de Tachygrafia, e nomeou para ella José Sérvulo da Costa.

Por tanto temos lei que estabelece a aula de Tachygrafia.

Lamentou o illustre Deputado, o Sr. Forjaz, a fui ta que hade instrucção primaria; de certo muito é para lamentar essa falta, e o Governo tracta de augmentar quanto seja possivel a instrucção primaria; mas no estado em que nos achamos, estando vagas 70 cadeiras em que tenhâmos encontrado quem as possa preencher (Uma voz: E pelo pequeno vencimento que tem)... Se a Camara julga na sua sabedoria que estamos nas circunstancias de augmentar os ordenados, de certo o Governo não se opporá; porém não julgo que este seja o momento.

Fallou o digno Deputado tambem sobre o Asylo da primeira infancia de Coimbra; — Sr. Presidente, no Ministerio do Reino receberam-se duas representações da direcção daquelle estabelecimento, o Governo mandou immediatamente proceder a todas as averiguações necessarias; nesse meio tempo a mesma direcção dirigiu-se a esta Camara; e a sua representação creio que foi mandada ao Ministerio da Fazenda: eu tomarei nota para lembrar ao meu Collega a necessidade de dar quanto antes andamento a este negocio.

O Sr. J. L. da Luz (Sobre a ordem). — Na copia deste Capitulo houve um êrro na primeira verba, que affecta todo o capítulo, e mando para a Mesa a competente rectificação: Diz-se ahi (leu) deve ser o seguinte

Fallou tambem o illustre Deputado n'um substituto extraordinario em Direito que apparece aqui: não podia deixar de apparecer, porque existe; creio que o anno passado é que houve equivoco, o homem esta vivo, e tem todo o direito a este ordenado, por consequencia creio que o illustre Deputado ha de nisto combinar comigo.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, já fui em parte prevenido em alguns dos pontos que tinha a tocai, pelo illustre Deputado pelo Douro que se senta no banco immediato a mim; mas eu já o anno passado ergui a minha vóz a pedir instrucção para o povo, que eu reputo como pão para o povo: sei que d'ahi não resultou bem nenhum; nem provavelmente resultará do que o illustre Deputado, e eu agora dizemos, ao menos temos este desafogo, e ás vezes tanto dá a agoa na pedra.... Sr. Presidente, é realmente irrisoria a estatistica da nossa instrucção superior, quando se apresenta um ponto em que deveria ser a instrucção primaria. Ha apenas 1:000 e tantos professores de instrucção primaria, e acaba de dizer-se que estão 60 e tantas cadeiras vagas, por não haver quem as queira occupar; e ao lado disso apparece uma instrucção secundaria, e superior que é enorme para o nosso paiz, com um pessoal de 509 pessoas, de maneira que para cada pessoa que se empregar na instrucção superior, ha apenas dois professores de instrucção primaria para cada um das de instrucção superior: isto basta só apresentar-se para fazer riso; 1:000 professores, já se vê, que não chega a haver nem dois para cada concelho, e essas mesmas cadeiras não estão providas, e as que estão, sabe Deos como o estão; para isto ha duas razões, a primeira é na realidade o pequeno ordenado que se dá aos professores, e a segunda é que esse mesmo pequeno ordenado não lho pagam, tem apenas 110$000 réis, tomaram elles que lhos pagassem; mas isso mesmo não o veem; essa é a razão principal, porque não ha ninguem que as queira, ao mesmo passo que a instrucção superior, como já disse, e todos conhecem, é um colosso: ha instrucção superior no nosso paiz que é inteiramente de luxo; o nosso paiz é um paiz de doutores, mas em que o povo não sabe escrever, e acontece mesmo que as habilitações da instrucção superior não são quaes devem ser, e daqui resulta que muitas vezes se fórma um bacharel, que vem depois apparecer na sociedade sem saber os primeiros rudimentos da grammatica portugueza: eu

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conheço alguns que tem chegado a altos empregos, o a Deputados e ate Ministros, sem saber grammatica, e sem saber reger uma oração o que acabo de dizer e uma verdade, eu não faço applicação a ninguem, e uma hypothese Sr. Presidente, este vicio radical mostra o nosso atrazo de civilisação, que é preciso acabar, e eu estou persuadido que a verba proposta, feitas as reformas que se deverão fazer, talvez pouco mais fosse bastante para a organisação da instrucção publica, ao menos senão fosse tão completa como a dos outros pares illustrados, seria muito mais satisfactoria do que a que temos, mas isto tem-se aqui dito já n'umas poucas de sessões, o nobre Ministro acaba de reconhecer estas verdades, e diz que as lamenta, e então, Sr. Presidente, não basta só lamentar. Eu peço ao Sr. Ministro que não se contente só de chorar sobre os rios que vão para Babylonia. = alli sentado chora as desgraças de Sião = eu peço a S. Ex.ª que se levante. Portanto visto que S. Ex.ª reconhece esta necessidade, e escusado estar a cançar-me, e a Camara, e caso haver vontade, para se removerem os inales, e necessario, digo, haver vontade, decisão, coragem, e tambem e necessario haver pensamento, e firmeza e coragem para affrontar certos estorvos, que ordinarmmente se oppoem ao andamento das reformas

Agora devo prevenir a S. Ex.ª sobre uma observação, que talvez se já mais cabida no Ministerio dos Negocios Estrangeiros, mas lanço-a já aqui, para depois em tempo a apresentai, pelo mesmo motivo pelo qual o nobre Ministro obrigou a um amanuense da Secretaria do Conselho d'Estado, a optar entre esse emprego, e o que tinha no Correio, ha tambem um membro da instrucção superior que esta no mesmo caso, por ser secretario geral da administração do Correio, e previno a S. Ex.ª de que esses dois exercicios, não fallando mesmo na accumulação dos ordenados, mesmo nos empregos e incompativel, porque não ha em Portugal repartição mais trabalhosa que a do Correio, que não tem dia nem noute de descanço, nem domingo, nem dia tancto, e resulta que aquelle empregado por ter uma cadeira, sabe-se que entta as tres e quatro horas, por consequencia causa um atrazo no expediente, porque depende toda a direcção dos correios do logar de secretario geral. Ha ainda outro empregado que é substituto, mas esse não e para aqui, e substituto na escóla naval Sr. Presidente, eu lancei estas observações para que quando chegai mos ao Ministerio dos Negocios Estrangeiros, e a verba dos correios, ter de as repetir a respeito das mesmas cousas e de mais algumas, agora tambem torno a repetir uma observação que fiz o anno passado, e ía não foi a primeira vez, em que mostrei que no conselho superior de instrucção publica, sendo um tribunal superior de instrucção presidido pelo nobre Ministro do Reino, tendo trabalhos todo o anno, e trabalho, consideraveis, porque administra toda a instrucção em geral, que o secretario tem apenas 400$000 réis de ordenado, e emolumentos anteriores ao que tem o secretario da Universidade, ao passo que o da Univeisidad- sendo de menos cathegoria, por isso que elle e subordinado ao conselho superior, tendo trabalho só no tempo das matriculas, que é só um tempo muito curto a vista do trabalho que o antro tem todo o anno, alem de que nesse trabalho das matriculas tem um rendimento, que lhe da talvez outro tanto, este secretario tem 800$000 réis de ordenado, esta desproporção e escandalosa, eu não quero que se augmente a verba, mas que se nivellem melhor estas duas addições, já disse isto o anno passado, sei que não e no orçamento que sr fazem estas economias, mas e para quando se fizer a reforma, que eu desejo para a instrucção de todos os graos, para ver se podemos ter um systema de instrucção primaria, porque hoje em dia temos instrucção superior sem systema, e para então que eu lancei de novo aqui esta idéa, tudo isto são observações, e como não tenho que fazer proposta alguma ao orçamento, porque elle esta conforme com as leis existentes darei o meu discurso por findo

O Sr. J. L. da Luz — Sr. Presidente, eu tinha cedido a palavra para dizer ao illustre Deputado pelo Douro, do qual a primeira parte do discurso me pareceu mais uma interpellação ao Ministerio, do que uma pergunta dirigida a commissão de Fazenda, que eu lhe offerecia a resposta do Sr. Ministro do Reino se ella não o póde satisfazei, a commissão muito menos o póde fazer. Não e ás commissões da Camara dos Srs. Deputados, que compete o arranjo dos diversos ramos de administração publica O Sr. Ministro do Reino prometteu que havia regular as cousas de modo que satisfaçam aos desejos do nobre Deputado, que vejo serem os desejos de toda a Camara, e da Nação, a unica cousa a que S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino não respondeu, foi á pergunta que se fez a commissão, acerca da eliminação do vencimento do reitor da Universidade de Coimbra, a commissão eliminou essa verba, fundando-se no mesmo principio que adoptou para todos os casos similhantes do orçamento. Os vencimentos de logares que o Governo declarára que não sei íam providos este anno economico, foram eliminados para todos, (apoiados) S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino declarou na commissão que não se achava nomeado reitor, nem nomearia para este anno, eis-aqui a razão porque a commissão eliminou a verba (apoiados)

O Sr. Corrêa Leal — Sr. Presidente, tinha primeiramente a estabelecer a minha pergunta para, conforme a resposta, poder concluir o meu discurso, e chegar ao fim que tive em vista, quando tomei a palavra sobre este capitulo Tambem digo como o nobre relator da commissão, que não e possivel ter de cor toda a legislação, com todos os seus artigos, e todas as suas datas, e principalmente eu homem leigo nestas matei ias Estou muito satisfeito com a resposta do nobre Ministro do Reino, que me convenceu cabalmente de que aquella cadeira existe, e foi creada por lei, só me maravilhei não ter vindo no orçamento anterior, e ter sido ate hoje supprimida aquella verba Em quanto a legalidade com que apparece no orçamento, convenho que ha essa legalidade, que veio muito bem, e que o nobre Ministro do Reino pelo seu Ministerio (que era o competente) muito bem fez em mandar inserir essa verba no orçamento, e no seu capitulo respectivo. Agora e que vou verdadeiramente entrar na materia

Todos sabem que a tachygrafia e uma arte, cujo e urso, grammaticalmente fallando não póde, nem deve exceder a tres mezes, e tres mezes de theoria para aquella arte e sufficiente tempo para o seu ensino, porque, attenda a Camara, não se tracta mais do que ensinar o discipulo a foi mar com a máo certos signaes, que representam as desinencias das pa-

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lavras: este e o curso theorico que pede o ensino daquella arte: por consequencia tachygrafos não os ha senão os que se acham actualmente empregados nas Camaras Legislativas; esses ou são discipulos do professor que já não existe (o Sr. José Sérvulo da Costa), ou uns dos outros, ou, por assim dizer, de um ensino mutuo entre si; ahi os temos e vemos todos, tanto nesta, como na outra Camara, uns com mais, outros com menos aptidão. Deos me livre de apresentar, como vou apresentar, a eliminação desta verba no sentido de matar a arte, e malar o seu ensino; não, Sr. Presidente, quero que exista o ensino da arte tachygrafica, ensino que mais depende da practica, que da theoria, como já disse, e por consequencia consideremos nós bem se é possivel conciliar a existencia de um professor de Tachygrafia com a economia que se póde fazer neste ramo de serviço publico, que é assaz interessante, como todos reconhecem. O primeiro tachygrafo da Camara dos Dignos Pares tem 800$000 réis de ordenado; o primeiro tachygrafo da Camara dos Srs. Deputados tem 650$000 réis de ordenado. Ora já sabe toda a Camara que os empregados das duas Camaras Legislativas estão equiparados nas duas respectivas cathegorias em ordenado; ha a mesma igualdade nos amanuenses e amanuenses, officiaes e officiaes, tachygrafos e tachygrafos: mas eu não tenho de propôr o augmento de ordenado ao primeiro tachygrafo desta Casa, porque tracto de equiparação de ordenados dos primeiros tachygrafos dos dois Corpos Legislativos, porém o que tenho a propôr é que, eliminada a verba de 400$000 réis para a cadeira de Tachygrafia, que vem aqui no capitulo 4.º, secção 4.ª me acceite a Camara outra proposta que vou fazer de uma gratificação de 150$000 réis ao tachygrafo da Camara dos Srs. Deputados, com obrigação de abrir curso de tachygrafia no intervallo das Sessões aqui em S. Bento, aonde já existiu, ou no lyceo, ou onde S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino lhe determinar que elle se abra: e aqui temos colhidos dois resultados, que veem a ser — o restabelecimento do curso da cadeira de Tachygrafia, que esta vago desde que morreu o Sr. José Sérvulo, que era o seu professor, e tinha de ordenado 1:200$000 réis, porque tinha 800$ réis como primeiro tachygrafo da Camara dos Dignos Pares, e 400$000 réis como professor daquella cadeira. Ora se se eliminarem 400$000 réis desta cadeira, e se derem de gratificação 150$000 réis para abrir o cuiso daquella aula de Tachvgrafia ao primeiro tachygrafo desta Camara, que sempre se deve considerar o mais apto para exercer esse magisterio, temos que quando por um lado fazemos a justiça, por esta gratificação, de equiparar os dois primeiros tachygrafos das duas Camaras, vamos ao mesmo tempo impor a obrigação ao primeiro tachygrafo desta Casa, determinando-lhe que tenha a aula abei ta aonde possa abrir-se no intervallo das sessões; e é este o segundo resultado. Depois desta clara e sincera exposição as minhas propostas vão seu caminho natural para a Mesa; aqui as tenho formuladas, a Camara tomalas-ha na consideração que merecerem.

1.ª Emenda. — Proponho a eliminação da verba de 400$000 réis, que vem proposta no artigo 24.º secção 4.ª para uma aula de Tachygrafia na secção occidental do lycêo de Lisboa. — Corrêa Leal. Foi admittida por 47 votos contra 9.

2.ª Emenda. — Proponho que a Camara vote uma gratificação de 150$000 réis ao 1.º tachygrafo da Camara dos Srs. Deputados, para, no intervallo das sessões, ensinar theorica e praticamente a arte tachygrafica em qualquer estabelecimento da capital, que o Governo lhe designar, devendo esta verba ser addicionada no capitulo das Côrtes. — Corrêa Leal. Foi admittida por 41 votos contra 13. O Sr. Assis de Carvalho: — Sr. Presidente, como não esta presente o primeiro relator da commissão de Instrucção Publica, nem o segundo que ha pouco tempo foi nomeado, devo responder a algumas observações que se fizeram, como membro da commissão de Instrucção Publica. Principiarei por responder ao nobre Deputado pelo Douro, que lamentou o estado desgraçado em que está a instrucção primaria em geral, dizendo que pagando a Nação um tributo especial para esse fim, esse tributo não tinha a applicação devida. Sr. Presidente, não é feliz o estado da instrucção primaria em Portugal; (apoiados) mas a causa dessa infelicidade tem a explicação em parte no que disse S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino, e de que eu já estava certo — de que um grande numero de cadeiras de instrucção primaria (que estando todas occupadas já não eram muitas) estão sem provimento — e porque? E porque sendo difficultosas as habilitações, os meios que dão de subsistencia são quasi nullos, (apoiados) porque além do mesquinho ordenado de 110$000 réis que recebem, não lhes pagam. Daqui resulta que na minha provincia tambem uma grande parte das cadeiras de instrucção primaria estão vagas; mas ainda depende de outra circumstancia, e vem a ser — que estando estas Cadeiras de instrucção primaria debaixo da immediata inspecção dos respectivos governadores civis, como uma parte delles não entende, que este é um objecto puramente administrativo, não se promptificam a animar a instrucção; e dahi resulta tambem a razão porque a maior parte das cadeiras estão vagas, porque não informam sobre isto, nem sollicitam o seu provimento.

Pelo que diz respeito á applicação que tem o subsidio litterario, direi que este subsidio rende pelo orçamento 102 contos de réis, e segundo o orçamento a instrucção primaria faz a despeza de 105 contos de réis — vê-se por tanto, que a Nação dá mais 3 contos de réis, quero dizer ainda se gastam com a instrucção primaria mais 3 contos de réis, que a somma que é applicada para esta despeza.

Mas eu por parte da commissão de Instrucção Publica devo dizer á Camara, (e V. Ex.ª o sabe, assim como toda a Camara tambem sabe) que este anno offereceu a commissão de Instrucção Publica um projecto de lei já lia muito tempo impresso e distribuido que augmentou consideravelmente o numero das cadeiras de instrucção primaria, porque creou outro gráo, e porque dividiu a instrucção em 1.º, 2.º, e 3.º gráo, e para o 1.º gráo designou as cadeiras ruraes, que deve ser em numero consideravel. Não tenho agora presente todas as disposições do projecto de lei, que já ha muito foi apresentado e mandado imprimir, mas que ainda não foi dado para ordem do dia. Já se vê por tanto que o estado da instrucção primaria não está como se diz actualmente dependente de causas, que não podemos remediar. Isto é pelo que diz respeito á instrucção primaria. Agora pelo que diz respeito á instrucção superior, eu tenho a dizer ao nobre Deputado (e com isto respondo a uma ou

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tra pergunta ou consideração, que sé aqui tem feito a respeito deste objecto) ao nobre Deputado que disse que havia luxo de instrucção superior, direi, que em sciencias nunca ha luxo, agora, com relação ao nosso paiz, o que se póde dizei e que a instrucção superior em Portugal esta muito mal distribuida; em quanto temos tres academias de Medicina, não temos uma escóla de Agricultura. Para remediar este mal já eu tive a honra de apresentar nesta Camara um projecto para a creação de uma escóla de agricultura, o qual a commissão de Instrucção me fez a honra de approvar com o seu relatorio, esse parecer da commissão é projecto já se acha impresso e distribuido, espero que brevemente será dado para ordem do dia nesta Camara.

Tambem eu tinha considerado um outro projecto, que tem por fim propôr a suppressão da escóla medico-cirurgica do Porto; parece-me que ninguem deixara de convir nesta suppressão, e isto vai d'accordo com os Srs. Deputados, que tem dicto por muitas vezes nesta Camara, que ha luxo de instrucção, dizendo que são tantos os bachareis, que difficil será ver-nos livres delles, e já hoje aqui ouvi dizer, que, grande parte delles hão sabia ler nem escrever: pois pergunto ao nobre Deputado que apresentou esta asserção — se não haverá algum official de marinha, que não saiba a razão porque um bote anda em cima d'agoa, e não vai ao fundo?... (riso) Hão-de estar muitos nestas circumstancias. Em todas as classes ha destas excepções. A regra geral é que todos os bachareis sabem ler e escrever; mas, repito, em todas as classes ha excepções.

Feitas estas considerações geraes, parece-me que tenho respondido ás observações, que se tem feito a respeito de instrucção publica.

O Sr. Rebello da Silva — Sr. Presidente, parece-me que o orçamento pelo que diz respeito á instrucção publica, deve merecer a attenção desta Camara. Sr. Presidente, fracas são as esperanças que tenho de que o ramo de instrucção publica se ha de melhorar, quando vejo que nesta Camara se apresenta uma proposta, e a Camara admitte á discussão, marcando já quem hão de sei os professores publicos. (apoiados) Eu Vejo, Sr. Presidente, que essa proposta importa nada menos que induzir esta Camara a chamar a si attribuições que são puramente do Poder Executivo (apoiados) e eu convido S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino para propugnar pelas regalias que competem ao seu Ministerio e não deixe pasmai uma proposta que tende a cortar-lhe as suas attribuições na escolha dos individuos, que devem ministrar a instrucção no paiz. A proposta e tão fóra de todas as regras e conveniencias parlamentares, que eu espero que esta Camara lhe faça as honras d'uma completa rejeição, (apoiados)

Sr. Presidente, ha grande necessidade no nosso paiz de prestai muita attenção ao que diz respeito á instrucção publica. Eu vejo, Sr. Presidente, que a instrucção publica entre nos esta muito mal distribuida, e muito mal fiscalisada, não creio possivel que o Ministro do Reino seja encyclopedico, nem que appareça em toda a parte, e attenda aos tantos ramos de que se compõe o Ministerio do Reino: vejo que esse ministerio involve industria, agricultura, commercio, instrucção, administração, policia, obras publicas, saude publica, artes, e officios, etc. não sei como um homem tem a colagem sufficiente para acceitar uma responsabilidade desta natureza. Mas na presença dos muitos ramos que compõem o Ministerio do Reino, não vejo esperanças nenhumas de melhorar a instrucção publica, em quanto esta repartição fôr uma secção do Ministerio do Reino: é preciso que se ligue a uma outra repartição, aonde mais especialmente se possa prestar cuidado a este ramo de serviço publico. (apoiados)

Sr. Presidente, em quanto ás vacaturas que ha das cadeiras de ensino primario, concordo com o nobre Deputado pelo Algarve de que essa circumstancia provem do caso que apontou; concordo tambem que é indispensavel que esta instrucção primaria seja mais generalisada, e que se cheguem a estabelecer as escólas ruraes; e não posso, por esta occasião, deixar de chamar a especial attenção do Sr. Ministro do Reino sobre este ponto, a que se deve prestar todo o cuidado, (apoiados)

Sr. Presidente, neste ramo de serviço publico ha um grande defeito, e consiste elle em que o conselho superior de instrucção publica esteja em Coimbra, e o Ministro do Reino, que esta em Lisboa, seja o Presidente desse conselho; porque o resultado de tudo isto é que tendo o conselho de propor alguns regulamentos, e algumas medidas a respeito de instrucção publica, e estando todos os esclarecimentos na secretaria do Reino que esta em Lisboa, e o Ministerio do Reino tão sobrecarregado, o que se segue é que todos esses trabalhos dormem na secretaria. Eu achava de toda a conveniencia que o conselho superior de instrucção estivesse em Lisboa, que devia ser um corpo consultivo junto ao Ministerio do Reino, e por isso eu não deixarei de impugnar a instituição do conselho superior de instrucção publica do modo, porque esta constituido, (apoiados)

Sr. Presidente, repito que a instrucção superior entre nós esta muito mal distribuida: no nosso paiz não ha uma escóla de agricultura; nós que somos um paiz essencialmente agricola não temos uma escóla de agricultura: é deploravel esta situação.

O nobre Deputado citou ainda a academia do Porto, é a escóla medico-cirurgica, essa escóla ouvi dizei que era frequentada por tres ou quatro alumnos; não estou bem certo no numero, mas o que é verdade, e que nessa escóla ha um numero muito pequeno de alumnos, e á despeza que custa ao Estado, não e muito pouca.

Sr. Presidente, para se adquirir o gráo da sciencia medica em Portugal, temos nada menos do que tres escólas; a escóla medico-cirurgica de Lisboa, a escóla medico-ciruigica do Porto, e a Universidade de Coimbra, e desgraçadamente é o Paiz onde ha mais doenças, e onde se morre mais. Eu entendo que nós devemos ter uma escóla de medecina, forte pela theoria, e pela pratíca, e devemos diminuir o numero destas escólas, que não fazem senão deitar homens habilitados na sua profissão sem terem meios para podérem viver convenientemente. No mesmo caso, Sr. Presidente, estão os bachareis formados em direito, que todos os annos são lançados sobre a superficie do paiz, sem terem meios para se sustentarem.

Sr. Presidente, como posso eu esperar que se apresente aqui quando tudo vacilla, quando tudo esta incoherente, uma medida de instrucção publica? Como poderei eu esperar que a instrucção publica seja comprehendida como ella deve ser, e como é com-

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prehendida nas outras nações, que seja comprehendida como uma habilitação para as funcções publicas, quando eu vejo que a instrucção publica continua em grande parte debaixo dos mesmos principios, e debaixo da mesma direcção que creou o Marquez de Pombal para a Monarchia absoluta? A instrucção deste paiz, Sr. Presidente, não ha de ser completa senão quando vier um dia em que se intenda que ella é o meio de produzir para as funcções do serviço do Estado homens habilitados, e não e um luxo, um monopolio; a instrucção publica não e um exclusivo para satisfazer algumas ambições, algumas vaidades, e orgulhos. No dia em que se intender que a instrucção publica é uma cousa productiva para o Estado, então nós veremos o Ministerio apresentar-se nestas cadeiras, armado dos esclarecimentos necessarios para illustrar as questões.

O Sr. Corrêa Leal (Sôbre a ordem): — Sr. Presidente, quando eu apresentei as minhas propostas á Camara, fui preceder este mesmo acto de uma pergunta á commissão sobre a duvida que tinha da existencia da verba para lente da cadeira de Tachygrafia; o nobre Deputado respondeu-me que havia uma lei, e que a verba vinha no orçamento. Todavia eu julguei que estava no meu direito, quando vinha propôr á Camara não a eliminação da cadeira, não a eliminação da verba, mas sim uma modificação para se continuar a reger aquella cadeira. Todavia algumas considerações que o illustre Presidente do Conselho fez, e a profunda convicção era que estou agora, de que se se desse o caso de se approvar a minha proposta para ser o primeiro Tachygrafo desta Camara quem exercesse este logar, era ir um pouco investir com as attribuições do Poder Executivo, áquem pertence nomear, isto na verdade fez-me um grande pezo, e não tenho duvida em pedir á Camara se ella consente que eu retire a minha proposta.

Agora em quanto a segunda proposta, eu podia sustenta-la, tinha direito de continuar a insistir na minha opinião, todavia como ambas as minhas propostas se acham tão ligadas uma com a outra, peço a V. Ex.ª e a Camara licença para as retirar ambas.

Permittiu-se-lhe retira-las, a favor 56 votos contra 4, a 2.ª por 58 contra 2.

O Sr. Silvestre Ribeiro. — Sr. Presidente, se a materia de que se tracta, não fosse tão importante, não teria eu pedido a palavra na occasião em que o Sr. Deputado pelo Algarve fez allusão aos governadores civis, increpando-os de falta de vigilancia sobre o ensino publico. Estou convencido de que o Sr. Deputado não pretendeu lançar stigma sobre a classe de magistrados, a que tenho a honra de pertencer; cumpre porém fazer algumas ponderações em resposta, tanto mais quanto o assumpto é essencialmente de grande interesse.

Sr. Presidente, o illustre Deputado disse que tres motivos obstam a que a instrucção primaria chegue no nosso paiz ao desenvolvimento que deve ter. O 1.º é a falla de pagamento dos vencimentos dos professores, 2.º o grande numero de habilitações que se exigem para o magisterio publico, 3.º a falta de attenção dos governadores civis

A respeito do 1.º, permitta V. Ex.ª e a Camara que eu levante a minha voz para advogar a causa de uma classe respeitavel, mas que por desgraça deste paiz, não direi que esta vilipendiada, mas ao menos e muito pouco considerada. Como e possivel, Sr. Presidente, que se exija dos professores de ensino primario um bom e zeloso serviço, se esses infelizes, para se sustentarem, são por vezes forçados a lançar máo de outros recursos, como por exemplo, de um officio mecanico, ou de outros expedientes? Como é possivel que esses homens se dediquem desvelados á vida do magisterio? Não e possivel por modo algum. Estão a morrer de fome, e não convem, não é justo, que se applique a severidade e o rigor a quem esta em tão tristes circumstancias.

Em quantos ás habilitações, não me conformo com a opinião do illustre Deputado, por que não posso deixar de exigir habilitações muitissimo rigorosas ao cidadão, que se propõe a doutrinar a infancia. Oxalá que ellas fossem ainda mais severas, mas que tambem em compensação tivessem o professores bons ordenados, mas que tambem paralellamente fôssem promptos e effectivos os pagamentos!

No que toca a incuria dos governadores civis, direi pouco, e com a devida moderação, se bem que já em uma das sessões passadas disse S. S.ª que os governadores civis nada mais tem sido do que agentes politicos, e de policia. Pudera alargar-me muito a este respeito, mas limitar-me-hei a observar que as circumstancias por que tem passado o nosso paiz, teem sido parte para que as auctoridades administrativas não hajam feito quanto bem se podia exigir d'ellas. Uma nação em que successivamente se passam tantas crises, se verificam tantas mudanças, se encadeam quasi seguidas as dissenções, se renovam tão amiudadas vezes as operações eleitoraes, uma nação, digo, em tal situação não é o theatro mais proprio para o exercicio pacifico, regular e fecundo da acção administrativa, maiormente na parte que esta tem de paternal, de civilisadora. O illustre Deputado sabe que a administração não assentou ainda entre nós, não tem ainda bases, não creou ainda raizes, e muito menos tem podido ainda dar a provar os seus bons fructos.

E note o Sr. Deputado, que estas ponderações abrangem igualmente o Governo central. Os Ministros, forçados a prestar a mais séria attenção a assumptos meramente politicos, a vigiar os movimentos dos adversarios, a oppôr um dique ao transtôrno da ordem, e por consequencia gastando toda a actividade e tempo nos negocios politicos, e de policia, não teem podido consagrar-se, com o disvelo que era preciso, á administração propriamente dicta, ao desenvolvimento dos verdadeiros interesses nacionaes. E daqui vem que os delegados do Governo tambem não tenham recebido a direcção, que deve partir do centro, e que consiste nas sabias instrucções, de que nos offerece aproveitaveis modelos a administração franceza. Mas na França a administração esta já regular, esta já assente em seguras bases, corre desassombrada de todos os estorvos, e preenche por isso o fim para que é destinada. Não admira pois que alli, apenas é promulgada uma lei, baixe immediatamente uma circular do Ministro competente, explicando com clareza o espirito dessa lei, prevendo todos os obstaculos que ella póde encontrar na sua execução, insinuando o modo de os remover, e aplanando todas as difficuldades; de sorte que os prefeitos podem obrar affoutamente, e exercitar efficazmente a acção administrativa, visto como de antemão se lhes tornou facil, e bem andamoso o caminho por onde teem que transitar.

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Não me parece que o Sr. Deputado tivesse razão em suspeitar, que os governadores civis sejam remissos em dar parte ao Governo das vagaturas das cadeiras do magisterio. Se uma ou outra vez algum tiver demorado taes participações, não justifica isso a censura geral. O» commissarios dos estudos dão parte das vagaturas aos governadores civis, e estes a dão do movimento da instrucção publica de 15 em 15 dias ao Governo. Nem se póde presumir que os governadores civis tenham o menor interesse em deixar vagas as cadeiras, ao contrario teem-no em que sejam providas immediatamente, porque estão m contacto com os povos, e os povos não levam a -bem as interrupções do ensino. Quando se verifica o caso da vagatura de uma cadeira, immediatamente os interessados, que são os paes de familia, «e dirigem a auctoridade administrativa para requererem o provimento della.

Tenho respondido quanto basta para acclarar as idéas neste ponto, e creio que affastei completamente o que podia haver de irritante nas asserções do Sr. Deputado, com referencia a classe dos governadores civis. Gosto sómente de ver trocar entre nós razões, raciocinios, factos, e jámais allusões, nem invectivas contra pessoas, ou contra classes.

Terminarei observando, que este assumpto da instrucção publica, e particularmente do ensino primario, e digno de toda a attenção do Governo, e formo voto» para que elle se não contente só com lamentar, que aos professores não possa dar-se maior ordenado. Oxalá que elle tenha bastante socego para poder consagrar a este objecto o cuidado necessario, e que nós possamos, pelo andar dos tempos, vir a ter bem organisada, e perfeitamente dotada a instrucção publica, por maneira que tiremos della todas as vantagens, e proveito possiveis.

Limito-me a isto por agora, reservando-me para logo pedir a palavra, a fim de chamar a attenção do Governo sobre a insufficiencia de algumas verbas

destinadas para o costeio de estabelecimentos scientificos, e nomeadamente da bibliotheca nacional, e do jardim botanico de Coimbra

O Sr. F. A. da Fonseca — Peço a V. Ex.ª queira consultar a Camara sobre se a materia esta sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida por 44 votos contra 19.

O Sr. Pessanha — (Sobre a ordem). Eu tinha pedido a palavra para mandar para a Mesa uma proposta.

O Sr. Presidente: — Não tem já logar.

O Sr. Pereira dos Reis — (Sobre a ordem). Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra sobre a materia, mas aconteceu-me o que ordinariamente acontece áquem pede a palavra tarde. Neste capitulo ha tres vencimentos n um individuo, desejava fazer uma pergunta a S. Ex.ª, sem resposta a qual não posso votar, abstenho-me de votar.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado estava inscripto, e era o immediato a fallar, mas a Camara julgou a materia discutida, por consequencia não póde ter a palavra para o fim de fazer proposta alguma respectiva a discussão fechada.

O Sr. Silvestre Ribeiro — (Sobre a ordem). Eu encontro-me na mesma difficuldade; suppuz que a discussão continuaria, e então reservei-me para fazer uma pergunta a illustre commissão de Fazenda sobre uma verba que tem aqui, e segundo a resposta que a commissão me desse, pertendia fazer uma proposta.

E pondo-se logo a votação o capitulo 4.º, disse O Sr. Presidente — Ha um êrro não só na primeira verba, mas mesmo no modo porque esta redigido o capitulo, o que se propõe para este capitulo e 285 418$705 réis, e não 271 908$705 réis. Este êrro que esta na primeira linha dar-se em todo o capitulo por consequencia a redacção do capitulo e, segundo a rectificação que já fez o Sr. Lourenço da Luz, na fórma que se vai ler

Artigos 22.º a 25. — Propõe-se para os ordenados e mais despezas deste capitulo..................................... 285 418$705

Deduz-se

No artigo 22º — Ordenado do vice-presidente............... 300$000

No artigo 25.º, secção 1.ª — Ordenado do reitor............. 1 600$000

»»» secção 6.ª — Ordenado do director do observatorio astronomico................................... 400$000

— 2:300$000 283.118$705

Excede a fixada na carta de lei de 22 de agosto de 1848..... 15.104$268

Foi assim approvado por 56 votos contra 6

Passou-se ao

Capitulo 5.º — Estabelecimentos scientificos e litterarios....... 17:809$800

Foi approvado sem discussão.

Capitulo 6.º — Estabelecimentos de bellas artes e officios....... 52 874$600

O Sr. Forjaz — Parece-me que neste capitulo é que vem a verba destinada para os theatros, e então tenho a honra de mandar para a Mesa uma proposta assignada por 31 Srs. Deputados.

Leu, e é a seguinte

Proposta. — «Propomos que da quantia votada para o theatro de S. Carlos se deduzam 2 contos para o theatro lyrico de S. João do Porto com as condições, que o Governo estabelecer — Forjaz, Vaz Preto, A. Albano, Passos Pimentel, Costa Lobo, Castro Ferreri, Corrêa Leal, F. Castello Branco, Cunha Reis, A. A. Mello, Cordeiro Abranches, Cai olmo Ferreira, B. da Torre, Franco de Castro, Grim Cabreira, Castro Pilar, Costa Xavier, Lacerda (Antonio), Cerveira e Sousa, Fana Barbosa, J. Manoel Botelho, Emilio Brandão, S. Sá Brandão, Cabral Mesquita, Ferreira da Motta, Alvellos, J. do Amaral, Sousa Lobo, Pessanha, Andrade Nery, Pereira de Barros.

Foi admittido por 48 votos contra 9

O Sr. Pereira dos Reis: — Discute-se o capitulo 6.º Sr. Presidente, não tractarei do ponto especial

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que se offerece agora de novo á discussão, nem tão pouco discutirei a lei de 30 de julho de 1844, que estatue sobre accumulações, se eu houver de me occupar désse negocio, será isso numa discussão geral; tractando-se do orçamento devo contrair as minhas reflexões ao ponto discutido.

Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra para notar que no capitulo anterior, no capitulo penultimo havia uma accumulação de tres ordenados, isto e de dois ordenados, e de uma gratificação na pessoa de um individuo: o Sr. Ministro do Reino tomou nota, confio que S. Ex.ª dará a providencia opportuna a este respeito. (O Sr. Ministro do Reino — Apoiado.) A lei de julho de 44 offereceu alguns inconvenientes, eu o reconheço, ha celtas accumulações que poderiam redundar em beneficio do Thesouro, mas a lei e clara, e a nós legisladores só nos compete a faculdade de a alterar por meio de uma proposta de lei, emquanto essa lei existir, devemos observa-la rigidamente.

Correndo a vista pelo orçamento deste Ministerio, acho que no anno passado se cortaram algumas verbas, que eu vejo hoje substituidas. Se algum empregado ha que mereça gratificação pelo que toca a serviço de espectaculos publicos, e o fiscal dos theatros, porque e homem cuja effectividade de serviço e reclamada imperiosamente para vantagem daquelles estabelecimentos. Tractando-se aqui da gratificação attribuida ao inspector geral dos theatros, e espectaculos publicos, creio que fui eu o primeiro a declarar que esse subsidio devia ser eliminado, por uma razão muito cabal, porque para aquelle logar, ou se escolhe um alto empregado, ou um homem independente. A Camara foi talvez severa em demasia a este respeito, porque não só tirou a gratificação ao inspector geral dos theatros, e ao secretario geral da inspecção, mas tirou a gratificação ao fiscal Vejo agora substituidas no orçamento essas parcellas então supprimidas, ignoro os motivos que levaram a commissão a repor estas verbas, e desejarei que ella me diga esses motivos.

Sr. Presidente, sinto muito que duas ou tres observações que vou fazer, entendam com um collega nosso, porem conservo-me nos principios que me impelliram a votar contra outro, e a fazer uma proposta que offendia os seus interesses. Neste capitulo vejo eu que ha uma verdadeira accumulação; ha um illustre Deputado que recebe de ordenado na repartição em que serve 60$000 réis, e que tem neste capitulo, secção 3 a um ordenado de 200$000 réis; é portanto uma verdadeira accumulação a que se oppõe directa, e positivamente a lei que nos rege neste ponto. Não contesto a utilidade da cadeira que elle rege num estabelecimento publico, posto que, digamos a verdade, fallemos com singeleza neste negocio, a recta pronuncia nem é habilitação necessaria hoje nos primeiros logares do Estado, cada um pronuncia como quer, como póde, e como sabe. (O Sr. Corrêa Leal — Apoiado); e se avaliassemos os homens pela sua recta pronuncia, danamos muito pouco por alguns que teem servido, e servem esses logares.

Mas, Sr. Presidente, ha do conservatorio real de Lisboa algumas cadeiras que são supprimiveis, e esta dos rudimentos de recta pronuncia no estado actual das finanças do paiz, entendo que deve ser supprimida, logo que a Camara possa determinar a sua suppressão. Sr. Presidente, eu declaro que votarei constantemente contra estas accumulações, em quanto não houver uma lei que destrua a de 30 de julho de 1844.

Desejarei pois que a illustre commissão me elucide sobre as duvidas que eu tive a honra de dirigir á sua consideração, isto e, quaes foram os fundamentos que a obrigaram a restituir as verbas, que do orçamento passado tinham sido eliminadas, ao inspector geral, ao secretario geral, e ao fiscal dos theatros. Desejo igualmente saber se ella tem algum motivo, em que se apoie para conservar esta accumulação. Depois de ouvir a resposta da commissão, é p4ovavel que eu tome a palavra, e reforce os argumentos

O Sr. Corrêa Leal — (Sobre a ordem) Sr. Presidente, eu peço á Camara que me permitta sobre a ordem dar uma breve explicação a respeito do que acaba de dizer o illustre Deputado; eu prometto á Camara o contrair-me o mais que possa sobre este assumpto, mas a Camara reconhecendo que elle me é pessoal, ha de permittir-me que eu decline de sobre mim qualquer presumpção que se possa fazer pouco vantajosa a respeito do meu modo de pensar, do modo de ter servido o paiz, e do meu modo de ter accumulado estas duas funcções — o modo porque as accumulei, o modo porque as tenho servido, e as circumstancias que occorreram para eu não ter até hoje o minimo escrupulo deter esta accumulação, nem o minimo escrupulo de ter, pela complicação das duas cousas, faltado, nem aos deveres de um, nem aos deveres de outro logar.

O Sr. Presidente — Ora permitta-me o Sr. Deputado... como não esta na ordem, é preciso que se inscreva pro ou contra o capitulo, para eu lhe dar a palavra, segundo lhe competir, e vou perguntar aos outros Srs. Deputados se pediram a palavra pro ou contra

O Sr. Corrêa Leal — Peço a palavra para um requerimento.

O Sr. Presidente — Tem a palavra O Sr. Corrêa Leal — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara sobre se ella me permitte, por uma especial bondade, e benevolencia sua, que eu muito rapidamente explique este negocio: depois de esclarecer a Camara deixo-a livre na sua votação, como e sempre.

O Sr. Presidente — Eu consulto a Camara: só assim é que póde preceder na inscripção Decidindo-se affirmativamente, disse O Sr. Corrêa Leal — Agradeço muito á Camara este acto de sua benevolencia. Eu bem sabia que havia uma lei antiga que não permitte senão ate 600$ réis as accumulações quando fôssem compativeis. Desde 1826 que tenho a honra de ser empregado da secretaria da Camara dos Srs. Deputados, de 1826 ate 1838 fui sómente amanuense de secretaria; e em 19 de janeiro de 1838, pela maneira porque Unha desempenhado o meu logar, e mesmo por me pertencer pela minha antiguidade, fui elevado a official ordinario da mesma secretaria com o ordenado de 450$ réis. Em 1840 por effeito de ter concorrido a um concurso publico com 5 ou 6 competidores a uma cadeira, que se creava de novo; e tendo eu sido pelo jury que presidiu a este concurso, julgado o mais habil para exercer o magisterio de professor de recta pronuncia, e lingoagem, (e agora aproveito esta occasião para dizer, que tenho razão de me ufanar em

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ser professor de recta pronuncia, porque é Sua Magestade que se assigna, e classifica esta denominação na minha carta) fui por Sua Magestade provido nessa cadeira com o ordenado de 200$000 réis, que com 450$000 réis que tinha do meu emprego, vinha a dar 650$000 réis. Ora eu tinha exercido até hoje aquelle logar de magisterio publico; mas o logar daqui da Camara ignora o Governo que eu o tenho, porque é da attribuição da Mesa nomear os empregados da secretaria desta Camara. Não trago isto nem para querer continuar a accumulação destes logares, nem porque queira vir pedir misericordia á Camara: honra ao nobre Deputado que com tanta imparcialidade veiu fazer uma proposta destas, a qual de maneira nenhuma me póde offender, porque S. Ex.ª não abrange a minha pessoa só, tem fallado em muitas outras pessoas; isto é feito com muita innocencia, é feito com a melhor boa fé do Mundo, aqui não ha motivo pessoal que venha contendei comigo; o meu coração é sufficientemente generoso para assim o julgar, Eu devo dizer á Camara que a minha consciencia tem estado sempre tranquilla; porque considerando os dois ordenados que tenho mesmo depois de terem sido igualados os ordenados dos officiaes desta secretaria aos ordenados dos officiaes de secretaria da Camara dos dignos Pares, attendendo ainda assim ao atraso, e maneira com que os pagamentos têem sido feitos, aos descontos que tem soffrido os ordenados, e ao que me levam os cambistas pelo rebate, não tenho chegado a receber 600$000 réis; quantia até á qual a lei permitte que se accumule. Agora em quanto ao principio geral das accumulações, se a Camara entendei que eu deva optar por um ou por outro ordenado, creio que a Camara não ha de duvidai muito sobre a escolha, que tenho a fazer entre elles.

O Sr. Assis de Carvalho — (Sôbre a ordem.) Como não sei se me chegará a palavra sobre a materia, por isso mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — «Proponho que se restabeleça averba de réis 22:000$000, que no ultimo orçamento era applicada ao subsidio do theatro de S. Carlos, deduzindo-se desta quantia 2.000$000, para o theatro lyrico do Porto.» — Assis de Carvalho.

Foi admittida por 48 votos contra 8.

O Sr. J. L. da Luz: — Sr. Presidente, nas mãos dos Srs. Deputados esta o parecer da commissão, aonde no ultimo paragrafo se diz: — a commissão espera que a Camara pela discussão corrija o projecto que apresenta: — por isso acha-se disposta a receber todas as emendas que tornarem mais proficuo o trabalho, que submetteu á consideração da Camara. Os nobres Deputados tambem verão no mesmo parecer, que as resoluções da commissão se tomaram muitas dellas por maioria; do que resulta haverem membros divergentes em alguns dos pontos do projecto: faço esta declaração, para que não pareça estranho o eu votar contra algumas das disposições que se apresentam aqui, por parte da commissão.

Sr. Presidente, eu pedi a palavra principalmente para dar explicações ao illustre Deputado, que se senta no banco lateral, que as exigiu de mim como relator da commissão: os esclarecimentos que exige, referem se ao inspector geral dos theatros, e ao fiscal do theatro de D. Maria 2.ª e tambem ao ordenado que accumula o professor de recta pronuncia do conservatorio real de Lisboa. Em quanto á restituição das gratificações que se dão ao fiscal e inspector geral dos theatros, o illustre Deputado sabe muito bem que o anno passado fui de voto que se eliminassem, e este anno tambem sou da mesma opinião. Não obstante, como em nota preliminar que precede os capitulos deste orçamento, se diz: a experiencia tem mostrado, desde o intervallo da sessão passada até hoje, a necessidade de conservar as verbas de gratificação para o fiscal, e inspector geral dos theatros; o Governo assim o confirmou na conferencia que teve com a commissão sobre este ponto, e a maioria della entendeu que deviam conservar-se estas verbas; aqui estão os esclarecimentos, que posso dar ao nobre Deputado. Agora em quanto á eliminação do ordenado do professor de recta pronuncia do conservatorio de Lisboa, tambem ainda agora disse: o trabalho deste Ministerio é tão minucioso, que a commissão não póde comparar os nomes dos differentes empregados com as respectivas verbas do orçamento, e é provavel que alguma cousa lhe escapasse; portanto se os nobres Deputados notaram que havia esta accumulação, eu pela minha parte acceito a desaccumulação proposta, porque a commissão não póde deixar de ser coherente com a lei, como o tem sido até aqui. (apoiados)

O Sr. Xavier da Silva — Sr. Presidente, não foi só neste negocio que eu fiquei vencido na commissão; fiquei vencido em muitos negocios do Ministerio da Guerra que já passaram, e em muitos outros que hão de vir. Sobre o ponto em questão insisto ainda na opinião, que tive o anno passado. Quando o anno passado se discutiu este capitulo, a razão que o Governo apresentou para não consentir na diminuição do subsidio dado ao theatro de S. Carlos, foi que havia um contracto feito com uma empreza por tres annos, e sendo aquelle anno ainda o terceiro da empreza, não era possivel faltar á boa fé dos contractos: mas hoje que este contracto terminou, já se não póde dar esta mesma razão; e por isso proponho que se diminua 8 contos de leis ao subsidio dado ao theatro de S. Carlos, ficando por consequencia com 12 contos de réis. Tambem do mesmo modo proponho que se diminua no subsidio do theatro de D. Maria 2 contes de réis, ficando por consequencia com o subsidio de 4 contos de réis Proponho tambem a eliminação das gratificações do inspector geral dos theatros, e fiscal do theatro de D. Maria 2.ª Ora todas estas reducções produzem a cifra de réis 10:600$000. Eu entendo que os theatros de S. Carlos, e de D. Maria 2.ª devem sei auxiliados; por isso que todos conhecem que os theatros são escólas de instrucção e moralidade, quando elles satisfazem ao fim que devem. Não quero agora entrar no exame de se os nossos theatros subsidiados têem satisfeito ao fim principal, para que são verdadeiramente creados; supponhamos que sim. Eu tambem sou amador dos theatros, ainda que não os frequente tanto como qualquer dos illustres Deputados, porque o tempo não me permitte; mas por isso não deixo de ter por elles toda a consideração.

Sr. Presidente, nas circumstancias em que esta o Thesouro Publico, nas circumstancias em que o Governo muitas vezes se acha, de não ter meios para satisfazer aos prets, e para as despezas mais indispensaveis do serviço publico; quando os empregados estão morrendo á fome (Uma voz — É verdade) será justo que se esteja dando ao theatro de S. Carlos 20

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contos de réis? Subsidio muito maior do que o preciso para sustentar o theatro, pois que da maneira que as cousas alli estão montadas, póde dizer-se que os empresarios fazem as despezas com o subsidio, e tudo o que rende o theatro, é lucro: e eu podia se quizesse, entrar no exame miudo para mostrar aos Srs. Deputados que isto é verdade. Não digo que se tire ao theatro de S. Carlos todo o subsidio, mas que se lhe deixe a verba de 12 contos, a qual para o auxiliar pelo tempo em que esta aberto, é de sobejo. Demais eu peço á Camara note, que se votar este anno 20 contos para o theatro de S. Carlos, e se passar uma proposta que o Governo apresentou de pôr em praça a empreza do theatro por tres annos tendo o subsidio certo, já nos annos seguintes, por maiores que sejam as necessidades publicas, não póde reduzir esta verba, porque depois de se ter feito um contracto, ha de ter de garantil-o.

Sr. Presidente, eu não quero tornar-me fastidioso á Camara; as minhas idéas são bem conhecidas de todos os Srs. Deputados, e do Governo, porque este objecto tem sido tractado, não só neste anno, mas no anno passado: a commissão faz esta proposta; se a Camara não a quer acceitar, não a acceita, mas fica-me a satisfação de apresentar uma economia, que se póde fazer sem prejudicar o serviço publico. Era quanto eu vir que o Governo não tem meios para satisfazer ás despezas do Estado, não posso annuir a que se esteja dando ao theatro de S. Carlos uma quantia para proveito, unicamente, do empresario.

Quanto á proposta que apresentou o illustre Deputado pelo Douro, eu de certo me, não opporia a ella se fosse um subsidio já estabelecido, mas como é uma novidade, convém que o Governo se pronuncie a esse respeito, e depois de o ouvir votarei conforme me parecer sobre esse negocio. Leu-se logo na Mesa a seguinte Emenda.. — Proponho que se deduza No art. 32.º secção 1.ª

Ordenado do inspector geral......... 300$000

No art. 33.º, secção 1.ª

Subsidio ao theatro de S. Carlos...... 8:800$000

No art. 33.º, secção 2.ª Subsidio ao theatro de D. Maria 2.ª... 2:000$000 No art. 33.º, secção 2.ª Gratificação do fiscal............... 300$000

Xavier da Silva. Foi admittida por 53 votos contra 8. O Sr. Pereira dos Reis: — (Sôbre a ordem) Na conclusão do meu discurso, disse que mandava uma proposta, vou portanto supprir a minha omissão. Leu-se logo na Mesa a seguinte Emenda. — < Proponho que seja eliminada uma das verbas que vence pelos cofres do Estado o Sr. Corrêa Leal, deixando-se a opção ao mesmo Senhor.» — Pereira dos Reis.

Foi admittida por 53 votos contra 10. O Sr. Cunha Sotto-Maior: — Sr. Presidente, a proposta do illustre Deputado pela Estremadura creio que entra em discussão conjunctamente; por isso declaro que não a adopto; e admiro-me muito de que S. S.ª, que até agora não tem levantado a sua voz contra nenhum augmento de despeza, venha justamente propor uma eliminação nesta verba, que torna impossivel o theatro de S. Carlos; porque não é possivel haver um emprezario que com essa diminuição tome a empreza; e mais coherente achava eu uma proposta para a eliminação do subsidio. Não é possivel, digo, montar uma companhia de canto, e baile, com 12 contos de réis: e eu, que tenho votado por muitas reducções, é esta a unica, porque não voto. Nem se pense que defendo a verba por me ser muito sensivel a falta do theatro; mas defendo-a por entender que nesta Capital tão falha de divertimentos, aonde não ha distracção de qualidade nenhuma, se não deve tirar o unico divertimento que existe.

Sr. Presidente, eu não voto pela proposta do Sr. Deputado, nem voto pela outra proposta em que se estabelece a applicação de 2 contos de réis para o theatro de S. João do Porto, por entender que, é muito pouco: ou a Camara ha de propor um subsidio condigno, ou nada; 2 contos de réis não satisfazem a cousa nenhuma: assim como 12 contos para o theatro de Lisboa tambem não satisfazem ao que é necessario. Por consequencia eu peço á Camara, pela primeira vez, que não acceite esta reducção de despeza. Nós não devemos ficar sem theatro, e a proposta não tende senão a faze-lo fechar. Quem me póde habilitar a votar, é a explicação que o Sr. Ministro der á seguinte pergunta: se o Governo entende que póde fechar-se o theatro, ou conserva-lo aberto com o subsidio de 12 contos de réis?

O Sr. Presidente do Conselho — E só para responder á pergunta, que me dirigiu o illustre Deputado pelo Algarve — Se o Governo julga, com a verba de 12 contos de réis, poder conservar o theatro aberto? Eu estou convencido que é impossivel; e que votarem-se 12 contos de réis, seria o mesmo que dizer — não haja theatro.

O Sr. Assis de Carvalho: — Sr. Presidente, os theatros Lyricos, ou devem ser bons, ou não devem existir, e o theatro de S. Carlos se tem decrescido da sua magestade, com tudo no ultimo anno apresentou uma companhia com algumas partes soffriveis, e com outras muito boas. A despeza deste theatro anda, termo medio, por 93 contos; o subsidio que o Governo lhe dá, sendo de 20 contos, não chega para a quarta parte da sua despeza, e se acaso se quer deduzir do subsidio de 20 contos de réis alguma cousa, então proporia que o theatro se compozesse só de uma parte de musica, ou de dança, porque não é possivel ter um theatro com os quadros completos, e com as obrigações e restricções, que as commissões a quem foi remettida a proposta do Governo a este respeito, tencionam propôr, com um menor subsidio.

Accrescentarei, que não considero o theatro de S. Carlos só como objecto de divertimento; elle é tambem uma escóla pratica de musica, a que é tão essencialmente dedicada a Nação Portugueza, e por outro lado delle vive um numero consideravel de familias, que ficariam reduzidas á necessidade, se por ventura aquelle theatro se fechasse E essa a consequencia da diminuição do subsidio; e foi por não querer reduzir esse subsidio, reconhecendo ao mesmo tempo que o theatro do Porto tem direito a um subsidio, que não assignei a proposta do Sr. Forjaz, e offereci a que apresentei.

Não queiram os Srs. Deputados das provincias considerar na mesma igualdade os direitos e obrigações dos habitantes de Lisboa, e os das provincias, porque além de Lisboa ser uma Capital, dá-se a circumstancia de seus habitantes pagarem direitos de consumo, que produzem para o Estado 700 contos, vendo-se por consequencia privados de gosar dos obje-

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jectos mais necessarios para a vida, pelo mesmo preço porque os gosam os das provincias, e quando os habitantes de Lisboa concorrem para as despezas publicas com 700 contos de impostos especiaes, não é muito que dessa somma se appliquem vinte contos para estar aberto o theatro lyrico.

O Sr. Poças Falcão — Eu tenho que votar pela proposta que mandou para a Mesa o illustre Deputado pela Estremadura, e desejo dar a razão porque assim o faço, para senão dizer que os Deputados tias provincias votam pela reducção do subsidio ao theatro de S Carlos, pela razão de não gosarem; pois a gente das provincias tambem vem a Lisboa, e tambem gosa quando cá vem; mas hei de votar pela reducção; hei de votar por ella pelas razões de que, quando os credores do Estado estão a morrer de fome, não se póde votar uma verba de 20 contos para o theatro de S. Carlos; em segundo logar, porque entendo que 12 contos já não é pouco. Quanto á substituição averba, entendo tambem que o theatro do Porto tem direito a que se lhe votem os 2 contos de íeis; mas eu que voto contra uma cousa, hei de votar por força contra a outra.

O Sr. J. L. da Luz — Quando o illustre Deputado que se senta no banco anterior, fez as suas considerações ácerca da verba lançada para o theatro de S. Carlos, confesso que lhe tive inveja; a situação do illustre Deputado é magnifica, quando a differença entre a receita e a despeza é tão notavel como se tem visto na commissão, e brevemente verá a Camara; quando aos servidores e credores do Estado se pedem sacrificios tão consideraveis, parece á primeira vista, que pedir 20 contos para um estabelecimento publico desta ordem, é querer para assim dizer escandalisar a moral publica. Mas apesar de tudo que disse o illustre Deputado, Sr. Presidente, eu não posso deixar de approvar a verba como esta no parecer, pelas razões que o Sr. Ministro do Reino acabou de dar. S. Ex.ª disse que sem 20 contos de réis, pelo menos, de subsidio, o theatro não póde conservar-se aberto, e não póde conservar-se, porque? Pelas razões que muito bem expendeu o illustre Deputado pelo Algarve que se senta no banco superior, e que eu escuso repetir. Além daquellas razões ainda ha outras, e eu até podia nesta parte appellar para a coherencia da maioria da Camara; quem concede 10 contos de réis para o arco da rua Augusta, não póde rejeitar 20 contos de réis para o theatro de S. Carlos. A Camara entendeu em sua alta sabedoria que as razões que se davam para o acabamento do arco eram solidas, e attendiveis, isto é, que o regalo da vista, a conservação dos operarios empregados na sua construcção era objecto a que se devia attender; pois pela identidade de razão deve votar a verba para o subsidio do theatro de S. Carlos. O theatro lyrico alegra o ouvido, e é um manancial de industria muito notavel, aonde se empregam muitos individuos de diversas profissões. Olhado pelo lado da policia e da administração publica, o theatro de S. Carlos póde dizer-se, que é um vehiculo de ordem, paz e moralidade. Quem vai alli, que não tenha visto como eu, com grande consolação, o modo como todos os individuos que alli concorrem, qualquer que seja a sua condição social, e até a opinião politica, se congratulam, quando reciprocamente apreciam as armonias que tocam igualmente a todos? O theatro de S. Carlos ainda tem outra grande vantagem, é um

derivativo da crápula (apoiados) e das más inclinações da mocidade; ao theatro de S. Carlos concorrem constantemente mancebos alvistados, que sem esta distracção sabe Deos aonde se interteriam todas as noites, o theatro lyrico é um lenitivo da mocidade da capital, que gasta uma parte das noites em que não ha theatro, a estudar no seu gabinete; e a applicação precisa deste passatempo para senão desviarar. Além disso o theatro de S. Carlos é uma recompensa justa que os habitantes da capital tem direito a exigir, porque são mais gravados, do que nenhuns outros do sólo portuguez, relativamente aos tributos que pagam para o Estado; e lhe devida esta retribuição, uma vez que a questão se queira considerar tambem por este lado.

Já que estou de pé responderei ao illustre Deputado que fez a proposta da deducção dos 2 contos de réis, para o theatro do Porto. Eu tenho muita sympathia pela Cidade Eterna; a ella entendo que foi particularmente devida a felicidade de que gosâmos, de ter o Governo Representativo; ella merece a consideração dos habitantes de Lisboa, porque foi o seu forte valimento, que lhes quebrou os ferros da tyrannia em que gemiam; não se me dá, se o Governo esta disposto a fazer mais essa despeza, que se dote o theatro do Porto não só com 2 contos de réis, apesar de mesquinho ser este soccorro, mas no que não posso concordar é que se tirem do subsidio do theatro de Lisboa, porque estou persuadido, como disse o illustre Deputado pelo Algarve, que se se tirar todos os annos alguma cousa do subsidio do theatro de Lisboa, hade este chegar ao estado de não poder permanecer; não hão de podér escripturar-se companhias competentes, e Lisboa não hade poder competir, como tem direito de o fazer, com as mais capitaes da Europa da sua cathegoria. Voto, portanto, pela verba como esta.

O Sr. Lacerda (Antonio): — Sr. Presidente, sustento a proposta apresentada pelo illustre Deputado pelo Douro, para se conceder um subsidio ao theatro do Porto; com quanto esteja convencido de que é elle bem diminuto; mas, Sr. Presidente, as circumstancias do Thesouro são muito apuradas, e é por isso que aquella proposta pede a deducção sómente de 2 contos do subsidio, consignado para o theatro de S. Carlos. Depois que se apresentou aquella proposta, foi mandada para a Mesa uma outra do meu amigo o Sr. Deputado pelo Algarve, que pede que a verba de 20 contos se eleve a 22, para dahi serem deduzidos 2 para o theatro do Porto; e eu não me opponho a essa segunda proposta, porque o meu fim é que o Porto seja tido na consideração, que por todos os titulos merece. Sr. Presidente, o illustre Deputado que mandou para a Mesa a proposta para diminuir a verba ao theatro de S. Carlos, disse que se o theatro do Porto devia ser considerado, o deviam ser tambem todos os que houvesse nas provincias! Sr. Presidente, não posso deixar de me maravilhar de similhante asserção, e a Camara muito bem sabe que o theatro do Porto esta em circumstancias especialissimas. Sr. Presidente, o Porto além de sr a segunda cidade do Reino, uma outra Capital, tem desempenhado na nossa historia liberal o principal, o primeiro, o mais brilhante papel; é o Libertador que melhor que ninguem sabia avaliar grandes feitos, e singulares serviços, tinha promettido ir morar no Porto alguns mezes todos os annos. Além disso, Sr. Pre-

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ridente, esta terra é de muita civilisação, muito importante no seu commercio, e concorre poderosamente para a receita do Estado; por consequencia se eu tenho alguma cousa a lamentar, é que sejam só 2 contos o que a urgencia das circumstancias permitte conceder ao theatro do Porto. Mas, Sr. Presidente, como é que se diz que senão vota pelo subsidio dos 2 contos por ser muito pouco? Porque senão podem votar 4 ou 6 contos, não se ha de votar nada? Muito bom era que se podesse votar mais, mas os apuros do Thesouro não o consentem; e por outra parte é certo que as despezas daquelle theatro não são consideraveis; não é um theatro de primeira ordem como o de Lisboa, e os habitantes do Porto de certo se contentam com uma companhia de segunda ordem, que fará muito menos despeza. Ora, Sr. Presidente, sendo o que observei inquestionavel, 2 contos de réis podem ajudar qualquer despeza.

Sr. Presidente, os illustre Deputados que defenderam o artigo, mostraram exuberantemente, quaes são as vantagens em geral que resultam da conservação do theatro; mas todas estas vantagens que os Srs. Deputados pela Estremadura, e pelo Algarve apre sentaram com tanta verdade; todas essas vantagens que se demonstraram resultar do theatro lyrico, e se disseram para sustentar o artigo, tem completa applicação tanto para o theatro de S. Carlos, como para o da cidade do Porto. O theatro, Sr. Presidente, ainda o repito uma vez, não só póde, e deve considerar-se como uma escola de instrucção, e bellas artes; mas como um meio moral, e favorecedor dos bons costumes. Que é o que se vê no tempo em que o theatro esta fechado? Vê-se a mocidade concorrer não só aos cafés, mas ás casas de jôgo, Sr. Presidente, que são a origem dos maiores crimes. Se o theatro estivesse aberto, essas casas maldictas não teriam tanta concorrencia.

Sr. Presidente, essas vantagens que se allegaram para a approvação da verba para o theatro lyrico de Lisboa, são em tudo applicaveis ao theatro lyrico do Porto; e depois do que observei sobre as circumstancias peculiarissimas daquella cidade, seria soberanamente injusto priva-la dessas vantagens.

Um illustre Deputado referiu-se a uma verba, que aqui se approvou para o arco do Terreiro do Paço; — e na verdade as razoes, que se deram para ella ser approvada, militam ainda a favor da proposta, que ora se discute; e depois de ter aquella verba sido approvada, não é possivel deixar de approvar esta. Tanto as bellas-artes, como as familias dos operarios são interessadas n'uma, e outra approvação. Por todos estes principios espero que a Camara approve a proposta do illustre Deputado pelo Douro, que não só é de justiça, mas de utilidade para uma cidade, á quem todos tanto devemos.

O Sr. Castro Ferreri — Sr. Presidente, eu tambem assignei a proposta do illustre Deputado pelo Douro, mas como pelo modo porque esta redigida, póde haver questão, eu mando uma emenda, na qual estabeleço o subsidio de 2 contos para o theatro do Porto; conservo o pensamento do Sr. Assis de Carvalho, mas julgo melhor ir em separado esta verba, e não incluida com a do theatro de Lisboa.

Proposta. — Proponho que se votem 2 contos de réis como subsidio ao theatro lyrico do Porto, e que se conserve a verba de 20 contos para o theatro de S. Carlos. » — Castro Ferreri.

Submettida á admissão, duas vezes não se deu numero de votos que validasse a votação.

O Sr. Antunes Pinto: — Sr. Presidente, eu deveria Ceder da palavra, visto que senão tem impugnado a verba senão com o argumento, que já se acha sufficientemente debatido; talvez no que vou a dizer, não faça mais do que repelir o que se tem dicto: entretanto pedi a palavra a fim de sustentar a verba de 20 contos para o subsidio do theatro de S. Carlos, é tambem para dizer, que todas as considerações que se tem apresentado ate agora pelos illustres Deputados que me precederam, são realmente aprova de que deve ser confirmada esta verba. Contra essas razões apresentou-se apenas um argumento consistindo no seguinte: pois quando o Governo carece muitas vezes de meios para pagar os prets, e para satisfazer aos servidores do Estado, ha de o Parlamento votar no orçamento uma Verba de tamanha importancia para o subsidio do theatro de S. Carlos? Este argumento que á primeira vista parece apreciavel, não tem comtudo força nenhuma, quando se consideram as vantagens, que resultam da conservação do theatro, de que se tracta; ora em primeiro logar este argumento pecca pela base em provar de mais, e em segundo logar, se desse argumento se podesse tirar uma consequencia logica, achar-se-ia, que pela mesma razão deveria reduzir-se tudo o que pertence á administração da justiça; achar-se-ia que se deveria reduzir tudo o que pertence ao Supremo Tribunal de Justiça, achar-se-ia que se deveriam reduzir os subsidios dos juizes de direito; assim como tudo o que pertence ao administrativo; o conselho de Estado, e todas as mais repartições publicas. — Por ventura porque no orçamento ha mais uma verba das que são indispensaveis, e porque ás vezes acontece não se poder acudir a todas as despezas, ha de dahi concluir-se que se tirem essas verbas do orçamento, e acabar com todas as repartições?

Quando porém se comparam esses argumentos com a necessidade que existe de se conservar aberto o theatro de S. Carlos, parece que deve desapparecer inteiramente toda essa força do argumento, com que se pretende impugnar a verba proposta. O theatro não é um objecto de luxo, quem assim o considera, não attende verdadeiramente á importancia que elle tem, porque não considera que não é só a vantagem da distracção, que já não é pequena, em uma capital tão populosa como esta, e que sendo tirado este meio de distracção certamente havia resultar grande falta para a maior parte das pessoas, que durante o dia se empregam, ou em trabalhos litterarios, ou no serviço do Estado, ou incluindo mesmo os proprios commerciantes, e artistas, que durante o dia estão debaixo do pezo dos trabalhos, a que se dedicam, e que desejam ler um passatempo, que lhes sirva de distracção; não considera tambem que o estabelecimento do theatro de S. Carlos é uma escóla pratica de musica e dança, e que a musica é uma das artes muito importante, necessaria, e util, e que de certo leria uma grande quebra entre nós, se o theatro não continuasse, porque além do intertenimento para os que o frequentam, promove a instrucção dos artistas em um objecto de tão grave importancia.

Considerado pois o theatro de S. Carlos, como escóla pratica tanto de musica, como de dança, são tão conhecidas as suas vantagens, que não podemos contestar a sua existencia. Que faria a mocidade

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em uma capital tão populosa, senão tivesse um theatro aonde podesse distrair-se?... Além disso o theatro serve de suavisar os costumes, porque o caracter do homem propende naturalmente para uma certa rigidez, que a musica sabe adoçar e cultivar, sendo mais esta uma das vantagens do theatro lyrico.

Quanto ao theatro do Porto parece-me que não póde ter logar a proposta que se apresentou, porque alli o municipio não esta tão sobcarregado de tributos municipaes como Lisboa, aonde o Estado recebe 700 contos de direitos de consumo, e só entrega á Camara a somma necessaria para illuminação e limpeza; ora estas circumstancias não se dão no municipio do Porto, e por tanto não ha accumulação nenhuma. Todas estas considerações demonstram evidentemente não só a necessidade da conservação do theatro de S. Carlos, mas que estas razões não são applicaveis ao theatro lyrico do Porto.

Peço á Camara que attenda, quaes seriam as consequencias se negassemos o subsidio, ou se o diminuissemos; diminui-lo seria o mesmo que extingui-lo; não era possivel com um subsidio menor de 20 contos, que elle podesse conservar-se, e quaes serão as consequencias? Eram, não só destruir esta escóla pratica de musica e dança, mas destruir todas as vantagens que dahi resultam, e quaes são ellas? Era nada menos que concorrer para a desmoralisação da capital, e fazer que a sua população adquirisse a grande vantagem que acabei de ponderar, e de que já outros illustres Deputados se occuparam.

Como não ha outros argumentos a combater, acabarei aqui o que tinha a dizer sobre o objecto, votando pela verba que esta no orçamento, e contra a proposta de reducção que se apresentou. Se acaso tivesse sido admittida á discussão aquella proposta que ultimamente se apresentou, eu diria alguma cousa sobre ella; pôsto que já tenho manifestado a minha opinião apresentando a differença que ha entre a cidade do Porto, e Lisboa.

Reconhecendo que ao Porto se deve em grande parte o triunfo da causa da liberdade, se as nossas circumstancias o permittissem, eu votaria não só os 2 contos para o seu theatro lyrico, mas alguma cousa mais. Concluo pois votando pela verba, comovem no parecer da commissão.

O Sr. Costa Lobo: — Admira-me que o illustre Deputado que acabou de fallar, dizendo que achava conveniente o subsidio para theatro de S. Carlos, negue um pequeno subsídio para o do Porto. Eu não digo que o theatro de Lisboa não deve ser beneficiado, por isso que é uma escóla moral e pratica das bellas artes, e por isso que emprega muita gente que se tem applicado a estas artes, e que ficariam sem meios de subsistencia, e mesmo por que é necessario dar este passatempo aos homens que passam o dia em trabalho e fadiga; tudo isto eu conheço, é por isso estou muito longe de combater o subsidio para o theatro de Lisboa; mas o que me admira, é que o Sr. Deputado negue que estas mesmas razões se dêem no Porto. Pois o Porto, uma praça tão importante, uma cidade que fez maiores serviços á liberdade, a capital das mais ricas provincias do Norte, não ha do ter um theatro? Não póde a muitos respeitos comparar-se á de Lisboa?!... Disse o Sr. Deputado, pois Lisboa que paga muito mais que as provincias... eu concordo que Lisboa paga mais, e até as contribuições são lançadas com mais regularidade; mas no Porto tambem se pagam direitos de consumo; a camara municipal do Porto lança contribuições nos generos consumidos, além das contribuições que nos mesmos generos são lançados para o Thesouro, por isso mesmo que não tem, como a de Lisboa, o Governo que a subsidie; por que em Lisboa ha outros meios que não ha no Porto, que é o soccorro do Governo para as despezas municipaes; por consequencia o mesmo que Lisboa paga á camara municipal por intermedio do Governo, paga o Porto tambem; pois esta sugeito ás contribuições de consumo para o Thesouro, e outras sobre o mesmo consumo a favor da camara municipal. Mas se no Porto se contribue o mesmo proporcionalmente que se gasta em Lisboa, como é que S. Ex.ª dá 20 contos para o theatro em Lisboa; e não dá os 2 para o Porto? Pois é á terra, fóco da liberdade, a quem S. Ex.ª quer negar esse mesquinho subsidio?! Pois é á terra de commercio por excellencia, que S. Ex.ª quer tirar esse subsidio?!... De mais a mais aquelle é um theatro particular, e a empreza que o tomar, tem que pagar o aluguer da casa... (Vozes: — O de S. Carlos tambem é). Pois bem, as circumstancias são iguaes; por que razão se hão de votar 20 contos para o de Lisboa e não se hão de votar 2 contos para o do Porto? O theatro do Porto até 1846 tinha 4 contos, e desde então para cá, que se lhe tiraram, é que o Porto não teve theatro; apenas o anno passado appareceu uma pequena companhia, que tão fraca era que não tinha nem partituras, nem orchestra regular, de maneira que quem ouvia cantar uma peça, não sabia que peça era. Ora á vista destas circumstancias póde haver quem recuse este mesquinho subsidio? Eu de certo que não, e por isso assignei a proposta do meu illustre amigo, não obstante que voto tambem a do Sr. Assis de Carvalho. Mas como o Sr. Ministro declarou que a somma toda era precisa para o theatro de S. Carlos, eu approvo então a proposta do Sr. Assis de Carvalho, que propõe uma verba de 22 contos, para desta somma se tirarem 2 para o theatro do Porto, que preenche o mesmo fim que eu tinha em vista. Um Sr. Deputado disse que não queria votar os 2 contos, por que então era necessario votar alguma cousa para as outras localidades do paiz, aonde houvesse theatros; então por que não póde haver theatro em Braga, e n'outros pontos não o deve haver no Porto?!... Mas ha ainda outra razão, e é, que essa gente das provincias do Norte vão e podem ir mais vezes ao Porto do que a Lisboa. Voto, por consequencia pela proposta do Sr. Assis de Carvalho.

O Sr. Corrêa Leal: — Peço a V. Ex.ª a bondade de mandar lêr a proposta, que foi mandada para a Mesa pelo illustre Deputado pelo Minho, sobre as accumulações. Leu-se.

(Continuando): — Eu já ha dias sabia que a especialidade da minha pessoa havia mesmo ficar separada da generalidade dos assumptos das accumulações para ser aqui tractada muito especificadamente; logo me occorreu que o primeiro passo que tinha a dar, era offerecer a minha demissão de um dos logares que tenho occupado; mas pareceu-me que não devia privar o illustre Deputado que se havia de encarregar da proposta de dar essa prova mais á Nação da regidez dos seus principios, e da imparciali-

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dade com que aqui vem pugnar pela fiscalisação da bolsa do povo, que é palavra muito Parlamentar (apoiados) e assim ir coherente com as idéas, e principios que constantemente tem seguido. Como a questão é muito pessoal, não posso demorar-me nella, mas a Camara me permittirá que diga só duas palavras, e eu termino já o meu curto e desalinhavado discurso. Eu pergunto á Camara se um conego de qualquer cabido que recebe um ordenado pelo Thesouro, se elle tiver uma cadeira de Latim, de Filosofia ou de Logica, e que não haja quem a dirija, se pelo facto de receber esse ordenado como conego póde ser privado daquelle que lhe pertence como professor? Se por ventura um militar, que é lente, não recebe o seu soldo, e ao mesmo tempo, não 200 mil réis, mas 600, e 700 mil réis pela sua cadeira, vencendo ainda accesso na patente? Mas não pense a Camara que eu quero que esta doutrina me seja applicada, porque eu desde já deste logar peço a S. Ex.ª o Sr. Ministro do Reino e Presidente do Conselho a bondade de pedir a S. Magestade a demissão do cargo de professor da cadeira do conservatoria de Lisboa, da qual faço plena desistencia; assim como tambem peço a S. Ex.ª acceite a minha demissão de membro da commissão inspectora do theatro de D. Maria 2.ª, optando pelo ordenado que tenho de official da secretaria desta Camara.

O Sr. Forjaz: — Sr. Presidente, eu estou prevenido na maior parte das reflexões que linha a fazer a favor da proposta que mandei para a Mesa, assignada por 31 Srs. Deputados a respeito da deducção de 2 contos de réis da verba destinada para o theatro de S. Carlos, applicados para o de S. João no Porto.

Sr. Presidente, se a conveniencia publica exige que seja subsidiado o theatro de Lisboa, não menos parece exigir que, em justa proporção, o seja tambem o theatro do Porto.

Sr. Presidente, eu ouvi dizer ao nobre Deputado pela Estremadura que este subsidio era novo. Sinto muito que o nobre Deputado se tenha retirado, por que lhe queria mostrar que S. Ex.ª estava em êrro; este subsidio não é novo, este subsidio foi sempre concedido, e só no ultimo anno é que lhe foi tirado. O theatro do Porto foi sempre subsidiado não com 2 contos de réis, com 4 contos; por consequencia não é um subsidio novo, é a continuação do mesmo subsidio, é uma divida que devemos á cidade Invicta, a qual não só pela sua posicção, não só por ser a segunda cidade do Reino, não só pelo seu commercio, não só pelo estado em que ali se acham as artes e as sciencias, mas até mesmo pelas considerações politicas não póde deixar de merecer ao Parlamento toda a devida consideração.

Sr. Presidente, aonde foi que primeiro soou o grito da liberdade? No Porto. Aonde existem as linhas que sustentaram os direitos do Povo? No Porto. Em que cidade se encerra a joia mais preciosa da Corôa Portugueza? No Porto; e entretanto é no Porto, a quem não se quer conceder uma migalha, a quantia de 2 contos de réis!..... Até se quer

despojar dessa consideração, que ella leve até á revolução de maio!...

Sr. Presidente, ouço dizer que esta quantia não se póde dispensar do theatro de S. Carlos. Tambem sou amador do theatro de S. Carlos, tambem tenho assistido ás suas representações, tambem vi que rarissimas vezes deixava de ter enchentes, e é por estar persuadido do gosto delicado dos Lisbonenses, que me parece não irá causar-lhe prejuizo a deducção de 2 contos; mas se a Camara entender que esta quantia não deve ser tirada da dotação daquelle theatro, não duvido propôr o augmento de 2 contos neste capitulo do orçamento: o que desejam os Deputados que assignam esta proposta, é que o Porto continue a ter a mesma consideração que já teve, que o theatro do Porto seja subsiado como é o de Lisboa.

Disse-se, Sr. Presidente, que não ha igualdade entre o Porto, e Lisboa. Eu acredito, mas tambem não é exacto o que disse o nobre Deputado, que o Porto não pagava para as despezas publicas; se o Porto não paga quanto paga Lisboa, paga bastante, soffre muitos onus, muitos impostos, tem barreiras, e tem alfandega; por consequencia na justa proporção paga o mesmo que Lisboa.

Sr. Presidente, ouvi, e ouvi com admiração dizer ao illustre Deputado que se senta do outro lado, que os impostos pagos pelo Porto não entravam no Thesouro; não sei então aonde entram; o que sei, é que se pagam; desejava que o illustre Deputado pela Estremadura me dissesse aonde entram.

Sr. Presidente, o Porto paga em justa proporção o mesmo que paga Lisboa, e entretanto não tem as vantagens que lêem os habitantes de Lisboa; e de mais esta mesma desigualdade existe na differença dos subsidios, porque em quanto não se duvída votar 20 contos de réis para o theatro em Lisboa, pede-se unicamente 2 contos de réis para o do Porto: por consequencia a differença que ha no pagamento dos tributos, nos onus absolutamente superiores de Lisboa para os do Porto, esta considerada pela differença que vai de 20 ou de 18 contos para 2.

Mas, Sr. Presidente, esquecia-me tambem reflectir que o theatro de S. Carlos não funcciona todo o anno, funcciona apenas 6 mezes, e por isso não são 20 contos de réis o que lhe votamos, são 40; não são 18 contos se se approvar a minha proposta, são 36.

Disse-se tambem que esta quantia de 2 contos era assás insignificante, que não se podia sustentar o theatro do Porto com ella; mas se os Deputados daquella cidade, se os Deputados mais proximos, e conhecedores dos interesses della se dão por satisfeitos com os 2 contos de réis, se eu posso asseverar á Camara que o Porto se dá por muito satisfeito com os 2 contos de réis, qual será a razão porque se ha de negar esta quantia? Qual ha de ser a razão porque queremos negar ao Porto aquella migalha?

Sr. Presidente, argumentou-se com as outras cidades, e disse-se que se no Porto se subsidiasse o theatro, tambem se devia subsidiar nas outras cidades do Reino.

O illustre Deputado, que avançou esta proposição, ausentou-se, e fez bem para não ouvir como se tem ouvido dizer que não ha justa proposição entre as outras cidades do Reino á excepção de Lisboa, e Porto. Que proporção tem Coimbra, e Braga com o Porto? O Porto paga mais que as outras cidades, o Porto pela sua posição commercial, e pela sua consideração politica não póde ser comparado a uma outra cidade, como é Coimbra ou Braga, e por consequencia essa razão que o nobre Deputado apresentou, não póde proceder senão a favor do Porto.

E demais ha uma outra razão em favor daquella cidade, por isso que se contos de réis são necessa-

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rios para o Porto, serão necessarios para se estabelecei um theatro em Braga, e nas outras povoações principaes do reino 20 ou 30 contos, porque não teria alli de certo o theatro o numero de assignantes que seriam necessarios para se fazer face ás despezas, dando-se-lhe uma dotação igual a do Porto.

Por consequencia, Sr. Presidente, não ha razão nenhuma na comparação que se fez das outras cidades com o Porto, não ha razão nenhuma para que se dêem 20 contos de réis ao theatro em Lisboa, e se neguem 2 contos de réis para o theatro do Porto; por isso que se o Porto não paga tanto como Lisboa, paga muito, tem barreiras, alfandegas, e todos os onus, como já eu disse, e como já apresentou um nobre Deputado pelo Porto; e parece-me que essa desigualdade que existe entre o que paga Lisboa, e o que paga o Porto, esta compensada pela desigualdade que vai de 20 contos que se votam para Lisboa, e de 2 que se pedem para o Porto.

Concluindo, mesmo para não abusar da benevolencia da Camara, digo que voto primeiramente pela minha proposta, porque desejo ser coherente em não augmentar as verbas do orçamento, e por isso que entendo que a verba de 2 contos póde ser dispensada do que se propõe para o theatro de S. Carlos; mas senão se approvar esta minha proposta, então voto pelo augmento de 2 contos de réis neste capitulo do orçamento, porque o meu fim é que o theatro de S. João do Porto seja convenientemente subsidiado.

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, a paciencia da Camara esta de certo esgotada, a hora muito adiantada, e eu vejo os bancos desertos; não abusarei por muito tempo da attenção: vejo-me porem forçado a dizer duas palavras; o que disse o penultimo (illustre Deputado que fallou, exige que eu dê algumas explicações.

Assevero ao illustre Deputado de certo para lhe tranquillisar a consciencia, que eu não fiz especialidade da sua pessoa para tractar esta questão, e se elle attribue essa especialidade a uma collecção de homens a que se chama opposição, e a que eu pertenço, devo-lhe tambem declarar que a opposição não pensou no illustre Deputado. Se estivesse mais attento á discussão do dia de hoje, havia de conhecer que o Deputado que esta fallando, pediu a palavra para fallar a respeito de outra accumulação, que a palavra lhe foi tolhida, porque a discussão acabou, e não póde fazer uma proposta; e que entretanto desejando eu tirar fructo da noticia que me fôra dada, pedi ao Sr. Ministro do Reino tomasse nota do que havia áquelle respeito, e providenciasse. Já se vê que não havia especialidade alguma. Se eu attendesse ao meu desejo, e não tivesse o empenho que devo ter em velar pela reducção desta despeza publica, não tractaria do illustre Deputado, porque me ligam a elle sentimentos de verdadeira e antiga amisade.

Ora o illustre Deputado tirou-me algum trabalho, fez uma declaração, que é muito honrosa para elle, e que de certo deve pôr termo a esta discussão; ma durante o debate que tem havido sobre este negocio, o illustre Deputado estabeleceu alguns principios que merecem ser combatidos. (Vozes: — Deu a hora) Então peço a palavra para amanhã.

O Sr. Presidente: — A ordem do dia para amanhã é a continuação da mesma. Está levantada a sessão. — Eram cinco horas da tarde.

O 1.º Redactor,

J. B. GASTÃO

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