O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 43

(43)

SESSÃO DE 11 DE FEVEREIRO.

Faltando um quarto para a uma hora tomou a cadeira o Sr. Vice-Presidente, e procedendo logo o Sr. Secretario Barão de Alcobaça a fazer a chamada, verificou estarem presentes 29 Dignos Pares, faltando, além dos que ainda não compareceram, os Srs. Duque de Palmella, por molestia, Duque da Terceira, por motivos de serviço, Sotto Maior, com licença da Camara; e Marquez de Ficalho, Conde de Farrobo, e Macedo.

O Sr. Vice-Presidente declarou aberta a Sessão, e a acta da precedente, pelo Sr. Secretario Conde Lumiares, foi approvada sem reclamação.

6*

Página 44

(44)

O Sr. Vice-Presidente: — Hontem ao meio dia foi recebida no Paço das Necessidades, a Deputação encarregada de levar á Real Sancção os dois Decretos das Côrtes, sobre as Viuvas dos Militares, e sobre a reforma da Alfandega do Funchal, os quaes eu depositei na Mão de Sua Magestade; sendo a Deputação recebida pela Mesma Augusta Senhora, com a sua natural affabilidade, e com as ceremonias do estilo.

Ficou n Camara inteirada.

O Sr. Secretario Barão de Alcobaça, leu uma Representação da Camara Municipal da Villa de Montemor o Velho, pedindo a extincção dos Juizes Ordinarios, e ficar a mesma Villa sendo Cabeça de Comarca. — Mandou-se para o Archivo afim de ser opportunamente tomada um consideração.

Passando-se á Ordem do Dia, teve a palavra a Commissão encarregada da Redacção do Diario, e em nome della, apresentou o Sr. Sarmento o seguinte

PARECER.

A Commissão encarregada da Redação do Diario desta Camara, é de parecer, em cumprimento do que se lhe incumbio na Sessão do dia 9 deste mez; primeiro, que em quanto se não estabelece um Regimento, para publicação regular das Sessões da Camara, se tome interinamente a medida de ficar esta mesma Commissão authorisada para mandar imprimir em addição ás Actas das Sessões, todos aquelles extractos das fallas dos Dignos Pares, que se poderem decifrar das notas Tachigraphicas com exactidão e brevidade; segundo, que a referida Commissão possa exigir dos Dignos Pares os esclarecimentos necessarios afim de que suas fallas, e observações pronunciadas se publiquem d'uma maneira clara, e segundo foram anunciadas; terceiro, que a Secretaria dê á mesma Commissão todo o auxilio para o melhor desempenho desta incumbencia; quarto, que da Imprensa se remettam á Commissão aquelles exemplares destinados para serem distribuidos pelos Dignos Pares, e Srs. Deputados da Nação Portugueza, ficando a cargo da Repartição Administrativa da Imprença Nacional, o destino dos exemplares que sobrarem, como objecto pertencente á Fazenda Publica, para ser administrado segundo o regulamento deste estabelecimento Nacional; quinto, que se communique ao Governo esta providencia interina, e de Regimento interno. Palacio das Côrtes, 10 de Fevereiro de 1835. — Conde de Lumiares, Par do Reino. = D. Filippe de Sousa Holstein, Par do Reino. = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento, Par do Reino.

Foi approvado.

Passando-se á Ordem do Dia, entrou em discussão o Projecto de Resposta ao Discurso Real de Abertura. (V. pag. 26.)

O Sr. Vice-Presidente: — Os assumptos desta Resposta são tão variados que não é possivel discutir-se em geral, por conseguinte, tratar-se ha separadamente cada um dos seus paragrafos. — Está em discussão o 1.º

Não se fazendo observação alguma sobre elle, nem sobre o 2.º foram ambos approvados como estavam.

Entrou em discussão o §. 3.º a respeito do qual disse

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não posso deixar de propôr uma Substituição a este paragrafo; e a razão é por não ser verdade o que nelle se diz. Ha Povoações onde se estão commettendo mortes, perseguições, e attaques ás casas; toda a gente sabe que isto é devido, em grande parte, ao desleixo das Authoridades que se mandaram para as Provincias; no Alemtejo, e na Beira particularmente ha uma especie de Guerra Civil de que as Authoridades não fazem caso: ha homens que andam attacando as casas; e Moimenta da Beira até tem imposto contribuições, e ninguem os prende nem castiga; por tanto isto não é ordem, nem tranquilidade, e por tanto é falso quanto diz o paragrafo: por isso proponho a seguinte

SUBSTITUIÇÃO.

Sendo muito para sentir que a Ordem Publica se não tenha totalmente restabelecido, continuando os assassinatos, e perseguições; o que só póde ser attribuido á falta de energia do Governo, e á má escolha de seus Empregados. = Conde da Taipa = Marquez de Loulé = Marquez de Ponte de Lima = Marquez de Fronteira = Conde da Cunha.

O Sr. Girão: — Ainda que fosse verdade o que acaba de dizer o Digno Par, o paragrafo estava muito bem concebido, mas eu fiquei maravilhado do que ouvi e que se diz acontece nas Provincias; quando as noticias que eu tenho são exactamente o contrario. O que ha pelas Provincias, são alguns Ladrões, mas isto é o resultado das guerras civis, e em todas as Nações acontece o mesmo; por isso o que acabou de dizer o Digno Par surpreendeu-me, e muito porque não apresentou as provas, e então é uma asserção gratuita, e não sei se bem fundada, mesmo quando fosse verdadeira; pois que o paragrafo está muito bem redegido a meu ver: diz assim: (leu) Não diz que estão inteiramente quietas e socegadas, diz sim que se vão aquietando; portanto, ainda quando fosse exacto o que disse o Digno Par, não era necessario usar de outras frazes. Por consequencia voto pelo paragrafo tal como está, e não pela substituição offerecida.

O Sr. Conde da Cunha: — Eu assignei a emenda que se propoz, porque estou certo dos factos que referiu o Digno Par Conde da Taipa, e por que além daquelles, ainda hontem recebi uma carta em que me dizem assassinaram um Cavalheiro José Maria de Gamboa, na Oliveirinha, districto de Villa de Taboa de que sou Donatario. Em Louzada assassinaram dois Padres etc. Eu poderia apresentar esta carta; não o julgo necessario, nem a tenho aqui, mas se fôr perciso, a demora é só em quanto mando a minha casa.

O Sr. Visconde da Serra, do Pilar: — É perciso fazer differença de agitações miguelistas, e do resultado de miseria em que muitas vezes se acham homens sem meios, que por isso se propõem a roubar; e é talvez o que acontece agora que se acabou uma guerra civil. Em tempos muito mais favoraveis commandava eu no Alemtejo um Regimento de Cavallaria, e passava muitas vezes um mez, sem fazer um exercicio, porque tinha o Regimento espalhado a perseguir Ladrões; por tanto deve fazer-se differença das agitações de que fallei, e de roubos: a guerra que

Página 45

(45)

acabou destruiu tudo a muitos homens que se vêem sem meios, elles não hão de morrer de fome, e roubão: estas são talvez as desordens que ha, porque outras não se mettem na cabeça de ninguem.

O Sr. Marquez de Loulé: — Os Dignos Pares que tem fallado do outro lado da Camara, que entraram nesta discussão, tem confessado que existem agitações, desordens, e roubos, e que o socego publico tem sido completamente alterado, pois tem havido assassinatos. O Digno Par Conde da Cunha acabou de referir alguns; e eu tambem sei de outro que aconteceu em Moura, o do Padre Xavier, é um facto que chegou ao meu conhecimento porque elle tratava ali de negocios meus. Além destes acontecimentos todo o mundo sabe que a Ordem publica não está restabelecida, e isto porque tem havido alguma negligencia da parte das Authoridades: não sendo pois exacto o que diz o paragrafo, peço ao menos que se elimine.

O Sr. Conde da Cunha: — Se é necessario, eu mando a minha casa buscar a carta a que me referi.

O Sr. Souza Holstein: — Para sustentar o artigo da Commissão basta ver que elle diz, que se vão em parte aquietando as desordens etc. Se a Commissão confirmasse que estavam de todo aquietados, então tinham logar as reflexões do Digno Par, mas dizendo que vão sendo menos frequentes as agitações creio que diz a verdade; tanto mais que estas agitações não se podem chamar discordias politicas; são originadas de Soldados licenciados e pessoas costumadas a viver de rapina, que actualmente se acham sem meios de subsistencia. Entre tanto repito que no paragrafo se diz o que existe, e por isto deve approvar-se como está.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Ademira-me que haja nesta Camara quem ponha em duvida que ha agitações populares nas Provincias do Reino, depois do que se tem dito a este respeito, e que é notorio a todos, e por isso creio não pode entrar em duvida. Nunca esperei tambem ver nesta Camara fazer o elogio do roubo, seja qual fôr o motivo, ha nelle sempre um acto criminoso.

O Sr. Souza Holstein: — Eu desejava saber quem é que fez o elogio do roubo,

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Como eu fallei nos roubos, e fiz a differença entre estes, e agitações Militares; peço a V. Exc.ª que proponha ao Digno Par, se se refere a mim. Devo fazer uma declaração: os Soldados de que fallei, não são os que estão com licença; são os que foram do Exercito de D. Miguel.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Eu pensava que o Digno Par que se assenta d'aquelle lado da Camara, quando apresentou uma emenda contra este paragrafo, mostraria que havia algum facto mais do que roubos ou assassinatos; porque só assim se poderia provar evidentemente que havia uma agitação politica; e porque estou certo que então não só o Governo, mas todos os amantes da Carta concorreriam para a comprimir: entre tanto não tem existido esta agitação como a querem representar; na Capital tambem tem havido alguns assassinatos, que todos deploram, e que felizmente tem cessado; mas não se pode dizer que fosse uma agitação politica; alguns individuos inexpertos foram presos, e depois absolvidos; mas isso pertence inteiramente ao Poder Judicial. Todos nós nos lembramos (ao menos eu, que tenho bastante idade para isso) que antes de ser organisada a Guarda da Policia, (de que eu não tenho saudades), na Capital houver muitos assassinos, e roubos, e não se pensava em agitação politica. Os roubos que tem havido agora: nas Provincias, procedem de haverem muitos Soldados licenciados, que acostumados a uma vida irregular, e ás violencias que praticavam os miguelistas, as julgam poder praticar da mesma maneira. Por tanto approvo o artigo como elle se acha redigi lo; e repprovo a emenda, porque é uma d'aquellas muitas accusações vagas, que me faz lembrar uma frase d'um Orador da Assembléa Constituinte, quando disse que = Toute accusation vague est l'invention du Tyran.

O Sr. Conde da Taipa: — Ninguem fallou aqui dos roubos que se fazem pelas estradas, foi das agitações que ha pelos Povos. Eu pergunto ao Digno Par se elle não tem noticia do que tem acontecido em Beja; se não sabe o que tem havido em Villa Nova de Foscôa, e no Algarve; será isto, declamações vagas? Porem como se imprime o que nós aqui dizemos, o Publico ajuizará imparcialmente entre uma, e outra opinião. O Digno Par o Sr. Conde da Cunha já referiu alguns factos verdadeiros, e outros muitos ha que todos sabem, e então para que havemos nós ir mentir á RAINHA, e dizer que se vão aquietando as agitações, quando nós não as vemos aquietar? Eu desejo que tal se não diga: ao menos não será pelo meu voto, que o paragrafo ha de ir á RAINHA: mostrando-lhe que a Camara se persuade de uma cousa que não é assim; quando contra ella ha factos que ninguem ignora. Quem ha que ignore o que tem acontecido em Evora, e na Beira? Em Moimenta foi assassinado um Cavalheiro, com dez ou doze facadas; e dirá ainda alguem que isto são declamações vagas? Por tanto eu não posso deixar de sustentar, e pedir á Camara que sustente a minha substituição.

O Sr. Sarmento: — Eu não tenho dúvida em approvar o artigo tal como está; nem creio que haja a culpa, que se possa attribuir ao Governo: elle tem posto em pratica os meios, que estão ao seu alcance. — Agora porém verão os Jurados quando julgarem, as difficuldades em que se achavam antigamente os Desembargadores, e então elles se verão obrigados a tornarem-se tambem Desembargadores. Não é por falta de intelligencia, mas por falta da ordem que ainda não está de todo restabelecida em Portugal, nem se poderá por muito tempo restabelecer. Os horrores praticados no tempo da usurpação não podem esquecer tão de prompto. Sem deferir innumeraveis factos atrozes, e irregulares, viu-se na Praça de Almeida mandar-se pranchar um Clerigo (o Padre Lima, Reitor de Oliveira do Douro), cousa que nunca aconteceu em tempo algum em Portugal, só porque era liberal; nem o Nuncio, nem authoridade ecclesiastica se oppoz a taes arbitrariedades, e despotismos do governo usurpador. Depois de uma perseguição tal, é impossivel que não hajam reacções muito fortes; para as evitar era preciso uma força, que o Governo não póde ter por ora, mas que irá adquirindo progressivamente pois não se póde conseguir de repente. A

Página 46

(46)

nossa attenção porém não está neste debate chamada para um Projecto de Lei; estamos examinando um papel em o qual e preciso salvar o respeito que devemos ter com o Throno; e por este motivo apoio os termos, em que elle está escrito.

O Sr. Marquez de Loulé: — Longe de mim a idéa de faltar ao respeito devido ao Throno, e á RAINHA. — Talvez a emenda que eu assinei não esteja em estudo de merecer a attenção da Camara; mas o que eu desejaria era que na Resposta se não fallasse á RAINHA em uma linguagem pouco exacta. A Commissão diz que deve haver regosijo pelo estado das cousas, e eu digo que deve haver lastima. Os factos apontados são bem sabidos de todos, e eu vou apontar um que o Governo deve saber. — Ha poucos tempos foi a Extremoz um Agente do Governo Francez para examinar alguma cousa relativo a lãs, sobre melhoramento de lavagem, ou sobre a criação do gado lanigero: chegou a Extremoz, foi apresentar-se ao Prefeito, e por uma mera civilidade foi a casa do Governador Militar, e como o não achou deixou-lhe uma carta de visita: o Governador Militar, veio para casa, e mandou-o chamar, perguntando-lhe qual tinha sido a razão porque não havia esperado por elle, e então depois de ouvir o Francez mandou-o metter na cadêa. Um Secretario, não sei de que Prefeitura, porque se não apresentou ao Governador Militar tambem foi preso. Ora isto, que são, senão perturbações da Ordem Publica? Em consequencia dos factos que acabo de referir, voto como já disse, que não se approvando a emenda, ao menos se elimine o artigo.

O Sr. Ministro da Guerra: — É a primeira vez que ouço fallar deste acontecimento; entretanto não sei porque se possa accusar o Governador Militar, por ter feito aquillo que lhe está determinado, e é que todos os Estrangeiros se lhe apresentem. O que diz o Digno Par (porque talvez lho contaram) custa-me a crer que o Estrangeiro fosse apresentar o seu nome ao Governador, e houvesse aquelle procedimento, mas se não lho apresentou parece que fez a sua obrigação, procedendo segundo as ordens que tem.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — A emenda continha uma accusação vaga ao Governo, mas referindo-me ás observações que se fizeram julgo ter-se mostrado evidentemente, que depois de uma Guerra Civil, como aquella que acabamos e muito difficil restabelecer a ordem de prompto.

O Sr. Vice-Presidente: — Eu peço licença á Camara para dizer que eu não posso entrar nesta questão, porque.....

O Sr. Sarmento: — E eu peço licença para que V. Ex.ª possa dar todos os esclarecimentos a este respeito (apoiado, apoiado.)

O Sr. Vice-Presidente: — Eu agradeço á Camara, mas só aproveito a permissão para dizer uma cousa. A Commissão reconhece duas verdades que as agitações são menos, e que a ordem se vai restabelecendo; por tanto era necessario provar, para arguir a Commissão, que tem havido mais agitações do que houve os mezes passados. É verdade que tem tido logar algumas desordens; mas em quanto se não provar que ellas não tem sido em maior numero do que havia ha quinze dias para cá, a Commissão falla verdade.

O Sr. Conde de Linhares: — Tenho ouvido aqui a muitos Membros relatar certos factos para com elles arguir o Governo; é porém perciso que nos lembremos que estamos em um Governo Constitucional aonde os Poderes são inteiramente independentes, e separados; e que effectivamente elles se acham em vigôr. Se se provasse que Membros do Poder Judicial não tem cumprido o seu dever tomando conhecimento destes factos, que não são mais que acções de individuos particulares, e não agitações politicas, então podia arguir-se com fundamento aquelle Poder, ou o mesmo Governo por não ter promovido a responsabilidade, e suspensão dos Magistrados omissos. Mas não tenho visto que se tenha arguido um destes Poderes de ter sido omisso em promover o socego, e a ordem. O Governo tem pela sua parte feito tudo que póde, mas ninguem ignora que tem encontrado obstaculos para regularisar o Poder Judicial; e por isso não será muito de admirar que em um ou outro ponto tenham havido alguns crimes, e que não tenham sido punidos devidamente; mas isto não é culpa com que se possa taixar o Governo, porque elle tem feito tudo o que tem podido. De tudo quanto se tem dito tambem não se póde colligir que elle tenha obrado em contrariedade com as Leis. Por tanto eu voto pelo artigo tal como está, e reprovo a emenda, muito mais quando ella quer attribuir ao Governo o que só pertence ao Poder Judicial.

O Sr. Conde da Taipa: — O Digno Par que acaba de fallar quiz lembrar-nos o que todos nós sabemos, e foi que temos um Governo Constitucional; mas depois confundiu os Poderes, e a doutrina do seu Discurso, foi toda nos principios do governo absoluto. — Elle sabe muito bem que o Poder Judicial é um Poder passivo, e não activo; e então como póde elle julgar fados que se lhe não apresentão? O Poder Executivo é que apresenta ao Poder Judicial os crimes publicos, e logo que estes o não são apresentados aos Juizes, de quem é a falta? Do Poder Executivo. Logo as reflexões do Digno Par não podem ter logar, porque aqui ninguem acusou o Poder Judicial, sendo reconhecido que elle não tem acção de julgar factos que não sabe, ou se lhe não apresentão. — As reflexões que fez o Sr. Sarmento a respeito do socego publico, certamente que são muito bem feitas; entretanto o que se vê praticar nas Provincias não é causado por Constitucionaes offendidos, é sim feito por homens amotinadores, e por alguns que, infelizmente, ainda agora tem sido Empregados: eu não posso vir para aqui carregado de Cartas, mas tenho-as de muitas Terras do Reino, em que se me relatão muitos factos; mas quem duvida do que eu digo note que eu os convencerei. — Tambem é preciso confessar que a instituição dos Jurados, (a que eu de todas mais prezo, porque é a maior garantia do Cidadão não é a melhor para crimes Politicos. Em Inglaterra é o maior orgulho de um Inglez ainda que elle seja condemnado á morte. Quando se trata de crimes Politicos, não é um Tribunal muito recto, porque ou o Jury e composto dos da facção do accusado, e perdoão-lhe por força, ou da facção opposta, e o condemnão irremediavelmente: assim se tem visto particularmente na Irlanda.

Por tanto, qual é o dever do Governo, o prevenir; pegar naquelles amotinadores conhecidos ha muito tempo, e apresenta-los a um Jury, e quando se castigarem dous ou tres, os motins hão-de parar. Ha-

Página 47

(47)

jão authoridades para as Provincias, homens que tenham a opinião publica, e verão como acabam as agitações. O Governo não nomeou para os Logares senão gente da sua facção, e isto é o que tem causado as agitações, porque em fim os Povos não tem confiança nenhuma nelles. Nas Provincias quasi sempre os homens da mesma terra são conhecidos, e muitas vezes compadres nos dos outros, sempre ha um compadre muito constitucional que perdoa a outro que era Miguelista: n'uma palavra a tendencia dos Portuguezes é serem perdoativos, e em havendo authoridades de confiança, as desordens hão-de acabar.

O Sr. Sarmento: — Eu vou tomar pouco tempo á Camara, unicamente darei uma explicação sobre o que acaba de dizer o Digno Par. Eu não quiz de modo algum dar a entender que a instituição dos Jurados não fosse a melhor do mundo, o que quiz mostrar foi que a força das circumstancias ás vezes fazia com que de um Jury se não seguissem os effeitos que era de esperar.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu fui accusado de não entender bem as attribuições do Poder Judicial, mas eu creio que me não enganei; se elle fosse um Agente do Governo, então poderia acontecer que elle se prestasse mais aos dictames do Governo, e desta sorte poderia vir a ser um instrumento da vontade deste quando quizesse opprimir alguem; mas a carta justamente determina o contrario, e diz: no art. 145, §. 9.º (leu). Do que se póde colligir em geral que aos Juizes pertence esta attribuição, e estes não são Agentes do Executivo, mas sim antes do Poder Judicial. Este é o mesmo fundamento que justifica o dizer-se que o Poder Judicial, e Executivo são independentes um do outro; no caso que não façam o seu dever póde promover-se-lhe a accusação legal, mas essa deve ser feita na fórma determinada pela Lei.

Julgada a materia sufficientemente discutida foi o §. 3.° posto á votação, e approvado tal como estava ficando assim prejudicada a substituição offerecida pelo Sr. Conde da Taipa.

Os §§. 4.° e 5.° foram approvados sem discussão, como se acham no Projecto

Entrou em discussão o §. 6.°, e pedindo a palavra disse

O Sr. Conde da Taipa: — Não posso deixar passar este §., porque illude uma das cousas mais importantes, e a que o Governo não tem dado attenção alguma; pelo menos as pessoas de quem aqui se falla, estão ainda morrendo de fome. Além de que os Frades que saíram dos Conventos, andam pedindo esmola, e as Freiras não tem que comer: chegando ao excesso de acontecer que um Parocho mendiga o pão de cada dia! Esta é a verdade, e é o que se deve patentear ao Throno, e não levar a Resposta um §. que passa por estas cousas levemente. — Por estas razões, proponho a seguinte

SUBSTITUIÇÃO AO §. 6.°

Comtudo não póde deixar de lastimar, que grande parte dos Religiosos que pertenciam aos Conventos supprimidos, as Freiras, e os Parochos estejam ainda com desdouro da Religião, e da humanidade obrigados a mendigar o pão de cada dia. = Conde da Taipa. = Marquez de Fronteira. = Conde da Cunha. = Marquez de Loulé.

O Sr. Gyrão: — O Digno Par que me precedeu a fallar disse que este paragrafo trata de illudir, que os Ecclesiasticos estão morrendo á fome, e que o Governo não tem tomado providencias nenhumas a este respeito; e que por tanto se deve aqui fallar a verdade á RAINHA para dar remedio a isto. Ora eu, como Empregado do Governo, devo declarar o que se tem feito, que é no meu pensar o mais que se podia fazer. — A Lei para dar subsistencia aos Parochos, tem sido executada religiosamente em cada um de seus artigos: mandaram-se fazer os mapas de todos os que existem, e bem assim da importancia de seus benesses, nomearam-se as Commissões competentes, e até já se mandou pagar aos de Leiria. Não sei por tanto que mais poderia o Governo fazer. Quanto aos Regulares as Prefeituras cumpriram as ordens do Ministerio a respeito delles; tem-se procedido ás habilitações legaes, e só na Provincia da Estremadura se tem passado titulos a mais de 600 para haverem suas mesadas. Ora, então onde está a culpa do Governo? Eu lha não acho, mas sim que nada ha mais difficil do que ser Governo nestes tempos; todos os tiros lhe são dirigidos, e porque eu o defendo, diz o Digno Par que sou Ministerial! Embora o diga, que eu o continuarei a defender em quanto elle fôr, como tem sido, o mais Liberal Governo que póde haver, tem tomado optimas medidas nos diversos ramos de Administração, e feito mais Serviços á boa Causa de Liberdade do que fariam 50 annos de Côrtes regulares. Por dizer isto me chamam Ministerial, mas eu o que não posso definir é o que são essas pessoas que não gostam do Governo que tanto tem desenvolvido os principios da Carta; uma vez que não sejam Liberaes (só porque os Ministros o são) hão de ser ou retrogrados ou republicanos não podem sair deste dilemma; mas eu lhes não applico nem uma nem outra qualidade, e só digo que isto confunde o meu juizo. — Voto pelo §. como está. (Riso na esquerda).

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Tomarei como applauso as risadas que ouvi quando se fallou em Ministerio, e em Governo. Agora restringindo-me ao ponto da discussão, direi que o Digno Par que acabou de fallar me preveniu com suas explicações, e que são aquellas mesmas que eu poderia dar, sobre o objecto movido pelo Auctor da Substituição. É necessario que precedam certas individuações, antes de effectivamente pagar aos Ecclesiasticos aquillo que por Lei está determinado; e é isto o unico motivo de alguma demora que terá havido; mas nunca por vontade do Governo, que aliás lamenta essa mesma demora, que é o que se oppõem a que elles não percebam as quantias que o Governo está authorisado a dar-lhes.

O Sr. Sarmento: — Continuando com os habitos de julgar, não posso deixar de trazer para a questão deste §. uma regra seguida entre os julgadores, os quaes quando se tratam causa de alimento, mandam primeiro que tudo, dar de comer a quem tem fome. Vejo, pelas informações dadas por um Digno Par, que o Governo mandou proceder a certas informações; relativamente aos Ecclesiasticos; mas mesmo antes destas informações me parece que elle deveria attender á penuria de alguns; averiguando depois o

Página 48

(48)

direito que elles tivessem. (Apoiado). Tratando agora particularmente do §. em discussão, sou de parecer que deve passar pela razão geral que já produziu, de que estamos fallando perante o Throno, e não perante os Ministros: se fosse com estes, talvez o devessemos fazer com mais franqueza, e até mais desculpaveis seriam certas palavras que pareceram azedas; mas fallando nós com o Throno convirá usar dellas taes o §. — Todavia tomo agora occasião (visto estarem presentes dous Membros do Governo) de lembrar o estado deploravel em que se acham as Freiras, que, ainda quando não houvesse outra razão senão a do sexo, merecem, só por esta, promptas providencias da parte do Ministerio.

Não tratarei actualmente da maneira porque se tem posto em pratica as Leis sobre os Regulares; nem se era justo considerar debaixo do mesmo ponto de vista as Ordens que eram proprietarias como aquellas, que nada possuiam, mas é muito necessario que este facto não esqueça ao Governo, para que não fiquem ao desamparo. Era justo que ao Throno revertessem aquelles Bens, que por sua natureza da Nação tinham saído, mas o Governo, além destes, igualmente lançou mão de muitos adquiridos por Legados, e Titulos onerosos, os quaes eram indubitavelmente propriedade de especie diversa. Talvez que entre em grande parte deste meu escrupulo o ser eu letrado, porque os politicos costumam subir mais acima, perdendo o mundo de vista, e fazem amiudadamente o que elles denominam golpes de estado cousas a que nós os letrados, mais agarrados á terra, chamamos ás vezes injustiças, por não entendermos bem o sublime da sciencia de Estado.

O Sr. Conde da Taipa: — Não posso deixar de redarguir ao Sr. Gyrão, quando entrou nos seus costumados elogios ao Governo. Quiz o Digno Par fazer um dilemma, de que uma das pontas era a Opposição, e a outra o Ministerio; e então disse que nunca tinha visto Governo mais liberal! Ora esta palavra está bem definida, em quanto se não fixar a idéa que ella exprime: e assim se o Digno Par entende que o Governo é liberal pelo muito que elle tem dado aos seus elogiadores, vou concorde nesta accepção, e não só digo que é liberal mas muitissimo liberal, porque não cessa de dar ás pessoas que o elogiam: mas se o Digno Par chama liberal aquelle que quer pôr em pratica os principios de Liberdade consagrados na Carta; neste caso não estou eu em que o Governo entre nesse numero.

Accrescentarei tambem, a respeito dos Frades e dos Clerigos tem elle andado muito mal, tanto pelo lado politico como pelo da humanidade. Ninguem mais do que eu approvou a extincção das Ordens Religiosas, nem cedo ao Sr. Conde de Linhares, que é o homem mais anti-fradesco que conheço: (riso) mas o que nunca poderei approvar é que se dissesse a homens que tinham tomado aquelle modo devida, consagrado pelas Leis do Paiz = ponham-se na rua = e não lhes dar que comer. Estes homens tem mais direito á sua subsistencia do que muitos d'aquelles a quem o Governo dá com não larga; por quanto um individuo educado para o Sacerdocio, não póde ir exercer um officio mecanico. Além de que, o Governo andou muito mal com as cathegorias, porque attendendo a circunstancias, excluiu uma grande parte delles, a quem hoje se nega o pão: eu digo que todos os Fradres Portuguezes tem direito a comer; ainda que sejam criminosos, em quanto não forem enforcados ha obrigação de lhes, dar que comer. E de que serviram essas cathegorias! Para os vêr andar por ahi morrendo de fome e lançar-nos uma contribuição a nós todos; porque ninguem que tenha seis vintens na algibeira, deixa de dar alguma cousa a quem lhe diz que não tem que comer. Era o que eu queria responder ao Sr. Gyrão relativamente aos seus elogios do Governo: e se isto é liberalismo não sei o que seja dispotismo; pegar n'um homem que tinha subsistencia, tirar-lhe o que tem, manda-lo embora e deixa-lo a morrer de fome, e ao mesmo tempo dar com mão larga a outro que não tem direito aos grandes sallarios que está disfrutando; declaro que não entendo.

O Sr. Vice-Presidente: — Sendo eu membro desta Commissão e tendo-o sido de outra em que se assentaram cousas que parecem oppostas as que actualmente estam por mim assinadas, parecerá isto uma contradicção, para me salvar da qual, pouco direi.

Eu disse nesse tempo que os Regulares tinham apenas recebido duas prestações (e depois receberam terceira); não fallarei das Freiras que aliàs me consta, estão morrendo á fome: sendo eu ainda hoje da opinião que então emitti, devo comtudo dizer á Camara o sentido em que approvei a Reposta.

No discurso do Throno, fizeram os Ministros dizer á Rainha isto (leu): ao que a Camara respondeu assim (leu): não diz por tanto se o Governo tem tomado todas as medidas; não diz tambem se as que tomou foram as mais efficazes, e se não necessarias outras; logo não se compromette em nada com o que o Governo tem feito. Foi neste sentido que eu na Commissão approvei o §. em discussão sem comtudo ir contra os principios que expuz na Camara em outra occasião.

O Sr. Souza e Holstein: — Não desejava entrar nesta discussão, porque me parece tempo perdido. Todo o mundo está de accôrdo em que as Ordens Religiosas e os Dízimos foram bem abolidos, assim como todos concordam em que as pessoas que por esta abolição ficaram sem meios de subsistencia, tem direito a recebe-los do Estado, e mesmo o Governo não differe de nós neste desejo: já antes de se reunir o Corpo Legislativo, empregou elle para obter este fim o que estava ao seu alcance, e ficava livre das despezas que as circumstancias desse tempo traziam, com sigo; e depois de reunidas as Camaras, tem feito mais alguma cousa. Pelo que pertence aos Parochos, o Sr. Gyrão acaba de referir as providencias tomadas pelo Governo para o conhecimento exacto dos que estavam no caso da Lei, mas creio que independente disso se tem mandado dar Congruas a alguns delles. Pelo que pertence aos Religiosos posso affirmar á Camara, por facto proprio, que mais de uma vez se lhe tem feito seus pagamentos; isto é, aos da Provincia da Estremadura tres prestações, e aos das outras mais de uma, entendendo-se, aos que para receber esses soccorros se tem legalmente habilitado. Parece-me por tanto que o Governo tem feito quanto estava em seu poder para accudir a essa classe que tanto interesse merece a alguns Membros desta Camara, com a qual eu pouco sympathiso, e sobre tudo, por aquelles individuos que tomaram as ar-

Página 49

(49)

mas pos D. Miguel, os quaes são excluidos pelo Decreto de 30 de Julho.

O Sr. Conde da Taipa: — Respondendo ao Digno Par, direi que não sympathiso nem antipathiso com os Frades; agora com que eu tenho sympathia é com a conservação dos direitos adquiridos, e com o respeito á propriedade, e é com a humanidade. Ha um homem a quem a Lei do seu Paiz permitte o ser Frade, entra para uma Ordem, e se depois é abolida e lhe tiram os meios de subsistencia, este Paiz, digo eu, tem obrigação de sustentar o individuo até que morra; pode sim dizer = não haja Frades = mas ha de lhes dar de comer. Talvez que nem todos assim discorram, mas discorro eu, e o mais que provo com isso é a minha sympathia, uns dirão que pelos Frades, outros que pela Justiça. Do contrario seguir-se-ia que estes individuos seriam enganados pelo Paiz dizer-lhes = vão-se embora = e nada que comam, é um grande ataque á santidade da propriedade: e admira-me muito que o Digno Par, que estudou Jurisprudencia venha dizer aqui cousas taes, querendo decidir o caso por antipathias! Mas, ainda bem que está no Tribunal do Thesouro Publico, e não no da Relação, porque havia de julgar muito mal certas demandas.

O Sr. Souza Holstein: — Como se falla em direitos adquiridos, devo dizer que foram conservados aquelles Religiosos cuja conducta não foi contraria á liberdade da Nação, a respeito dos quaes o Governo tem feito quanto é possivel para lhes dar subsistencia, o que ardentemente deseja; mas quanto áquelles que pelo seu procedimento se tornaram inimigos da RAINHA e da Carta, não lhes considero nenhuns direitos adquiridos, conservando muitos delles a vida, só por effeitos da Clemencia Real.

O Sr. Sarmento: — Depois da Convenção d'Evora Monte, não pode haver sympathia nem anthipathias por essa classe, o Governo tem a força em sua mão, e eu lhe faço a justiça de que não usará da palavra paternal para enganar os Povos, como o faziam os despotas. — Entre tanto se é possivel haver alguma sympatia essa será pelo sexo feminino; é até necessario examinar o modo porque grande parte das Communidades femininas se tem portado nos Conventos: além de que todos sabem que estas infelizes Portuguezas, estão sujeitas ás fortes insinuações que lhes davam os Padres Confessores. Os nossos inimigos persuadiam aos espiritos fracos, que a liberdade era uma especie de heresia, e infelizmente estas insinuações fizeram muito mal, porque effectivamente o alto Clero tinha uma grande influencia entre nós; e a fazer-se um exame rigoroso de quem teve a culpa dos malles de que a Igreja foi origem, a imputação não recairá sobre as Freiras senão com injustiça. Mas em todo o caso deverá ter logar a respeito dellas a generosidade, que é o espirito da Nação Portugueza, e por conseguinte está da parte do Governo, o acudir ás grandes precisões dessas Corporações; mesmo porque nunca se deve apellar para a humanidade da Nação Portugueza, mormente para a parte illustrada sem que se achem auxilios, e soccorros promptos.

Julgada a materia sufficientemente discutida propoz o Sr. Vice-Presidente o paragrapho 6.° á votação e foi approvado tal como se acha, ficando por este modo prejudicada a Substituição que lhe offerecêra o Sr. Conde da Taipa.

Entrou em discussão o paragrapho 7.° sobre o qual, obtendo a palavra, disse

O Sr. Conde da Taipa: — Tenho tambem que propôr uma Substituição a este paragrafo. O cavallo de batalha da gente do Ministerio e dizer, apenas chega o Paquete = subiram os fundos; = nem que com isto alcançassem vitoria. Tomara saber o que se ganha com essas medidas se o Governo não tiver credito? É logo um sophisma, uma patranha para enganar a todos; a mim não: darei os motivos. — Os fundos Portuguezes estão muitos por cento a baixo dos das Nações mais pequenas da Europa; eu o provo. — Os fundos de Bruxelas ficavam a 99, os Hollandezes a 101 etc., e os nossos a 91! Ora, se o Governo tivesse tomado boas disposições era impossivel que não estivessem muito mais altos; mas o facto é que nem igualam os Piemontezes, que certamente não tem (assim como nenhuma das outras Nações que referi) não tem, digo, mais meios de pagar do que nós, havendo boa administração, que é em que se funda o credito. Então se isto é assim, para que ha de esta Camara dizer á RAINHA que = tem observado com prazer o favoravel aspecto que apresenta o credito do Estado, quando na verdade tal aspecto se não apresenta? = Por estas razões offereço a seguinte

SUBSTITUIÇÃO AO §. 7.º

«A Camara tem observado o aspecto que apresenta o credito do Estado, e sente ver que os nossos fundos estejam muitos por cento mais baixos do que os das outras Nações, não exceptuando a Belgica, e a Hollanda, apezar de estarem em estado de guerra, o que se não pode attribuir se não á ignorancia do Governo em materias financeiras. = Conde da Taipa. = Marquez de Fronteira. = Conde da Cunha. = Marquez de Loulé. = Marquez de Ponte de Lima.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Eu não sei certamente como hei de agradecer ao Digno Par, o fallar sempre no Governo.... (O Sr. Conde da Taipa interrompendo S. Exc.ª disse: — Pois em quem hei de de fallar? — O Sr. Ministro proseguiu.) Mesmo esta interrupção lhe agradeço, nem por ella lhe quero fazer imputação alguma, porque prova o que eu observei hontem, que não seria a ultima vez que lhe acontecesse o estar fóra da Ordem. O Digno Par parece que tem estado em contradicção comsigo mesmo, nas observações que fez sobre o §.: ao principio disse que nada importava o estarem os nossos fundos mais altos, e depois affirmou que elles se achavam muito mais baixos do que os de outras pequenas Potencias. Mas é de advertir, que a maior parte dessas Nações, não passaram por uma guerra Civil, nem foram obrigadas a fazer os grandes sacrificios que se tornaram indispensaveis para que hoje nos achassemos aqui reunidos: eu porém antes faria a comparação com o valor dos fundos de uma Nação, de uma riqueza consideravel depois da paz geral; esta comparação seria mais exacta. Todos sabem que nesse tempo, e ainda muitos annos depois os fundos Francezes estavam muito mais baixos do que hoje estam os Portuguezes. — Sómente accrescentarei, em quanto ao Digno Par dizer que nada faz ao credito da Nação o estarem os seus fundos altos ou baixos, que se estivessem a 50 em vez de acima de 90 como

(P)

7

Página 50

(50)

elles se acham, elle poderia julgar da differença que isto faz.

O Sr. Conde da Taipa: — Não vejo a differença desses effeitos: seja qual fôr o preço dos fundos Portugal ha de pagar os seus dividendos a 100, por isso mesmo que não são rendas perpetuas, nem fundos consolidados que tem amortisação; por tanto o subirem os fundos, sustento que não é nada para quem não use bem do seu credito não é mais do que o aspecto que apresenta uma Nação, e Portugal ninguem dirá menos meios de pagar a sua divida, havendo boa administração, do que tem a Belgica, que apresenta os seus fundos mais altos do que os nossos. Disse-se que foi entre nos a guerra Civil quem nos obrigou a despezas que não tem tido esses Paizes, cujos fundos comparei com os nossos: mas na Belgica ainda ha pouco tempo que houver essa guerra, ainda hoje conserva um Exercito de 100 mil homens, e apesar disso os seus fundos estam mais altos, dos que os nossos uns poucos por cento. O que diz a isto? É o que as pessoas que dirigem as nossas finanças não inspiram confiança, que aliàs deveriam inspirar as circumstancias do Paiz, sendo suas cousa bem administradas. A respeito da comparação que o Digno Par quiz fazer de fundos de ha 15 annos, eu lhe pediria que chegasse ao Diluvio, não precisando ir tão longe. Tambem os fundos Inglezes estiveram a 36 e hoje sabemos a como estam. E então, poderia servir de termo de comparação, uma differença entre a actualidade e 26 annos que decorreram? Certamente que não. Mas seja como fôr; o facto é (como já disse) que os nossos fundos estão uns poucos por cento abaixo dos das Nações mais pequenas da Europa; e por tanto não se deve dizer á Rainha que o credito apresenta um aspecto favoravel, em vista das circumstancias do Paiz. Se o Governo se apresentasse no mercado de Londres, como tal e não como um espectador (que é a figura que tem feito até aqui), os fundos subiram muito mais pela simples razão de que o especulador tem sempre menos credito de que um Governo.

O Sr. Sarmento: — Este §. parece-me que pode passar, todavia se não apparecesse nesta Resposta ao Discurso do Throno, não seria falta consideravel, porque está redigido com alguma obscuridade; e tanto que os Dignos Pares fallaram em fundos pagos fóra, quando eu julgo que o credito de que aqui se falla, e relativo aos meios de pagar a divida. A totalidade dos bens, que pertencião aos Corpos de mão morta, que hoje estão incorporados no Thesouro, não é ainda sabido com exactidão; sabe-se comtudo que elles são de uma importancia um grande, e só por si constituem um fundo tal que habilita a Nação a pagar a sua divida, que nesta consideração e a mais pequena da Europa. Nenhuma Nação está nestas circumstancias, e um estado inteiramente unico, e em que só Portugal se acha, e podemos de alguma forma agradece-lo aos Governadores do Reino em 1808, pois que recebendo ordens do Rio de Janeiro para vender os bens das Ordens Religiosas, tiveram a coragem de as não cumprir, o que faz com que hoje estejamos senhores destes grandes fundos; o que admira, pois que a Côrte de Roma, que então dava licença para tudo, hoje se opporia a essa venda; mas deixarei esta questão, que é alheia do §., e voltando a elle direi que poderá conservar-se (entendendo por credito os grandes meios que tem a Nação de pagar a sua divida) e até me parece que se o §. se eliminasse ou substituisse, fariamos algum mal com isso, porque em Londres, e mais Praças de Commercio se poderia dizer, que em tal a falta de credito da Nação Portugueza, que a Camara dos Pares não se tinha atrevido a fallar nelle.

O Sr. Gyrão: — Levanto-me para confirmar o que disse o Digno Par relativamente aos muitos recursos que tem Portugal, o que é sempre a favor do credito publico; e nada me tem admirado mais do que ouvir homens que se chamão liberaes, cousas que só servem de desacreditar o Governo. Acaso os fundos Portuguezes estarão mais baixos do que quando não havia um palmo de Patria; mas os Estrangeiros conhecem a verdade e quaes são os meios que nós temos para pagar a divida do Estado. A este respeito tenho muito gosto de dizer que Prefeitura da Estremadura, foi a primeira que acabou o cadastro dos bens dos Regulares, os quaes só na Comarca de Leiria, importam em 15 milhões; em todo o Reino de Portugal os bens dos Conventos supprimidos juntos com os Nacionaes, talvez andem acima de 100 milhões de cruzados, que, com o perdão do Digno Par, dão o maior credito aos nossos fundos, que tem muita acceitação entre os Estrangeiros. Uma prova porém desse mesmo credito, é o que actualmente tem as Notas do Banco de Lisboa, que sendo do valor de 500 mil réis, estão agora no mercado a 650: e ainda que os fundos do mesmo Banco sejam de particulares, comtudo as suas transacções são ligadas com o Governo. O preço do papel-moeda é ainda outra prova do nosso credito; estava antes de Julho a 27 por cento, e agora ninguem duvida acceita-lo a 20. tudo isto são factos; os nossos fundos sobem, eis a verdade, e por tanto escuso responder ao que se disse do Governo, porque são cousa tão repetidas que já não tem resposta.

O Sr. Sarmento: — Acha que será verdadeira a declaração, que o Digno Par acaba de fazer, a respeito dos Bens Nacionaes, que se acham na Comarca de Leiria, mas parece-me tambem achará justa a observação, de que os mesmos tem um valor tão grande porque na mencionada Comarca está situado o Mosteiro de Alcobaça, que é a maior acquisição, que a Nação fez pela extincção das Ordens Religiosas, entretanto pela pouca exactidão, que tem havido na avaliação destes Bens, persuado-me que seria da maior utilidade que o Governo publicasse uma relação exacta de todos elles, a qual nas Praças Estrangeiras falla mais a favor do nosso credito do que quantos outros esforços se possam fazer.

O Sr. Gyrão: — Antes de se tratar da extincção dos Regulares, já Bolby na sua Statistica de Portugal, tinha avaliado os seus Bens em 400 contos de rendimentos: isto pelas informações muito inexactas que obteve de outras que se haviam exigido dos Conventos; digo inexactas porque os Frades receando que ellas fossem para lhes lançar algum tributo, omittiram a descripção de muitos de seus Bens, apesar do que o calculo total da renda produzida a quantia que disse; ora esta quantia é o juro de 20 milhões a 5 por cento, mas como é sabido que os predios rusticos

Página 51

(51)

e urbanos não rendem senão 2 e meio, ou quando muito, 3 por cento, vemos que só por este calculo tem os mesmos Bens um valor real de 40 milhões de cruzados. — Mas o Governo não póde apresentar essas relações, porque é muito difficil acabar de as fazer com a precisão em que fallou o Digno Par. — Os Bens de que fallei são muitos, e não só em Leiria, mas ainda em outros sítios da Provincia; não os posso aqui enumerar de cór, mas recordo entre outros, que os que foram avaliados pelos Provedores dos seis districtos de Lisboa subiram de 2 milhões.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Pedi a palavra unicamente para responder ao Sr. Sarmento quando disse que a questão do credito se tinha encarado pelo lado dos nossos fundos, quando a elle lhe parecia que o devia ser em geral. Convenho com a opinião do Digno Par, e só accrescentarei que se eu olhei a questão por esse lado sómente, foi com o fim de responder a outro Digno Par que abriu a discussão suscitando essa especie.

Julgada a materia sufficientemente discutida foi o §. posto a votação, e approvado como se achava ficando assim prejudicada a Substituição offerecida pelo Sr. Conde da Taipa.

O §. 9.º foi approvado sem discussão.

Lido o §. 10, obteve a palavra, e disse

O Sr. Conde da Taipa: — Proponho que deste §. Se eliminem as palavras relativas á responsabilidade dos Ministros, as quaes não podem aqui ter logar senão com charlatanaria ou hipocrisia. — Todos sabem que é impossivel a Lei de responsabilidade Ministerial, e que tem dado logar a muitissimas questões, sem que até agora se tenha achado nos outros Paizes conveniencia alguma um fazer similhante Lei. E na verdade, a responsabilidade do Ministerio está na Carta, que diz os casos em que devem ser punidos que são pelo abuso do poder, que lhes está conferido. Em França tratou-se desta Lei, e todos Membros da Camara (liberaes, e não liberaes) convieram em que ella era mais a favor do que contra os Ministros; todos desde Benjamin Constant até Mr. de Vilelle foram desta opinião. Os Ministros são castigados quando abusam do poder que a Lei lhes confia (como ha pouco disse), e a sua garantia é o Tribunal que o julga porque sempre é superior a toda a excepção, quero dizer, a Camara dos Pares. Em Inglaterra, onde se tem julgado muitos Ministros (ainda que nenhum fosse condemnado), tambem não ha Lei de responsabilidade de Ministros.

Quando o Principe de Polignac, e seus companheiros foram julgados, é sabido que não foi em virtude de similhante Lei, porque a não havia; entretanto não foi necessaria porque o processo fez-se, e foram condemnados pelo poder discricional do Tribunal. — Esta é a unica Lei sólida que a tal respeito deve haver, a qual consiste na latitude do poder da Camara dos Pares, e havendo a Lei chamada da responsabilidade póde sempre ser illudida com subterfugios. — Por estas razões, peço se elimine a parte do §. que disse, porque estou persuadido que não póde servir senão de charlatanaria ou hypocrisia.

O Sr. Ministros dos Negocios Estrangeiros: — Peço a leitura do §. do Discurso do Throno correspondente ao que está em discussão.

(Foi satisfeito).

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Desejaria se pedisse tambem a Sua Magestade quizesse marcar os limites da authoridade dos diversos Funccionarios Publicos; cousa que actualmente é muito necessaria em vista da confusão que a este respeito vai por todo o Reino: á excepção de Lisboa onde as attribuições dos diversos Empregados estão em alguma harmonia, todas as Provincias se ressentem da desordem que dellas provém, e dos conflictos que tem havido entre Sub-Prefeitos, Governadores Militares, etc.; e em quanto não estiver marcado aquillo que a cada um delles pertence, farão o que quizerem; resultando disto a má administração da Justiça.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — O art. 104 da Carta responde ao que se tem dito contra o §.: é assim concebido (leu): por conseguinte se a Carta manda expressamente que haja essa Lei de responsabilidade, para que havemos de estar a perder tempo com esta questão.

O Sr. Conde da Taipa: — Quando a Carta determina aquillo que não póde ser, é inexequivel nessa parte.

O Sr. Gyrão: — A Carta diz no artigo 103 isto (leu), e no seguinte 104 assim (leu): logo deve haver a Lei, porque a Carta o determina, e tambem porque a rasão o pede. O Ministerio foi proprio que apresentou a Proposta a Lei de sua responsabilidade na Camara dos Srs. Deputados: e por estes, e outros factos é que eu digo que elle é mais liberal que ninguem.

O Sr. Conde da Taipa: — Este ponto tem sido tratados pelos Publicistas mais liberaes que são da opinião que eu emitti: se o Digno Par se julga mais liberal do que Benjamim Constant, bata-se com elle. Em uma grandissima Obra que fez sobre este assumpto, provou aquelle Escritor que era impossivel haver uma Lei de responsabilidade Ministerial que fosse a favor do Povo, por sempre possivel aos Ministros usar de subterfugio taes que a illudissem; que o mais prudente era deixar isso ao poder discricionar o do Tribunal dos Pares que os deve julgar, que é onde reside a garantia do Publico contra as vexações dos Membros do Governo, visto suppôr-se que a mesma Camara é composta das pessoas mais superiores de Nação. — Esta mesma opinião é seguida por Mr. Vilelle, que a sustentou nas Camaras de França, sendo apoiado de ambos os lados, e não replicando ninguem ao seu discurso. (Riso) É homem de muito talento; tomara-o eu cá. (Riso)

O Sr. Souza e Holstein: — É para lamentar que percamos tempo em similhante discussão! A Carta diz que haja a Lei, o Digno Par diz que a não haja: peço a V. Ex.ª proponha a Camara se deve prevalecer o artigo da Carta, ou a vontade do Sr. Conde da Taipa.

O Sr. Sarmento: — A lembrança do Digno Par, author da emenda, tem bastante fundamento, e tanto assim que na maior parte dos Paizes Constitucionaes não se tem consiguido fazer tal Lei: os Inglezes se restringiram ás palavras High crimes e Misdemeanors que Benjamim Constant não quiz, ou não pôde traduzir com exactidão para a lingua Franceza, para significar em geral a idéa do abuso do Poder Ministerial, e debaixo desta rede, melhor do que em Lei articulada, comprehendem os Inglezes, todos os

7*

Página 52

(52)

crimes, que podem cometter os Membros da Administração. — Todavia, entre nós a questão muda de face, porque a Carta determina que a Lei se faça, e os argumentos em contrario nos levariam a uma prolongada discussão: diga-se pois em geral = responsabilidade dos Funccionarios Publicos. = No pouco que tenho lido sei que a Lei de responsabilidade dos Ministros existe com alguma perfeição na Legislação do Grão-Ducado de Baden; os Francezes, amigos sempre de theorisar, não poderam deixar de confessar a inconveniencia, ou difficuldade de se fazer tal Lei, vistas as observações contra ella produzidas. Entretanto a verdadeira responsabilidade é a moral, aquella que acompanha todos Empregados Publicos, e mormente os Membros do Governo. Concluo, que a questão movida pelo Digno Par poderia tratar-se, mas actualmente póde applicar-se-lhe o sed nunc non erat his locus; ou pelo menos ella nos levaria a uma discussão abstracta, longa e intempestiva.

O Sr. Souza e Holstein: — Agora não se trata da conveniencia de fazer uma Lei da responsabilidade dos Ministros, trata-se unicamente de responder a um §. do Discurso do Throno. Ora esta Lei já foi apresentada na Camara dos Srs. Deputados aonde passou a uma Commissão; além disso a Carta determina que ella se faça, assim peço a V. Exc.ª ponha a votos se a materia está bastante discutida.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu apoio a entenda do Sr. Sarmento, para que no §. em discussão se falle unicamente em responsabilidade de todos os Funccionarios Publicos.

O Sr. Conde de Linhares: — Acho que póde omittir-se a frase = responsabilidade Ministerial =, visto que ella se menciona no Discurso do Throno, e ter já sido apresentada uma Proposta dessa mesma Lei; se não mencionassemos este artigo na Resposta da Camara talvez se entendesse que queriamos prejudicar desde já a doutrina da mesma Lei.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — A questão da responsabilidade dos Ministros é alheia desta discussão. Eu apoio o §. pelos mesmos motivos que o Digno Par acaba de fallar expoz: se no Discurso do Throno se não tivesse fallado em uma Lei de responsabilidade Ministerial, e se além disso, a Carta não determinasse expressamente que á houvesse, embora poderia ter logar a questão; mas á vista de uma outra razão, creio não póde ser ponto de controversia nesta Camara.

Julgada materia sufficientemente discutida, foi o §. entregue a votação, e approvado tal como se achava.

Os §§. 11.º 12.º e 13.º foram todos approvados sem discussão; ficando-o assim todo o Projecto de Resposta.

O Sr. Vice-Presidente nomeou para formarem a Deputação, que com elle, deve apresentar Sua Magestade a Resposta ao Discurso do Throno, que acabava de sanccionar-se os Dignos Pares.

Os Srs. Marquez de Sampaio.

Conde de Santa Iria.

Condes de Linhares.

Conde de Sampaio.

Visconde da Serra do Pilar.

Mello Breyner;

Declarando que para isso se pediria dia e hora pela competente Repartição.

O Sr. Sarmento: — Estou encarregado pela Commissão da Reforma do Regulamento de pedir á Camara, permitta que os Dignos Pares os Srs. Marquez de Loulé, e Conde de Lumiares, pertençam a mesma Commissão, não só pelos seus talentos, mas porque consta tem uma collecção de Regimentos que podem servir de muito para os seus trabalhos.

A Camara conveio na Proposta do Digno Par o Sr. Sarmento.

O Sr. Conde da Taipa leu uma Representação da Camara Municipal do Conselho de Azerede, pedindo a conservação dos Juizes Ordinarios, a qual ficou sobre a Mesa.

Foram distribuidos 40 exemplares de um Impresso intitulado = Clamores dos Madeirenses etc.: e mais 40 do outro que tinha o titulo de = Moção feita na Sociedade Patriotica Madeirense, por um dos seus Membros. =

O Sr. Vice-Presidente, deu para Ordem do Dia da Sessão 13 do corrente, que declarou seria a seguinte, a discussão da Proposição sobre as Bases Judiciaes, que estando já dada para Ordem do Dia de ámanhaã ficou assim transferida por proposta do Sr. Conde da Taipa, approvada pela Camara.

Sendo tres horas e tres quartos disse, que estava levantada a Sessão.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×