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RECTIFICAÇÃO
No Diario n.° 189, a pag. 2368, lin. 58, onde se diz = que foi approvada a proposta do sr. Pulido para se permittir a introducção de farinha = deve ler-se = que foi approvada a proposta de sr. D. José de Alarcão, que exclue a introducção da farinha, ficando prejudicada a do sr. Pulido, que admittia a farinha. =
Discurso do sr. Vaz Preto, pronunciado na sessão de 20 de agosto, e que devia ler-se a pag. 2365, 2.ª col, lin. 50
O sr. Vaz Preto: — O modo inexacto e improprio com que pareceu ter sido atacada alminha honra e, como deputado, offendida a minha dignidade, compelliu-me a pedir a palavra por varias vezes para me explicar, o que não pude conguir, nem sequer que se propozesse o meu requerimento á votação da camara. O meu direito offendido encontrou porém em V. ex.ª, que tem presidido dignamente a esta assembléa (apoiados), um juiz imparcial, que não teve duvida de submetter esse requerimento á decisão da camara, a qual igualmente me fez justiça, concedendo-me a palavra para em seguida á discussão do Orçamento, se bem que entendesse depois que medidas mais urgentes e de maior necessidade deviam ser expedidas primeiro, em virtude do que me retirou a palavra para me ser concedida em occasião opportuna, o que finalmente teve hoje logar.
Não posso pois deixar de agradecer a V. ex.ª e á camara a benevolencia e respeito que tiveram para com os meus direitos parlamentares offendidos, com quanto entenda que apenas um deputado for atacado na sua honra e dignidade deve conceder-se-lhe a palavra para que se explique sem demora. Acato e respeito comtudo as decisões da camara, e muito principalmente porque hoje fallarei com todo o socego de espirito e completa tranquillidade, e sem que ninguem possa impedir que eu restabeleça os factos.
Eu, usando do mandato que me foi conferido, pedi por varias vezes ao governo que desse providencias tendentes a estorvar os factos funestos do vigario geral de Castello Branco; mas mal sabia que, quando fallava em geral, em desempenho do meu dever havia de ser obrigado a descer a especialidades!...
Seja assim muito embora. A questão reduz-se simplesmente a saber, se os factos que asseverei, são ou não verdadeiros, e se os documentos que apresentei para comprovar esses factos, têem ou não valor.
Isto era o que convinha discutir, mas foi com bastante admiração minha que vi erguer-se o sr. deputado por Castello Branco para combater n'outro campo, discutindo actos publicos da minha vida, os particulares, e até os da minha familia!...
Estimo muito que me trouxesse para esse campo, porque estou sempre prompto a aceitar o combate no terreno que se me offerecer. É para mim de summa satisfação que o nobre deputado queira discutir todos os actos da minha vida, e de qualquer membro da minha familia, porque todos nós podemos com a fronte erguida olhar para traz, sem que o mais leve rubor nos possa subir ás faces. E eu preso muito o lustre, os serviços, a dignidade e decoro da minha familia desde longos annos, para que não cuide seriamente em o conservar n'uma serie não interrompida.
O sr. deputado, a que me refiro, o sr. Augusto Xavier, no calor da discussão soltou expressões menos exactas (de que estava talvez convencido), e por isso espero que s. ex.ª rectificará os factos; o que não poderá sem duvida deixar de fazer depois de ouvir a minha narração fiel, que ninguem contestará e muito menos s. ex.ª, que se tem sempre achado envolvido nas eleições d'aquelle districto.
Antes porém de descer á apreciação dos acontecimentos eleitoraes, não deixarei de estranhar o modo de argumentar do sr. Augusto Xavier, que, querendo defender o vigario geral e algumas auctoridades de Castello Branco, disse que tudo quanto eu tinha proferido n'esta casa era devido sem duvida á paixão nascida das derrotas eleitoraes.
É necessario que eu pondere ao nobre deputado, e que s. ex.ª se convença d'isto, que se quizer entrar no fôro interno de cada um, dá direito a todos de lhe devassarem a sua consciencia e os seus actos mais intimos, e a mim de lhe dizer que não me avalie por s. ex.ª
Eu entendo, e todos devemos estar firmes n'este principio, que as intenções de cada um devem ser respeitadas, e que os seus erros são filhos do entendimento e não da vontade. Avaliem-se muito embora os actos externos que devem exprimir realmente os internos, mas respeitemos mutuamente os nossos direitos, dignidade e posições.
De outra fórma os actos externos de s. ex.ª serão tampem avaliados conjuntamente com a sua consciencia e intenções; e esse desfavor que lança sobre o seu collega lhe Bera enviado de retorno depois das observações competentes.
Se sou severo de mais, é porque me recinto ainda de o nobre deputado querer entrar nos motivos determinados das minhas acções, e n'esse caso é do meu dever responder-lhe vigorosamente.
Eu olhei sempre o bem publico acima de considerações mesquinhas e pequenas, pondo de parte todas as questões pessoaes, como attestam os actos da minha vida; e supponho que o illustre deputado estará tambem inspirado do zêlo e amor publico, e advoga os interesses dos seus constituintes incessantemente. Mas se deseja que lhe façam essa justiça é mister que considere nos outros iguaes sentimentos e iguaes desejos, e acredite que elles são defensores da sua dignidade e honra como s. ex.ª deve ser da sua.
Eis o que disse o sr. Augusto Xavier: «Que a rasão por que eu atacava tão violentamente b vigario geral e algumas auctoridades do districto de Castello Branco, era porque quatro vezes me tinha proposto para deputado por aquelle districto, sem que nunca podesse conseguir o meu fim, excepto a ultima vez, que fui proposto pelo governo».
Esta asserção é completamente falsa e errada; porque não me tenho proposto quatro vezes, mas sómente duas.
A primeira vez que (segundo o illustre deputado) me propuz foi em 1856, exactamente quando tambem pela primeira vez o nobre deputado saíra eleito por Castello Branco.
Em 1856 estava eu em Lisboa, onde tinha vindo em companhia de meu pae tratar de um negocio importante, a minha restituição á universidade, pois por uma sentença injusta e arbitraria havia sido riscado, e não queria voltar mais ali emquanto não se me desse uma completa reparação, o que consegui, recusando amnistia, e por um decreto baseado em uma consulta do conselho d'estado se fizeram respeitar os meus direitos.
Estes escrupulos tinha eu para que nunca me lançassem em rosto esse acto como falta grande quando entrasse na vida publica.
O nobre deputado sabe que foi então que tomei relações com s. ex.ª, que andava afflicto e desconfiado da sua eleição, por não conhecer ainda o districto; e n'essa occasião não podia eu ser deputado, não só porque não tinha habilitações litterarias, mas nem estava recenseado, porque não tinha o censo. S. ex.ª ha de estar lembrado de que, a pedido seu, escrevi ás pessoas da minha amisade rogando-lhes que trabalhassem a favor da eleição do nobre deputado, porque poderia fazer talvez serviços ao districto, emquanto os seus esforços a meu respeito eram baldados, porque não podia á face da lei ser eleito.
Já vê pois que em 1856 não me podia propôr. Ahi está o sr. Aragão Mascarenhas, que era governador civil do districto, que não deixará de comprovar isto mesmo que digo. E se obtive uma manifestação n'essa epocha foi porque o meu nome tinha algumas sympathias e eu alguma influencia.
Rectificarei tambem um facto que se deu n'essas eleições, e que o sr. deputado apresentou com ar de triumpho para provar a influencia dos seus amigos.
Disse o sr. Augusto Xavier que a influencia dos seus amigos era tal, que em 1856 riscavam um nome da lista do governo e substituiram-n'o por outro, fazendo em vinte e quatro horas com que a votação mudasse toda.
Esse facto diz respeito a meu pae, e eu quereria que o illustre deputado o narrasse com todas as circumstancias que o acompanharam.
Meu pae declarou pela imprensa que não aceitava a candidatura, escreveu a esses amigos de s. ex.ª que então tambem se diziam seus amigos, e pediu á opposição que riscasse da lista o seu nome. S. ex.ª sabe o resto; sabe o modo e os meios que se empregaram: por uma parte trabalharam com todo o affinco, emquanto meu pae se conservava estranho a tudo.
Não quero com isto dizer que meu pae saísse deputado se o quizesse ser; mas o que posso assegurar é que n'aquelle tempo nem s. ex.ª nem pessoa alguma poderia fazer triumphar a sua candidatura a não ser proposta pelo governo, porque as eleições eram feitas por circulos grandes, o districto era extensíssimo, e era difficil combinar e unir as influencias, ao passo que o governo tinha um centro e estava completamente organisado. Por esse systema, desengane-se o nobre deputado, os eleitos haviam de ser sempre quem o governo quizesse, por mais desconhecidos e antypathicos que fossem os nomes recommendados
A segunda vez, que o sr. deputado disse que me propuz, foi em 1858.
Como imagina s. ex.ª que eu, que fui eleito agora unanimemente não podesse obter n'essa occasião um só voto? Equivocou-se sem duvida ainda o nobre deputado, tão grande era o desejo de mostrar a minha impopularidade.
Saiba pois s. ex.ª, que não me propuz senão duas vezes, que saí deputado em uma, e se o não saí na outra foi porque não quiz, nem quereria nunca, a não ser por meios muito dignos e honrosos para mim.
A primeira vez que com effeito me propuz foi o anno passado, porque a influencia do governo podia ser combatida, visto serem os circulos eleitoraes de um só deputado.
A minha eleição foi combatida por todos os meios, e o sr. Augusto Xavier, que apoiava decididamente o governo, que todos julgavam forte, não se poupou a esforços para me guerrear a todo o transe. S. ex.ª sabe como trabalhou: poder-se-ía até dizer que o illustre deputado foi quem dirigiu a eleição por parte do governo n'aquelle districto, e fez com que se propozesse um cavalheiro que julgava poder vencer a eleição e derrotar-me; comtudo eu vence-la-ia no primeiro escrutinio se não fosse o desejar o concelho de Penamacor ter um deputado da sua localidade, porque em virtude. d'isso ninguem pôde obter o numero de votos sufficientes para ser então eleito.
O cavalheiro d'aquelle districto a quem depois cedi Os meus votos venceu a eleição. Mas, sr. presidente, acredite V. ex.ª e a camara que se eu quizesse ser deputado era-o; porque esse cavalheiro, que o sr. Augusto Xavier protegia, e era proposto pelo governo, mandou a minha casa uma deputação, pedindo-me que, no segundo escrutinio, consentisse que o meu nome fosse votado por elle e pelos seus amigos: e esses votos conjuntamente com os que eu tinha obtido, davam-me seguramente uma maioria consideravel. E sabe V. ex.ª e a camara qual foi a minha resposta? Que não aceitava senão o que fosse muito digno e airoso para mim, e que nunca seria cousa alguma na vida publica por outros meios, que não fossem estes. Apoiei pois o escolhido por Penamacor, e os votos de que eu podia dispor deram-lhe a eleição contra os desejos, esforços e trabalho do sr. Augusto Xavier.
A segunda vez que me propuz foi este 'anno...
(Interrupção do sr. Pinto de Almeida, que não se percebeu.)
Peço ao nobre deputado que não queira tolher-me a palavra que me custou a alcançar. Estou fallando com toda a urbanidade. Timbro sempre em ser delicado para com os meus collegas e em lhes respeitar os seus direitos; e espero que o nobre deputado o seja igualmente comigo.
A segunda vez que me propuz, digo, foi este anno; e o sr. Augusto Xavier, ligado completamente ao governo (segundo o seu costume), soube perfeitamente o que se passou n'aquelle districto.
Fizeram-se altas diligencias para que se propozesse esse mesmo cavalheiro, que o anno passado havia sido proposto pelo governo, escreveu-se-lhe mesmo por parte do governo convidando-o a aceitar a candidatura, e s. ex.ª não insistiu pouco. Estou convencido de que esse mesmo cavalheiro é o primeiro que não terá duvida em todas as vezes que o chamem á autoria declarar que assim aconteceu, e que elle respondêra que não aceitava a candidatura por aquelle circulo, por não querer soffrer uma derrota, e se o governo tivesse empenho em o ver eleito, que o propozesse por outro circulo mais seguro. Isto foi-me certificado por pessoa da -sua propria familia.
Por consequencia não era a mim que o governo propunha, nem tão pouco era a meu favor que s. ex.ª trabalhava. Pelo contrario, a guerra que me fazia era tal que eu escrevi duas cartas ao sr. Sant’Anna e Vasconcellos, amigo meu e intimo do governo, dizendo-lhe: «Que não sabia a rasão porque o governo me guerreava tão atrozmente, e que com isto não pedia a sua protecção, não a queria, nem carecia d'ella». Foi isto o que escrevi ao sr. Sant’Anna e Vasconcellos, e que elle pôde attestar.
Depois alguns srs. deputados que têem saído eleitos por aquelle districto, os srs. Miguel Osorio e Aragão Mascarenhas, escreveram, pedindo a protecção das pessoas influentes a favor do sr. Sebastião de Castro Guedes. Não era inda eu o proposto pelo governo!
O sr. Miguel Osorio: — Eu não escrevi. Sou alheio a esse negocio..
O Orador: — Parecia-me que sim; mas como s. ex.ª diz que não, é quanto basta.
A carta do sr. Aragão vi eu; e dizia — que o sr. ministro da fazenda se empenhava por esse senhor, tendo escripto ás auctoridades de Castello Branco.
Por ultimo pretendia-se fazer eleger por ali o sr. Costa Xavier, que chegou a pedir cartas n'esse sentido; e desistiu perante as grandes difficuldades que não podia por certo vencer.
Eis aqui a historia fiel do que se passou.
O nobre deputado diz que eu fui proposto pelo governo. Concordo com isso se me mostrar por um unico documento, que a auctoridade superior do districto me recommendou como tal.
Se o governo recommendou o meu nome, porque não fez outro tanto a auctoridade que dirigia as eleições? Se fui proposto pelo governo deviam todas as auctoridades ter recommendações n'esse sentido. Em quanto ao administrador do concelho de Idanha, confessa o proprio sr. deputado, que esteve contra mim; e em quanto ás outras auctoridades, peço-lhe que apresente um só documento que prove, que uma só dellas tivesse uma unica recommendação do chefe do districto a favor da minha eleição. Desde o momento em que apresentar um só documento, então acreditarei que fui proposto pelo governo.
E tanto o governo não apoiava, nem desejava a minha eleição, que o administrador do concelho de Penamacor, cujo saber, talento, habilitações e serviços... (O sr. Pinto d'Albuquerque: — E virtudes) e virtudes, porque era meu amigo e se havia entendido com a auctoridade superior do districto, como a sua honra lhe exigia, expondo-lhe a vontade dó concelho, ainda hoje se conserva administrador interino, sem poder sequer obter aquelle insignificante logar de propriedade. E assim que o governo desejava e queria a minha eleição!!!
Se o governo apoiava a minha eleição, porque não havia de confirmar um mancebo cheio de talento, esperanças e habilitações? Qual a rasão por que ainda não foi confirmado?
Ou o governo me recommendou e as auctoridades desobedeceram, ou não. No primeiro caso as auctoridades deviam ser demittidas, porque não cumpriram com o seu dever; e ellas conservam-se ainda, sem que o governo nada fizesse. No segundo caso não tenho nada que agradecer ao governo. E tanto n'um como "n'outro caso não fui candidato ministerial.
O sr. Augusto Xavier apresentou ainda a sua pessoa como modelo, como typo, e disse que a sua eleição tem sido sempre unanime. Sem querer ferir o modelo ou o typo direi só que a unanimidade póde significar ou influencia real, ou abandono da urna por qualquer motivo, a influencia até esse 'ponto é impossivel, e portanto o que significa é a segunda cousa; e assim tem sido, porque quem o podia guerrear, vendo a impossibilidade em virtude do poder do governo no concelho de Castello Branco, tem abandonado a eleição, o mesmo que o governo fez comigo em Idanha..
O que tenho tambem a "notar ao nobre deputado é que soltou uma expressão inexacta = que eu o linha ameaçado