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discussão, e o que se julgou discutido foi a Proposta do Digno Par Conde da Taipa, que é inteiramente separada do Projecto.

O Sr. Conde de Linhares: — É preciso não surprehender a Camara: confesso que tambem intendi o mesmo, e nenhum de nós quer violentar a vontade dos outros.

O Sr. Sarmento: — Mas a questão é de facto; V. Exc.ª effectivamente propoz se a materia estava ou não discutida.

O Sr. Marquez de Loulé: — A materia tanto não esta discutida, que o Sr. Sarmento observou que o debate ía fóra da ordem, no que foi apoiado pelo Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Vice-Presidente: — Vou consultar a Camara, e ella o decidirá.

E fazendo-o assim Sua Exc.ª, resolveu a Camara continuasse a discussão. — Em consequencia teve a palavra, e disse.

O Sr. Conde da Taipa: — Vou fallar na generalidade do Projecto. — Não entrarei na delicadeza do fôro, porque o não conheço, mas tratarei d'aquelles pontos em que elle tem relação com a liberdade civil ou politica.

O Poder Judicial é o mais formidavel dos Poderes Politicos, e aquelle que dispõem uma Nação, ou para a liberdade ou para o despotismo; que ou lhe dá tendencia para a escravidão ou costumes energicos que a faz reagir contra a arbitrariedade: é pois este Poder o que convém organisar com mais cautela. Vemos pela historia que Portugal conservou a sua liberdade em quanto teve Juizes leigos; nesses tempos produziu homens que se opposeram ao poder de Hispanha, que fallaram em Côrtes contra a opinião dos Reis, e que cometteram as grandes façanhas da India; vemos igualmente que á maneira que se foram criando os Juizes de Fóra, Portugal foi perdendo a sua liberdade, acabando de todo quanto definitivamente se estabeleceram aquelles Empregados, e foram acabando os Juizes que eram eleitos pelos Povos. Parece que foi Affonso IV quem primeiro tentou a mudança, mas encontrando opposição em Côrtes não póde conseguir a criação dos Juizes Letrados, acontecendo depois o mesmo, com pouca differença, a todos os Reis de Portugal até D. Manoel, que foi o que poz em pratica com mais extensão a medida projectada por seus Antecessores: então começou o despotismo a reger Portugal, e foi nessa época que os Povos entraram a adquirir costumes servís, de que infelizmente Portugal tem sido victima. Em todos os tempos se tem experimentado, que só a Legislação póde dar energia ás Nações para resistir a tyrannia; e se agora fôrmos cubrir o Reino de um bando de Juizes de Direito, nunca alcançaremos livrar-nos inteiramente da escravidão, nunca os Povos terão a robustez do animo sem a qual não se resiste ao Poder; pois que nada torna os homens mais abjectos do que o sentimento do terror, e quem estiver debaixo da influencia de uma authoridade, tem de ganhar esse terror, e tarde ou cedo se torna a servil. Eu não me atemoriso com os 130 Juizes de que falla o Projecto, temo sim os que para o futuro se hão de estabelecer á sombra deste exemplo. Eu me explico.

O Governo quer extinguir os Juizes Ordinarios em todo o Reino, para perpetuar o despotismo em Portugal. Viu que as eleições não podiam inteiramente subjugar-se pela unica influencia dos Prefeitos, viu que apesar dos seus exforços tinha apparecido uma numerosa, e formidavel minoria na Camara dos Srs. Deputados (minoria tal que nos outros Paizes se reputa uma maioria), e estando aliás informado que os Povos não poderiam ser vencidos pelas suggestões Administrativas, a mandar a uma Camara de Representantes gente do seu partido; lança mão da influencia Judicial, e vem propôr ao Corpo Legislativo o estabelecimento de 130 Juizes de Direito para os pôr de guarda aos Povos, e dizer-lhes = Aqui está quem faz os Processos, e quem depois ha de decidir se as Pronuncias são bem ou mal lançadas, e vossês ou hão de seguir as vontades do Bey que para cá lhe mandam ou hão de ser victimas da sua arbitrariedade. = Demais os 130 Juizes são agora para o principio, porque é impossivel que em Portugal onde havia 800 e tantos de Primeira Instancia, possa este numero substituir-se com 150 sómente, e haver boa Administração de Justiça; por conseguinte atraz destes 130 hão de vir outros tantos, e depois ainda mais outros, até que o Reino fique cuberto com uma rede de tyrannos de Aldêa, para que ninguem possa levantar cabeça: eis a opinião de que eu estou convencido.

Por outra parte, onde se viu que o Juiz de Instrucção seja o mesmo de Sentença? Diz o Sr. Ministro que esta objecção está providenciada n'um Projecto apresentado á outra Camara. Mas quem vem a ser o Juiz da Sentença? O visinho do de Instrucção do Processo: quer dizer, que fica o caso como negocio de compadres, e não outra cousa. — Mas isto não hade acontecer adoptando-se o meu Projecto: é um sophisma dizer que os individuos que nelle proponho para instruirem os Processos são Juizes; não são Juizes, são Magistrados, e se estes forem eleitos pelos Povos poderá diminuir-se muitissimo o numero dos Juizes de Direito, bastando apenas cincoenta para todo o Reino: podemos dar-lhe toda a consideração, e bons ordenados, cousas que são indispensaveis para exercerem o Poder Judicial com a independencia que convém á administração da Justiça, é necessario que sejão ricos para serem considerados, e para não estarem com a vista nos favores do Governo, ou fazer injustiças e vexações aos Povos, como infelizmente tem acontecido entre nós mais de uma vez; Portugal póde pagar bem a cincoenta Juizes, o que não poderá fazer a cento e trinta; e então ficão sujeitos a tyrannisar os Povos; é esta a grande questão. — Em Inglaterra ha sómente 12 Juizes que administrão a Justiça em primeira Instancia; e quem lhes prepara os Processos são Magistrados eleitos pelos Povos. Que são os Sheriffs, os Coroners, e os Juizes de Paz? São Magistrados d'Instrucção que alli se elegem amiudadamente. Se pois em Inglaterra se administra Justiça com doze Juizes, não poderá em Portugal fazer-se o mesmo com 50? Sem duvida que para a Justiça é isto bastante, e em politica tudo o que não é isto necessario para a liberdade é contra a liberdade. — Estou convencido em minha consciencia que este Projecto não veio aqui para a Justiça, mas sim para a injustiça; não vem aqui para que a causa de um particular seja bem julgada, vem para que a Causa Publica fique debaixo das mãos do Ministerio, vem para que, assim que os Juizes en-