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Discurso que devia ler-se a pag. 119, col. 2.ª, lin. 11 da sessão n.° 15 d’este vol.

O sr. Mendes Leal: — Sr. presidente, declaro que nunca sem sobresalto levanto a voz n’esta casa: hoje porém é muito maior a difficuldade com que o faço, porque se trata de um assumpto extremamente melindroso. Desde já declaro que não pretendo por nenhuma fórma reviver odios, exacerbar antogonismos, ou irritar paixões. Para mim a questão é só de principios e strictamente de principios.

Era eu um dos que tinham pedido a palavra para apoiar a proposta de adiamento, porque entendia que se em tres legislaturas successivas se tinha apresentado este projecto, e em todas tres havia sido adiado, era porque effectivamente existiam, porque não podiam deixar de existir, rasões poderosas para isso. D’esta maneira, n'este sentido, o argumento produzido pelo illustre relator da commissão, que sahe em quanta consideração tenho o seu caracter e talentos, prova exactamente o contrario do que indicou. Effectivamente se em tres parlamentos a questão foi apresentada e em nenhum póde achar solução, necessariamente motivos fortes impediram essa solução; seria fazer uma offensa grave á illustração dos distinctos membros d’aquellas tres legislaturas suppor que, sem inconvenientes graves, a questão senão tivesse já resolvido. Faço estas ponderações unicamente para justificar a rasão porque apoiava o adiamento, o que não pude fazer por me não ler chegado a palavra.

Limitar-me-hei agora ao assumpto. Longe de mim, repito, querer resuscitar os rancores politicos, porque são elles o maior flagello que podem dilacerar um paiz; longe de mim avivar as causas que originaram os movimentos anómalos d'onde saíram estes inconvenientes. Taes movimentos nasceram, não tanto de idéas, não tanto de sentimentos, como desgraçadamente de epithetos.

Sobre essas lutas que» ensanguentaram os campos de batalha, em que para dor maior se fallava a mesma lingua, não caiu só o véu do esquecimento, desceu a benevolencia de todos os partidos. Não alludirei pois nem á junta no Porto, nem áquelles que da parte do governo legal se lhe opposeram. Hoje todos os animos se acham congraçados e accordes n'um intuito que deve absorver todos os intuitos, no intuito mais santo e mais justo, o bem do paiz. (Apoiados.) Mais do que nunca precisa o paiz de um só coração e de um só braço. Entibiar o coração, afrouxar o braço, seria mais do que intempestivo, seria impio e sacrilego. (Apoiados.)

E porventura, o projecto de que estamos tratando, não poderá fazer reviver essas paixões que todos desejâmos ver extinctas? Entrego á intelligencia da camara a solução d'esta pergunta. Estão presentes muitos membros d'esta legislatura que o foram das anteriores. Mettam esses a mão na consciencia francamente, e poderão dizer perante o paiz se não ha fundamento plausivel n'este meu receio.

Trata-se de uma classe prejudicada. Declaro que votaria, não sómente com prazer, mas com alvoroço, todos quantos meios se podessem rasoavelmente lembrar para desfazer os prejuizos d'essa classe, para a indemnisar e compensar quanto fosse possivel, mas não com prejuizos novos para outros, mas não pelo meio proposto n’este projecto, que reputo indisciplinar para o exercito, e ainda mais prejudicial para a sociedade.

Poderia tambem aqui invocar a questão de numero. Ouço dizer, e para este ponto chamo a especial attenção da commissão que mais tem examinado estes negocios, e por consequencia melhor nos póde esclarecer; ouço dizer, repito, que ha de um lado oitenta officiaes que por este projecto são favorecidos, e oitocentos que por elle são lesados. Não sei se isto é verdade. Se o é, pergunto: d'este desequilibrio de numero não poderão resultar graves perturbações? Poderá, em consequencia de tal desequilibrio, reputar-se a sociedade em perfeita segurança? Sei que se podem apresentar precedentes. Deploro que os haja, venham de onde vierem.

Entendo que o dever da força militar é, primeiro que tudo, a observancia fiel do juramento á sua bandeira. Entendo mais que, seja qual for a situação individual, que muito conscienciosamente leve os individuos a seguirem mais o impulso da sua opinião do que o dever stricto contrahido para com a sociedade; entendo mais, digo, que seja qual for essa situação individual, o militar em serviço não póde, não deve lembrar-se senão daquelle juramento, que não póde ser senão um.

N’este ponto não vejo pessoas, ainda que eu tenha, como tenho, para com ellas a mais alta consideração. Peço de novo á camara que não queira achar nas minhas palavras nenhum motivo de interesse pessoal ou partidario; que não procure senão o amor do justo, e o desejo de que, de uma vez para sempre, se extingam os odios politicos. (Apoiados.)

Não entreterei longamente a attenção da camara sobre um assumpto, em que naturalmente as opiniões estão formadas; devo só dizer que em mim a consciencia do que tenho exposto é inabalavel. Abster-me-hei das comparações com factos analogos ou similhantes, porque no estudo da nossa historia contemporanea, desde muitos annos, não tenho encontrado precedentes que se possam invocar senão para mais entenebrecer o quadro. Declaro portanto que não posso votar pela indemnisação consignada no projecto em discussão.

N'um assumpto d'esta importancia insistirei ainda; desejaria ouvir as elevadas capacidades, as illustrações que se acham dentro d’este recinto ha muitas legislaturas, e que podem, que hão de ler estudado profundamente um negocio de tanto alcance. Pedir-lhes-ia pois que, com a sua palavra auctorisada, illustrassem esta camara a respeito d’esses precedentes que outros invocam, e que tem acompanhado a apresentação successiva d’este projecto; porque, pondere-se bem, tal projecto não é de hoje, foi renovada a sua iniciativa por pessoas muito conspicuas, mas a sua verdadeira data é muito anterior, é de 1852. De 1852 até hoje forçosamente os caracteres parlamentares, que fizeram parte das diversas legislaturas, terão procedido a investigações graves sobre as rasões de direito e sobre as rasões de politica que militam pro e contra; lerão ainda mais avaliado de perto os perigos que resultariam da sua adopção, e o conselho de taes caracteres seria muito para ouvir. O testemunho de cavalheiros Ião illustrados o versados n'um assumpto d’estes, tão experientes e cordatos em todos, seria por extremo valioso: eu pelo menos careceria muito dos seus pareceres.

Se n'isto ha questão politica, só póde ser uma: saber se effectivamente da approvação d'este parecer e d’este projecto, não resultam, como já disse, justamente os perigos que se querem evitar, isto é, a perpetuarão de rivalidades que podem ser altamente perigosas. Eis o que eu peço á camara que pondere com toda a sizudez de que é capaz, com todo o bom senso que lhe reconheço. Pedirei mais, instarei para que trate de fugir a escolhos que não tenham sido previstos, ou que, lendo sido previstos, não tenham sido devidamente medidos e avaliados.

Cometei dizendo que era este um assumpto de sua natureza extremamente melindroso. Creio que nas poucas palavras que proferi, procurei em tudo poupar as susceptibilidades dos diversos lados da camara. Mas assim como eu não pediria aos illustres membros da commissão, nem aos mais cavalheiros que se interessam pelo projecto, uma abstenção de suas crenças politicas, tambem, e da mesma fórma, não posso estar em opposição com os principios que tenho sempre professado, que professo ainda hoje e espero continuar a professar.

Entendo, e nunca me cansarei de repeti-lo, que a obediencia passiva da forra armada é a base da segurança do estado. O não cumprimento d’este preceito é uma cousa sobre que senão podem fazer concessões. Seja qual for a generosidade de intenções que presidiu á confecção do parecer, a maneira por que se acha exarado é uma excepção grave feita