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O Sr. Vice-Presidente: — Na forma do Regimento nomeio para a Commissão que deve examinar esta Carta Regia aos Srs. Marquez de Valença, Conde de Lumiares, e Conde da Taipa, os quaes darão hoje mesmo o seu Parecer sobre ella.

Passando-se a Ordem do Dia (e estando presentes os Srs. Ministros do Reino e da Justiça) entrou em discussão na sua generalidade a Proposição sobre as bases para a Administração Judicial Reino de Portugal, e ilhas adjacentes. (V. pag. 37.)

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, a materia do Projecto que vai entrar em discussão nesta Camara, tem sido tão debatida na outra, e por tão longo espaço que difficultosamente se poderá dizer cousa nova: por consequencia para não roubar o tempo que a Camara tanto percisa, limitar-me-hei a breves reflexões, muitas das quaes eu apresentei á Commissão, aonde tive a satisfação de as ver tomar em consideração pelos Membros della, reconhecendo a justiça com que o Governo tinha apresentado aquelle Projecto.

O Governo havia conhecido pela experiencia (e principalmente eu, no tempo em que tive a honra de ser Presidente da Relação de Lisboa) que o Decreto de 16 de Maio de 1832, aliàs fundado em principios luminosos, era inexequivel em muitas das suas partes, e continha defeitos que na pratica se tinhão desenvolvido, os quaes convinha remediar; mas que esse remedio seria impossivel em quanto á administração da Justiça, senão desse aquella forma regular, que convém em todos os tempos, e muito mais nas circumstancias em que nos achamos, depois d'uma guerra, civil, e depois das reformas que se tem feito. Estes defeitos exigião por tanto que aquella Lei fosse reformada; mas reflectindo que esta reforma nas suas diversas partes, e principalmente na da organização do Processo, teria de ser muito longa, e que a urgencia de remediar os males que, por isso, se achava soffrendo o paiz, pediam prompta providencia, intendeu o Governo que para conciliar uma e outra cousa, poderia separar aquella parte em que era mais necessaria a reforma, isto é, a do pessoal, na qual se encontravam defeitos, e anomalias contradictorias com a Carta. Quanto à outra parte que diz respeito a organisação do Processo, a sua reforma poderia ainda espaçar-se mais por não apresentar deffeitos tão salientes; e neste sentido apresentou o Governo um Projecto de Bases Judiciaes, com o fim de proceder desde já á reforma do pessoal, reservando o que é relativo á organisação do Processo para uma reforma mais prolongada; e porque na verdade não está em armonia com a actual Legislação, e tem de ser difficiente em quanto não houver os Codigos.

Vê-se pois, pelo que acabo de expôr, que as Bases em discussão não tem por objecto senão o pessoal da Administração Judicial; e neste sentido o que principalmente se teve em vista foi extinguir os Juizes Ordinarios, que no Decreto de 16 de Maio de 1832, figuravam como uma parte das Auctoridades Judiciaes, as quaes o Governo, e eu como Membro delle, intendeu que não podiam sustentar-se, não só por serem contrarios á Carta em letra e espirito, nomeadamente nos artigos 119, e 120, mas tambem porque, segundo os termos em que estavam estabelecidos, não era possivel que aspirassem a desempenhar as attribuições, visto que, pelo mencionado Decreto, se lhes commettiam funcções muito importantes. — E na realidade todos os que tem algum conhecimento do fôro, conhecem as difficuldades de instruir um Processo, sendo tambem certo que de boa ou má instrucção delle, depende em grande parte o seu resultado futuro: se o Juiz não tiver os conhecimentos necessarios para fazer os corpos de delictos, juramentar Testemunhas, proceder ás accareações, e a todos os mais actos preparatorios connexos com o Processo, debalde se exigira um resultado justo em qualquer causa, porque os Juizes de Sentença não tem outros meios para firmar os seus procedimentos senão estas antecedencias; reconhecendo-se igualmente ser uma especie de contradicção o entregou a parte mais delicada do Processo a homens que não tinham conhecimento de Legislação, e outra menos difficultosa, e que sem duvida não podia deixar de trabalhar pelos actos preparatorios da primeira, exigir para ella homens de Lei. Com taes fundamentos se propoz este Projecto que foi examinado em uma Commissão da Camara dos Srs. Deputados, havendo depois na mesma Camara renhido debate em que se expenderam todas as razões pró e contra. Entre tanto a maioria da Camara approvando a opinião do Governo, intendeu que deviam ser eliminados os Juizes Ordinario, não obstante uma sympathia que (não sei com que fundamentos) se tinha excitado a favor destes Magistrados, chegando a ponto de considerar os mesmos Juizes, como os sustentaculos das liberdades publicas, e como entidades sem que não podia vigorar a Carta; e isto era tanto mais notavel, e parecia extraordinario, por isso que estas opiniões foram sustentadas por individuos que professam o systema progressivo, e que defendendo estas idéas vinham a ser contradictorios com os seus mesmos principios; por quanto, se querem derivar a beleza da instituição da sua antiguidades deviam pela mesma razão ser apologistas das antigas Côrtes, e até da Inquisição, porque estas duas instituições tinham a seu favor o argumento da antiguidade; mas ninguem dirá que uma ou outra dellas possam convir á Liberdade. Se porém era pelos principios da boa administração da Justiça, vê-se que ella não podia ser bem administrada por homens que tinham de recorrer ao auxilio estranho ainda para as decisões mais ordinarias; e por isso quando mesmo não houvesse estes motivos, as immensas provas que o Governo tem tido sobre a incapacidade dos Juizes Ordinarios, acabariam de tirar todas as duvidas que a tal respeito podessem existir.

Entre outras, vou lêr á Camara uma Carta que recebi d'um Juiz pela Lei, (que é o mesmo que um Juiz Ordinario), o qual pela falta de conhecimentos juridicos, tem demorado um processo, pelo motivo de o ter remettido a seu Accessor. — É o caso: constou-me que a Villa d'Arraiolos, quando ali passou um destacamento do 1.º Regimento de Infanteria, se tinha comettido um roubo, e assassinato, com circumstancias horrorosas e até atrozes; e como eu não tinha conhecimento do facto, escrevi a este Juiz, e a resposta que se me deu foi, a que vou lêr; e espero que se não supponha que esta carta foi encommendada.

(Sua Exc.ª leu a carta seguinte.)