O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 153

(153)

SESSÃO DE 13 DE MARÇO.

Sendo uma hora e um quarto, tomou a Cadeira o Sr. Vice-Presidente; e feita a chamada pelo Sr. Secretario Barão de Alcobaça, disse que estavam presentes 25 Dignos Pares, faltando além de Sua Alteza Real o Principe D. Augusto, e dos que ainda se não appresentaram, os Srs. Duques de Palmella, e da Terceira, e Conde de Villa Real, por motivo de Serviço; Marquez de S. Paio, Conde de S. Paio, e Sotto-maior, com licença da Camara; Barradas, por molestia; e Marquezes de Ponte de Lima, e de Santa Iria, e Sousa Holstein, sem causa motivada,

O Sr. Vice-Presidente disse, que estava aberta a Sessão.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu a Acta da Sessão precedente. — Sobre cuja redacção disse

(P.)

20

Página 154

(154)

O Sr. Margiochi: — Acho uma circumstancia notavel nesta Acta, a qual é a especificação de todos os Dignos Pares que entraram na discussão; e não sendo isto costume, faço esta observação.

O Sr. Marquez de Loulé: — Nunca da minha parte reclamarei por explicações de mais, quando nellas se não falte á verdade. — Outra cousa tenho notado na redacção das Actas, sobre que tomarei a liberdade de observar, que me parece incoherente mencionar os Dignos Pares que faltam com motivo, e não haver o mesmo procedimento para com aquelles que não comparecem sem causa: em todas as outras Assembleas, se costuma fazer o contrario: o Regimento não determina nem uma nem outra cousa, mas a fazer-se alguma declaração, creio que seria mais conveniente notar os Membros da Camara que faltam sem causa, do que os que estão com licença ou doentes.

O Sr. Vice-Presidente. — Se não ha outra observação a fazer sobre a Acta, passa por approvada.

O Sr. Gyrão apresentou a seguinte

DECLARAÇÃO.

Declaro que na Sessão de hontem fui de voto que se rejeitasse o artigo l º da Proposição de Lei que veio da Camara dos Senhores Deputados, sobre a maneira de pronunciar os réos suspeitos de algum crime, em razão de ser minha opinião particular que a decisão tomada pela Camara dos Dignos Pares é inexequivel, transtorna a ordem do Processo criminal presentemente seguida, sem lhe substituir cousa alguma, destroe a Policia Correccional, faz amontoar nas prisões os criminosos, sem que seja possivel verificar a pronuncia em muitos mezes, e talvez annos, faz com que os Cidadãos se cansem e aborreçam o Processo do Jury, e finalmente abre as portas á impunidade, e permitte que homens suspeitos de crime sejam eleitos Camaristas, e Representantes da Nação. Palacio das Côrtes, 13 de Março de 1835. = Antonio Lobo de B. F. T. Gyrão, Par do Reino.

Em conformidade do Regimento, mandou-se guardar no Archivo.

O Sr. Sarmento appresentou a seguinte

PROPOSIÇÃO.

Artigo 1.º Ficam supprimidas as tres Cadeiras Analiticas de Direito Patrio, Romano, e Canonico, nos cursos das Faculdades Juridicas da Universidade de Coimbra, e um logar dellas se crearão outras tres, a saber: uma de Hermeneutica Juridica, com applicação a cada um daquelles tres Direitos; outra de Elementos de Economia Politica; e outra de Princípios de Direito Commercial.

Art. 2.º A Cadeira de Hermeneutica Juridica será regida por um Lente da Faculdade de Canones; e a de Economia Politica por um Lente da Faculdade de Leis, ambas ellas com a de Practica Judicial, formarão o estudo do quinto anno commum ás duas Faculdades.

Art. 3.º A Cadeira de Direito Commercial será regida por um Lente da Faculdade de Leis, e fará parte do Estudo do quarto anno Juridico, commum a ambas as Faculdades, passando a Cadeira de Historia Ecclesiastica, para o segundo anno Juridico onde tem o seu proprio assento.

Art. 4.º As Congregações das respectivas Faculdades proporão os Compendios, que lhes parecerem mais proprios para o ensino dos Elementos de Hermeneutica Juridica, d'Economia Politica, e de Direito Commercial, os quaes serão approvados pelo Governo.

Art. 5.º Para os exames do segundo anno, tirarão os Estudantes ponto em todos os tres Compendios, que nelle se explicam: para os Actos de Bacharel, em logar do ponto de Historia Ecclesiastica, o tirarão no Compendio de Direito Commercial; e para os Actos de Formatura, além do ponto na Practica Judicial, o tirarão tambem nos Elementos d'Economia Politica, e no Compendio de Hermeneutica, principalmente na parte que dependem da analyse dos Textos de Direito para illustração dos preceitos desta Arte.

Art. 6.º Esta Lei só se porá em practica no principio do anno lectivo proximo seguinte, devendo desde já proceder-se a escolha, approvação, e se poder ser, publicação dos Compendios proprios para as Aulas novamente creadas, assim como á promoção dos Lentes Cathedraticos, e Substitutos, que as hão de reger.

Art. 7.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes em 13 de Março de 1835. = O Par do Reino, Sarmento.

Foi admittida, e ficou reservada para segunda leitura.

O Sr. Gyrão: — Mando para a Mesa o Requerimento que me entregou o Marechal de Campo Sir John Milley Doyle. — Passou á Commissão de Petições.

O Sr. Vice-Presidente: — Acham-se nomeados para a Commissão Special encarregada de examinar a Proposição do Sr. Sarmento, para que se dirija a Sua Magestade uma respeitosa Mensagem, os Dignos Pares seguinte:

Os Srs. — Marquez de Valença.

de S. Paio.

Bispo Conde.

Conde de Lumiares.

Sarmento.

Passando-se á Ordem do Dia, continuou a discussão das Proposições sobre o modo de constituir a pronuncia nos Processos crimes, (Vide pag. 106) começando-se pelos seguintes artigos.

Art. 2.º (Da Camara Electiva.) O Juiz de Direito proporá ao Jury por escripto, e nos proprios Autos o quesito seguinte: = Ha, ou não ha motivo, para ser pronunciado criminoso, e judicialmente accusado do crime de que é arguido o Cidadão (Fuão) posto em custodia? = O Jury responderá diante do quesito = Sim = ou = Não.

Art. 2.º (Do Digno Par Trigoso.) Na audiencia dos Jurados de pronúncia, o Juiz de Direito lhe proporá por escripto, e nos proprios Autos, o seguinte quesito: «Ha, ou não ha motivo, para que a declaração feita acerca do Cidadão F., já posto em custodia, possa produzir o effeito da pronúncia?» Os Jurados responderão adiante do quesito «Sim» ou «Não» Segundo esta resposta fôr negativa, ou affirmativa, assim será o Cidadão posto em liberdade,

Página 155

(155)

ou conduzido da custodia á cadêa, e judicialmente accusado do crime, de que é arguido.

Art. 2.º (Do Digno Par Barradas.) Logo que o indiciado esteja seguro, o Juiz proporá ao Jury, por escripto nos proprios Autos, depois de ter feito a relação do seu contheudo, o seguinte quesito = Ha, ou não, motivo para subsistir o despacho, e ser o indiciado posto em custodia, pronunciado como criminoso, e judicialmente accusado do crime, de que é arguido? = O Jury responderá a este quesito = Sim = ou = Não = e conforme a resposta, o Juiz mandará pôr o indiciado em Liberdade, ou proseguir o Processo os seus termos, lavrando-se o assento de prisão em logar de custodia.

O Sr. Conde de Linhares: — Tenho uma emenda sobre este artigo, que vou mandar para a Mesa. Assim o fez o Digno Par; é a seguinte

Emenda ao

Art. 2.º O Juiz de Direito, convocado o Jury de pronúncia, entregará ao mais velho dos Jurados, que servirá de Presidente do mesmo, os proprios Autos, e proporá ao Jury por escripto nos Autos o quesito seguinte = Ha, ou não ha motivo para ser accusado como criminoso, e judicialmente processado do crime de que é arguido o Cidadão (Fuão) posto em custodia? = Então retirando-se o Jury para outra sala a deliberar entre si, e tendo adoptado uma decisão, responderá diante do quesito = Sim, ou não. =

§ 1.º Se o Jury necessitar para continuar de algum outro esclarecimento, voltará á Audiencia para o haver do Juiz de Direito, o qual julgando necessario mandará em publico proceder a elle. Palacio das Côrtes, 10 de Março de 1835. — Conde de Linhares, Par do Reino. — José Joaquim Gerardo de Sampaio, Par do Reino.

O Sr. Margiochi: — Eu desejaria, antes de entrar em discussão o artigo 2.º, vêr se se podia alterar a redacção do artigo 1.º, não sobre a materia...

O Sr. Conde da Taipa: — Não se póde pedir á Camara que tracte outra vez de uma materia decidia da hontem.

O Sr. Margiochi: — Eu tenho visto muitas vezes na Camara approvar-se um artigo, e depois tractar-se da redacção; neste 1.º artigo vê-se que não está conforme a Carta, e nós não podemos fazer Leis que não sejam conformes com a Carta; e de mais as Leis não podem ir acompanhadas de motivos: os motivos poderão muitas vezes ir em preambulos, mas não em cada uma das disposições da Lei; e por isso eu desejaria que a Camara alterasse esta redacção.

O Sr. Vice-Presidente: — A Commissão quando redigiu este artigo, não fez scrupulo algum de dar o motivo da sua doctrina; e não vejo que haja inconveniente em que nas Leis se dê o motivo dellas, principalmente, quando elles são tirados da Carta. Na Legislação antiga a pronúncia ficava completa pelo despacho do Juiz; agora faz-se esta declaração, de que, seguindo a regra adoptada na Carta, intervirão nella os Juizes de Direito, e os de Facto: pozeram-se pois essas palavras no artigo, não em relação á antiga, mas á nova Jurisprudencia. Parece-me por tanto que não haverá razão para alterar a redacção do artigo 1.º

O Sr. Sarmento: — Supposto que eu receie enfraquecer os principios tão claros que acaba de expôr o Sr. Vice-Presidente, continuo na mesma opinião a dizer que o motivo, que tive na Commissão, foi porque no logar da Carta onde se falla de pronúncia, (art. 126) referia-se a duas species de Legislação ao Direito constituido quando a Carta foi promulgada, e ao Direito, que se havia de constituir, acompanhando a declaração do Juiz de Direito com a dos Jurados; por este motivo a maioria da Commissão, (ou toda, porque creio nesta parte não as appresentou objecção alguma á frase em que o artigo estava concebido) quiz fazer o preceito bem explicito, visto que se não tractava de uma mudança na ordem do Processo: mas, como muito bem disse o Sr. Vice-Presidente, não ha inconveniente em que as Leis tenham a enunciação do mandado, e a este respeito disse Seneca = jubeat non suadeat lex. = Entre nós se faz notavel a fraseologia da Legislação do Marquez de Pombal, pelo estilo asiatico dos seus proemios, trazendo grandes preambulos, os quaes, muitas vezes, á vista do preceito, parecem partos da montanha: tambem acontece, que muitas vezes aquellas Leis trazem principios de Direito espalhados com desnecessarias demonstrações, o que é verdadeiramente um erro de fraseologia, que merece critica. O certo é que o estilo das Leis tem occupado a attenção de muitos criticos, e á maior parte delles agrada a emphatica simplicidade das antigas Legislações, e chegam até a chamar o exemplo de Horacio, quando legislando sobre a poesia, fallou como Legislador = Non satis est pulchra esse poemata, dulcia sunto = como que imitando o mandado das Leis das doze Taboas. Parece tambem que a Secção de Legislação, tem a seu favor a opinião de muitos Jurisconsultos; e porque esta fraseologia, não satisfaça em todo o rigor, não resulta que a Legislação deixe da ser boa, pois o essencial della consiste na doctrina. O Codigo dos Gentios, que na opinião de Carlos Butler, (um dos Jurisconsultos, que mais honraram nestes ultimos tempos o foro Inglez) é o melhor presente, que veio do Oriente, para o Occidente, depois da Escriptura Sagrada: este Codigo é escripto n'aquella frase propria dos Povos Orientaes, e ella não destroie a excellencia da doctrina. — Por tanto parece-me que o modo porque o artigo 1.º se acha redigido, é necessario, por isso mesmo que ha nelle um periodo de transicção, que marca o preceito, que se deduz da Carta para a nova Legislação, e se o Digno Par tivesse a paciencia de ouvilo lêr outra vez, repararia que a frase = Ordem escripta — foi copiada talvez supersticiosamente da mesma Carta: creio por tanto que o artigo póde passar com a redacção que tem.

O Sr. Marquez de Ficalho: — Este artigo já passou, quem tinha observações a fazer contra elle devia-as ter appresentado hontem; mas se alguem as tinha a fazer eram os que votaram a favor delle, e não os que votaram contra, pois quem não gosta da sua doctrina, tanto se lhe dá que passe assim como de outra maneira: o costume desta Camara é votar os artigos taes quaes, é salva a redacção quando assim se declara, mas isto não se fez hontem; por consequencia o artigo passou tal qual.

O Sr. Margiochi: — Muitas vezes se tem feito o

20*

Página 156

(156)

contrario. Ora ainda que eu não esteja responsavel, como deu a intender o Digno Par que fallou, com tudo desejo que as Leis não saiam daqui com motivos superfluos; as Leis são illustradas, e motivadas pela discussão, e não conservando-se nellas os seus motivos.

O Sr. Vice-Presidente: — Pergunto á Camara, se subsiste a redacção do artigo 1.º, vencido hontem?

Assim se resolveu por uma votação.

O Sr. Vice-Presidente: — Vai-se ler a emenda do Sr. Conde de Linhares ao artigo 2.º, e entra em discussão uma e outra cousa.

Lida a mencionada emenda pelo Sr. Secretario Barão de Alcobaça, pediu a palavra e disse

O Sr. Gyrão: — Eu hontem levantava-me para dar uma explicação ao meu Illustre Collega e particular amigo o Sr. Sarmento; não o pude conseguir, porque fui chamado á Ordem; por consequencia aproveitarei para isso esta occasião, se V. Exc.ª mo permittir.

O Sr. Vice-Presidente: — Não confundâmos a Ordem do dia de hoje, com a questão de hontem que já acabou.

O Sr. Gyrão: — Mas lançou-se-me um stigma particular, sobre que devo dizer alguma cousa.

O Sr. Sarmento: — Nesse caso sou eu quem tem de dar uma satisfação, porque a explicação torna-se contra mim.

O Sr. Vice-Presidente: — O Sr. Sarmento creio que não offendeu ninguem; talvez lhe escapassem algumas palavras...

O Sr. Sarmento: — Nem isso.

O Sr. Gyrão: — Lançou-se uma expressão desagradavel sobre os Prefeitos, chamando-lhes Prefeitos do Pretorio.

O Sr. Vice-Presidente: — Então bastará que se diga, que o Digno Par não é Prefeito do Pretorio.

O Sr. Gyrão: — Não me satisfaço com isso; tinha ouvido com toda a attenção... (Interrupção.) — Vozes: — Ordem do dia. Ordem do dia.

O Sr. Gyrão: — Declaro que se... (Nova interrupção.)

Vozes da esquerda: — Falle; falle.

O Sr. Gyrão: — Não me escandaliso do que disse o Sr. Sarmento; venero-o muito, mas no calor da discussão chamou-me por ironía Prefeito do Pretorio; (O Sr. Sarmento: — Não chamei.) seguindo-se disso que os Prefeitos passavam ordens contra a Lei; não me escandalisa a ironía, mas não posso admittir que se affirme o que não é exacto. — Todas as arguições que se tem feito aos Prefeitos são sem fundamento, e só tem por fim desaccreditalos: entretanto elles foram nomeados por quem deu a Carta, por quem tambem nomeou os Dignos Pares. — Muitas das attribuições que pertenciam aos Corregedores, estão hoje devolvidas por Lei aos Sub-Prefeitos e Provedores, assim como outras aos Juizes Correccionaes, e é em consequencia dellas que esta ultima Auctoridade procede a prisões, porque as outras só o fazem em flagrante: mas as Prefeituras não mandam prender ninguem, e quando, os agentes subalternos prendem é sempre em, flagrante delicto, remettendo-se logo o preso á competente Auctoridade Judicial; mas isto mesmo está determinado por Lei. Por conseguinte quem assim obra em virtude de Lei, não merece expressões de ironia. Estas injustas ironias tem feito muito mal, porque de algum modo tiram a força moral a Auctoridade Pública: tem-se dito muitas cousas contra as Prefeituras, mas na minha opinião, são ellas, a instituição mais liberal que tem apparecido no mundo; porque em, prova disso tenho a experiencia. Quando chegar a occasião eu o demonstrarei, e fora disso já me tenho offerecido a responder por escripto a quem quizer appresentar as suas razões em contrario.

O Sr. Sarmento: — Não ha outro remedio senão o admittir a Camara um parenthesis na discussão de que se trata, a fim de eu dar uma explicação. — A minha consciencia estava tão segura, relativamente ao que acaba de dizer o Digno Par, que nem me passava pela cabeça que elle podesse reparar nas minhas expressões. — Quando hontem fallei da auctoridade, que exerciam as Prefeituras, se bem me lembra, foi em relação a ellas, e não ao Digno Par, que eu disse: = Que se assimilhavam ao Prefeito do Pretorio em Roma, entre o qual, e o Imperador não mediava auctoridade alguma. = Creio que estas palavras devera estar na memoria de todos os Dignos Pares. (Vozes: — É verdade, é verdade. — O Orador proseguiu: —) Ora eu não tenho meio para fazer com que aquillo, que eu profiro sem a minima intenção de offender, obre diferentemente no animo de alguem. — Declarei que a auctoridade pública se achava enfraquecida, por isso mesmo que estava n'um estado de confusão, e até tenho pedido ao Ministro da Justiça adoptasse um systema appropriado, sem o qual seria impossivel que a ordem se restabelecesse; não levei a bem que quando se tractava de divisão dos Poderes Politicos, houvesse auctoridade que conhecesse ao mesmo tempo de objectos de administração, e de Fazenda; resultando de tal confusão a falta de ordem pública em que o Reino se acha; porque logo que uma auctoridade invade outra, esta se debilita, e o serviço publico, vem a padecer. — Nem julguei que a susceptibilidade do Digno Par chegasse a tanto, que disso se offendesse: além de que, em uma obra que compuz, e publiquei não ha muito tempo, fallava eu da necessidade das auctoridades administrativas. E como seria possivel que era menos de tres annos mudassem as minhas idéas? — Nesse escripto até indiquei a denominação de Prefeitos, quanto ainda os não havia. Como poderia eu condemnar hoje aquillo mesmo, que approvei nos meus escriptos? — Em que eu não convenho, é na confusão de que já fallei; mas as Prefeituras contem com o meu voto, sempre que ellas se contenham em seus limites; nem quando contra ellas fallasse se deveria intender que eu me dirigia aos empregados, que as exercitam. Mas o transtorno que tem havido, é o odio que se tem incitado são devidos a causas bem sabidas, e que não é esta a occasião para as referir. Porque se misturam os Prefeitos em objectos de Policia, assim como os Provedores quando exercitam funcções de Officiaes de Fazenda. Ora nenhum destes ramos são partes administrativas no sentido restricto em que se intende por administrações, porque aquellas auctoridades foram sómente estabelecidas para outros objectos que estão postos de parte, e em vez de se cuidar delles, se tractam de outros; pois que Fazenda é cousa mui diversa de Administração, e Policia ainda mais alheia. — Sou obrigado a fazer estes reparos, para dar toda a satisfação ao Digno Par; e

Página 157

(157)

até me admira que elle podesse tirar similhante consequencia do que eu disse; certamente não me intendeu, ou então não proferi com exacção aquillo que eu tinha no coração. — Eu fiz allusão sómente ao estado em que aquella auctoridade se achava, em relação áquelle em que devia ficar constituida, no que eu descubria um abuso, mas do qual não pertendia culpar pessoa alguma em particular, sim lamentar a marcha que tinham tomado certos estabelecimentos creados, para differentes destinos.

Por tanto creio que os Dignos Pares farão justiça ás minhas intenções, e como foram testimunhas presenciaes do que eu disse, de modo algum poderão accreditar que eu me quizesse referir a uma pessoa a quem tanto respeito, e que além da consideração pessoal, que por ella tenho, accresce ainda a de ser Membro desta Camara; devendo conseguintemente persuadir-se que nem levemente quiz offendelo; e não posso deixar de concluir que eu, e não elle é quem devia accudir com a explicação. — Peço perdão á Camara de ter cançado a sua attenção, e de ter involuntariamente interrompido a materia em discussão.

O Sr. Vice-Presidente: — Visto que a satisfação está dada, parece-me conveniente que os Dignos Pares se restrinjam á discussão do art. 2.º

O Sr. Gyrão: — Entrando agora nessa questão, direi que este artigo 2.º é uma consequencia do antecedente; diz o que se deve practicar, mas não marca o tempo em que se hade reunir o conselho dos Jurados, mas isto talvez fosse necessario: no mais nada tenho a dizer, porque a doctrina do artigo é uma recapitulação do que a este respeito se acha no Decreto de 16 de Maio da 1832. Todavia rejeito o artigo para votar pela substituição do Sr. Conde de Linhares; comparando uma e outra cousa, a doctrina é a mesma, entretanto prefiro a redacção desta por melhor, e por isso a adoptarei antes do que o artigo. — Nada mais tenho a accrescentar.

O Sr. Conde de Linhares: — Adoptado o artigo 1.º parece que o artigo 2.º é uma consequencia necessaria delle. — A minha emenda pois a este artigo não tende a outro fim mais do que ao de obviar um deffeito que me fere na Legislação actual, e é o de subjeitar o réo a dous processos em logar d'um. — É necessario não confundir nas causas crimes duas partes distinctas que as compõem, uma que tem por objecto preparar ou instruir o processo, e outra que o realisa. Os actos preparatorios são diversos, taes quaes por exemplo a pronuncia do Juiz, ou a formação da culpa, (segundo se exprime a Carta Constitucional) a prisão ou custodia subsequente que a mesma Constituição permitte tenha logar por decisão do Juiz; a preparação da accusação, posto que este acto seja segundo a Legislação actual subsequente á rectificação de pronuncia pelo Jury d'accusação, quando eu considero que deveria ser anterior, visto que a rectificação do Jury d'accusação deveria ser o ultimo dos actos preparatorios do processo. — Eu fundamento esta minha opinião no que prescreve a Carta Constitucional, quer dizer, que todos os actos subsequentes á pronuncia sejam publicos, de que infiro que ella intendeu por actos publicos todos aquelles que constituem realmente o processo, isto é, aquelles actos que se passam diante do Jury de Sentença presididos por um Juiz de Direito. — Então é que o réo é realmente processado, ou julgado em frente d'uma accusação estabelecida e corroborada com provas, e de uma defeza produzida por elle, é igualmente sustentada por provas. Ora ninguem negará que no processo a intervenção do réo é indispensavel, mas não é assim quando se tracta meramente de decidir se ha nos actos preparatorios do processo bastante fundamento para, no interesse da Sociedade (note-se que, digo da Sociedade e não do réo) se realisar o processo contra o réo indiciado. É de facto a decisão do Jury d'accusação, uma garantia mais tambem estabelecida em favor do Cidadão, pois por ella é elle protegido do risco de soffrer um processo improcedente: mas não vejo com tudo a necessidade do réo ser obrigado a substanciar a sua defeza diante do Jury de accusação, que o não póde julgar, e que tem só a decidir da justiça ou injustiça de se realisar o processo, e para o que realmente não tem necessidade de o ouvir. Em alguns Paizes aonde a instituição do Jury se acha regularmente estabelecida, sempre se evita ouvir o réo antes do processo, excepto quando expontaneamente elle o quer fazer em sua justificação. Foi pois segundo estas idéas que regulei a minha emenda, e que propuz que convocado o Jury d'accusação pelo Juiz de direito, este logo sem processo algum previo, os convidasse á vista dos autos a decidiram da validade da pronuncia para se verificar ou não o processo. — Desta maneira julgando o Jury de accusação as peças do processo escripto, evita-se no réo a necessidade de defender-se anticipadamente, e evita-se-lhe igualmente o vexame inutil d'um processo se o Jury vem á conclusão de ser este improcedente. — Tal foi a minha emenda que me parece preencher o meu objecto.

O Sr. Vice-Presidente: — Desejo advertir a Camara de que, quando se escreveu este artigo 2.º apenas se attendeu a que na pronuncia devia entrar o Jurado, não se dizendo o tempo em que devia ser convocado; e a razão foi porque o assento desta nova Legislação, está no Decreto de 16 de Maio de 1832, actualmente em practica: por tanto apenas se estabeleceu o principio geral, ficando os mais termos pertencentes ao processo preparatorio, dependentes daquelle Decreto; não se repetindo aqui por não parecer necessario.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu ía fazer a mesma observação que acaba de produzir o nosso Vice-Presidente. Está claro que o artigo não contém esses detalhes, por se intender que hão de ser observados segundo a Legislação actual: ora se as razões ou fundamentos que expôz um Digno Par podessem admittir-se, eu proporia que aquella Legislação se alterasse; mas realmente, apezar de não ter conhecimentos de Jurisprudencia, acho que com isso se não daria garantia alguma aos réos em não serem ouvidos, até por um proverbio que ha em Portuguez = Não se deve condemnar ninguem antes de ser ouvido. = Bem sei que isto não é uma sentença final, mas sómente uma pronuncia: porém, qual é maior garantia, ser ouvido, dar testimunhas, ou Jurados por suspeitos, observar que o processo não está legal, e pôr difficuldades a tudo, ou ser simplesmente pelo Jurado indiciado de crime? Ninguem dirá que o primeiro methodo não seja preferivel; e por isso achando eu que os réos tem

Página 158

(158)

mais garantias pela Legislação actual, deve ella ser conservada naquillo que póde referir-se ao artigo em discussão, o qual eu approvo como o appresentou a maioria da Commissão.

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Como eu assignei a emenda do Sr. Conde de Linhares devo dizer o espirito com que o fiz: está vencido que a pronuncia será feita pelo Jurado; e achando-se redigida a emenda em sentido contrario, sentido que eu adoptei e adopto, parece-me que ella se acha prejudicada, menos que se não mude a fórma porque está concebida; isto pelo que diz respeito ao artigo 2.º; agora pelo que pertence ao §. 1.º do mesmo, se abraçarmos o systema, de que o réo seja reperguntado perante o Jury, bem como as testimunhas da culpa, e feitas as necessarias acariações, e confrontações, dados assim todos os esclarecimentos aos Jurados, eu o considero superfluo, visto que elle só tem em vista esse fim.

O Sr. Conde da Taipa: — V. Exc.ª já hontem disse, que muitas cousas relativas ao andamento do processo por Jurados, se não podiam comprehender na Lei que actualmente estamos fazendo; Lei que se achou necessaria para evitar inconvenientes muitissimo graves, e de que já tinha havido exemplos: por isso a querermos ir dar aos réos todas as garantias possiveis, então era preciso principiar pelo Codigo do processo criminal. É sem dúvida que ha esses inconvenientes que apontou o Sr. Gerardo de Sampayo, principalmente o de poder qualquer Juiz pronunciar um individuo, pôlo em custodia, e depois não convocar o Jury para a rectificação senão d'ahi a tres mezes...

O Sr. Vice-Presidente: — Isso está na Lei, que me parece marca o praso de oito dias: no artigo apenas se quiz estabelecer um principio, seguindo-se em tudo o mais o Decreto de 16 de Maio de 1832; terá elle alguns inconvenientes, mas não te tracta agora de os emendar; e quanto á parte que tem relação com este artigo, o mesmo Decreto designa o tempo dentro do qual o Juiz de Direito é obrigado a convocar o Jury.

O Sr. Conde de Linhares: — O artigo que eu desejo emendar, de facto é o artigo 202 da Lei de 16 de Maio; elle diz assim (leu); ora daqui concluo que o indiciado responde a dous processos; quando realmente a defeza do réo não deve ter logar senão perante o Jurado de Sentença, que é o unico competente para o julgar, decidindo-se alli o facto e o direito. Não ha duvida que tambem se decide de um facto no Jurado de accusação, mas este é se ha provas bastantes para ser um réo accusado ou não; este é o espirito da minha emenda, que tende a modificar a Lei actual do processo, que julgo nesta parte defeituosa: Desejaria perguntar a todo o homem de boa fé, se ouvindo ler este artigo que acabei de ler, não collige que realmente o réo é submettido a dous processos em logar de um; e sendo o objecto do Jury d'accusação livrar o Cidadão do vexame d'um processo injusto, seria contrario ao fim o continuar na practica que hoje se segue.

O Sr. Sarmento: — Creio que não ha outro meio de responder ás optimas intenções do Digno Par, senão concordando com elle; porque pretendendo a Camara que volte este artigo á Commissão para ella ver a possibilidade, que ha de augmentar mais as garantias do Cidadão, e sendo este o fim que ella teve em vista, estou certo da boa vontade dos meus Collegas, que não desejam outra cousa, e então, examinando a emenda proposta pelo Digno Par, appresentará um novo artigo, se assim o achar conveniente.

Julgada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Vice-Presidente, e a Camara resolveu que os Artigos e a emenda voltassem á Secção de Legislação, unindo-se-lhe o seu auctor o Sr. Conde de Linhares; afim de ser presente á Camara uma nova redacção do artigo 2.º

Entraram logo conjunctamente em discussão os seguintes:

Art. 3.º (Da Camara Electiva.) Sómente os Cidadãos assim pronunciados criminosos por decisão do Jury, ficam comprehendidos na excepção do §. 3.º do art. 67 da Carta Constitucional.

Art. 3.º (Do Digno Par Trigozo.) A regra estabelecida no art. 1.º, tem logar em todos os processos criminaes e por identidade de razão é applicavel ao nosso Direito eleitoral, para o fim de qualquer Cidadão permanecer no goso dos seus direitos politicos, em quanto a pronúncia não estiver completa.

Art. 3.º (Do Digno Par Barradas) Como a pronúncia do Juiz é provisoria, e fica dependendo, para todos os seus effeitos, da rectificação do Jury; é consequente, que só os que nesta fórma forem pronunciados, são comprehendidos na excepção do §. 3.º do art. 67 da Carta Constitucional.

Obteve a palavra e disse

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Eu propunha que visto ser este 3.º artigo dependente dos dous primeiros, ficasse reservado para quando a Commissão appresentar a nova redacção do 2.º

O Sr. Vice-Presidente: — Este artigo nada tem com o 2.º, é como um Corolario que se deduz do 1.º; ora como este já se acha approvado, parece-me não haverá inconveniente nenhum em discutir-se agora o 3.º

O Sr. Sarmento: — Este 2 º artigo é uma materia que se deduz da propria de 1.º, e corre paralello com este, e não com o 2.º; sendo mais uma interpretação de Lei para evitar inconvenientes para o futuro (e tanto para o Codigo eleitoral como para o criminal) do que propriamente preceito novo.

O Sr. Vice-Presidente: — Creio que esta specie não vem na Lei de 16 de Maio de 1832.

O Sr. Sarmento: — Este objecto é uma questão similhante áquelles embargos de direito que no foro se, recebem ou rejeitão.

O Sr. Vice-Presidente: — Está o artigo em discussão, e tem a palavra o Sr. Gyrão.

O Sr. Gyrão: — Ainda que o artigo 2.º foi á Commissão, sempre eu desejaria lembrar-lhe alguma cousa sobre elle. — Não se ajuntando o Jury com brevidade, segue-se incommodo aos prezos; ora eu já aqui disse que não podia haver se não uma reunião cada dia, e então o resultado é estar o Cidadão um anno na cadêa, ou então hade-se-lhe abrir a porta sem elle estar julgado: por tanto é necessario buscar algum meio para que a convocação do Jurado se não demore mais de oito dias, por exemplo, depois do indiciado estar em custodia; pois que o artigo expressando se assim (leu) não acautella este inconveniente. De mais eu já mostrei pela Statistica dos crimes, que

Página 159

(159)

para os primeiros tres dias deste mez são necessarios trinta e seis processos: e então como hade isto fazer-se? Todos sabem que quando se convocam os Jurados para um caso não servem senão para elle, e a rasão é porque podem alguns ser excluidos, quando assim lhe convenha para allegar o réo o seu direito; entretanto os que servem no processo de João, já não servem para o de Pedro; sendo a consequencia o formar-se um novo Jurado para cada réo; e eis o maior obstaculo deste Projecto, custando-me que desta Camara saia uma Lei que não seja exequivel. — Muito se engana alguem com esta Lei se a julga mui liberal, e oxalá lhe não aconteça o mesmo que á mariposa quando vôa de roda do lume; eu não temo a falta de liberdade, mas receio que a demasiada nos não deite a perder. — Concluo que este Projecto sahindo assim é inexequivel.

O Sr. Conde da Taipa: — Quando o Digno Par exclama que o numero de crimes é tão grande que não póde completar-se por isso a pronuncia nos Jurados, acaso quererá intender por isto que não haja o grande Jurado? Desejava me respondesse a esta pergunta.

O Sr. Gyrão: — Quero que haja o grande Jurado, mas desejo que esta Lei seja exequivel, o que não póde ser, sempre que se convoque um Jury para a pronuncia de cada accusado, como já mostrei.

O Sr. Conde da Taipa: — O Digno Par quer que haja o grande Jurado; então qual é o inconveniente que acha no artigo? Não o percebo; mas isto será certamente falta da minha cabeça, que não é grande cousa. Quererá o Sr. Gyrão que o Juiz prenda, e depois solte, como até ha pouco se fazia? Era isto o que eu desejava saber. — Um Juiz de Fóra em Portugal era como o Coronel de um Regimento; este anda pelo quartel, vê alguma cousa que lhe não agrada, por exemplo, um corredor pouco limpo, diz logo, metta lá esse homem no calabouço: assim fazia o Juiz de Fóra, se via fazer o que não gostava, ou deixar do fazer aquillo de que gostava, mandava prender quem lhe parecia, com a unica differença que nestes casos era o Alcaide, e no primeiro, o Sargento de Brigada quem cumpria as ordens. — Ora se é isto o que intende o Digno Par, bem, senão declaro que ignoro o que elle quer; porque, em fim, o accusado sempre tem de ir ao grande Jurado. — Diz-se, comettem se dez crimes n'um dia em Lisboa, e por isso não e possivel convocar tantos Jurys, como é necessario: mas estes dez crimes pertencem a, não sei, quantos Districtos; (Uma voz: — A seis) cada um delles constitue um circulo de Jurados, e então já o calculo é diverso. Na verdade, apanhar uns poucos de fenomenos, depois ommittir os que faz conta, e formar assim uma theoria, digo que nada ha menos exacto; deste modo até se póde fazer um tyranno de Henrique IV., e um homem justo de D. Miguel!

Desde a discussão de hontem que eu não pude ainda comprehender o que querem os Dignos Pares, que fallaram contra o artigo, a não ser o dar ao Juiz Correccional um veto na eleição da Camara dos Srs. Deputados, permittindo-lhe guardar uma pronuncia na algibeira, para a appresentar ao ver eleito o individuo contra quem o tivessem prevenido, e isto sem responsabilidade alguma. Ainda hoje se tornam a produzir os mesmos argumentes; e eu que os estou ouvindo ha 13 horas, ainda não percebo o que pertende quem delles se serve. — Por tanto vejo ainda pôr-se em questão o artigo 1.º, porque este artigo não é senão uma consequencia daquelle, e puramente regulamentar. Tenho com tudo uma emenda a propôr-lhe, visto dizer o Sr. Margiochi que a unica affeição que tinha a esta Lei, era porque ia emendar a da Liberdade de Imprensa: ora isto nunca poderá ser, porque esta ultima é uma das Regulamentares determinadas na Carta; Lei de Direito commum, que nada tem com a que está em discussão; e tanto assim que a primeira até tem um Jury special: e como além disso a Liberdade de Imprensa é a primeira das garantias em um Governo Constitucional, offereço esta emenda ao artigo = Salvos os crimes de Liberdade de Imprensa que serão julgados pela Lei special. =

O Sr. Sarmento: — O que eu queria dizer é que nós temos estado alguma cousa fóra da estrada; a questão é, se este artigo deve tractar-se hoje, ou ir á Commissão. As circumstancias delle são mui differentes das do 2.º, que foi mandado novamente á Commissão, para examinar se seria preferivel o methodo da emenda do Sr. Conde de Linhares, a qual appresenta uma fórma de Juizo, que de algum modo me não parece admissivel, segundo a Lei existente. Ora este motivo não milita a respeito do artigo 3.º em discussão, porque não contem nada mais que a applicação de um principio de Direito; por isso me parecia não haver inconveniente em se tractar já a sua materia, que é de si mui simples, e só depende da vontade dos Dignos Pares dar o seu assenso, ou reprovação á sua doctrina. Tem aqui havido bastantes repetições a este respeito, ninguem duvida da utilidade da materia, mas não sei que se possa dizer cousa alguma sem ir ao que já se tem dito.

O Sr. Gyrão: — O artigo é bem claro, diz assim (leu) não exclue nenhum crime; ora agora como se fazião até ao presente os Processos criminaes? Todos principiavam nos Juizes de Policia correccional, e excedendo a sua alçada passavam para o Juiz de Direito, porque todos os outros que cabiam nas suas attribuições acabavam alli; por tanto isto diminuia o numero de Processos; ora se explicando-me eu assim ainda me não intendem, não sei como o heide fazer.

O Sr. Conde da Taipa: — Mas não se explicou ainda.

O Sr. Gyrão: — Por consequencia digo que é escusado que certos crimes vão aos Jurados, e os que por sua natureza lhe pertencerem, então a respeito desses o Jury inquire as testimunhas, e o réo defende-se, os outros é escusado que lá vão; em um Paiz como este, aonde os crimes são tão frequentes, que já cançam os Jurados, se acaso passar em Lei um tal artigo, o que acontecerá? Hade acontecer o mesmo que aconteceu em França, aonde ficou só o Jurado de segunda instancia.

O Sr. Conde de Linhares: — Votaria para que este artigo se eliminasse, porque no artigo 1.º já está definido o que se deve intender por Pronúncia, e quando ella se acha completa. Tendo a Carta Constitucional effectivamente no artigo 67 determinado, que aquelles que forem pronunciados não sejam elegiveis, considero inutil este artigo. — Além de que,

Página 160

(160)

logo que o Juiz tenha ordenado a prisão ou custodia contra alguem, é claro que elle não póde ser eleitor, e deste modo se acha prejudicado no seu direito apezar desta Lei. Devo confessar, não succede porém o mesmo ao eleito, que realmente é protegido por esta mesma Lei, quando só reconhece a Pronúncia perfeita na decisão do Jury. — Á vista do que, me parece escusado este artigo, e caso que prevaleça peço licença para propôr a minha terceira emenda (leu); ella tem ao menos o merecimento de ser mais explicita, e de repetir a doctrina da Constituição; mas repito que o considero inutil, visto que o artigo 1.º determina assaz claramente quando a Pronúncia se deve considerar procedente. — Voto por tanto pela rejeição do artigo em primeiro logar, e caso não se vença, pela adopção da emenda, que remetto para a Mesa.

S. Exc.ª assim o fez, é a seguinte

Emenda ao

Art. 3.º Os Cidadãos pronunciados criminosos em querella ou devassa, são inhibidos do direito de eleitores de Deputados, e de serem elegiveis, segundo o Art. 67, § 3.º da Carta Constitucional. — Palacio das Côrtes 10 de Março de 1835. — Conde de Linhares, Par do Reino. — José Joaquim Gerardo de Sampaio, Par do Reino.

O Sr. Sarmento: — Eu levantava-me unicamente para responder ás dúvidas do Digno Par, relativamente aos Processos de Policia: se tivesse comparado o artigo 1.º do Projecto da maioria da Commissão com o que se acha na Proposição da Camara dos Senhores Deputados, veria que se deixou a Policia como está, sómente senão considera como parte do Poder Judicial. — Eu não faço a sua apologia, mas julgo que por ora deve existir, e até me persuado que nunca te poderá dispensar a Policia Correccional. — Ora, na Policia Correccional não deverá haver a pronúncia, de que aqui tractâmos; por consequencia não tem logar a objecção produzida a respeito della.

Quanto ao artigo 3.º, parece-me que elle deve ficar; por ser fóra de dúvida que houve um caso extraordinario, sobre a intelligencia das pronúncias, que chamou a attenção da Camara dos Senhores Deputados, e me parece que se não póde prescindir de que esta Camara intervenha, para se declarar a presente Lei: o que eu acho bem intendido por mais uma razão. — A regra deste artigo 3.º, antes de se achar definido em Portugal, o que constituia o Poder Legislativo, sería causa de um Assento da Casa da Supplicação, por ser verdadeiramente uma interpretação authentica da Lei; aquelle Tribunal está hoje extincto, e quando elle existisse, as suas attribuições de maneira alguma poderiam ser as do Corpo Legislativo; por consequencia ha utilidade em que este artigo se sustente por ser uma rigorosa interpretação, que póde prevenir graves questões; e ainda quando não houvesse esta razão, a perda de tempo, que sobre o assumpto houve na Camara Electiva, merecia que aqui se consagrasse este principio. Conseguintemente creio que todos estes motivos devem merecer a nossa attenção, porque na verdade a applicação do artigo tem logar não só para os Processos Criminaes, mas igualmente para a eleição da Camara dos Senhores Deputados.

Sobre a demora, que póde acontecer de soffrer algum individuo nomeado Deputado, quando está em custodia, direi, que acontece o mesmo, quando outro qualquer eleito se ache doente. Logo aquella razão não é bastante, para privar os Cidadãos de mais uma prerogativa, e direito tão importante. — Concluo pois que o artigo 3.º deve subsistir, porque é necessario, e porque está em perfeita harmonia com o 1.º Quanto a lembrança do Sr. Conde da Taipa, relativamente á Lei da Liberdade de Imprensa, não vindo agora para o caso, devemos abster-nos de tractar esse ponto hoje.

O Sr. Conde da Taipa: — Como nesta Lei se determina, que os indiciados não sejam prezos sem a rectificação do Jury, não tem isto que vêr com a de Liberdade de Imprensa, porque estes crimes todos admittem fiança.

O Sr. Sarmento: — Não posso entrar agora no espirito da Lei da Imprensa, porque não a tenho presente. No paiz classico da Liberdade tem havido condemnações extraordinarios por delictos de offensa a esta Lei: parece-me que um Jezuita chamado Doleman, ou Parsons, foi levado ao cadafalso por ter publicado certo escripto...

O Sr. Conde da Taipa: — Isso havia ser antes da revolução.

O Sr. Sarmento: — Seria; mas em Inglaterra os delictos de Imprensa transtornam-se ás vezes conforme são os Jurados: depois do Bill de Mr. Fox, em todo o caso se exigiu que os Jurados fossem os verdadeiros Juizes, sendo o Juiz de Direito o director dos processos, e encarregado de ver que a Lei é fielmente executada.

O Sr. Vice-Presidente: — Queira o Sr. Conde da Taipa remetter á Mesa o seu additamento.

O Sr. Conde da Taipa: — Reduz-se, depois da palavra crimes, a escrever estas = Salvos os delictos relativos á Lei da Imprensa.

O Sr. Sarmento: — Então isso é uma questão de alguma magnitude: creio que o Digno Par me fará a Justiça de que estou possuido do desejo de acertar, mas acho que o seu additamento poderia fazer parar o andamento deste artigo; porque, pela minha parte, é uma questão sobre que ainda não formei juizo algum.

O Sr. Bispo Conde: — Todos os Dignos Pares concordam em que este artigo é uma consequencia do 1.º; mas sobre elle se tem feito considerações que intendo merecem alguma attenção. O Sr. Gyrão (se bem percebi o que elle disse) parece-me que o ataca como pouco exequivel, ou como sendo prejudicial aos réos; porque disse, que havendo muitos crimes, e sendo forçoso convocar o Jurado para cada um delles, é difficil fazer isto em um só dia, e por tanto o indiciado no crime, ficará demorado por muito tempo na prisão; podendo por esta razão um homem ser eleito para a Camara dos Senhores Deputados, e não poder tomar assento nella. Estou persuadido que o argumento do Sr. Gyrão não é decisivo; apontou muito grande numero de crimes, mas, segundo minha lembrança, acontecidos em diversos districtos; e então a difficuldade diminue um pouco: comtudo se se determinar um praso para a reunião dos Jurados, póde a Lei ser susceptivel de alguma modificação. —

Página 161

(161)

A opinião do Sr. Conde de Linhares, que appresentou a substituição total deste artigo, não me parece se deva rejeitar in limine; e a excepção que propõem o Sr. Conde da Taipa a respeito da Lei repressiva da Liberdade da Imprensa, tambem me parece digna de attenção. Ora que conclusão quero eu tirar daqui? Que me parece não haver inconveniente em mandar o artigo novamente á Commissão, demorando-se a sua decisão mais um ou dous dias, visto que o negocio não é daquelles que exigem grande urgencia: por tanto decidâmolo com toda a madureza.

O Sr. Margiochi: — Tambem me parece que este 3.º artigo deve ir á Commissão; o que elle appresenta, á primeira vista, é cousa escandalosa; se se não declarar que depois de um Funccionario electivo estar em custodia não lhe aproveita a eleição, para que esta não seja um novo meio de subtrahir-se á Justiça, e seria escandaloso que homens indiciados de crimes viessem occupar os primeiros logares da Nação, sahindo da Cadeia para este fim.

O Sr. Conde da Taipa: — Mas se elle está innocente?

O Sr. Margiochi: — Eu creio que V. Exc.ª mesmo, hontem disse, que um homem indiciado de crime não devia passar a Representante da Nação. Ora se se convocar o Jury immediatamente isso entendo eu, mas fazer o Juiz responsavel, isso não.

O Sr. Conde da Taipa: — Se é escandaloso estar na Cadêa, então digo eu que esta Camara é muitissimo escandalosa; porque muitos de seus Membros lá estiveram; não fallarei em mim, mas aqui estão o Sr. Duque da Terceira, o Sr. Conde de S. Payo, o Sr. Conde de Paraty, e o Sr. Marquez de Fronteira etc. que todos estiveram presos por D. Miguel. Por tanto se não póde ir-se da Cadêa para logar mais elevado, então esta Camara não póde merecer a confiança Nacional. Mas como isto seria um absurdo, insisto em que qualquer homem que fôr á cadêa innocente, possa ser eleito, e occupar o logar de Deputado.

O Sr. Sarmento: — Creio que não poderemos sahir deste embaraço sem o artigo voltar á Commissão: não sou culpado da lembrança que houve em appresentar agora idéas complexas sobre que não tenho fixado o meu juizo: além disso esta Lei não se póde dizer que esteja cavalgando sobre nós (expressão que já aqui se usou): peço por tanto a V. Exc.ª queira propôr á Camara se o artigo ha de voltar á Commissão; e desde já peço se não inste com ella para o appresentar n'um tempo marcado, porque isso seria talvez exigir muito do espirito humano.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu creio que não ha opposição alguma em que este artigo volte á Commissão, até porque se não adianta cousa nenhuma decidindo-se hoje, visto que o 2.º tambem para lá foi remettido, e a Lei não póde sahir sem elle.

Não se fazendo mais reflexão, propôz o Sr. Vice-Presidente, se os artigos em questão voltariam a Secção de Legislação conjunctamente com a emenda do Sr. Conde de Linhares, e a (verbal) do Sr. Conde da Taipa; e assim o resolveu a Camara.

O Sr. Sarmento: — A Commissão Special encarregada de propôr medidas Legislativas sobre aboletamentos, desejaria conferir na Terça feira 17 do corrente com o Digno Par Ministro da Guerra, e com o Coronel Inspector Geral dos Quarteis José Dionízio da Serra.

O Sr. Conde de Lumiares: — Se V. Exc.ª o permitte, pela Secretaria se farão as competentes participações.

Assim o resolveu a Camara.

O Sr. Marquez de Loulé: — A Commissão encarregada de propôr á Camara um Projecto de Lei sobre Caudelarias, precisa dos trabalhos feitos no anno de 1822 pelo Capitão de Cavallaria D. José de Carcajal, e roga á Camara que se peçam ao Governo.

A Camara annuiu a este Requerimento.

O Sr. Vice-Presidente: — Ámanhan não póde haver Camara, porque tem de reunir-se as Commissões. A Ordem do dia para Segunda feira 16 do corrente, são Segundas leituras, e Pareceres de Commissões. — Está levantada a Sessão.

Eram trez horas e um quarto.

(P.)

21

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×