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N. 8. Sessão em 11 de Junho 1849.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada — Presentes 48 Srs. Deputados.

Abertura — Ao meio dia.

Acta — Approvada unanimemente.

EXPEDIENTE.

Officios. — 1.º Do Ministerio da Justiça, acompanhando o mappa do lançamento e cobrança das congruas dos parochos nos annos economicos de 1845 a 1848, pertencente ao districto administrativo de Braga; continuando assim a satisfazer ao requerimento do Sr. Ferreira Pontes. — Para a Secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, dando os esclarecimentos, que lhe foram pedidos ácêrca do projecto dos Srs. Deputados pela Ilha da Madeira, para serem isentos do disimo e de quaesquer outros impostos, certos generos de producção da mesma Ilha. — Á commissão de Fazenda.

Representações. — Uma da camara municipal da Arruda dos Vinhos, apresentada pelo Sr. Xavier da Silva, em que pede a restituição da cadeira de Grammatica Latina naquelle concelho, da qual gosou até 1832. — Á commissão de Instrução Publica.

O Sr. Poças Falcão: - Participo a V. Ex.ª que o Sr. Pessanha não póde comparecer á sessão de hoje por incommodo de saude.

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, no principio da sessão de 1849 tive a honra de apresentar a esta Camara um projecto de lei sobre a livre importação do chá; este projecto depois de repetidas instancias minhas appareceu na Camara com o parecer da commissão de Commercio e Artes, pedindo alguns esclarecimentos a este respeito: seguiu-se uma larga discussão, e o parecer foi approvado com uma nova substituição que eu tive a honra de offerecer. Eu disse então, e a experiencia o tem mostrado, que o pedirem-se informações ás associações commerciaes de Lisboa e Porto, era fazer com que esse negocio de perfeita urgencia, se não tractasse na sessão actual; e com effeito assim acontece: estamos no fim da sessão, e por ora não me consta, que tenha vindo á Camara informação alguma além da que deu a alfandega grande de Lisboa Peço aos Srs. Ministros, que estão presentes, que se empenhem, para que essas informações, se foram pedidas ás associações commerciaes de Lisboa e porto, venham a tempo de serem tomadas em consideração.

Tambem apresentei um outro projecto, que foi remettido á commissão de Commercio e Artes, e não sei como deva qualificar a demora que tem havido em dar sobre elle e seu parecer; e por isso peço que haja de dar o seu parecer sobre esse projecto, relativo á extincção do monopolio do sabão, em que interessa toda a communidade Portugueza.

Sr. Presidente, escuso de sobre este objecto fazer reflexões algumas á Camara; mas entendi que a commissão era a primeira empenhada, ou que devia ser a primeira empenhada em trazer aqui o seu parecer; pediria eu a V. Ex.ª que sei, que toma tanto interesse como eu neste objecto, que houvesse de unir os seus votos, para que aquella commissão despertasse, trazendo aqui o seu parecer.

O Sr. Presidente: — quanto ao primeiro objecto creio eu, que já vieram algumas informações, ainda que talvez não sejam todas; e em quanto ao outro, relativamente á extincção do monopolio do sabão já por mais de uma vez tenho pedido á commissão, que dê o seu parecer sobre este negocio, sobre o qual tem vindo á Camara tantas informações (apoiados). Agora novamente lhe recommendo a urgencia deste objecto.

O Sr. Corrêa Leal: — Mando para a Mesa a seguinte

Declaração de voto. — Declaro que se estivesse presente na sessão do dia 6 do corrente, votaria a favor do projecto da minoria da commissão Especial de Notas. — Corrêa Leal.

Por unanimidade se resolveu que fosse lançada na acta.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, primeiramente perguntarei a V. Ex.ª, se acaso o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros já marcou dia e hora para a interpellação, que eu annunciei ha muito tempo, e que pedi se renovasse ácêrca da administração dos correios: e em segundo logar, Sr. Presidente, levantarei ainda uma vez a minha voz, posto que talvez inutilmente, em favor de um objecto, que reclama as attenções de todo o paiz, mas que não reclama as attenções do Governo. Ha 6 ou 7 dias que se distribuio nesta Casa o ultimo parecer da commissão de Estradas, trazendo reduzida a bases simples o projecto, para se fazerem estradas no paiz: este projecto, segundo o que aqui foi asseverado, foi combinado com o Governo, e era de esperar, era um dever da parte do Governo, depois do programma que tinha apresentado aqui, viesse pedir immediatamente, que esse projecto se desse para ordem do dia, sabendo qual é a expectativa geral da Nação sobre este objecto de communicações geraes internas: com tudo tem passado o tempo e outros projectos se tem discutido; e ainda não ouvi dos bancos ministeriaes uma voz, pedindo a V. Ex.ª que desse para ordem do dia este projecto salvador, do qual depende todo o nosso bem estar, porque desengane-se o Governo:

VOL. 6.º - JUNHO – 1849.

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todos os seus trabalhos empyricos a respeito de negocios de fazenda, tudo isso ha de envolver-se em bolhas de sabão, em quanto não crear receitas e der desenvolvimento a todas as industrias. Já que o Governo põem de parte objectos de tanta importancia, e esquece o seu dever, peço eu a V. Ex.ª, que com a brevidade possivel, e antes que venha a lei de meios, e que se exclua outra vez esse projecto, o dê para ordem do dia quanto antes.

O Sr. Presidente: — A interpellação a que se refere o Sr. Deputado, foi communicada ao Sr. Ministro respectivo a primeira vez em 28 de março, e a segunda vez renovou-se em officio de 28 do corrente: devo com tudo advertir ao Sr. Deputado, que ao Sr. Ministro não compete marcar dia e hora para ella ter logar; e ha de verificar-se na hora propria para as interpellações, e quando estiver presente S. Ex.ª

E em quanto ao projecto das estradas estão satisfeitos os seus desejos, porque já esta dado para ordem do dia, e ha de entrar em discussão no logar competente.

O Sr. Silvestre Ribeiro: — É para mandar para a Mesa o seguinte requerimento, cuja urgencia peço:

Requerimento. — Requeiro que pelo Ministerio da Fazenda sejam remettidos a esta Camara todos os papeis que existirem no Tribunal do Thesouro Publico, relativos á questão do restabelecimento das cadeiras de filosofia, dogma, e moral, creadas por Fr. José de Santo Antonio Moura, no extincto convento da 3.ª ordem da penitencia da Villa de Almodovar, do districto de Béja, nos termos da representação da camara municipal daquelle concelho, por mim apresentado em sessão de 30 de maio findo. — Silvestre Ribeiro.

Foi declarado urgente por 49 votos contra 1, e approvado sem discussão por unanimidade.

O Sr. Rebello da Silva:, — Sr. Presidente, desejo interpellar o Sr. Ministro da Guerra sobre um facto praticado por S. Ex.ª na escola polytechnica; e como desejo que S. Ex.ª tenha conhecimento da interpellação, vou annunciada. Foram riscados da escola polytechnica 12 estudantes, attribuindo-se-lhes o terem praticado, o que em termos escolásticos se chama fazer parede j estou informado, que um dos riscados esta na cama com bexigas, e outro foi espancado por querer entrar para a aula; é pois sobre este objecto, que mando para a Mesa a seguinte

Indicação. — Requeiro que o Sr. Ministro da Guerra seja convidado a responder a uma interpellação, que lhe desejo dirigir acêrca da escola polytechnica sobre o acto de mandar riscar 12 estudantes. — Rebello da Silva.

O Sr. Presidente: — Manda-se fazer a communicação.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, por portaria de 20 de janeiro deste anno, que foi ampliada e declarado pelas de 24 de fevereiro e 24 de março, determinou-se que os individuos das classes inactivas fossem admittidos a notar os recibos, para os podérem negociar; e apesar de se dizer que essa providencia foi tomada a requerimento de alguns dessas classes, do que não duvido, visto o grande atraso em que se acham os seus pagamentos, e não terem outros meios, donde possam viver, sei com tudo que outros não querem usai dessa faculdade, por lhes ser mais commodo usarem dos titulos de renda vitalicia, passados em virtude do decreto de 30 de maio de 1844; mas entram em duvida se podem ou não continuar a usar delles. Em quanto a mim, julgo que aquella providencia é facultativa; entretanto para que os interessados fiquem tranquillos, é preciso uma declaração da parte do Sr. Ministro da Fazenda, a qual póde fazer pelo modo que julgar mais conveniente, ou respondendo agora, ou expedindo alguma portaria, que declare a de 20 de janeiro que já mencionei,

Eu pedi a palavra nesta occasião, para evitar o apparato de uma interpellação, e porque confio em que S. Ex.ª não duvidará tomar alguma providencia, ou dar uma resposta que tire todas as duvidas, sem ser preciso usar désse meio de que podia usar. E aproveito tambem esta occasião para chamar a attenção de S. Ex.ª para o atraso, em que se acham os pagamentos destas infelizes classes, as quaes cada vez se vão atrasando mais.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Pelo que pertence -ao objecto da pergunta, que o nobre Deputado me dirigiu, devo dizer, que tendo a medida, de que o illustre Deputado faz menção, sido tomada em virtude de representações de alguns interessados, já se vê, que o Governo considerou, e não podia deixar de considerar essa medida facultativa, e não obrigatoria, e por isso os que quizerem tirar os recibos, podem tiral-os, e os que quizerem continuar a receber pelos titulos, tambem o podem fazer. Em quanto a melhorar os pagamentos, o Governo tem já tomado medidas a esse respeito; e de certo ha de continuar a procurar todos os meios para conseguir este fim.

O Sr. Ferreira Pontes: — Agradeço ao Sr. Ministro da Fazenda, a prompta e explicita resposta, que deu á pergunta, que lhe dirigi; e visto que a providencia da portaria de 20 de Janeiro é facultativa, e não ficam os interessados obrigados a notar os recibos dos seus vencimentos, nem lhe ficam inutilisados os titulos de renda vitalicia, dos quaes poderão continuar a usar independentemente desses recibos, fico satisfeito, e julgo que é quanto basta para que os que tem esses recibos, fiquem socegados; e por isso não insto por outra alguma declaração.

O Sr. Pereira dos Reis: — Mando para a Meza a seguinte

Indicação. — Peço que o Sr. Ministro da Justiça seja prevenido, de que desejo interpella-lo sobre o estado, em que se acha a reforma das tabellas judiciaes. — Pereira dos Reis.

O Sr. Presidente: — Manda-se fazer a communicação.

Ordem do dia.

Continua a discussão do parecer n.º 60, sobre as alterações feitas na Camara dos Dignos Pares ao projecto sobre a aposentação dos Juizes.

O Sr. Faria Barbosa: — Sr. Presidente, como membro da commissão de legislação assignei o parecer em discussão, e assignei-o sem declaração alguma; por que entendi e entendo, que os artigos ou provisões que lhe accresceram na outra Casa, não concorrem nem directa, nem indirectamente para armar os inimigos do Throno Legitimo e da causa da liberdade; pelo contrario eu entendo, que essas provisões são de conveniencia publica, e são sustentadas nos eternos principios de humanidade, e justiça.

Sr. Presidente, eu estou persuadido, que os nobres

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Deputados, que tem combatido este -parecer, decerto não estão orientados sobre o numero desses magistrados, e muito menos daquelles, que estarão nas circumstancias de se aproveitarem do beneficio da lei.

Sr. Presidente, nem por um momento posso acreditar que o partido da Rainha, e o partido da Carta possa estremecer — logo que este projecto seja approvado. Pois o Throno da Rainha e o partido da Carta que debellou um exercito de 80 mil homens póde estremecer só por se dar um subsidio a uma duzia de homens, valetudinarios e desgraçados? E impossivel que esta idéa possa ser adoptada e recebida pela Camara. Eu sou insuspeito nesta questão; padeci e muito; fui victima desse partido; soffri martyrios e perseguições barbaras; reconheço que nesse partido se fizeram muitas atrocidades, grandes violencias e actos de horror; mas não posso deixar de dizer que nesse partido existem homens de muita probidade e muito distinctos, e que devem ler direito a alguma consideração.

Disse-se que isto é fazer um beneficio a homens incorregiveis, a homens que na lucta passada se uniram á causa da Junta do Porto que queria a queda do Throno da Rainha» — Não é tanto assim, eu presenciei os movimentos desse partido, e se examinarmos agente que pegou em armas, veremos que os homens mais notaveis desse partido não appareceram em publico; em geral quem appareceu em publico, foram aquelles miseraveis que ahi andam esmolando, e que queriam melhorar a sua situação: estigmatiso, condemno esse acto, comtudo meditando sobre elle, não posso deixar de attender a muitas considerações. O que selhès prometteu em Evora Monte? Prometteu-se-lhes garantir as suas patentes legitimas, e dar-se-lhes um subsidio correspondente a ellas. E que se ha feito? Determinou-se por uma medida provisoria que se lhes désse meio soldo: depois que aconteceu? Depois disse-se-lhes: — Para vós poderdes ser pagos em dia tereis apenas uma quarta parte do vosso soldo. A quanto monta esta quarta parte, e como se tem ella pago? Ora estes homens vivendo ha tantos annos, na maior miseria, e suas familias, como podiam elles deixar de conspirar? Eu declaro que antes quero ser victima d'uma revolução, do que estar n'um continúo martyrio padecendo, e os meus, uma morte lenta e afflictiva (apoiados).

Disse-se tambem a Que senão queria concorrer para a approvação deste projecto, por isso que havendo outro que diz respeito aos militares que serviram nesse partido, não se queria dar direito a estes, pela approvação do parecer em discussão eu julgo que esta idéa tem de ser despresada. Nesta Casa só brilham os principios de justiça, humanidade, e generosidade, e não os da vingança, e da perseguição eterna á situação destes infelizes, poucos em numero, e de mais a mais já n'uma idade bastante cançada; desperta a compaixão de todos: a Camara ha de reconhecer que isto além de ser um acto de humanidade, é um acto de justiça, porque é cumprir aquillo que se lhes prometteu em Evora-Monte... (Vozes: — Não se lhes prometteu nada). Pois tem-se-me affirmado que se lhes promettêra garantir as suas patentes legitimas (Vozes: — Não, não) mas dado o caso que nada se lhes promettesse; eu observo que o Governo prometteu a estes individuos meio soldo, e depois disse-lhes — Para vós serdes pagos mais promptamente tereis uma quarta parte sómente — e por

fim nem essa triste e diminuta parte se lhe paga, estão em grande atraso, morrendo á fome, e a necessidade. Accresce ainda, o outro dia houve uma ordem dimanada do General em Chefe que mandou examinar as circumstancias em que estes individuos se achavam, para melhorarem a sua situação, isto é, reconheceu-se que a situação destes infelizes é desgraçada, e que é uma justiça dar-se-lhes uma fatia de pão. Não se diga que estou a promover o sentimentalismo, porque estes argumentos não são composição minha, são factos que se não podem negar. Sr. Presidente, é um acto de conveniencia publica o decretarem-se as medidas, que se propõem a favor destes individuos. O que aconteceu ha pouco em Hespanha, quando a bandeira do Pertendente se havia desenrolado nas provincias? Aconteceu o Governo dar um perdão, e admittir nas fileiras do exercito da Rainha Isabel officiaes que o combaliam, e note-se nos postos que tinham. Qual foi o resultado deste acto do Governo forte de Narvaez, foi acabar-se a guerra. Quantos desses homens que serviram D. Miguel vejo hoje nas nossas fileiras prestando valiosos serviços, e muitos talvez sem que prestassem juramento de fidelidade á Rainha? Ora se isto se tem feito com uns, porque se não ha de fazer o mesmo com os outros Isto é que são excepções, e excepções odiosas.

Disse-se — a Que este partido ainda conspirava: e tanto assim que se publicou nesta Capital um periodico orgão desse partido, que mostrava tão grande acinte contra é Throno da Rainha, que quando escrevia o Nome da Augusta Soberana, era sempre com letra pequena 5» — pois porque existe um periodico redigido por meia duzia de especuladores, devem todos responder por elle e serem condemnados, quando isso se pratica sem seu consentimento sem que elles cooperem directa ou indirectamente E agora perguntarei o que se tem dicto pela imprensa liberal a respeito da mesma Augusta Personagem? E porque se não reclama a mesma justiça para essa gente? Porque se não diz tambem — Saiam para fóra dos empregos? Pois estes homens não tem mostrado tambem o mesmo acinte, não tem feito uma guerra cruel contra o Throno Legitimo: na minha villa lá existe um juiz que dizia da Rainha quanto lhe, parecia, a que chamou gente ás armas... (Vozes: — A ordem, á ordem. — O Sr. Silva Cabral: — Aqui não se discutem pessoas determinadas). Então por dizer verdades sou chamado á ordem!...

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado queira restringir-se ao objecto em discussão.

O Orador: — Eu tenho a responder a argumentos que se apresentaram.

O Sr. Presidente: — Mas não fazendo allusões a nenhum empregado publico, quando senão tracta de accusação feita a este empregado, (apoiados)

O Orador: — Isto não são allusões, são factos já relatados por mim nesta Casa, e que fazem objecto d'uma interpellação que esta pendente ainda.

O Sr. Presidente: — É para essa occasião que o nobre Deputado póde fallar sobre este objecto; agora peço ao Sr. Deputado que tracte da materia em questão; e mesmo podia fallar de pessoas sem designar quaes são.

O Orador: — Muito bem; Sr. Presidente, esse partido esta hoje em uma quebra espantosa, por isso que muitos homens desse partido estão envolvidos em

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grandes emprezas, e com grandes fabricas, e tem comprado uma somma enorme de bens nacionaes, e estes actos para mim, são os mais convincentes e me levam a crer que esses homens nenhum interesse podem ter em que D. Miguel torne a pizar o terreno portuguez, porque todas essas fortunas lhes desappareciam no momento em que elle apparecesse.

Sr. Presidente, eu não entendo que da aposentação que se deu a alguns desses magistrados resulte outra cousa mais do que terem esses individuos mais alguns meios de subsistencia: não posso conceber como alguem diz que da approvação deste projecto resulta não só o direito de ser aposentados, mas de ser integrados na magistratura; estou convencido que para esses homens serem reintegrados, era preciso uma nova lei; e ainda assim não podia ter logar a reintegração com estes magistrados, porque se acham talvez na quasi impossibilidade de serem reintegrados. Pois estes magistrados hoje na idade em que se acham, depois de terem servido os logares de segunda ordem, e talvez os de terceira, na escala da antiga magistratura, não tendo até hoje sollicitado o entrarem na nova magistratura, quereriam ser delegados? Estou inteiramente convencido que não.

Então como se quer dizer que por esta lei não só se concede o direito de aposentação, mas o direito de tornarem a entrar na carreira da nova magistratura os individuos, áquem ella é applicada? Declaro a V. Ex.ª que não sei como se confundem cousas tão diversas. Entendo que esses magistrados antigos estão hoje na impossibilidade de tomarem a entrar na vida da magistratura por esta razão, que já disse; quanto aos bispos, é necessario tambem que se apresente outra lei, e então quando ella vier combatam-na; mas combater esta lei com fundamentos, que não existem, e para que senão conceda uma pequena falta de pão a esses individuos que ha 14 annos tem sido condemnados a um exilio, e considerados como não pertencendo á Familia Portugueza para tudo aquillo que são proventos, e só sim para tudo aquillo que são onus, isto a fallar a verdade não me parece proprio de um Governo Constitucional, e estou certo que a Camara o não ha de consentir por mais tempo. Sr. Presidente» eu se acaso esta medida tivesse a iniciativa nesta Casa, talvez me parecessem justos alguns dos argumentos contra ella apresentados, mas tendo tido começo na outra Casa, e vendo que as personagens mais distinctas do paiz, que tanto padeceram, e tantos serviços prestaram, não só votaram por esta medida, mas a apoiaram com todas as suas forças — todos esses argumentos julgo-os dignos de -despreso, porque esse acto de generosidade, de humanidade daquelles cavalheiros, deve ser seguido por esta Camara sem o menor escrupulo.

Fallou-se em os membros das alçadas. Quantos existem? Apenas dois, e um por sua idade, por suas molestias não promette muita vida. Deveria pois fazer a Camara uma excepção por causa de um unico homem, homem de muita illustração, que foi humano, que muito favoreceu, e que até salvou algumas vidas?

Sr. Presidente, os principios de humanidade, de tolerancia, de generosidade reclamam esta medida — os corações verdadeiramente liberaes — e que fizeram viandes sacrificios pela Causa da Liberdade, e do Throno Legitimo, não podem ver o estado de soffrimento, de miseria, e de exilio tão longo a que estão condemnados esses individuos São portuguezes, e se soffrem os incommodos da sociedade, devem tambem gosar dos commodos; já é tempo bastante de expiação, e de martyrio. Por todos estes motivos é que assignei sem declarações, e voto pelo parecer.

O Sr. Mexia: — Sr. Presidente, em relação ao art. 6.º tem já sido sufficientemente adduzidas as razões, que ha pro ou contra; e pertence á Camara pesa-las em sua alta sabedoria, e decidir o que julgar melhor. É com prazer que tenho visto que os illustres Oradores, tanto os que sustentam o art. 6.º como os que o impugnam, se encontram uniformes em um ponto, no sentimento de lealdade, e respeito á Rainha, e á Carta, no qual a commissão, que approvou o artigo, não cede a palma.

Porém, Sr. Presidente, o fim com que pedi a palavra é outro. É convicção minha que nas aposentações dos magistrados se deve attender sómente ou á dicturnidade do serviço, cujo praso a lei marque, ou ao impedimento fysico, legitimamente justificado; fôra destes indicadores, não conheço outro Já emitti esta opinião, quando na Camara se tractou da reforma dos militares, e na commissão de Instrucção Publica, quando nella se discutiu ácerca das jubilações dos professores publicos; e porque desejo não ser avaliado por contradictorio com os principios, pedi na commissão licença, para na Camara fazer esta declaração, por isso que, salvo o respeito á illustração da Camara dos Dignos Pares, não posso achar razão que justifique a alteração.

Sr. Presidente, não é possivel reputar-se justa a exigencia dos 60 annos, porque a aposentação, jubilação, e reforma, é pela Legislação de todas as nações cultas conferida como remuneração de serviços; ainda mesmo quando por força maior da doença, caso em que se attende sempre aos serviços já prestados, e que deixou de prestar por impedido; e deve-se notar que o valor dos serviços é igual tanto nos velhos, como nos novos; e senão mostre-se-me onde esta a differença? Sr. Presidente, deixemos neste caso a idade como um motivo de mais para o nosso respeito, e veneração para com os magistrados provectos; consideremos como Chateaubriand nas suas Memorias para depois do Tumulo, a idade avançada como uma dignidade, que merece o nosso culto; mas para quem de menos idade tiver os mesmos annos de serviço, não seja a falta dos 60 um motivo essencial de menos.

Sr. Presidente, se se quizer contemplar a idade, então devem bastar os 60 annos sem a diuturnidade do serviço; mas neste caso haverá outra injustiça, porque falta a base da remuneração, que é o serviço. Seja muito embora tomada essa taxa da idade como uma das provas de impedimento, porém nunca para conferir ou auferir direitos; aliás muitas outras hypotheses nascerão, em que um magistrado com muitos mais annos de serviço do que o sexagenario, não poderá aposentar-se, e uma tal disposição parece ferir a igualdade, que deve reinar em uma legislação justa.

Como nas disposições das leis, que partem de um mesmo principio justificativo, deve existir, como seu elemento, a uniformidade, entendo que os annos de serviço, que constituem uma escala para as aposentações na presente lei, devem ser reconhecidos como sufficientes para que o magistrado que em qualquer idade, e circumstancias nella se achar comprehendi-

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do, adquira um direito inauferivel ao seu descanço com a devida honra, e congruente ordenado, por quanto e essa a base que reputo justa para as reformas, e jubilações. Concluo pois mandando para a Mesa a seguinte

Proposta. — Proponho a eliminação das palavras — 60 annos de idade — no art. 1.º, e correspondente, — Mexia.

O Sr. Presidente: — Devo observar á Camara que nesta occasião não é de certo que tem cabimento fazerem-se propostas para alterar o que veio da Camara dos Dignos Pares, porque logo que se altere uma parte daquelle projecto, tem de haver commissão Mixta; o meio mais proprio é que os Srs. Deputados que não concordam com o parecer, ou que se oppõem a qualquer das emendas que alli se fizeram, é votarem contra aquillo em que não concordam, havendo votação separada relativamente a cada uma dessas emendas para fazer vencer aquellas que se entender que devem ser approvadas, e seguir-se nas outras em que ha de ter logar a commissão Mixta, mas agora apresentar propostas desta natureza, entendo que não tem cabimento algum (apoiados).

O Sr. Silva Cabral: — Sr. Presidente, em geral essa é a douctrina, mas não póde deixar de se adoptar o principio, que é conforme com a razão e com a pratica; necessariamente nos havemos de conformar com esse principio. Sr. Presidente, em geral desde que acontece que uma das Camaras não concorda absolutamente nas alterações feitas a um projecto que é enviado da outra Camara, tem logar a commissão Mixta; mas tambem é verdade, que se a commissão tem de verificar a sua acção unicamente sobre os pontos em que ha discordancia entre uma e outra Camara, não póde deixar de se admittir aos membros daquella Camara donde é remettido o projecto, o proporem as eliminações daquillo que entenderem não dever ser approvado, com relação aos differentes artigos, em que não se concorda, porque desta sorte fica demonstrado que nesses pontos não ha aquella concordancia necessaria para passar o projecto de lei, vindo necessariamente a outro ponto que vem a ser, nomear-se a commissão Mixta para que, sem prejudicar aquelles dos pontos sobre que ha concordancia, a discussão verse sobre aquelles em que senão concorda; isto para que haja em tudo a uniformidade necessaria, e evitar-se o conflicto, que de outro modo haveria entre as duas Camaras.

É neste mesmo sentido que eu não posso, em conformidade com o que defendi na ultima sessão, deixar de mandar para a Mesa a proposta para a eliminação do art. 6.º porque desta fórma mostra-se que se não concorda, e então tem logar a commissão Mixta, que é justamente o ponto a que eu quero chegar. Mando pois para a Mesa a seguinte

Proposta. — Proponho a eliminação do principio do art. 6.º do projecto da Camara dos Pares. — Silva Cabral.

O Sr. Presidente: — O parecer da commissão sujeitou-se á discussão em todas as suas partes, e isto em harmonia com os precedentes. Se algum Sr. Deputado, sobre a ordem, tivesse pedido que a discussão fosse em separado, consultada a Camara, não havia duvída nenhuma nisso, mas como se não fez este pedido, a Mesa não podia fazer outra coisa. Agora vai dar se seguimento ás propostas apresentadas pelos Srs. Deputados Mexia, e Silva Cabral.

Foram submettidas á admissão, sendo a do Sr Mexia admittida por 53 votos contra 8; e a do Sr. Silva Cabral por 53 votos contra 5, e consideradas ambas como emendas.

O Sr. Ferreira Pontes: — Sr. Presidente, a emenda que acaba de ser admittida á discussão, se fôr approvada, tira do projecto uma providencia reparadora, que foi addicionada na outra Camara, não posso por isso deixar de a combater, e tambem responderei a algumas, observações que se fizeram em contestação ás que fiz na sessão passada, quando sustentei essa, e as outras alterações que o projecto soffrera. Não se póde contestar aos antigos magistrados o direito que têem a estas pequenas remunerações que agora se lhes concedem, assim como o têem a serem considerados membros da magistratura judicial, para nella serem collocados, quando as circumstancias o permittirem, conforme as suas graduações. São passados 15 annos, é já tempo de esquecerem factos que foram cobertos com o manto de uma amnistia, e uma vez que quando se tractar de assumptos iguaes a este que nos occupa, vierem á lembrança os factos amnistiados, esse acto de humanidade, de justiça, e de alta politica, ficará inutilisado. Depois dos grandes abalos politicos é necessario, é indispensavel haver toda a moderação para com os vencidos, e não se abusar da victima, porque só assim se evitam as reacções, se assegura melhor o triunfo, e se podem reunir em roda de uma só bandeira todos os cidadãos dos diversos partidos; foram estes os votos enunciados logo que acabou a guerra civil, por um dos primeiros Estadistas do nosso paiz, que presidia á Administração, foi então contrariado, e não póde levar ao cabo as medidas conciliadoras, que a justiça e a politica reclamavam, porque as paixões então estavam ainda irritadas, e só do tempo se podia esperar as acalmasse, e o que tem acontecido, e o que admiro é que haja ainda quem possua sentimentos de odio e vingança para com os vencidos, e que se pertenda justificar este sentimento pouco generoso, com o pretexto do bem publico, quando este exige um total esquecimento do passado. O bem geral do paiz exige tambem que todos sejam chamados» aos empregos, segundo as suas habilitações; não somos nós muito ricos em capacidades administrativas, é necessario ir procura-las aonde quer que se encontrem, e de se attender mais aos partidos, e ao systema do exclusivismo procede, sem duvida, a falta que se experimenta nos diversos ramos de administração publica, a qual não melhorará em quanto senão adoptar outro systema.

Não contesto ao Governo, que para os empregos de confiança prefira aquelles que pertençam ao seu partido politico, e em quem confiar mais, porém para os outros não ha nenhuma razão de justiça, nem de politica, que justifique a exclusão que se tem observado, e sobre que ainda se insiste.

Sr. Presidente, isto não é querer que os vencidos passem para o logar dos vencedores, como se asseverou, nem uma similhante illação se podia tirar do que eu disse, porque bem claro fallei para não se podér dar ás minhas observações uma tão estranha interpretação; eu não advogo os interesses de nenhum partido exclusivamente, advogo, do modo que posso, os geraes de todo o paiz, o que desejo, e porque tenho pugnado constantemente, é para que todos os portuguezes sejam igualmente considerados, sem outra differença mais que a dos serviços e do mere-

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cimento, E perguntarei, que se tem feito para chamar ao novo systema os homens do outro partido? Os militares que derramaram o seu sangue em tantas batalhas, na defeza da Patria, por aí andam a pedir uma esmola. Aos egressos que foram expulsos de suas casas, e privados da sua propriedade, tem-se-lhes recusado as insignificantes prestações que se lhes prometterram. Alguns beneficiados ainda se acham suspensos dos seus beneficios, e os que foram restituidos, ou que não foram suspensos, foram privados das suas antigas rendas, estão entregues á mercê dos povos, e não se tem cuidado de lhes dar uma subsistencia segura e independente. Muitos professores foram destituidos das suas cadeiras, e ainda não foram restituidos a ellas. Os magistrados que consumiram a sua vida no serviço publico, foram votados ao esquecimento, e inhabilitados para continuarem a servir, com o pretexto de não pertencerem ao novo quadro! Mas quem fez esse quadro, e porque motivos foram delle excluidos os membros da antiga magistratura? A resposta já a deu um Digno Par, que foi Ministro naquella época, a necessidade em que o Governo se viu de satisfazer ás exigencias do partido vencedor.

Sr. Presidente, eu não pertendo que os vencidos passem para o logar dos vencedores, o que não quero, e o que pertendo é que estes senão considerem conquistadores, e tenham os vencidos como simples colonos; para cultivar as terras, darem soldados para o exercito, pagarem os tributos, e lançarem sobre elles os demais encargos da sociedade.

Sr. Presidente, entre os magistrados, territoriaes daquella época houveram alguns que modificaram, quanto puderão o rigor das ordens do Governo, entre estes citarei o corregedor de Braga o Sr. Gaspar Homem de Almeida Pinto Pisarro, que serviu desde 1828 até 1833 — 0 Juiz Fóra o Sr. Antonio Saraiva da Costa Pereira de Refoios, o corregedor de Penafiel o Sr. Antonio de Azevedo Lopes Serra, e o provedor do Algarve o Sr. José Antonio de Almeida; citando os nomes destes dignos e antigos magistrados não receio ser contestado, e compraso-me de lhes dar neste logar um testimunho publico do meu reconhecimento, e mais podia citar se não quizesse poupar tempo á Camara. Além de terem administrado justiça a todos com rectidão e imparcialidade déram toda a protecção e segurança aos do partido da Rainha e da Carla. — Estes juizes a quem ninguem póde contestar muita probidade, e mui vastos conhecimentos, aí estão no esquecimento, e fóra do quadro da magistratura, e para haverem de entrar nelle hão de principiar por onde um simples bacharel, tantos annos de serviço não lhes dão a habilitação que a lei actual concede a um delegado, ou sub-delegado.

Sr. Presidente, tambem se disse que esta providencia era preparatoria para te abrir a porta da outra Casa do Parlamento a alguns antigos Dignos Pares, que se acham privados do Pariato; eu não posso descobrir a relação que uma providencia tem com a outra, mas não duvido declarar que apoiarei todas as medidas que tenderem a restituir a todos os cidadãos quaesquer direitos de que fossem privados, em virtude de acontecimentos politicos, e desejava que esta medida se adoptasse, por que entendo que a causa publica lucrava em que esses antigos Pares entrassem no novo Systema Politico, tornando parte nas deliberações legislativas, e não receava que faltassem ao juramento de fidelidade á Rainha e á Carta que tem de prestar, pois que não é proprio de quem professa os principios da Moral Christã, o dar juramentos com essas reservações mentaes a que se alludira, nem fazer promessas, e confirma-las com um vinculo tão sagrado, com o pensamento reservado — de faltar a ellas — igualmente se affirmou que esta medida serviria tambem para os bispos que se acham fóra do Reino, serem admittidos ás suas dioceses; eu penso que só dous se acham ausentes, e entendo que se voltarem ao Reino, nenhum obstaculo se lhes opporá a que exerçam as funções do seu alto e sagrado ministerio.

Sr. Presidente, diz-se que sem constantes e repetidas provas de decidida adhesão ao novo systema não devera ser admittidos aos cargos publicos, os homens do outro partido. Mas como é que hão de dar estas provas, se estão inhibidos das funcções publicas? Que hão de fazer como particulares? Querer-se-ha que andem a prégar as vantagens do novo Systema? E o mais que podem fazer? Além disto a provisão que se combate, não admitte os antigos juizes aos cargos que perderam, apenas se lhes dá uma recompensa mui tenue, em relação á que se concede aos juizes actuaes, na qual muito poucos são comprehendidos como já demonstrei: convem assentar em que uma Nação não póde passar sem empregados, e que aos que servirem bem se lhes não deve recusar a recompensa devida aos seus serviços, nem devem esquecer por haver qualquer mudança no systema politico do Governo ou mesmo no Chefe do Estado. O Legislador deve ser superior ás paixões pequenas, e attender só aos dictames de uma esclarecida e sã politica? — Não écom medidas de proscripção que se póde conseguir a desejada união da Familia Portugueza, o meio é respeitar os direitos de todos, e admitti-los aos empregos para que forem capazes, com igualdade, pois é desconhecer inteiramente o coração do homem o pertender que seja affeiçoado a um Systema Politico, em que é votado ao despreso e ao abandono.

Em vista das observações que tenho feito, e com que me persuado ter respondido aos argumentos que se produziram para sustentar a emenda, confio em que a Camara o ha de rejeitar, e assim dará uma prova de que adopta uma politica moderada, que quer que as amnistias sejam uma realidade, não sejam sofismadas, e que se lhe dê uma execução sincera e leal,

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, depois da defeza que acaba de fazer do projecto o illustre Deputado que me precedeu, quem meditar bem nas reflexões, e explicações do illustre Deputado, convencer-se-ha de certo que a causa que S. S.ª pertendeu defender, não póde ser peior, porque todos os argumentos, que se podiam produzir contra o artigo foram proferidos pelo illustre Deputado a favor delle. Sr. Presidente, quando em uma Camara filha da eleição, eleita em 1848 incumbida de manter a Carta, e a Dynastia Reinante, se apresentam argumentos tendentes a restabelecer o regimen antigo, faz-se a maior apologia que é possivel, á doutrina do projecto; e eis-aqui porque eu digo que os argumentos do illustre Deputado, longe de sustentarem o artigo, foram todos contra elle.

A doutrina exarada no artigo é mais uma dessas mil ficções de Protheu. Sr. Presidente, a união da

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Familia Portugueza, entendida desta maneira, não significa senão fazer taboa rasa de 14 annos da nossa Historia, fazendo a irrisão do ultimo suspiro dos homens, que morreram no patibulo pela liberdade (apoiados.) Eis-aqui o que significam estes beneficios concedidos, e não pedidos; o que significa essa concessão, que eu não entendo, porque não entendo que se façam concessões, senão quando se offerecem motivos para isso; quando aquelles a quem se querem fazer essas concessões, tem dado provas de que as merecem, e aqui não ha nada disso, aqui não ha senão o Governo que vai abrir as portas do templo da liberdade a homens, que combateram contra ella, e que ainda hoje não querem reconhecer as instituições (apoiados.) Mas esse outro projecto que desappareceu um dia da discussão, que tendia a entregar as espadas aos nossos adversarios que combateram até aos campos de Evora-Monte, que é feito delle? Jaz nos limbos da commissão; e que significa isto? Não significa senão uma idéa timida do Governo, que não ousou trazer á Camara uma medida completa. E que é isto, senão uma falsa generosidade? Diz o illustre Deputado que a medida não é perigosa, porque é pequena; pois não sabe o illustre Deputado que nenhum Governo propõe medidas desta importancia, quando são inuteis? Póde separar-se desta medida a questão de fazenda, a questão politica, e outras muitas? Generosidade, e união da Familia Portugueza! E todavia conservam-se ainda mettidos em subterraneos tres homens sem crime algum! Generosidade para homens que não nos separaram o pescoço do corpo, porque não tiveram força para isso, porque lhes não pudemos cair nas mãos, e que ainda hoje o fariam, se podessem, e rigor para aquelles que fizeram parte dos 7:500 que desembarcaram nas Praias do Mindello, que fizeram a guerra contra a tyrannia, e que ajudaram a trazer a liberdade a este paiz (apoiados.)

Sr. Presidente, argumenta-se com o exemplo de uma Potencia visinha, sem se attender ao que aí aconteceu. Em Hespanha concedeu-se uma amnistia ampla; mas qual foi o resultado? Foi a immediata necessidade de a restringir, porque os effeitos que se esperavam, iam saindo em contrario. Enganam-se pois os homens que pensam que é possivel a alliança dos dois principios liberal, e absoluto; não ha união possivel destes dois extremos (apoiados) como individuo, um por um, póde-se ser generoso, se derem provas de que sinceramente querem abraçar os principios da liberdade; mas como partido, se se lhes entregarem hoje as espadas, essas espadas, na primeira occasião que se offerecer, hão de servir para atravessar o peito dos seus protectores (apoiados.) Por consequencia não quero, nem posso approvar essa generosidade, que se indica. Sejamos fortes, não hajam vencidos nem vencedores, no sentido geral, quando em estado ele paz, mas hajam vencidos, e vencedores, quando de toda aparte o perigo esta imminente, como hoje (apoiados.)

O illustre Deputado, Apostolo da Caridade, o que lhe esta muito bem, porque é Ministro de Christo, de um Deos de Paz, diz que é necessario que um dia nos esqueçamos de todos os erros passados, e nos unamos todos como verdadeiros Portuguezes. Ora o illustre Deputado deve saber que nos tempos do primeiro homem Abel, e Cain eram irmãos, e inimigos declarados um do outro; hoje dá-se a mesma razão, os partidos realista, e liberal não podem ser bons irmãos, não é possivel (apoiados.) Sr. Presidente, o partido liberal deve estar desenganado a respeito das allianças com o partido realista; já uma vez se ligou com elle, e a resposta foi logo na primeira occasião, que teve o partido realista, pôr a espada ao peito do partido liberal; respondeu-lhe com as prisões, com os desterros, e com os patibulos! Portanto já se vê quanto impossivel é haver essa alliança, que tanto nos apregoou aqui o nobre Deputado.

Sr. Presidente, com a Junta do Porto não esteve só a gente menos notavel do partido realista, como nos disse aqui um illustre Deputado. É preciso esquecer a historia desses acontecimentos, para não saber que no Porto estiveram as primeiras espadas do partido realista; para esquecermos que alli estiveram os primeiros homens désse partido, e são esses que nós agora queremos recompensar! (apoiados)

Tambem não é exacto o que disse o mesmo illustre Deputado quando observou, que se tinham promettido aos convencionados de Evora-Monte as suas -patentes e soldos correspondentes, por quanto é certo que a esses convencionados só se prometteu meio soldo, e esse subsidio tem sido satisfeito segundo as fôrças do Thesouro; se se lhes não tem pago tudo, é porque as circumstancias não o permittem, e o mesmo que lhes tem succedido, acontece aos servidores do Estado, que tambem andam atrasados no pagamento de seus vencimentos, e não pouco. Por tanto nesta parte não ha motivo de queixa, e muito menos ha motivo para o nobre Deputado vir aqui sustentar uma doutrina, que não póde de modo algum ser admissivel; pois o illustre Deputado disse, que os amnistiados, por estarem na miseria, tinham razão para levantarem o estandarte da revolta! Admiro que seja do seio da maioria desta Camara que se levante uma voz, sustentando semilhante doutrinal (apoiados)

Mas eu faço justiça completa á maioria, quando creio que ella rejeita completamente, como eu, uma semilhante doutrina, (apoiados) Se é licito, como sustentou o illustre Deputado, que os amnistiados, pela posição em que se acham, levantem a voz da revolta, para que é ir-lhe dar meios para melhor o poderem fazer?... (apoiados)

Sr. Presidente, não é para ter em pouca attenção o Jornal que é publicado por esse partido; eu não quero que elle deixe de existir, ao contrario desejo que continue, porque elle é o thermometro por onde se podem avaliar as tendencias désse partido, e o que ahi se publica, deve servir de aviso ao partido liberal, para ser cauto e prevenir-se contra toda e qualquer pertenção désse partido; e não se diga, Sr. Presidente, que porque alguns homens désse partido tem algumas fabricas e alguns bens, que eram da fazenda publica, não se tenha nada a recear delles, e que se deve embainhar a espada, porque elles não nos virão jámais inquietar. Isto é um engano, porque esse partido não deixa as suas crenças, nem a tenacidade de desejos em que está de voltar á sua antiga posição, (apoiados)

Sr. Presidente, eu sinto que um nobre Deputado fizesse aqui allusão a um individuo, querendo pô-lo no pelourinho da opinião publica; e tanto mais sinto isto, quando se refere a um homem que fez grandes serviços ao Throno e á Carta Constitucional. Estas allusões não são permittidas n'um Parlamento.

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Sr. Presidente, o illustre Deputado por Traz-os-Montes não tem razão para se ressentir da differença que se pertende fazer entre a magistratura moderna e a antiga, porque na verdade ha uma grande differença entre uma e a outra, porque em quanto a antiga serviu o usurpador, e foi o instrumento das suas oppressões e tyrannias, a moderna soffria pela sua fidelidade á Rainha e á Carta, e por isso não é possivel conceder iguaes direitos á magistratura antiga, como os que se concedem á magistratura moderna.

Termino, Sr. Presidente, dizendo que já que se seguiu a má politica de se acceitar na outra Camara a emenda de que se tracta, ao menos esta Camara evite as terriveis consequencias, que se podem seguir da adopção de tal principio, e approve a emenda offerecida pelo nobre Deputado, o Sr. Silva Cabral.

O Sr. Forjaz: — Sr. Presidente, não assisti ao principio da discussão, não ouvi os argumentos, que na ultima sessão se produziram, li apenas o extracto no Diario de hoje, não estou preparado para fallar, mas obedeço a um dever, e a uma convicção, defendendo o projecto em discussão.

Sr. Presidente, não participo desses odios eternos; a minha consciencia, a minha razão, e o meu coração vão naturalmente para todas as providencias, que tenderem a fazer esquecer os discordias passadas, e a considerar como filhos da mesma patria todos os cidadãos, quaesquer que sejam as suas opiniões sobre Govêrnos politicos, passo assim pelo pesar de apartar-me da opinião dos meus illustres amigos, a cuja illustração, rectidão, e justiça tributo o maior respeito.

Sr. Presidente, a commissão de Legislação approvou a indicação dos Dignos Pares, porque tendia a extinguir uma reminiscencia de vingança, e de intolerancia, que ninguem possue nesta Casa (apoiados); porque seguia o exemplo constantemente dado pelo Chefe do Estado nas amnistias generosamente concedidas em todas as crises; actos que, na minha opinião, são os mais firmes esteios da sua conservação, e os mais brilhantes padrões da sua gloria (apoiados); porque avalia o que se praticou com os ecclesiasticos, que pregaram o incendio, e o extermínio; e com os militares, que sustentaram a usurpação, e cobriram de terror o paiz, parecendo-me haver injustiça, pelo menos relativa, admittir aquelles, e despresar os magistrados, abandonando-os á miseria.

Sr. Presidente, é tempo em fim de examinarmos friamente os factos, e as circumstancias d'uma época, de que nos achamos já tão longe, e dos homens, que nella figuraram. Commetteram-se horrores, praticaram-se atrocidades; mas esse Governo inspirava todos os sentimentos de fanatismo, ao qual cederam desgraçadamente alguns magistrados antigos; mas não será ainda tempo de esquecermos taes horrores, e acabar com excepções politicas?!...

Quando se dá essa aposentação a um magistrado antigo, não se lhe dá por ter servido a usurpação, dá-se-lhe pelos longos annos, que serviu a sua patria. O periodo desse Governo foi curto, e não é justo, nem conveniente, nem politico, que aquelles que nelle figuraram, percam todos os seus anteriores serviços, pois alguns magistrados houveram, que os prestaram assás valiosos, como os proprios Deputados, que combatem a indicação, já reconheceram.

Sr. Presidente, a commissão de Legislação attendeu ao procedimento assás nobre da outra Casa, aonde, sem excepção d'um unico voto, cavalheiros distinctos pelos seus relevantes serviços á liberdade, e ao Throno Constitucional, e victimas desses sentimentos de adhesão á Carta, e á Rainha, pois uns estiveram presos, outros homisiados, e até alguns condemnados á morte, não hesitaram erguer a sua voz a favor da indicação, bastando menciona-los, para se conhecer a exactidão da minha asserção, pois foram os Srs. Duques de Palmella, e Terceira, Conde de Thomar, Visconde de Laborim, etc; e perguntarei aos nobres Deputados, que nos ameaçaram com a queda da liberdade, e do Throno Constitucional, se os Palmellas, Terceiras, Thomar, Laborim, e outros amigos decididos, e leaes da liberdade, quererão cavar a sua ruina, a ruina do partido liberal?...

Tremes pelo Throno com a aposentação destes magistrados?!... Mal seguro estava se os poucos, ou muitos, a quem a medida se estender, o podem abalar; essa aposentação não lhes dá mais braços, ou influencia, póde matar-lhes unicamente a fome.

O Throno Constitucional, e a Augusta Dynastia firmam-se em bases mais solidas; nos respeitos publicos, nas adhesões nacionaes, no amor, na dedicação, no patriotismo, na lealdade, e na justiça dos portuguezes (muitos apoiados).

Tremes pelas idéas liberaes?!... Mas essas idéas não morrem, crescem, desenvolvem-se, fortificam-se todos os dias, porque estão na opinião publica, por que foram alcançadas com o sangue do» martyres, porque são alentadas com o espirito da civilisação (apoiados).

Sr. Presidente, não se tracta de restituir ao serviço publico esses magistrados antigos, tracta-se unicamente de aposenta-los, quando em circumstancias de o serem, não se offendam os direitos adquiridos dos magistrados modernos, porque ficam inteiramente salvos, nem de outra sorte eu apoiaria a indicação, porque sei fazer justiça a esses distinctos ornamentos da magistratura moderna, sendo tambem certo, que reflectindo nas condições exigidas para as aposentações dos magistrados antigos, poucos poderão ser comprehendido», porque a maior parte já não existe, e se ainda alguns vivem, locam o ultimo termo da existencia, pois estarão com os seus oitenta annos de idade, e perguntaria, se a ordem publica poderia perigar com similhantes conspiradores?!... (apoiados).

Sr. Presidente, talvez fosse este o lado vulneravel da indicação: não se devendo tambem desconhecer, que magistrados antigos terão descido ao tumulo, victimas da miseria, a que ficaram reduzidos!...

Sr. Presidente, é innegavel, que as idéas têem-se modificado muito na apreciação dos crimes politicos por causa das alternativas, e das desgraças inherentes aos actos de violencia, e de vingança.

Na Hespanha tem-se decretado successivas amnistias, e o seu illustrado Governo não recusou lançar máo deste meio, ainda a braços com as facções, e com a guerra civil; fez mais, admittiu os amnistiados ao serviço publico; é verdade, que alguns atraiçoaram o seu dever, correspondendo com a mais negra perfidia a esse procedimento generoso do Governo hespanhol; mas qual foi o resultado?... A opinião publica, levada do espirito de generosidade,

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e conciliação politica, louvou, apoiou, e fortaleceu o Governo, e as facções desappareceram, a traição foi castigada, a revolução acabou, e seus ultimos caudilhos são pelo povo acossados como salteadores!... (apoiados).

Sr. Presidente, a acção do tempo gasta, acaba, esquece tudo, é irresistivel, traz a prescripção a todas as cousas, o até as nossas leis criminaes sabiamente estabeleciam a prescripção ainda dos maiores crimes, passados dez annos, e devemos, passados dezasseis annos, recordar esses actos de despotismo para estabelecer excepções odiosas?!...

Sr. Presidente, em época mais proxima aos tempos desgraçados, a que alludo, quando ainda estavam frescos, na memoria de todos, os soffrimentos passados nos calabouços, e na emigração, quando o sangue dos martyres tingia os patibulos, quando o lucto de parentes, e amigos ainda nos trajava, não duvidou a Camara electiva, cheia de homens saídos das cadêas, regressados da emigração, cobertos de cicatrizes, reagir, quasi toda, contra a lei de indemnisações?... E devemos nós, Representantes do povo em 1849, offerecer esse documento de sentimentos vingativos, e intolerantes, que todos abominamos?!...

Espero que a Camara actual terá o mesmo senso de justiça, e o mesmo tacto politico, que teve a Camara de 1834 (apoiados).

Sr. Presidente, não me conformo com algumas das asserções do meu amigo, o Sr. Faria Barbosa, acho-as, peço licença para dize-lo, inconvenientes, e confio que S. S.ª as ratifique, ou explique, porque conheço terem sido proferidas na melhor boa fé, (apoiados) e sem combater outras ainda mais inconvenientes, e prejudiciaes á approvação da indicação, feitas pelo Sr. Deputado pelo Minho, Ferreira Pontes, porque outros Oradores lhe responderam, acho que S. S.ª foi assás inexacto, quando hontem avançou, que este projecto mostrava a influencia que os juizes exercem nesta Camara; asserção, que repillo em nome desses juizes, e da Camara, porque aqui a unica influencia é das convicções, e dos desejos de concorrer para o bem geral do paiz (Muitos apoiados).

Tambem S. S.ª foi inexacto, quando disse, que — Os magistrados antigos foram lançados fóra só para dar logar a entrarem outros — desconhecendo assim, que foram as circumstancias politicas, que motivaram essa saída, e a necessidade de organisar a administração judicial em bases mais solidas, em regras mais liberaes, sendo certo, que a magistratura moderna é credora dos maiores elogios pelos seus actos de independencia, e rectidão (apoiados).

Sr. Presidente, admira-me que S. S.ª esquecendo-se das conveniencias publicas, e até mesmo do máo effeito de comparações, tractasse assim uma classe respeitavel, chegando mesmo a desattender as provisões assás calculadas do projecto das aposentações, para imaginar favores, privilegios, e prerogativas, que não existem! (apoiados) Demais, peço licença para dize-lo, que as suas palavras, as suas asserções, e as comparações a que recorreu, alimentando a discussão, tem sido fataes para o projecto (Vozes: — É verdade, apoiados); mas a commissão não tem culpa; mas a indicação dos Dignos Pares expressa um sentimento de humanidade, de politica, de generosidade, e até mesmo de justiça, que não póde resentir-se dessas menos reflectidas considerações.

Sr. Presidente, não continuarei a rebater as asserções do illustre Deputado em relação á magistratura moderna; cáem por terra na presença dos factos; desapparecem á vista dos respeitos, e considerações, que depois lhe dedica. Os magistradas modernos compreendem sua missão, tão grande, tão distincta, e tão nobre; essa coragem, essa força de espirito, essa dedicação pelo serviço publico, que se exige no exercicio de uma das mais importantes, e das mais honrosas funcções, de que o homem póde ser encarregado, tem sido acompanhada da mais completa imparcialidade; nenhuma ambição, nenhum receio, nenhum temor os faz vacillar na rectidão dos seus juizos (muitos apoiados), não necessitam de serem justificados; justificam-se pelos seus actos; estão superiores a qualquer censura (muito bem, muito bem).

Sr. Presidente, desejava que o Governo se collocasse á frente da discussão; os seus sentimentos são conformes com os desejos da commissão; porém não basta, é necessario, que o Governo se pronuncie; é indispensavel, que corresponda ao paiz com os attractivos de um Governo justo e liberal, e que tenha força e coragem para fazer triunfar os principios de razão e de justiça, ou cair com elles; e se fez do projecto das notas questão de vida ou morte, collocando assim alguns de seus verdadeiros amigos na dura posição de hostilisa-lo, obedecendo ás suas antigas convicções exaradas na respectiva acta, como abandonar esta questão, a que assistiu na Camara Alta; a que prestou o seu apoio na commissão de Legislação, que vai em harmonia com o seu programma ministerial, com as suas propostas governamentaes, e com os seus desejos illustrados?!....

Desejava que esses individuos implicados n'um processo politico fossem amnistiados, e nesta parte uno os meus desejos aos dos nobres Deputados.

Sr. Presidente, seja embora a fusão dos partidos uma chimera para uns, um problema de difficil resolução para outros, é uma idéa altamente nobre e generosa, que cumpre realisar, pois que nação póde prosperar, retalhada pelos partidos, e lacerada pelas facções?!.... Todo o Reino em si dividido será desolado, e vêr-se-ha cair casa sobre casa, diz a Escriptura, cujos oráculos são infalliveis. Os homens lançados no campo das facções, ou collocados na esfera agitada dos partidos, diz um sabio, estão em continuada guerra, e o estado de guerra é um estado de perseguição, de morte, e de exterminio. Como se fossem infalliveis, para elles todos os que pensam differentemente, erram; e como se o êrro fosse o maior dos crimes, todos os que nelle se dizem cair, merecem as maiores penas. Contra as regras da justiça universal, elles são accusadores, juizes, e executores. De suas sentenças não ha recurso: e os caracteres com que as escrevem, são caracteres de sangue.

Não desejo, não approvo; detesto, abomino essa religião, a religião das facções, e dos partidos exaltados; estou certo, certissimo, que os meus amigos politicas hoje divergentes, seguem os meus desejos, fazem os mesmos protestos, porque conheço a rectidão dos seus sentimentos (apoiados),

Deixemos pois a exaltação, que nos cega; essas paixões, que nos extraviam, essas dissensões que nos flagelam, enfraquecem e arruinam, e se ainda nos lembrarmos de haver ido perseguidos, seja unica

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mente para usar com os nossos inimigos de generosidade.

Desejo sinceramente a união da Familia Portugueza, sem ella não tem cura os males da patria, aviventam-se os odios, quebram-se os ellos, que podiam construir essa cadeia: advogarei constantemente os principios de moderação, pois não posso conceber um pai tido moderado sem o exercicio da tolerancia, e da justiça (apoiados).

Posso assim fallar, porque nas crises nunca duvidei collocar-me na posição, que a minha convicção pelos principios liberaes, e a minha adhesão ao Throno Constitucional exigem (muitos apoiados).

Eis-ahi os meus principios. Voto pela substituição da Camara dos Dignos Pares.

Sr. Presidente, passando a outro objecto approvo a emenda offerecida pelo meu amigo o Sr. Pereira de Mello ácerca do § unico do art. 6.º, e sobre os direitos a vencimentos dos Agentes do Ministerio Publico; pois a provisão do projecto acha-se em desarmonia com as elevadas funcções dos Agentes da Lei, e em contradicção com as palavras, e com as propostas ministeriaes da ultima reforma administrativa, apresentada nesta casa.

Uma das mais importantes e honrosas funcções sem questão, reclamar os direitos e os interesses da sociedade, exigir a vindicta legal para as offensas publicas, pugnar pelo castigo dos culpados, e pela absolvição dos innocentes, e essa missão tão elevada, e tão laboriosa exige as mais serias applicações, a mais subtil penetração, aquelle tacto prompto e seguro, de que tanto depende a prompta e efficaz acção da justiça, longos e valiosos estudos, que senão limitam ao conhecimento da legislação do paiz, e a pratica das formalidades forenses, mas se estendem a adquirir noções as mais claras sobre o justo e injusto, a fallar a linguagem da verdade, a collegir e combinar os factos e as circumstancias.... em uma palavra, que constituem o individuo orgão da sociedade fiscal da lei, e agente da justiça.

Mas a existencia desses empregados fica, e por espaço de quinze annos, á mercê das vicissitudes politicas, ou da vontade dos Ministro.; quando a responsabilidade do funccionalismo será sempre ser nominal, em quanto a vida publica não fôr segura, e estimulada com garantias solidas.

Quando o futuro dum agente da lei se reduz ao dia em que se acha, quando a sua conservação depender unicamente d'um capricho ministerial, ou de uma intriga, muito facil nestes tempos de inquietação, como exigir delle que não pertença a partidos; que não entre em lides eleitoraes; que conserve e faça conservar inhabalavel a balança da justiça?!..

A moral, administração, e a ordem publica serão sempre as victimas forçadas desta posição equivoca, em que n'uma parte esta o dever entregue só a si, e a probidade exposta a ser punida com a miseria — disse o Ministerio em um dos seus relatorios deste anno; mas como realisou tão justas e santas palavras a respeito dos agentes do Ministerio Publico.

O Governo deve ser coherente; e se as suas palavras são a expressão dos seus sentimento, espero que estas provisões da lei sejam reformadas, até mesmo para que não se dê contradicção com as prerogativas concedidas aos magistrados administrativos na reforma respectiva (apoiados).

Confio, que se harmonisem estas provisões, e pedindo desculpa do tempo que roubei á Camara, e retirando qualquer expressão menos conveniente, que acaso soltasse, concluo approvando o projecto em discussão, com a modificação annunciada, e que espero da sua justiça (Vozes: — Muito bem).

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, não farei um discurso, nem estava prevenido para isso; mas não podia deixar de fallar nesta questão, porque tendo eu sido um daquelles que tiveram a honra de approvar nesta Casa em 1834 uma lei de exclusão do usurpador da Corôa portugueza, não posso agora prestar o meu voto a uma medida, que eu entendo que tende nada menos que a ir rasgar essa mesma lei, assim como se tem já rasgado, vão rasgando, e pretendem rasgar as leis do sabio e immortal Libertador.

Eu não estremeço, Sr. Presidente, como aqui se disse, de 2 ou 3 magistrados velhos a que se quer dar uma aposentação; estremeço do principio que se quer introduzir e que tem sido manifestamente defendido pelos Srs. Deputados, que sustentam a emenda da outra Camara; estremeço désse principio, em virtude do qual alguem despeitado talvez de vêr que não póde assentar o seu predominio absoluto sobre o partido cartista, vestindo a loba jesuítica, pretende arrancar ainda um pedaço do pouco pão com que se alimentam hoje os defensores fieis da Rainha e da Carta, para com elle fazer esta negaças aos inimigos implacaveis da dynastia e das instituições, aos homens das alçadas, aos bombardeadores do Porto, aos assassinos de Estremoz; porque com tudo isto aqui se tem estado, e já o não podem negar os illustres Deputados, rasgando o veo que ainda encobria esta emenda jesuítica, e apresentando em todas as suas feições o quadro que se antolha, aquillo para onde se caminha.

Sr. Presidente, tractemos a questão aqui como homens politicos, e não como questão de humanidade, que esta não é a Sancta Casa da Misericordia: nós não estamos aqui a tractar questões de humanidade, estamos a tractar questões politicas, e devemos tracta-las como homens politicos, e não com esses sentitnentalismos, com essas generosidades cavalheirescas de cavalleiro andante, que podem trazer muito máos resultados, porque um rifão portuguez nos diz que — quem o seu inimigo poupa, nas mãos lhe morre (apoiado).

Sr. Presidente, parte daquillo que disseram os illustres Deputados, já foi respondido; já se respondeu, ao illustre Deputado que não se garantiram patentes aos homens de Evora Monte: tal concessão não houve; apenas se garantiram as patentes áquelles que se apresentaram, no tempo da lucta, ás auctoridade constitucionaes, e que hoje estão no exercito, e até são conhecidos pelo nome de officiaes garantidos aos outros concedeu a generosidade do magnanimo Libertador um subsidio, e foi esse subsidio então uma generosidade tão excessiva, que por elle foi o Libertador apupado, e talvez d'ahi viesse a sua morte (apoiados). Mas hoje os illustres defensores dessa emenda querem ser mais generosos que D. Pedro,. querem ser mais magnanimos do que Elle, pois não o hão de conseguir, não ha de a historia qualifica-los como taes; hoje é outro sentimento, hoje não é ge-

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nerosidade, é medo (apoiados), e este sentimento não entra no meu coração; e medo, e é mais alguma coisa; talvez seja filho de um plano; talvez alguem que influe neste negocio, queira servir-se das espadas ferrugentas de Evora Monte, e dos punhaes de Estremoz, para levantar um novo absolutismo; eu estou persuadido disto, e é com esta idéa que combato a emenda; tudo nos indica a crer que se pertende plantar entre nós a civilisação cossaca, e é por isso, Sr. Presidente, que se nos vem dizer que é perigoso obrigados a conspirar pela miseria; quer-se dar-lhes alguma coisa para que conspirem, aproveitando-se a miseria em que estão; quer-se dar-lhes alguma coisa para que conspirem no sentido que se pertende contra o partido, que senão sujeita a certas prescripções.

Concedeu-se um subsidio, e esse subsidio anda atrasadissimo, não se paga. E como andam os subsidios de todos os defensores do Throno e das Instituições? Como andam os subsidios dessas infelizes viuvas dos que pereceram victimas da sua lealdade nos campos da batalha? Como andam os desses infelizes reformados, cujos peitos estão cobertos de cicatrizes feitas pelas balas, e pelas espadas desses homens de Evora-Monte, que se quer agora pôr a seu lado?

«Mas esses homens que susto podem metter, se são uns 50 e tantos? (Fallava-se dos militares). Oh! Sr. Presidente, é preciso estar muito desmemoriado, e preciso que o illustre Deputado que disse isto, não se recorde de 1847; é preciso que não se lembre de Braga, e da Serra da Estrella; é preciso que se não lembre de que o illustre marechal commandante das forças da Rainha uma das razões que allegou para desculpar a inacção em que esteve em Oliveira de Azemeis, foi a necessidade que tinha de destacar força para ir combater esses 50 e tantos. Escripta manent, isto esta escripto, e nós ainda não podémos ter esquecido o que se passou ha dois annos. Então são 50 e tantos?! Com effeito eram uns Rhodamontes para occasionarem tamanho bulicio!

Mas a Hespanha. A Hespanha julgou-se forte: aí é que havia a generosidade da força, e não a generosidade da cobardia, como esta que agora se apresenta; a Hespanha forte como estava amnistiou, porém com a condição de previamente se prestar o juramento de fidelidade á Rainha e ás Instituições. E que aconteceu assim mesmo? Muitos desses que foram amnistiados, viu-se depois o Governo obrigado a fusilal-os passados poucos mezes, porque elles se tornaram dignos disso, e bem presente esta ainda a lealdade dos Tristanys (apoiados)

Eu passarei em silencio a indicação que fez o illustre Deputado para se expulsarem dos empregos certos magistrados que elle conhece, e tambem passarei em silencio, porque entendo que não merece resposta, a allusão sobre o Porto, para dizer alguma cousa a respeito do que avançou o outro illustre Deputado por Traz-os-Montes. Este illustre Deputado achou-se em contradicção com aquelle de que acabo de fallar, em um ponto muito essencial, porque o illustre Deputado foi mais sincero, coherente com os seus principios, desenvolveu-os amplamente coram populo; o illustre Deputado pelo Minho havia dicto — «Isto não é collocal-os; ninguem os quer collocar; é unicamente uma aposentação a uns velhos» — e o illustre Deputado a que respondo, disse-nos (tomei nota) — «que era preciso repartir os empregos com igualdade por todos, como um pai reparte um bocado de pão por todos o seus filhos » — Então é preciso que primeiramente se combinem nas idéas, porque creio que os illustres Deputados não concordam, ouse concordam, este ultimo illustre Deputado é mais sincero. E isto a que sequer ir, Sr. Presidente, é a reparos empregos por todos; e como os empregos são poucos, e os pertendentes são muitos, a Camara avalie o que daqui se ha de seguir. Sairem cartistas para entrarem miguelistas. É isto o que se leva em mira. Mas é preciso que se verifique, e é preciso (diz o illustre Deputado por Traz-os-Montes) porque não devemos renovar factos, sobre os quaes já passaram 14 annos. Não passaram, Sr. Presidente, não passaram 14 annos, hoje, ámanhã tomar-se-hão a repetir se houver occasião para isso; passaram 14 annos sobre as alçadas, mas não passaram 14 annos sobre 1847. Mas são factos amnistiados.

E quem é que hoje vem contra esta amnistia? Que significa amnistia \ E perdão de crimes. (O Sr. Ferreira Pontes: — E esquecimento). Pois bem; acceito essa definição da palavra amnistia; os nobres Deputados querem que haja esquecimento; é exactamente o que eu desejo, quero que se esqueçam esses homens, e todos aquelles que pertencem ao seu partido, (apoiados) Ora o nobre Deputado mostrou bem o que sentia; disse — «Que era necessario marcar a um systema, no qual se não prescindisse de homens muito dignos, e que era preciso collocal-os» — porém os nobres Deputados rasgaram o veo, e mostraram ao que se quer chegar; e a Camara já sabe o que ha devotar. Tracta-se nada menos que de abrir uma porta para entrar toda a hoste de Evora-Monte. O illustre Deputado chamou á politica que sustentamos politica perseguidora, e que por se haver seguido esta politica perseguidora é que caiu o partido do Usurpador. Aonde esta aqui a perseguição? Politica perseguidora era a das forcas, dos presidios, dos degredos para a Africa, e aquella que atolhou as torres do Reino do que havia demais nobre; (apoiados) mas hoje que a politica permitte aos sectarios do Usurpador o estarem em suas casas, a cultivarem os seus campos; quando antigamente se perseguia um homem, até á forca, ocaso era haver um denunciante que declarasse que esse homem era malhado; que differença não existe entre uma e outra politica? Disse o nobre Deputado — Que alguns Magistrados ha que tem dado garantias, citando o Sr. Almeida. Mas quem duvida de que aquelles que têem dado garantias, não estão no mesmo caso dos de que actualmente se tracta? Pois o Sr. Almeida não foi já governador civil de um districto? Não leve elle já a honra de se sentar n'uma destas cadeiras? Hoje esta empregado pelo Governo, assim como outras pessoas que serviram D. Miguel; por isso que nessa época se portaram muito bem; o Governo devia acceitar os offerecimentos destas pessoas, visto que até hoje ellas têem dado sufficientes garantias. Mas isto não vem para ocaso, porque isto são questões de individuos; ainda que eu sou o primeio a dizer que muito bem tem feito os Govêrnos Constitucionaes em lançarem mão, e aproveitarem aquelles homens que tenham dado garantias; e temos um exemplo, o Sr. Visconde de Santarem. Pois o Sr. Visconde de Santarem não foi Ministro de D. Miguel? E não tem elle prestado muito bons serviços ao Governo da Rainha, em consequencia dos quaes se acha hoje empre-

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gado? (apoiados) Isto o que mostra é que nós não sustentamos uma politica perseguidora, mas sim uma politica generosa; mas só generosa para aquelles que o merecem, e não para aquelles que ainda não são dignos, por isso que ainda não deram garantias.

Agora, o que achei celebre foi uma distincção metafísica que fez o nobre Deputado, porque disse — a Os empregados servem a Nação, e não o Chefe do Estado?? — porém eu peço ao nobre Deputado quando fallar, que faça sentir a differença entre o Chefe do Estado, e a Nação; creio que o nobre Deputado não se quiz referir aos creados de galão branco da Casa Real. Eu entendo que se não póde servir a Nação sem se servir o Chefe do Estado; por isso mesmo que elle é Chefe do Estado, é o Chefe da Nação; por consequencia não posso acceitar esta distincção, porque pela theoria do nobre Deputado tanto faz servir D. Miguel como D. Maria; porque tudo é servir a Nação. Tanto servia a Nação em 1847 o general Povoas na Serra da Estrella, como o illustre Marechal Saldanha em Oliveira de Azemeis!... Não é assim?

Peço tambem licença a outro nobre Deputado para lhe dizer que se enganou n'uma asserção que avançou, quando disse — Que o primeiro Parlamento depois da Restauração tinha repellido o projecto das indemnisações — se bem me lembro, esse Parlamento, a que eu pertenci, tanto o não repelliu que o adoptou, e foi reduzido a lei, que vem a ser a lei de 25 de Abril de 1835; e o nobre Deputado que é tão conhecedor de leis, não sabia que existia esta; a qual depois cahiu em desuso, mais por generosidade dos interessados, do que por outro motivo, por isso que não foi ainda revogada. O mesmo illustre Deputado querendo de alguma maneira attenuar o effeito desta emenda, disse — A commissão approvou esta emenda, na intelligencia de que se deve contar o tempo desde 1834 até agora: — isto é uma illusão: isto era uma burla que se fazia áquelles magistrados; porém isto é que eu não quero; porque eu não quero zombar daquelles cavalheiroso

Perguntou o nobre Deputado aonde estão os factos successivos? O nobre Deputado creio que deve estar inteirado delles; porque ainda em 47 se tractou da admissão dos direitos do partido miguelista igualando-o em direitos com o partido constitucional: é este principio que eu combato, porque já antevejo as consequencias, que delle se querem tirar. O partido miguelista é um partido incorregivel; alguns individuos ha nelle de muita capacidade, e senso que poderiam prestar serviços ao paiz; mas o partido em si nunca ha de dar um abraço, que não seja o abraço de Judas, e na primeira occasião que tiver, ha de cravar o punhal. Disse o nobre Deputado — » Seja embora n união da Familia Portugueza uma chimera: nós devemos adoptar essa chimera.

O Sr. Presidente, pois o illustre Deputado admitte que seja uma chimera, e quer que nós, os Legisladores, nos occupemos em legislar sobre uma chimera? Eu creio que a Camara não esta disposta a submetter-se a esse ridiculo; se é chimera, será muito boa para os romances; recommende-a o illustre Deputado a algum dos seus collegas que costuma fazer poesia, e que é forte em romances; mas não a venha apresentarem uma Camara de Deputados. Sr. Presidente, lembra-me do adagio portuguez, — Quem o seu inimigo poupa, nas mãos lhe morre — e por consequencia voto contra a emenda feita ao projecto na Camara dos Pares

O Sr. Presidente: — Vai dar-se conta á Camara de uma mensagem que veiu da Camara dos Pares, sobre um projecto que tem de ir a uma commissão.

Leu-se na Mesa o seguinte:

Officio. — Da Camara dos Dignos Pares, acompanhando as alterações feitas na proposição de lei de 23 de maio do corrente anno, relativa á prorogação do praso concedido no artigo 1.º da carta de lei de 10 de março de 1840, cuja proposição teve por base o projecto de lei n.º 54 desta Camara. — A commissão de Fazenda.

O Sr. Presidente: — Continua a discussão da ordem do dia.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, o objecto que se discute é summamente grave e importante; tracta-se da apreciação de direitos antigos, e da applicação de um pensamento politico, que na minha opinião honra sobremaneira o partido liberal. Eu, firme nos principios que tenho aqui sustentado, e qualquer que seja a sorte da emenda [que veio da Camara dos Pares, habituado, como estou, quasi sempre a votar com a minoria da Camara, não estranharei agora, que vou sustentar um pensamento originario do Governo, ficar tambem em minoria. Sr. Presidente, já veiu a esta Casa um projecto para reintegrar nos seus postos quatro, ou cinco individuos; e eu sustentei-o, com quanto a sua approvação redundasse em prejuizo, principalmente da minha pessoa; mas disse-se então, para o não approvar, que a medida era incompleta, e por consequencia injusta.

Mãis tarde apresentou o Governo um projecto de lei em que regulava o modo porque deviam entrar na 3.ª e 4.ª secção os officiaes amnistiados d'Evora Monte. — Esse projecto ainda não foi discutido, e receio ainda que se diga quando se entrar no respectivo debate, que a medida é incompleta, a fim de se não approvar, porque vejo que se faz o mesmo agora que se fez então, quando por esta emenda, e pelos projectos já apresentados, fica abrangido quasi tudo. (apoiados)

Sr. Presidente, este systema de combater as medidas por dizer que são incompletas, parece-se com certa operação que se recommenda na arte da guerra, e que consiste em bater o inimigo em detalhe. Não sou eu decerto que tenho culpa disto, e permitta-se-me dizer que é o Governo.

Sr. Presidente, eu não posso nem devo separar o negocio que se discute agora, com o que foi apresentado pelo Gabinete, tanto pelo que respeita aos officiaes militares que tinham entrado na ultima lucta civil, como para os que combateram nos campos de Evora-Monte. Mas se este era o pensamento do Ministerio, porque se não põe á frente da discussão, sustentando as suas opiniões no Parlamento, ou cahindo com ellas? É assim que eu entendo o Systema Representativo. Se eu tivesse afortuna, ou a desgraça, de me sentar naquellas cadeiras, tendo, como tenho, aquelle pensamento politico de conciliação havia de sustenta-lo na Camara, e havia de cahir honrosamente do Ministerio com elle, se a Camara o rejeitasse; por tanto não me parece de maneira alguma que o Governo possa ficar silencioso nesta questão; é preciso que se saiba se já mudaram as suas idéas a este respeito, se já não concorda com o seu primittivo pensamento; se não quer já que delle se faça applicação ao caso que se discute.

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Sr. Presidente, esta questão é puramente politica; máo lia senão dois caminhos a seguir, ou o caminho do conciliação, ou o caminho opposto, que é o que defendem os illustres Deputados. Ouvi fallar em alliança monstruosa, que se quer fazer com o partido inimigo da Rainha; peço licença para dizer ao illustre Deputado, que aqui senão tracta de alliança, mas de generosidade, que é um sentimento nobre n'um homem, e não menos nobre n'um partido — é

0 forte a conceder no fraco algumas migalhas depois de quinze annos de desgraça — isto não se póde combater.

E não se diga que o Governo vem aqui ostentar uma generosidade, que póde ser perigosa da parte rios vencidos; não sei se o partido liberal tem força, mas o que tem força são as idéas da liberdade, que estão no coração da grande maioria dos Portuguezes; f. Sr. Presidente, muito fracas estariam as instituições neste Paiz, se se póde-se sequer suppôr que, por esta medida, ellas podiam soffrer ornais insignificante rico; eu nada receio pela liberdade; não posso receiar, porque esta regada com sangue, e não póde por conseguinte morrer. Não ha Cossacos do Norte, nem communismo do Sul, nem despotismo déreis, nem anarchia de povo, que possam matar a liberdade — ella vive pelo poder das idéas, e bojo não ha força que a anniquille.

Eu não quero fallar, nem no exercito liberal, nem nas espadas dos seus generaes; estou certo, com tudo, que essas se não haviam de manchar nunca a favor do dispotismo; o Governo absoluto já não esta em moda; ate a moda vem reforçar a minha opinião.

O illustre Deputado que ultimamente fallou, e que combateu o projecto, disse que aqui, além de tudo mais, havia um grande inconveniente em ser o Governo que offerecia, em logar de os interessados pedirem. Ora, Sr. Presidente, ou isto é uma questão politica, como eu entendo que é, ou não; se o é, quem é que ha de regular a conveniencia de fazer esta concessão senão o Governo? Podem pedir: — creio que muitos tem pedido, mas não venhamos em este sofisma, que é um dos muito conhecidos de Bethan — ninguem póde quando não tem a menor esperança de ser attendido? Mas, Sr. Presidente, esta idéa é grande e generosa, e a respeito de generosidade, o illustre Deputado a quem me refiro, fez algumas considerações, que mereceram apoiados de uma parte da Camara. — Generosidade!... Pois generosidade disse o nobre Deputado, quando a não tivemos com tres homens que ainda hoje estão obrigados a dizer em subterraneos, talvez? Sr. Presidente, quando aqui se apresentou um projecto de mensagem a respeito destes tres individuos, eu pedi a palavra a favor, mas houve logo quem requeresse que julgasse a materia discutida ~ pedi então votação nominal, e a Camara rejeitou a minha proposta — não pude fazer mais — onde esta aqui a contradicção? Se existe, não é da minha parte, mas daquelles que appellam agora para a generosidade d'um sentimento que então não quizeram ter. Eu quero generosidade para todos; quero justiça e direito. Pergunto uma cousa; os homens aos quaes póde dizer respeito a emenda, ou sejam militares, ou empregados civis, ou magistrados, não prestaram serviços antes dessa época, a que se allude? E esses serviços que tinham feito antes, devem ser esquecidos pelo paiz? A amnistia em que o illustre Deputado acabou de fallar significa esquecimento dos crimes politicos, mas não das boas acções, e dos serviços prestados á Patria.

Pois nós podemos pôr de lado os direitos ganhos em virtude de serviços prestados anteriormente a esses factos?... Ninguem dirá que sim — o esquecimento como já disse, e em relação a esses factos que se praticaram, e não em relação aos serviços prestados; (apoiados) os serviços que foram prestados a bem do paiz, não podem ser esquecidos pelo mesmo paiz (apoiados).

S. Presidente, já lá vão muitos annos contados da época em que esses acontecimentos tiveram logar; e eu não posso entender de modo algum, que a liberdade perigue por se attender a meia duzia de individuos já decrepitos (apoiados) a liberdade no nosso paiz tem esteios muito fortes para poderem resistir as doutrinas dos seus inimigos (apoiados).

Sr. Presidente, eu não sou representante de partido algum; aqui nesta Casa sou Representante do povo, e como tal digo que, na minha opinião, convem ao paiz a politica que o Governo quer seguir neste ponto (apoiados) E esta a razão por que voto pela emenda feita ao projecto na Camara, do Dignos Pares do Reino (apoiados).

O Sr. Pereira dos Reis: — Sr. Presidente, entro com receio neste debate, porque já tem sido tractado o objecto mui larga, e proficuamente pelos Oradores que me precederam, no entretanto sempre direi alguma cousa, porque quero que a minha opinião sobre este negocio fique bem consignada; e porque entendo que em negocios taes é inadmissivel toda a casta de reserva. Desde o momento que eu vejo que ha um certo empenho de fazer ameaças; desde o momento que observo que se tracta de metter medo com este negocio, entendo que é dever nosso manifestar qual a verdadeira opinião, que possuimos ou desposamos a este respeito.

Sr. Presidente, deu-me Deos um certo desassombro, que me honra; nesta questão tractarei sem medo de expor a minha opinião com franqueza e lealdade, e não hesito um só momento de responder por ella. Estou de accordo com o nobre Deputado, que acabou de fallar, pelo que toca a esta frase quasi banal, que se repete todos os dias — União da Familia Portugueza — Ainda não ouvi a explicação verdadeira desta frase; mas se ella indica, como pertendem alguns homens chamados estadistas, o querer conseguir que entre nós haja identidade perfeita de opiniões; digo, que vamos atrás d'uma ficção, e d'uma verdadeira chimera (apoiados). E esta uma idéa que faz honra, mas que é impossivel de levar á execução, porque impossivel é haver perfeita identidade de opiniões (apoiados).

Sr. Presidente, é impossivel deixar de encarar a questão do modo que me parece indubitavel; eu entendo que a emenda feita ao projecto pela Camara dos Dignos Pares, approvada tal qual se acha, resulta dahi uma injustiça relativa; entendo que este enxerto que soffreu o projecto, é de certo um corpo estranho á mesma lei Se confrontarmos a antiga magistratura com a moderna; se considerarmos qual era a magistratura no govêrno absoluto, vemos que essa magistratura estava sujeita ao arbitrio da vontade do Soberano, e não me consta que por lei se estabelecessem garantias a favor dessa classe; nos pri-

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meiros graos daquella classe, não havia mais do que a livre vontade do Soberano; a respeito das Relações é certo que raras vezes os Monarchas exerciam o podér demissorio, mas este facto resultava do comportamento dos magistrados, que geralmente não davam motivo á sua demissão; mas tinham uma garantia fundada em lei. E havemos nós por ventura estabelecer uma regra de aposentação tanto para uma magistratura inamovivel, como para uma magistratura, que não tinha a garantia da inamovilidade? Creio que não. Os nobres Deputados teem confundido, de certo sem intenção de má fé, as duas magistraturas. Sr. Presidente, ainda repito com os meus Collegas que teem defendido opinião igual á minha, que esta providencia é uma providencia incompleta; é uma providencia manca. As razões que se déram para o adiamento de outro projecto relativo aos officiaes de Evora Monte ainda militam, e hoje militam ainda com mais força; a Camara esta compromettida neste negocio, não o deve decidir a respeito d'uma pessoa, e deixal-o de todo a respeito d'outra; sem que o Governo apresente uma medida geral para todos os homens que estão em circumstancias de poderem merecer igual favor, a Camara não póde logicamente approvar a emenda, que se fez ao projecto.

Não sei se esta proposta veio de pensamento originario do Governo, nem tenho dado algum para julgar pelo lado affirmativo, e se for a julgar pelas apparencias, não acredito que esta seja a vontade do Governo; se esta fôra a vontade do Governo, os Srs. Ministros estão presentes, deviam ter pedido a palavra, e declarar solemnemente na Camara qual era a resolução do Governo a este respeito; mas eu vejo que a materia se discute ha muito tempo, que é hoje o terceiro dia de discussão, e reina o silencio nos bancos dos Srs. Ministros; isto faz-me crer que a questão e decisão deste negocio d'um ou d'outro modo é indifferente ao Governo. (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Estou persuadido que na occasião, em que se discutiu este objecto na Camara dos Dignos Pares, só estava presente o Sr. Ministro da Justiça que não tinha alli voto; o Governo esta nas mesmas idéas exactamente que contém a emenda, vinda da Camara dos Dignos Pares do Reino). Parece-me que já a discussão tinha corrido espaço bastante para ha mais tempo se apresentar alguma declaração da parte do Governo; mas é certo que a declaração que se acaba de fazer, não é muito cathegorica, e eu devo lembrar a S. Ex.ª que se o seu Collega da Justiça não tinha voto na outra Camara, tinha a liberdade de entrar na discussão, logo podia fazer alguma declaração a este respeito, e no sentido que pareceu agora indicar S. Ex.ª; porém não me consta que o Sr. Ministro da Justiça tivesse alli feito declaração alguma sobre o ponto dado; portanto não tendo o seu Collega alli fallado, isso prova que o negocio lhe é perfeitamente indifferente.

Sr. Presidente, a magistratura antiga não tinha garantias algumas; estava no mesmo caso que qualquer outro servidor do Estado, e por consequencia os magistrados de que agora tractamos, estão no mesmo caso em que estão todos os outros servidores que acompanharam D. Miguel até á sua queda; e havemos nós só attender aos juizes, e deixar de attender a tantos outros empregados, que estavam em caso perfeitamente identico?... Das Secretarias d'Estado saíram uns poucos de empregados, que não fizeram mais que obedecer ás ordens do Governo, e que talvez por motivos muito louvaveis e attendiveis se conservaram em seus logares mansos e quedos; e comtudo esses homens foram esbulhados de seus empregos; e estou persuadido de que alguns delles são benemeritos, e dignos do emprego que exerciam. Ora sendo pois o meu fim transigir com alguns obstaculos que se oppõem á realisação da união da Familia Portugueza, direi que não levo este meu desejo tão longe como alguns Srs. Deputados; não transijo, nem posso transigir com os servidores voluntarios de D. Miguel, com os seus carrascos das alçadas. (apoiados)

Disse um illustre Deputado — Não devemos tremer pela liberdade. — Eu não receio pela liberdade; a liberdade não morre, certo é, Sr. Presidente, mas a liberdade póde acabar entre nós. Iguaes palavras se proferiram em um Corpo Legislativo Portuguez — Nós já mandamos salgar o Congresso de Leibach — e d'aí a poucos dias estavamos sujeitos ás espadas que nos dictaram a lei em Villa Franca.

Sr. Presidente, póde ser que eu seja temerario, mas póde ser que este projecto, e os outros projectos insolitos, que se nos apresentam aqui, sejam principios de um plano; póde ser que eu me engane, mas esse plano vai apparecendo pouco a pouco traduzido em factos: parece que ha empenho manifesto em desacreditar o Systema Representativo, por este meio da morosidade das providencias, pela perplexidade, e por outros defeitos, que já se arguiram por parte do Governo.

Sr. Presidente, o defeito não é do Systema; (apoiados) digamo-lo bem alto; o defeito vai de quem não sabe seguir as regras désse Systema, (apoiados) vem de quem não sabe ser Governo.

O partido liberal esta forte, diz um illustre Deputado. Nego, Sr. Presidente; podia estar forte, mas não o esta; o partido liberal tem sido victima de grandes injustiças, de fórma que é preciso que a liberdade esteja muito radicada em certos animos, para que lhes não seja de algum modo desagradavel. Eu confio em que os homens verdadeiramente liberaes não renegam a liberdade, porque o Governo os maltracta; mas nem todos são homens da mesma tempera, nem todos seguem as mesmas idéas: eu conheço muito homem liberal, verdadeiramente liberal, que esta desgostoso, que sabendo o modo porque são tractados outros liberaes, quando sáem de empregos em que se empenha a liberdade, receiam entrar em taes difficuldades.

Sr. Presidente, sejamos generosos; sejamos justos para todos, é verdade, e sancto este principio; mas o que eu vejo é que pelo artigo que esta em discussão, não chegamos a esse fim; hoje as tendencias são todas contrarias aos homens liberaes. O Governo que preside aos nossos destinos, governa segundo as noticias que recebe pelo paquete; estamos condemnados a observar a politica que se recebe aqui nos dias em que assoma ao nosso Téjo o paquete de Inglaterra; se as noticias são de algum modo propicias á causa republicana, as concessões veem immediatamente; se os cossacos avançam um pouco, a reacção é completa.

Sr. Presidente, estes factos demonstram-se, porque os apalpamos todos os dias; podem nega-los, mas a experiencia aí esta para mostrar que eu tenho razão. (apoiados)

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Ouvi estabelecer uma doutrina perfeitamente peregrina, nova para mim, a respeito de recompensas, Um illustre Deputado entendeu que a respeito de crimes havia compensação. Esses homens de quem se falla, practicaram grandes serviços em outro tempo, podiam perde-los em um momento; grandes serviços practicou o Sr. Gravito, e morreu no patibulo; grandes serviços prestou á sua Patria um dos nossos mais illustres cabos de guerra, o Sr. Gomes Freire, e morreu enforcado. Em crimes não ha compensação: estes homens que haviam prestado serviços, perderam-nos em um momento. A amnistia perdoou o crime, mas ficou aí, nem podia, nem devia ir mais longe.

Receiais estes homens? (E aqui note-se o algarismo) São 3 homens. Que medo vos podem pôr estes homens? Sr. Presidente, não tractamos aqui de homens, não abatam, não rebaixem esta questão; não tractamos do numero, a questão não é do numero, a questão e de principios, (apoiados) a questão é de politica, a questão é de justiça; meio homem que fosse, valeria para nós tanto como centenares, ou milhares delles.

Mas, Sr. Presidente, a questão não se reduz a 3 homens, a questão havemos de avalia-la como ella é; havemos de considera-la como se deve apresentar aos homens entendidos, e que veem a marcha dos negocios; é a porta que se abre, Sr. Presidente, para um grande plano, e a porta que ha de facilitar a entrada para se chegar a um fim que alguem premedita.

Sr. Presidente, tenho ouvido algumas não opiniões, mas pertenções, que me parecem exoticas; pelo menos não as vi ainda sustentar em parte alguma, aonde os negocios são vistos com a devida profundidade. Comparou-se aqui um juiz da antiga magistratura, que não tinha, como disse, garantias, com um parocho collado! Sr. Presidente, ha uma differença summa, differença enorme entre uma e outra cousa. Um parocho collado tinha garantias, garantias que derivam da sua collação; e até o que tem acontecido entre nós, a respeito de parochos collados, será certo, ou não será certo, que muitos parochos collados ainda estão ausentes das suas Igrejas? É certo. Será certo que o Governo usava de um direito inauferivel, privando dessas Igrejas os parochos collados? E certo. Sobre esse facto existe mais que uma, uma ou duas Igrejas, em que a Côrte de Roma não tem insistido fortemente.

Fallou-se em que havia factos amnistiados ha 14 annos, diremos melhor se dissermos 15. E verdade, eu não quero recrudecer esses factos, esses factos estão amnistiados, ninguem pertende traze-los de novo á questão, ninguem pede, ninguem exige castigo por esses factos, os factos estão amnistiados, mas se amnistia significa esquecimento, eu direi com o illustre Deputado: esquecidos sejam esses homens (apoiados).

Sr. Presidente, nesta questão sejamos justos, alguem ha de ficar bem. Eu tambem emigrei; pela causa constitucional estive emigrado 5 annos, e durante esse tempo não vi que uma voz generosa se levantasse para pedir a restituição dos Portuguezes que se achavam emigrados, aos seus lares, pelo contrario vi que o furor do Governo absoluto crescia á proporção que alguns conselheiros officiosos (estrangeiros) lhe davam mostras de que conviria muito á sua causa, que desse uma amnistia aos Portuguezes emigrados.

Não sei se este projecto reduzido a tão mesquinhas dimensões póde evitar a continuação de revoltas no nosso paiz, mas o nosso paiz é um paiz excepcional, as revoltas não veem aqui com fome, veem quando ha fartura, e trago como exemplo o acontecido em 46: nós formámos uma excepção na Europa; se queremos uma revolta, é necessario abrir estradas, promover, fomentar todos os principios industriaes; aqui desgraçadamente revoltam-se, quando ha prosperidade.

Mas esta não é a questão, Sr. Presidente, nem eu entrarei agora, porque me parece fóra de tempo, no que occorreu ultimamente no Minho. Um illustre Deputado por aquella provincia parece que não viu bem a revolta na mesma provincia. Sejamos justos; não foi a canalha da provincia, nem das outras provincias, que a fez; a canalha foi instrumento docil na máo dos homens principaes daquella provincia.

Mas tudo isto digo vem fóra de proposito: a questão reduzida ao seu verdadeiro ponto de vista é muito facil. Não me opporei a que se pratique um acto de justiça para com os homens que serviram D. Miguel; que serviram D. Miguel (note-se bem), mas excluindo-se sempre os que o serviram voluntariamente nas alçadas. E aqui devo dizer a verdade, um magistrado, um empregado dependente do Ministerio da Justiça que escapou á joeira de Francisco de Paula, póde dizer-se homem tenaz na defeza dos principios de D. Miguel. Aqui não ha partido, quando nos referimos a D. Miguel; os sectarios de D. Miguel não podem decorar-se com o nome de partido (apoiados), esses homens não constituiram mais que uma facção. Note-se bem, favor não justiça, favor quero para os homens que se conservaram no serviço de D. Miguel, mas que não praticaram factos taes como os que conspurcam a memoria desses homens, que o serviram voluntariamente nas alçadas; favor quero para outros homens que em logares que tinham iguaes garantias, ou nenhumas garantias, praticaram antes disso alguns serviços á sua Patria; favor em fim quero para todos esses homens, que serviram infelizmente uma causa desgraçada e má; mas em termos habeis: em quanto eu vir mendigando pelas ruas tantos homens que se distinguiram na defeza da Rainha e da Carta, tantos desgraçados que desembarcaram nas praias do Mindello, cobertos de feridas, em quanto eu vir que homens liberaes, liberaes provados jazem na mizeria, porque são liberaes; em quanto eu vir que se castiga uma opinião, em quanto eu vir em fim que a mesquinhez do Governo chega ao ponto de reter em duas ou tres trapeiras dois ou tres homens, que lhe fazem ahi tanto mal como cá fóra, em quanto eu vir esta incoherencia, estas contradicções, digo que não estou disposto a votar pelo artigo que se apresenta, aliás corpo estranho nesta lei (apoiados). Traga-se uma lei geral que comprehenda todos (já manifestei esta opinião na imprensa, não tenho duvida de a repetir na Tribuna) todos esses homens victimas de muitas injustiças; revejamos os nossos actos desde 34 até hoje, e onde houver uma injustiça, emende-se; mas em todo o caso, Sr. Presidente, declaro com toda a franqueza, com os carrascos das alçadas não transijo de modo algum.

Voto contra a artigo.

O Sr. Faria Barbosa: — Sr. Presidente, na verdade nunca pensei que este parecer produzisse uma

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discução tão renhida, e tão acalorada, e menos que tantos argumentas forçados se apresentassem para o combater A questão é muitissimo simples, e pelo menos esta é a minha opinião. Talvez, Sr. Presidente, (posso enganar-me) que muito de proposito se queira apresentar esta questão de summa gravidade, e de alta magnitude, lin não a posso conceituar assim, torno a repetir. A questão é muitissimo simples, tracta-se de sabei se acaso será justo, e conveniente, se será humano considerar na lei das aposentações os antigos magistrados; eu julgo que é justo, humano, e mesmo conveniente, e o contrario seria uma injustiça, e uma desconveniencia publica. Disse-se aqui, qual foi o magistrado que escapou á joeira de Francisco de Paula? Pois quantos magistrados dos que serviram com D. Miguel existem hoje em exercicio na nova magistratura, magistrados dignos de grande illustração, e probidade? Os antigos serviços dessas magistrados deviam ser esquecidos nesta lei? (Uma voz: — Deviam) Deviam!! Que justiça é esta, em que principios se funda essa justiça! Pois um magistrado que serviu até 1828, como digno magistrado, e que se conservou durante o Governo de D. Miguel, porque as suas circumstancias não lhe permittiam emigrar, que não praticou um acto unico por onde se mostrasse que ora inimigo da Rainha, e tanto que o Governo da Rainha o despacha — devem os seus antigos serviços serem esquecidos? Que principios são estes? Que justiça é esta? E isto profere-se neste tempo de liberdade, neste anno, e neste logar!!!! Quer-se resuscitar o exclusivismo fatal. Então só, e exclusivamente devem ser attendidos os novos magistrados da nova magistratura. — Os que serviram antigamente, apesar de dignos de muitos serviços devem ser sepultados no esquecimento? Serão luminosos principios para alguem; eu detesto-os: Sr. Presidente, os antigos serviços de muitos dos actuaes magistrados não podiam deixar de ser attendidos nesta lei sem gravissima injustiça, mas como tambem muitos dos antigos magistrados em iguaes circumstancias não foram despachados para a nova magistratura, porque não tiveram quem os lembrasse, porque não quizeram ser delegados, era tambem grave injustiça não serem contemplados nesta lei; mas para que estes actos de dever de justiça, de humanidade, e conveniencia senão pratiquem, vem os argumentos das alçadas, e dos carrascos, desses actos sanguinarios praticados por meia duzia desses homens, que já não existem, mas que ainda hoje devem existir para se combater, e derrubar a lei: se esta lei tivesse vindo do outro campo, se o Governo senão tivesse pronunciado a pro della, de certo que não precisavamos esta grande lucta.

Sr. Presidente, tal é o acinte com que se argumenta, que alguns dos argumentos das palavras que proferi, quando fallei a outra vez, foram invertidos, e transtornados para se lhes podér responder, o que não e novo. Disse um illustre Deputado que combateu o parecer, que eu dissera que se conspirava por necessidade, e concluiu dizendo que por isso era justo que se lhes désse alguma cousa para se conspirar melhor: na verdade forçar deste modo o sentido das palavras para combater os argumentos, é mostrar, para assim dizer, mingoa de razões que destruam; o que eu não considero no illustre Deputado. O que eu disse é uma verdade, e torno a repetir, que os homens que ha 14 annos vivem perseguidos, e na miseria, sem ter que comer, e suas familias, esses homens que ainda hoje se lhes não quer conceder o direito de uma aposentação, e se combate da fórma que se esta vendo, esses homens por consequencia, que não podem obter cargo algum publico, que não podem gozar commodo algum da sociedade, e só sentir os incommodos, esses homens que são unicamente portuguezes para os encargos, e estrangeiros para os beneficios, esses homens, pergunto, não desejarão antes serem envolvidos em uma revolução que os melhore, ou os mate, do que continuar no estado afflictivo em que se acham? É neste sentido que eu disse que a necessidade muitas vezes os obrigava a conspirar, para fazer reconhecer que os principios com que se combate o projecto, nos conduzem á desordem, e á anarchia A experiencia o mostrou; se Os illustres Deputados quizerem attender aos motivos da revolução de 1846, verão que as perseguições que se fizeram acertos homens, os exclusivismos foram em grande parte a causa dessa revolução. Disse outro nobre Deputado, que não são só 56 individuos, os que estão no caso de gosarem do beneficio do outro projecto, e disse o illustre Deputado «Mas um Deputado do Minho, que presenciou a revolução, assevera que são só 56» por consequencia daqui entendo eu, que o nobre Deputado nega que são 56 os officiaes de que tracta o projecto que ainda não veiu a discussão, e diz «Então Macdonall linha só 56 officiaes?» Mas pergunto eu ao nobre Deputado, por ventura esses officiaes de Macdonall estão todos comprehendidos nesse projecto? Pois os officiaes de voluntarios realistas, e os officiaes de milicias, e outros muitos, que acompanhavam Macdonall estão comprehendidos nesse projecto? Eu fallo unicamente dos officiaes, a quem esse projecto diz respeito.

Disse mais, um illustre Deputado que eu até pertendera censurar os actos d'um magistrado para ser desempregado, isto é uma injustiça, eu não disse semilhante cousa; tractei de fazer um parallelo, e mostrar que se acaso esses magistrados antigos tinham praticado os actos que lhes imputam, que tambem dos actuaes bastantes praticaram outros semilhantes, e que contra estes senão declama. Disse mais um illustre Deputado que se senta nos bancos superiores, que eu tratara de os collocar, eu não trato de os collocar, trato de lhes dar pão, e que eu dissera tambem que era preciso repartir os empregos, eu já disse que o systema adoptado, quando não se acham razões sufficientes para se destruirem os argumentos apresentados, era forçar-se, torcer-se o sentido ás palavras, deshguiar-se, e procurar-se até dai-lhe um certo ridiculo para emfim d'alguma maneira se dizer — Eu la respondi satisfactoriamente — eu disse e torno a repelir, e estimarei muito que o illustre Deputado me responda, mas cathegoricamente, com razões claras, e não desfigurando e transtornando o sentido daquillo que eu profiro; eu disse que não se tractava de collocar ninguem, que se tractava unicamente de dar pão, isto é uma verdade. Como póde conceber o nobre Deputado que por esta lei se concede a esses magistrados antigos, não só o serem aposentados, mas o serem collocados, na nova magistratura? Como é que concebe o nobre Deputado na sua imaginação o meio de por esta determinação se chegar a esse fim?. Isto fallando a verdade nem merecia resposta pois se nós sabemos que para esses magistrados antigos que quizessem entrar na magistratura moderna, era preciso entrar nos lugares de delegados, como é então?

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que o nobre Deputado julga que elles por esta lei, passam a exercer os seus antigos empregos? Isto é um disparate, nem merecia resposta, torno a repetir. Do que traia a lei unicamente, é de dar pão, e de melhorar a sorte desses infelizes que ha 14 annos soffrem um exilio Estes actos de generosidade, e filantropia só podem ser avaliados pelas grandes almas, e por esses corações que já padeceram. Attenda-se a outra Camara, alli esses illustres Varões que prestaram grandes e valiosos serviços ao Throno da Rainha, que soffreram duras perseguições — o exilio — que se tossem agarrados, seriam os primeiros a quem -e faria saltar a cabeça fóra do corpo, e que talvez se deva aos seus relevantes serviços, o estarmos hoje neste logar, foram os primeiros a lançai um veio sobre o passado, e a apresentar essa medida, que nesta Casa tanto se combate, o que não proprio de homens liberaes, e d'um partido moderado, tolerante, e conservador como o nosso, deixar por mais tempo neste estado desgraçado e de miseria esses individuos, e mais proprio d'um Governo absoluto e dispotico — de perseguição e vingança — de que d'um Governo justo, liberal e benefico, isto são verdades que senão podem contestar nem combater com esses argumentos forçados, por mingoa d'outros, para se acreditai que esta medida e perigosa, que a aposentação equivale a uma reintegração, o que muito bem foi já respondido por outros illustres Sr. Deputados; mas diz-se, que isto o um acto não sollicitado, quando aqui se tractou dos homens das trapeiras, reconheceu-se nesta Casa que tambem se conspirava, e até se disse por parte do Governo o estado em que a Capital se achava, e as medidas que se tinham empregado. Para esses pediu-se uma amnistia não sollicitada, e não se julgava ser este acto de descredito, de fraqueza para o Governo 4 porém este das aposentações sim, bella justiça! Para uns administra-se por um modo, para outros d'outro modo.

Disse um nobre Deputado que considerava a amnistia como um esquecimento, mas um esquecimento das pessoas, que não queria as forcas, nem os degredos da Africa, mas que nos esqueçamos desses homens!...

Estou persuadido que esta idéa nasceu do calor da discussão; um esquecimento perpetuo de homens portuguezes como nós, só porque não pensam como nós, abandona-los em todos os momentos da vida, ainda e, mais afflictivos, e dignos da maior compaixão, obriga-los a um soffrimento constante, são idéas que a natureza, e a humanidade repelle com horror, e que só podem ter sequases em um estado selvagem e barbaro; mas que nunca deviam sair da bocca do homem, que se diz liberal, e que se présa de ter combatido pela causa da liberdade; porque esse homem e do seu rigoroso dever, ser homem generoso, tolerante, e compassivo, do contrario não póde ser liberal, ou é um hypocrita, ou um despota.

Sr. Presidente, eu estou convencido, que a Camara estygmatiso, detesta similhantes idéas. A Camara tem mostrado, por seus actos, a sua tolerancia, o quanto deseja a união da Familia Portugueza, a paz, e a ordem (apoiados).

Disse-se tambem — Que esta medida traz o odioso, por isso mesmo que excepcional, e que devia abranger a todos, porque se os juizes da antiga magistratura devem ser attendidos, tambem o devem ser os mais empregados desse tempo — Eu não sei com que direito se quer sustentar este principio por que em todos os tempos tenho visto, se as aposentações são concedidas a certos empregados, e não a todos; então tambem se podia dizer o mesmo a respeito das leis que teem passado nesta Casa sobre aposentações dos magistrados, militares, e professores, estas tambem não deviam ter passado, porque deviam abranger todos os empregados do actual Governo, e todos se devem considerar com direito de serem aposentados. Mas se isto não e exacto, se nem todos os empregados teem direito a serem aposentados, porque se ha de vir dizer, que se os antigos juizes vão hoje ser contemplado nessa aposentação, o devam tambem ser todos os mais empregados antigos? Existe hoje esta igualdade para todos os empregados? De certo que não.

Disse-se mais — Que os parochos collados não podem servir de argumento, por isso mesmo que elles estavam vinculados nas igrejas, o que não acontecia aos magistrados. — Concedo que seja assim; mas devo lembrar ao nobre Deputado, que os que sairam, tambem estavam collado, e com essa vinculação nas igrejas: e por consequencia o motivo da collação não prendeu o Governo de tal fórma, que o obrigasse a praticar um tal acto, quando elle conhecesse que désse acto podiam resultar graves consequencias. Ora se por ventura se praticou isto com os parochos, no meu entender mais perigosos, e de quem se podia receiar mais, porque se pertende fazer temidos uns poucos de homens decrepitos, quando gosem do beneficio desta lei?

Sr. Presidente, repito, eu entendo que deste acto nem o Throno da Rainha, nem o partido cartista póde receiar cousa alguma: pelo contrario e um acto de justiça, e de generosidade, que póde influir muito para que muita gente, que até aqui era inimiga do Governo, daqui por diante o não seja. Tambem se contestou o argumento que eu apresentei a respeito de Hespanha: e disse-se — Tanto se reconheceu que a medida foi perigosa, que depois se restringiu, e trouxe-se o exemplo dos Trystanis. — Não me consta lai restricção. Mas pergunto, quantos officiaes existem, em virtude desta medida, nas fileiras do exercito da Rainha df Hespanha, e que estão prestando serviço? Os nobres Deputados que argumentam contra as excepções, e especialidades, querem, e sustentam essas mesmas excepções; isto e, não impugnam que o Governo admitta hoje, ámanhã ao serviço dos individuos, que pertencem ao partido vencido, o que não querem, o que combalem e que haja uma lei para admittir todos aquelles que estão nas mesmas circumstancias. Termino, portanto, votando pelo artigo 6.º til como veiu da Camara dos Dignos Pares.

O Sr. Cabral de Mesquita: — Sr. Presidente, pedi a palavra para manifestar a minha opinião sobre esta questão, que eu não reputo de tão alta importancia, como o nobre Deputado que se senta no banco inferior. Entendo que esta questão não devia ser elevada a altura que se tem elevado; não sei quaes as razões que o nobre Deputado tem para lhe chamai questão de alta politica; vejo que não e uma proposta do Governo, e que nem e sustentada por elle e só se soube a sua opinião depois do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros declarar que eram estas as idéas do Governo a tal respeito, mas ainda não vi nenhum dos Srs. Ministros tomar a palavra, o que

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dá a entender que o Ministerio considera esta questão de pequena importancia; e ella realmente o é pela sua mesma natureza.

É preciso declarar á Camara que eu pedi a palavra contra, porque desejo fazer uma alteração neste art. 6.º, com quanto approve a sentença geral do mesmo artigo, e darei a razão que tenho para fundamentar esta minha opinião. Sr. Presidente, sobre mim não póde recair a menor suspeita de ter sympathia pelo partido a que pertencem os magistrados de que se tracta (apoiados); pertenço a uma familia que foi perseguida e victima do fanatismo daquelle partido; todas as propriedades que pertenciam a minha casa, foram confiscadas; e um partido que erigiu a perseguição em systema, tendo praticado os actos da maior tyrannia não póde deixar de merecer o odio de um homem livre.

Sr. Presidente, e necessario considerar a questão como ella deve ser considerada. De que se tracta aqui? Se por acaso se apresentasse um projecto que tractasse de restituir os magistrados da antiga magistratura á magistratura moderna, eu declaro que votava contra esse projecto; mas aqui só se tracta de dar uma recompensa a magistrados que foram despachados pelo Governo legitimo, e que serviram durante esse tempo, mas que tiveram a infelicidade de servir tambem debaixo do Governo da Usurpação; e a esses que nós tractamos de dar esse beneficio, não pelos serviços que prestaram durante o Governo absoluto, mas por o tempo que serviram antes. Sr. Presidente, muitos ecclesiasticos antigos, que esquecendo-se de todos os deveres da religião, empunharam a espada contra o exercito libertador, nas linhas do Porto, e que nos pulpitos e confessionarios desacreditavam o Systema Representativo, grangeando para o Principe proscripto essa falsa popularidade de que por tanto tempo gosou, fizeram toda a guerra possivel, esses homens vejo-os restituidos nos seus logares, e não se diga que o motivo foi a collação, não admitto tal; foi apolítica que lhe conseguiu esse favor, e se pois os ecclesiasticos e os militares que serviram no exercito usurpador contra o exercito constitucional estão todos mais ou menos recompensados, porque motivo se ha de fazer uma excepção a respeito dos magistrados, quando não ha razão alguma para isso? Sr. Presidente, querer pôr fóra da regra geral estes magistrados que só tem a culpa de servirem durante o Governo da Usurpação, e de serem cegos instrumentos da tyrannia daquelle Governo, e muito duro e cruel, porque esse crime esta completamente expiado com a pena de 10 annos de privação de seus logares; por consequencia, na minha opinião, os antigos magistrados despachados no Governo legitimo, e que serviram nesse tempo, apesar de terem reconhecido a Usurpação do Principe Proscripto devem ser contemplados na regra geral. Espero que esta Camara assim o faça, porque uma Camara Constitucional nunca faz uma lei de vingança. Ha com tudo alguns magistrados a quem não é justo conceder esse beneficio, e são os que serviram em alçadas, e commissões destinadas a julgar os crimes politicos.

Sr. Presidente, ha crimes de uma ordem tal, que na minha opinião, nunca se podem esquecer. Para esses cargos foram escolhidos homens, de cuja perversidade se esperava que houvessem de desempenhar perfeitamente a missão de sangue de que foram encarregados, e effectivamente nada deixaram a desejar, seria injusto, e até uma immoralidade equiparar magistrados muito dignos, com homens carregados de crimes indignos do beneficio desta lei A questão pois não é politica, nem é de tal ou tal homem, a questão é de justiça; eu nem sei se existe algum, nem me importa saber; entendo que se deve fazer uma excepção contra homens, que realmente merecem que se lhes faça justiça.

Por tanto concluo dizendo, que voto pelo art. 6.º que tracta dos magistrados da antiga magistratura, mas faço uma excepção a respeito dos que serviram nas alçadas, e por isso mando para a Mesa a seguinte

Proposta. — Proponho que os magistrados pertencentes á antiga magistratura, que serviram nas alçadas creadas no tempo da Usurpação para julgar os crimes politicos, sejam exceptuados da sentença geral do art. 6 — Cabral Mesquita.

Foi admittida por 48 votos contra 16, e classificada de substituição.

O Sr. Pereira de Mello: — (Sobre a ordem). Eu tinha assignado o parecer com declaração, tanto a respeito do art. 6.º, como do paragrafo unico do art. 9.º, e não 8.º como declara o projecto, porque me parece que contem um principio de injustiça; e por isso mando para a Mesa a seguinte

Emenda. — Paragrafo unico do art. 9.º — Em vez da palavra — quinze — se dirá — dez. — Pereira de Mello.

Foi admitida por 55 votos contra 11.

O Sr. Moraes Soares: — Peço a V. Ex.ª que consulte a Camara, sobre se a materia esta discutida.

Consultada a Camara não houve numero bastante para constituir votação pro ou contra.

O Sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. Presidente, tambem cederia gostoso da palavra, para se conceder a algum illustre Deputado que a desejasse, senão tivesse de responder a algumas observações que se fizeram, mas serei muito breve. Primeiramente permitta-me o nobre Deputado que me precedeu, e que disse, que na sua opinião, esta materia não era importante, que eu lhe observe que a Camara acaba de mostrar o contrario, porque tendo esta questão durado já hontem e hoje, acaba de se resolver que a materia ainda não esta discutida sufficientemente. Diz o illustre Deputado que não sabe, porque sequer considerar isto uma questão politica; e eu o que não sei, o que não comprehendo, é a razão, porque o illustre Deputado a não considera como tal, pois que se esta questão é alguma cousa, é politica, e nada mais; nem posso saber, porque o illustre Deputado a não considera assim. — E porque o Ministerio não tem entrado no debate? Direi em primeiro logar que um Sr. Ministro já fez uma declaração a este respeito; e além disso permitta-se-me que pergunte, que culpa teem as questões, para se considerarem politicas, ou não, que os Srs. Ministros não entrem na discussão? As questões teem o cuidado de se qualificarem a si mesmas. Portanto, eu julgo a questão ainda summamente grave, porque se tracta de interesses de muitos individuos de um certo partido, e de um principio de generosidade de outro partido que é mais forte.

Mas fallou-se em certo Periodico politico, na sua linguagem violenta, e impenitente, e tambem isto foi argumento contra o projecto: a esse respeito direi que os seus artigos, e as suas doutrinas não assustam

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nem me fazem pêso algum Capotado) quanto mais escrever em certo estilo, tanto mais se desacredita; essas doutrinas não teem força no paiz, nem apodem ter (apoiado) essas idéas não lavram, porque não e possivel retrogradar (apoiados.)

Disse um nobre Deputado que aqui fazia-se politica pelas noticias do Paquete; se os Cossacos avançavam a politica era uma, se retiravam era outra. É verdade que existe esse facto, e de nenhuma sorte me conformo com elle como systema; e verdade que tenho visto mais de uma vez apresentarem-se certas medidas, e passado certo tempo serem retiradas, pela mudança das circumstancias tem-se dado essa notavel coincidencia de andarem certas propostas a par do que se passa lá fóra; mas eu não acceito este systema; entendo que o Governo, e o Parlamento devem fazer politica sua, sem querer comtudo affirmar com isto que se deve ser extranho ao que se passa na Europa; isso seria absurdo — mas com relação ao ponto em questão, e outros identicos, entendo que deve ter politica sua; nem lhe deve importar para as suas resoluções os movimentos deste, ou daquelle exercito Russo ou Prussiano.

Sr. Presidente, disse um nobre Deputado que eu tinha vindo aqui sustentar uma doutrina peregrina, e isto em relação a compensações de crimes politicos. Eu ainda sustento que sendo a amnistia o esquecimento do passado, isto é de factos passados em certa época, não podémos de modo algum fazer, reviver esses factos para se fazer qualquer exclusão; que adoptava a medida em questão, nós não vamos recompensar esses crimes politicos, mas recompensar os serviços que esses individuos teem feito ao seu paiz. Sr. Presidente, eu não faço questão de numero, para mim não me importa que sejam 3, 30, ou 300, os beneficiados; ou ha ou não ha direito; se o ha é para todos; no caso contrario não o ha para ninguem.

Sr. Presidente, eu não posso concordar, de modo algum, com a proposta de um nobre Deputado que pertende estabelecer uma excepção a respeito dos magistrados que serviam nas alçadas, parece-me que isso é rebaixar demasiado a questão, e a dignidade do Parlamento, se acaso fizermos uma excepção que vai recair em 2 ou 3 individuos, e eu admiro que o nobre Deputado, defendendo a doutrina do artigo, viesse depois apresentar uma similhante excepção; ou tudo ou nada, não entendo que deva haver excepções especiaes; as excepções são sempre odiosas.

Sr. Presidente, ouvi aqui dizer que estes individuos de que ora se tracta, teem soffrido 14 ou 16 annos de perseguição; protesto contra esta idéa, porque não tem existido tal perseguição (apoiados) fallo da perseguição auctorisada pelo Governo, e não de factos singulares, que não constituem regra. Pois os individuos que pertencem a outro partido que não é o liberal, não teem estado sempre no goso de seus direitos civis, e politicos? Aonde estão as masmorras atulhadas de victimas? Onde os cadafalsos que se tem levantado na praça publica para esses individuos?.. Nem um só (apoiados.) Eu rejeito completamente uma tal insinuação (apoiados) não cabe ao partido a que se quer lançar em rosto (muitos apoiados.) Embora eu reconheça que tem havido essa exclusão de que fallei, e que é bastante contra minha opinião; nós hoje collocados na situação de vencedores ha tanto tempo, depois de terem decorrido tantos annos, podemos, e devemos ser generosos; podemos, porque temos direito, e devemos, porque temos a força; não a força do Governo A ou B. mas a força das idéas liberaes que estão muito arreigadas no nosso paiz, e que são companheiras inseparaveis da época em que vivemos (apoiados.)

O Sr. Castro Ferreri: — Sr. Presidente, eu não concordo com esta medida, por que é uma medida excepcional, e por que ainda não foi considerada debaixo do ponto de visto financeiro; ainda não se tractou de saber em quanto importa a despeza que ha de vir ao Thesouro pela adopção desta medida; qual o numero de individuos sobre que ella vai recaír, quaes os seus ordenados ou vencimentos, e qual a receita, com que se ha de satisfazer esta despeza. Eu não vejo outra cousa senão estar aqui a votar despezas, e a respeito de meios para as satisfazer nem palavra! De maneira que estamos a prodigalisar os dinheiros da Nação, julgando que entrâmos em alguma Califórnia; mas eu digo que pela maneira que nós estamos a fazer distribuições de dinheiros, daqui a pouco tambem o mandamos para a Prussia, para a França, para Vienna, (riso) e para isto tudo nem que nós tivessemos 200 mil Californias chegavam (apoiados, riso).

Sr. Presidente, esta despeza que se vai fazer com as aposentações dos magistrados antigos tem de ser paga pelo povo, e nós não sabemos se o povo a quer pagar; não sabemos se é de sua vontade que se faça esta despeza. Pois nós não temos dinheiro para pagar as despezas activas, e havemos de te-lo para o dar a estes individuos? De mais a mais, a medida com relação a estes magistrados antigos vem muito fóra do caso, para que nós aqui fizemos este projecto de lei (apoiados): por quanto o projecto só foi feito para segurar a» aposentações da magistratura regulada pelas leis do systema liberal, e não para a que foi regulada pelas leis do systema absoluto (apoiados); a magistratura do Systema Representativo tem a garantia de amovivel e perpetua, e a antiga magistratura não tinha essa garantia; nós estamos a legislar para o Regimen Constitucional, e esses Senhores querem que se legisle para o Governo despotico: não sei como isto se possa combinar! Este artigo foi mettido aqui a tarraxa (risadas); não sei como se possa combinar.

Sr. Presidente, não entrarei nas considerações aliás ponderosissimas, que os dignos Oradores, que me precederam, fizeram, não sei mesmo se o podiam fazer, dada a possibilidade tambem havia de divagar muito sobre a alta politica, e a conveniencia ou não conveniencia desta medida; mas em todo o caso ponho de parte essas considerações, porque teem sido feitas largamente por mui distinctos Oradores, limito-me só a dois pontos unicos. — O primeiro é não saber se temos os meios necessarios, nem a commissão apresenta os dados estatisticos precisos; em segundo logar que esta medida é isolada, e excepcional, e por conseguinte não devia ser trazida aqui assim.

Outro objecto que me levou a pedir a palavra, foi o ver ha pouco tempo um illustre Deputado mandar uma substituição para a Mesa á emenda da Camara dos Dignos Pares, que é sobre a eliminação da edade de 60 annos. Eu approvo inteiramente a emenda da Camara dos Dignos Pares, e rejeito a substituição offerecida pelo illustre Deputado. A prescripção dos 60 annos de idade acho-a muito judi-

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ciosa, n'um magistrado é uma idade muito propria para exercer esta funcções; porque calculando que um magistrado acabe o seu curso da Universidade de Coimbra na idade de 21 annos, depois de 30 annos de serviço, vinha a ter 51, e sendo aposentado nesta idade ficava privado o paiz do serviço de um magistrado, com muita pratíca dos negocios forenses, e de mais a mais seria obrigado a sustenta-lo na aposentação, e a sustentar um outro que o havia de substituir. Aqui não se dá o mesmo caso dos militares, que precisam ter certa idade para poderem com o serviço activo; um magistrado quanto mais velho melhor; porque n'uma idade avançada, por exemplo de 60 annos, e quando o magistrado esta livre das paixões, e tem o espirito quieto e tranquillo, esta já fóra de todas estas paixões do Mundo, e quando julga, julga com mais prudencia, sensatez e circunspecção. Por tanto, Sr. Presidente, acho muito conveniente, que a substituição se não approve, por que os juizes quanto mais velhos mais prudencia hão de ter. Com isto não quero fazer injustiça aos magistrados novos, antes pelo contrario: masso quero dizer que a idade de 60 annos não é idade em que as faculdades intellectuaes estejam alteradas, fintes acho que é então que o magistrados estão mais no caso de podérem julgar convenientemente; e por outro lado ha a razão da economia, porque póde dar-se o inconveniente do juiz ser aposentado naquella idade, quando ainda póde servir, e servir melhor, tendo de o sustentar na aposentação, e na actividade o juiz que o substituir.

Voto por tanto pela emenda que veiu da Camara dos Dignos Pares, rejeitando o artigo que lá se introduziu neste projecto, e que diz respeito aos magistrados das alçadas, pelos motivos que já expliquei.

O Sr. Presidente — Vai dar-se conta de um officio que veiu da Camara dos Dignos Pares.

O Sr. Secretario Corrêa Caldeira — Deu conta de um officio da Camara dos Dignos Pares, participando que ámanhã ás 4 horas da tarde e o dia desiguado para a reunião da commissão Mixta, e por isso pede que sejam convidados os Srs. Deputados, que fazem parte da dicta commissão a acharem-se presentes no dia e horas indicados na sala dos Dignos Pares

O Sr. Presidente: — Creio que se allude á commissão Mixta sobre o projecto das commissões Mixtas; e então ficam os membro da mesma commissão, que pertencem a esta Camara, prevenidos de que ámanhã as 4 horas hão de se reunir na mesma commissão.

Aproveito a occasião da discussão se interromper para annunciar que a deputação encarregada de apresentar a Sua Magestade a Rainha os autógrafos do decreto das Côrtes Geraes sobre a urzella ha de ser composta dos seguintes Sr. Eusebio Dias Poças Falcão, João Amaro Mendes de Carvalho, João Pereira Crespo, Joaquim Honorato Ferreira, Joaquim José Pereira da Silveira, Joaquim Manoel da Fonseca Abreu Castello Branco, José Izidoro Guedes.

Em quanto senão designa dia e hora para a recepção, se se apresentarem mais alguns autógrafos, ha de ser a mesma deputação encarregada tambem de os apresentar.

O Sr. Ministro da Guerra (Sobre o ordem) — Sr. Presidente, constou-me que na minha ausencia se annunciou uma interpellação; na qualidade de Ministro da Guerra tenho a declarar a V. Ex.ª, que estou prompto a responder a qualquer hora, e que não é necessario fazer-se-me intimação.

O Sr. Presidente — Não estamos ainda na hora das interpellações.

Vozes: — Já déram 3 quarto.

O Sr. Presidente: — Ainda estão inscriptos sobre a ordem do dia os Sr. Lacerda Antonio, Rebello da Silva, Ferreira Pontes, Cunha Sotto-Maior, Carlos Bento, Lopes de Lima, e Cabral de Mesquita: não sei se a Camara quer que se passe primeiro a uma interpellação mais antiga que é a do Sr. Lopes de Lima no Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros; não sei se S. Ex.ª já póde responder a ella, se póde é a primeira que se ha de verificar, porque é mais antiga.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Não tenho idéa sobre que é.

O Sr. Presidente: — Sôbre a administração do Correio.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — Muito bem. responderei.

Consultada a Gamara sobre se deviam ter logar já as interpellações annunciadas, resolveu-se affirmativamente por 51 votos contra 8.

O Sr. Presidente: — O Sr. Lopes de Lima é que primeiramente tem a palavra.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, eu não sei se S. Ex.ª esta ou não inteirado do que aqui se passou na discussão a respeito dos correios: o Sr. Ministro não assistiu a essa discussão; mas naturalmente terá sido informado; por isso abstenho-me de estar aqui a repetir o que então se disse. Eu tenho a dirigir duas perguntas a S. Ex.ª: primeira, se naquella repartição se tem dado execução á lei de 30 de julho de 1844, fazendo-se optar por um dos vencimentos dois empregados que ha naquella repartição que accumulam os ordenados de dois empregos, empregos que aliás (particularmente a respeito de um désse empregados) apresentam certa incompatibilidade, de maneira que é quasi impossivel satisfazer ao mesmo tempo a ambos, ao importante, e laborioso logar de secretario geral da administração dos correios, e ao de professor effectivo, proprietario de uma cadeira do Lycêo.

A segunda pergunta que tenho a dirigir a S. Ex.ª é quando tenciona S. Ex.ª apresentar ao Parlamento, ainda nesta sessão, as contas da despeza da administração geral dos correios, que não vieram juntas ao orçamento, e não só a despeza propria da repartição, mas inclusivamente certas despezas que me consta que se tem mandado fazer por aquelle cofre; e tambem não esquecendo uma nota de uma divida activa, que me consta haver naquella repartição, por adiantamentos que por aquelle cofre se tem feito a diversas pessoas. Depois de S. Ex.ª responder, tomarei logo a palavra, se o julgar conveniente.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — Sr. Presidente, eu não tinha recebido formulada esta interpellação, porque não estava na Secretaria, quando ella lá for dirigida; quando a minha saude me permittiu reassumir o trabalho daquella pasta, conheci de alguns objectos que eram mais urgentes, e confesso que não vi a interpellação; direi portanto aquillo que me occorrer, e póde ser que satisfaça o illustre Deputado.

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Em quanto ás contas ellas têem sido dadas constantemente, as contas do correio dão-se ate mensalmente, e vem juntas com as contas annualmente dadas da repartição dos Negocios Estrangeiros. E uma verdade que as contas creio que de 46 e 47, se a memoria não me falha, não trouxeram todos os desenvolvimentos, e a causa foi a falta de empregados; foi necessario mandar ao Porto um dos individuos empregados na contabilidade daquella repartição em unia diligencia de serviço, e esta falta fez com que não se dessem ás contos todos os desenvolvimentos; mas esses desenvolvimentos podem ser presentes á Camara, porque o correio da contas com a maior regularidade, que ri possivel, dá conta todos os mezes da sua entrada e saída, dá mesmo um mappa semanal do estado do cofre, e dá no fim do anno a sua conta geral, a qual se examina no Ministerio dos Negocios Estrangeiros: póde estar o illustre Deputado certo e certissimo de que não ha repartição alguma publica, que dê contas com mais regularidade do que é o Correio.

Ora em quanto á disposição dos fundos tambem é necessario sabei que não se distribue dali um só leal, sem ser por ordem do Sr. Ministro da Fazenda, isto e, salvas as despezas proprias da repartição, como são os postilhões, como são as fôlhas, como são outras que não dependem da ordem do Ministros da Fazenda, mas tiradas as despezas da repartição propriamente dicta, não se paga alli um só real, que não seja por uma ordem do Sr. Ministro da Fazenda: eu que sou o Ministro da repartição, não tenho auctoridade de dispor dos fundos della.

Ora, Sr. Presidente, quem faz observações, sabe muito bem como se têem feito alguns adiantamentos, sabe o muito de raiz, e eu não passarei daqui; mas sómente direi que a algum empregado em circumstancias tristissimas, por exemplo pela morte de sua mãi, onde seu pai, ficando sem dinheiro para lhe fazer o enterro, ou outras circumstancias desta natureza, tem-se mandado adiantar (O Sr. Ministro da Guerra: Apoiado) alguma modica quantia para ser deduzida nos seus ordenados. A respeito de adiantamentos é o que existe, e tambem um adiantamento para a Imprensa Nacional para uns compendios uteis para a educação da mocidade para se satisfazerem pelo producro dessas obras. Um dos empregados mais dignos da Secretaria dos Negocios Estrangeiros tem imprimido uma quantidade de compendios utilissimos, approvados, e apoiado na lei o Ministro anterior a mim fez-lhe algum adiantamento para elle poder pagai as despezas na Imprensa, o qual adiantamento é logo coberto pela venda da obra, ou pelo desconto nos seus ordenados. Eu não tenho presente este papel, porque não contava com esta interpellação, mas eu trarei á Camara uma relação destes adiantamentos, e a Camara vera no que isto consiste; isto é objecto de uma importancia muito diminuta, e quasi tudo esta pago. Ha um porteiro áquem morreu a mãi, adiantaram-se-lhe 100$000 réis, deverá 30$000 réis, ou cousa que o valha; a outro porteiro, o ajudante, que tem estado á morte adiantou-se alguma cousa, os primeiros mezes de 47, que se pagarem, liquidam e balançam a sua conta. Tudo isto esta escripturado, e por tudo isto eu me responsabiliso perante a Camara para trazer uma relação exacta destes adiantamentos; e cousa muito insignificante.

Em quanto á escripturação repito novamente que não é possivel desejal-a mais regular; esta por partidas dobradas, e esta em dia, cada oito dias esta no Thesouro o mappa de entrada e de saída, cada mez uma conta regular, cada anno uma conta geral. Esta era a segunda parte da interpellação do nobre Deputado.

Em quanto á primeira, devo dizer, que ha dois empregados que praticam outras funcções em outras repartições publicas; um delles foi ultimamente despachado por mim, é fulano Braz de Oliveira, foi a um concurso, e foi-lhe dada em concurso uma cadeira de substituto na escóla naval. Sr. Presidente, não é possivel que elle renuncie já ao logar do correio, porque estas nomeações fazem-se com a condição de ter um tirocinio de seis mezes, (apoiados) só (indo o qual e que se rivalida a nomeação; e no entanto devo dizer que não existe accumulação incompativel.

Em quanto ao outro empregado, que é o secretario geral do correio, devo dizer que é um optimo empregado; mas se quizerem os nobres Deputados ser tão rigorosos, que a um homem dignissimo, que ha dezanove annos é professor do Lycêo, e que desempenha este cargo com a maior vantagem dos alumnos, que alli vão aprender para adquirirem os preparatorios da Universidade, e de que se espera continuar a tirar as mesmas vantagens, que se lhe tire esse logar, o Governo o fará em obediencia á lei, e á Camara; mas sempre advirto, fallo do secretario do correio, que este homem é dignissimo, que as funcções de secretario do correio as desempenha da maneira mais cabal que se póde desejar; que é um empregado que vai para o correio ás tres horas da tarde, é verdade, mas que passa alli as noites muitas vezes, e os dias sanctos, quando é necessario, de maneira que a escripturação do correio esta sempre em dia, as correspondencias as mais regulares, o registo da melhor maneira que se póde desejar.

Sr. Presidente, tambem conheço a lei das accumulações, em 1834 não tinha então a honra de ser Ministro da Corôa, não sei se sou enganado, mas tenho idéa que o principio da lei era evitar despezas ao Thesouro, era fazer economias; (apoiados) não sei se desaccumulando estes dois empregos, que aliás estão muito bem servidos, se a fazenda economisaria, ou se pelo contrario seria gravada, nomeando-se outro empregado. É verdade que se diz, ha outro principio na lei de occupar o maior numero de pessoas que seja possivel nos empregos publicos; estabelecido este outro principio na lei, então é necessario desaccumular, e chamar gente; mas eu entendo que este principio era absurdo, porque tenho para mim que o interesse publico exige que o serviço publico se faça com o menor numero de empregados, que seja possivel: (apoiados) todos nós que servimos o publico, não quero dizer que somos improductivos, como alguem avança, porque os empregados publicos, ou sejam empregados nos tribunaes, ou empregados de fazenda, ou empregados militares, ou empregados em qualquer outro ramo de administração, em geral o trabalho dos empregados publicos é sempre productivo, porque basta a consideração da manutenção da ordem, para o julgar productivo, sem a qual é impossivel que o lavrador, o artista, e todos os outros que trabalham por sua industria, e seus meios, possam prosperar, (apoiados) Por tanto digo, sem pôr

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em questão que a classe dos empregados publicos é uma classe muito productiva, digo e avanço sem receio de ser contrariado que todos nós que servimos o Estado, somos por assim dizer roubados ao commercio, á agricultura e ás fabricas, e por consequencia entendo que para a boa administração do paiz, seu progresso, seu melhor desenvolvimento, quanto menos soldados houver, quanto menos juizes, menos impregados de Secretarias, tanta mais gente industriosa haverá nos outros ramos, de que resulta a prosperidade do paiz. Dizia eu por tanto, que achava na lei mais rasoavel o principio da economia da fazenda publica, e que esse segundo principio me não parece muito justo: e em quanto á qualidade do individuo, e ao seu serviço, não posso accrescentar outra cousa, se não quer preenche ambos aquelles logares da maneira a mais satisfatoria, e que serve, como já disse, o logar de professor do lyceo, ha 19 annos.

O Sr. Lopes de Lima: — Sr. Presidente, ouvi com toda a attenção a resposta dada por S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, que eu, como V. Ex.ª sabe, não tinha instado que fosse hoje, pelo adiantamento da hora; V. Ex.ª é que me deu a preferencia nesta interpellação; eu não exigi que fosse hoje, ou ficasse para outro dia: mas permitta-me o nobre Ministro que lhe diga, que nenhuma das suas respostas me satisfez; a primeira porque S. Ex.ª asseverou que a repartição da administração geral do Correio dá contas muito regulares, não só mensalmente, mas semanalmente, e que no fim do anno apresenta a sua conta geral com muita legalidade. Assim será, mas então essas contas lá ficaram entre a Secretaria e a repartição do Correio, e não tem vindo á Camara, e é ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros a quem me dirijo a exigir que essas contas venham ao Parlamento, como devem vir; porque eu não vou examinar essas contas ao Correio Geral, nem á Secretaria de S. Ex.ª: o que digo é que admira que havendo tanta regularidade na apresentação dessas contas, ellas não venham no orçamento, no seu logar competente. (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros — As contas do Correio não veem no orçamento, veem á parte, ellas aqui estão, as contas da gerencia.) O Orador. — Mas no relatorio não vem a despeza que eu pedi, e era sobre isto que recaía a minha pergunta; entretanto como S. Ex.ª diz, não sei se se obrigou a trazer aqui essas contas? (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Pois não!) O Orador: — Esse e que é o objecto principal da minha interpellação; e é para então, para quando venham essas contas, que reservo o que tinha a dizer sobre este objecto, porque porem quanto não possuo fazer observação alguma a respeito das explicações que S. Ex.ª deu, bem como a respeito dessas qualidades de adiantamentos; porque lá fóra se exaggera muito; ate se falla de pessoas que não pertencem á repartição, a quem taes adiantamentos se teem feito por ordem superior: e é mesmo para interesse da repartição, e de S. Ex.ª que S. Ex.ª deve esclarecer este negocio: por tanto neste ponto não insistirei mais, ate que S. Ex.ª satisfaça a sua promessa dê vir apresentar estas contas; e então saberei tambem se esta votada, ou não, essa despeza de recompensas; mas isso não é para aqui, é para depois da apresentação dessas contas.

Agora quanto á segunda parte da minha interpellação direi o que me occorrer. A respeito do empregado do Correio, que foi ha pouco nomeado substituto de uma cadeira da escóla naval, o que S. Ex.ª diz é uma verdade, que durante esses 6 mezes que tem de tirocinio, não póde abandonar o logar do Correio, até vêr se fica, ou não, lente daquella cadeira; mas o que me parece é que não póde accumular o subsidio durante esses 6 mezes. Pelo que toca ao outro empregado, que é professor de uma cadeira do lycêo, peço a S. Ex.ª que note que concordo com S. Ex.ª nas boas qualidades desse empregado: consta-me que é um empregado muito probo, e homem muito respeitavel, (apoiados) Sou o primeiro a prestar-lhe este testemunho; porém aqui não se tracta do individuo, tracta-se de executar a lei. (apoiados) S. Ex.ª disse — a Camara decidirá — mas a Camara nada tem a decidir, salvo se quer revogar a lei, que é clara, e não permitte accumular ordenados, seja porque caso fôr; ha só um caso que esta ressalvado que são as gratificações que percebem os militares, quando estão no exercicio de alguma cadeira: porque e preciso saber-se que os militares têem o seu soldo da 3.ª secção, que vencem estando nas suas camas a dormir, e nas suas casas, e que não podem exercer cargo algum sem que tenham uma gratificação, ou maioria de soldos; e por isso é esta a excepção que ha a respeito de militares que regem cadeiras; porque esses têem uma gratificação concedida na lei, além do soldo que é propriedade sua permanente: a respeito dos outros não militares, a lei não faz menção. Não tracto de saber qual foi o principio que se teve em vista: importa-me unicamente a letra da lei, que é muito clara e terminante a este respeito, e que em quanto não fôr alterada, parece-me não ha razão para se invalidar, ou deixar de cumprir. E o mesmo digo a respeito do outro empregado, que tem de exercer aquelle logar durante o tirocinio dos 6 mezes; mas entendo que não póde vencer dois ordenados.

As qualidades que se attribuem ao secretario geral, são constantes: é um empregado muito habil; todavia direi a S. Ex.ª, que apezar da sua vontade em exercer bem as suas funcções, nem sempre as podéra desempenhar com vantagem para o serviço publico; porque o empregado que entra tres horas da tarde para a repartição, (como S. Ex.ª confessou) embora satisfaça á escripturação ordinaria do Correio, de certo não o póde fazer todos os dias, nem podéra, nos dias de correio, abbreviar um expediente como é o daquella repartição, e ha de por isso faltar ao serviço; porque não vale a Compensação do que trabalha de noite, e fóra das horas em que é preciso trabalhar; porque o correio tem de partir a horas certas. Por conseguinte digo, que, em quanto ás contas, espero que S. Ex.ª ha de apresenta-las; quanto aos empregados que accummulam, entendo que a lei deve ser cumprida, e que não póde haver nisto objecção alguma; porque a lei é clara e seja qual fôr o motivo, em quanto não fôr alterada essa disposição, deve cumprir-se. E direi mais, esta Camara faria uma injustiça relativa a respeite de um de seus membros, o qual reconhecendo o preceito irrefragavel da lei, teve a generosidade mui louvavel, de mesmo, em pleno Parlamento, se demittir de uma cadeira que regia, e optar por outro emprego, porque reconheceu, que, em presença da lei, não podia accummular dois vencimentos. Ora se isto se praticou a respeito de um membro do Par-

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lamento, a Cantara, que deu este exemplo, não póde consentir que haja, ou que se dê outro em contrario.

A hora já deu$ não direi mais nada; a Camara tem-me ouvido; e já se vê que a minha interpellação tinha fundamento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Rebello da Silva para a sua interpellação.

Vozes: — Deu a hora.

O Sr. Ministro da Guerra: — Peço a V.ª Ex.ª tenha a bondade de consultar a Camara, sobre se consente em que se prorogue a sessão.

O Sr. Presidente: —.Não ha numero na Sala; mas se o Sr. Deputado quer usar da palavra para a sua interpellação, póde usar della.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, farei duas perguntas ao Sr. Ministro da Guerra; a primeira e, se pelo Ministerio da Guerra se expediu uma portaria em 28 de maio ultimo, sobre o facto acontecido na escóla Polytechnica com os discipulos da primeira cadeira, de não terem concorrido á aula, do que houve uma participação do director da escóla Polytechnica, na qual se diz, que se ignora quem eram os auctores, que impediram que os estudantes entrassem para a aula, e em virtude do que o Governo providenciara, mandando que fôssem excluidos da aula doze individuos, que vem incluidos nesta portaria. Desejava saber tambem se existe alguma lei a este respeito, ou em que principios se funda esta portaria?

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, o simples relatorio do processo em questão, parece-me que satisfará o Sr. Deputado. É uma participação do director da escóla Polytechnica, em que dá parte, que em dado dia os estudantes da primeira cadeira tinham feito uma cousa a que se chamava — fazer parede — não querendo entrar para a aula, nem consentindo que os outros alumnos entrassem; usando até de força com alguns, que intentavam satisfazer aos seus deveres, a ponto de ficarem mallractados. Dizia mais a participação, que apezar das diligencias feitas, não se sabia quem eram os verdadeiros motores desta falla de disciplina, e que julgava que todos eram cumplices neste attentado, á excepção daquelles nomeados, que conseguiram, a muito custo, entrar pára a aula. Já se vê que era necessario um exemplo, para que um tal facto senão repelisse. Na mesma occasião o director da escóla Polytechnica acompanhou a sua participação d'uma relação dos alumnos que frequentavam a primeira cadeira, com as competentes informações sobre o merito, e applicação de cada um dos estudantes, os quaes alguns vinham com anota de — pouco adiantados, e repetição do anno. = E então como pratiquei eu, sendo necessario dar um exemplo? Procurei os menos habilitados, e foram justamente destes, os doze que excluí, e julguei assim ler satisfeito ao meu dever, e cumprido com a disciplina: nem sei que o podesse cumprir melhor, nem fazer de outra fórma.

O Sr. Rebello da Silva: — Sr. Presidente, desde que na Universidade de Coimbra os estudos foram regidos pelo marquez de Pombal, estabeleceu-se, para se obstar ás chamadas — paredes — dos alumnos, o principio, de que todas as vezes que ellas tivessem logar, todos os alumnos seriam suspensos no «urso desse anno, e por isso nunca havia parede. Mas pergunto eu agora, houve parede nestas circumstancias? Não houve, porque este acto não foi acompanhado de todas as circumstancias, que são. precisas para o qualificar como lai, e tanto não houve$ que alguns alumnos tinham entrado para a aula, como se diz n'um paragrafo da propria portaria, que vou ler (leu). Não houve por consequencia parede, tomou-se o ponto. Mas diz o Sr. Ministro, qual foi a razão porque eu obrei da maneira, porque obrei? Foi porque esses individuos eram os menos habilitados. Sr. Presidente, riscar da escóla Polytechnica a carreira de certos individuos, só porque esses individuos, ou pela sua debilidade de engenho, ou porque as suas faculdades intellectuaes lhes não permittem fazer progressos, e lançar-se sobre elles a responsabilidade d'um acontecimento, de que póde muito bem ser não fôssem os motores, é na verdade um principio eminentemente funesto no ensino publico! Diz o Governo — Tambem o director não sabia quem eram os motores, que haviam dado logar ao acontecido — e não obstante não se saber quem eram os motores, o Governo diz — Serão riscados da aula doze alumnos — e é preciso advertir, que não me consta que nenhum tivesse sido maltractado.

Sr. Presidente, eu desejarei que factos desta ordem se não adoptem como principio de ensino, e uma vez que o Sr. Ministro queria dar um exemplo de rigor, devia, ou suspender por um anno a todos os discipulos dessa cadeira, como estava determinado nos estatutos da Universidade de Coimbra, ou então, não applicar a ninguem o castigo, visto que o Sr. Ministro não sabia quem eram os motores desta desordem: não posso por tanto approvar um semilhante principio, porque o julgo eminentemente funesto para o ensino publico.

Agora aproveitarei a occasião para dizer duas palavras ácerca d'um objecto em que toquei ha dias. Ha dias tive a honra de dirigir ao Governo uma interpellação a respeito de ter ou não ter havido algum movimento nas tropas da capital, e o Governo disse que nada havia a semilhante respeito. Quando eu fiz ao Governo esta pergunta, tinha sido informado do facto de que uma portaria, ou circular confidencial se tinha dirigido ao commandante da Indivisão militar, e aos commandantes dos corpos, para terem os soldados em armas, e deitarem grossas patrulhas: eu sei que este facto não era ignorado pelo commandante da 1.ª divisão; tinha-me constado mais que uma diligencia se tinha destinado fazer para os sitios do Caramujo; que esta diligencia se linha quer rido começar por intervenção militar, e que depois passara para a intervenção administrativa: comtudo como o Sr. Ministro affirmou, que não houve taes ordens, S. Ex.ª sabe o que affirma com pleno conhecimento do facto, e a Camara e o Paiz serão juizes, se eu fui bem, ou mal informado.

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, a Gamara e o Paiz serão juizes a respeito do procedimento que eu tive em mandar riscar da 1.ª cadeira da escóla Polytechnica os 12 alumnos. Quando o director da escóla me deu parte do acontecido, disse que tinha prestado toda a attenção possivel para ver se descobria quem eram os motores; que o não podéra verificar, mas que pelas indagações que tinha feito, tinha-lhe resultado a convicção de que se não todos, a maior parte tinham sido cumplices naquelle attentado, excepto aquelles discipulos que ao mesmo tempo elogio porque tinham entrado para

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a escóla. Na mesma occasião referiu o merito de todos os discipulos, e notou aquelles de que não havia esperança nenhuma que satisfizessem aos estudos, pelas repetições e por terem sido já reprovados; foi desses, que havia já a presumpção, ou quasi a certeza de que não podiam ter uma carreira, porque não podiam satisfazer aos seus deveres, que eu mandei riscar os 12, para que se não désse logar a que houvessem faltas de disciplina; e como a escóla Polytechnica não se regula pelos estatutos da Universidade de Coimbra, procedi deste modo, por não ter outro mais conveniente, e entendo que assim cumpri o meu dever.

Quanto á allusão feita pelo Sr. Deputado, de que uma portaria ou circular se expedira ao commandante da divisão, e aos commandantes dos corpos para fazerem ficar os soldados no quartel, responderei, que são destituidas de todo o fundamento as informações que lhe deram, com quanto cada commandante possa fazer dormir os seus subordinados no quartel, porque alli é que é a sua residencia, e a minha é no Caes dos Soldados.

Direi pois que não houve portaria, ou circular alguma ao commandante da divisão militar; que não houve diligencia nenhuma feita para os sitios do Caramujo, nem que tal diligencia se pertendeu fazer, e que não houve movimento nenhum nas tropas, se não o renderem-se as sentinellas ás horas do costume.

O Sr. Presidente: — Eu lembro que, do que se tracta, é a respeito sómente do facto de serem riscados 12 alumnos da escóla Polytechnica, o mais não tem cabimento.

O Sr. Rebello da Silva: — Eu direi unicamente duas palavras. Parece-me impossivel, e admiro-me, como S. Ex.ª o Sr. Ministro da Guerra queira castigar as faltas de capacidade intellectual dos alumnos da mesma maneira, como se castiga uma falta, de disciplina; o que aconteceu, Sr. Presidente, é que a falta de habilitações intellectuaes de um individuo é castigada da mesma fórma que uma falta de disciplina! Isto na verdade é novo! Eu não sei onde o Sr. Ministro foi buscar um semilhante principio, muito mais quando não ha tal parede semilhante cousa não existiu. Por tanto concluo dizendo, que se o Sr. Ministro esta persuadido que obrou muito bem, eu estou persuadido que o Sr. Ministro obrou muito mal.

O Sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje. Está levantada a sessão. — Passava das 5 horas.

O Redactor,

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO.

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