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CAMARA DOS PARES.

SESSÃO DE 11 DE ABRIL.

O Sr. Vice-Presidente tomou a Cadeira faltando dez minutos para uma hora.

Concluida a chamada, declarou o Sr. Secretario Barão d'Alcobaça que se achavam presentes 30 Dignos Pares, e que faltavam, além dos que ainda não compareceram, os Senhores Marquezes de Santa Iria, e de Ficalho, e Visconde de Sá da Bandeira, sem causa motivada; Barradas, por molestia; e Sotto-maior, com licença da Camara.

Em seguimento disse o Sr. Vice-Presidente que estava aberta a Sessão; e lida a Acta da precedente, pelo Sr. Secretario Conde de Lumiares, ficou approvada sem reclamação.

O mesmo Sr. Secretario leu o seguinte

OFFICIO.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. = Tenho a honra de remetter a V. Ex.ª dous dos authographos, tanto da Acta da Commissão Mixta, que teve logar sobre o Projecto de Lei da venda dos Bens Nacionaes, como do accordão tomado sobre as duvidas, que motivaram a mesma Commissão, o fim de serem depositados no Archivo dessa Camara. Deus guarde a V. Ex.ª — Palacio das Côrtes 10 de Abril de 1835. — Illustrissimo e Excellentissimo Senhor Presidente da Camara dos Dignos Pares do Reino. — Duque de Palmella, Presidente da Camara dos Dignos Pares.

Resultado da Commissão Mixta, nomeada pelas Camaras dos Dignos Pares do Reino, e dos Senhores Deputados da Nação Portugueza, a fim de discutir as duvidas offerecidas na segunda Camara ao Projecto de Lei, enviado á mesma pela primeira sobre a venda dos Bens Nacionaes.

Venceu-se que o periodo 1.º do § 8.º do Artigo 4.º daquelle Projecto ficasse subsistindo pela mesma fórma, porque nelle está mencionado; que o periodo, 3.º do § 8.º do Artigo 4.º daquelle Projecto fosse substituido pelo seguinte: «das perdas e damnos provenientes da extincção dos dizimos, que se achavam annexados in perpetuum a algumas familias, que permaneceram fiéis á Rainha, e á Carta, ou nas mesmas vinculados, os quaes serão indemnisados na conformidade do Decreto de 30 de Julho de 1832, salvo qualquer direito que possa ser reclamado pelos interessados.»

Igualmente se venceu que o periodo 4.º do mesmo, paragrapho fosse substituido pelo seguinte: «da perda, ou diminuição total, ou parcial do rendimento em dizimos, ou bens da Corôa das Commendas das Ordens Militares pertencentes ás familias designadas no numero antecedente, calculando-se essa perda sobre o methodo do Decreto de 30 de Julho de 1832, nos Artigos 10.º e 11.º, com a só differença de se avaliarem os rendimentos pelos quatro annos ultimos anteriores á usurpação.» Concordou-se em que depois do Artigo 16.º se seguisse o seguinte: «Artigo 17.º Os Bens Nacionaes comprados na conformidade da presente Lei, não poderão ser vinculados senão para substituir os bens vinculados, de cuja indemnisação tracta o periodo 3.º de §. 8.º do Artigo 4.º, ou para a subrogação d'outros bens vinculados.» Resultando da introducção deste Artigo que o do numero 17 fica em numero 18, e que em tudo o mais fica adoptado o mesmo Projecto sem mais alteração que as acima mencionadas, as quaes fizeram o objecto desta Commissão, que por achar todo o referido conforme com o que nella se venceu, e concordou, mandou lavrar a presente, que por todos os Membros é assignada.

Sala das Sessões da Camara dos Dignos Pares do Reino, 10 d'Abril de 1835. = Duque de Palmella, Presidente. = Polycarpo José Machado, Par do Reino. = Marquez de Loulé, Par do Reino. = Visconde da Serra da Pilar, Par do Reino. = Bispo Conde Fr. Francisco, Par do Reino. = Conde da Taipa, Par do Reino. = Marquez de Ficalho, Par

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do Reino. = Marquez de Fronteira, Par do Reino. = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento, Par do Reino. = Thomaz de Mello Breyner, Par do Reino. = Marquez de Valença, Par do Reino. = Marquez de Ponte de Lima, Par do Reino. = Barão d'Alcobaça, Par do Reino. = Conde da Cunha, Par do Reino. = Joaquim Antonio d'Aguiar, Deputado. = Rodrigo da Fonceca Magalhães, Deputado. = Joaquim Antonio de Magalhães, Deputado. = Manoel Gonçalves de Miranda, Deputado. = Francisco Antonio d'Almeida Moraes Pessanha, Deputado. = José Alexandre de Campos, Deputando. = José Ferreira Pestana, Deputado. = Florido Rodrigues Pereira Ferraz, Deputado. = Francisco de Lemos Bettencourt, Deputado. = Januario Vicente Camacho, Deputado. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado. = Lourenço José Moniz, Deputado. = Manoel Joaquim Cardoso Castel-Branco, Deputado. = Conde de Lumiares, Par do Reino Secretario. = Antonio José d'Avila, Deputado Secretario.

Terminada esta leitura, leu o mesmo Digno Par Secretario a Acta da Commissão Mixta, que se mandou passar ao Archivo, juntamente com os mais documentos.

O Sr. Visconde do Serra do Pilar: — Da Acta de Commissão Mixta consta exactamente o que se passou, mas tendo eu alli offerecido um accrescentamento ao periodo 4.º do § 8.º do Artigo 4.º da Lei que se decidiu na Commissão, foi elle rejeitado; e porque me não contento com o que a este respeito consta da mesma Acta, e desejo que a todo tempo se saibam as minhas opiniões, peço licença á Camara para ler uma declaração de voto, e que depois fique guardada no Archivo: é a seguinte

Declaração de voto.

Declaro que na Sessão da Commissão Mixta que teve hontem logar a respeito da Lei da venda dos Bens Nacionaes, votei que se accrescentasse ao Periodo 4.º do § 8.º do Artigo 4.º o seguinte: = Tudo que se acha determinado neste 8.º § do referido Artigo 4.º, será unicamente intendido a respeito dos Subditos Portuguezes que foram sempre fiéis á Rainha, e á Carta Constitucional na conformidade do determinado no Artigo 11 do Decreto de 30 de Julho de 1832. = Peço que esta minha declaração seja guardada no Archivo desta Camara no mesmo maço em que sacha o authographo da Acta da mesma Commisão Mixta. = Palacio das Côrtes 11 de Abril de 1835. = O Par do Reino, Visconde da Serra do Pilar.

A Camara resolveu, na fórma requerida, que esta declaração fosse tambem depositada no Archivo.

Passando-se á Ordem do dia, leu o Sr. Secretario Barão d'Alcobaça o seguinte

PARECER.

A Commissão Special encarregada dos assumptos pertencentes aos Dominios Ultramarinos, viu a Proposição do Digno Par Conde de Lumiares, e intende que é conveniente adoptala, a fim de que as informações necessarias para se saber com exacção do estado das cousas d'Africa Portugueza, e da Asia, bem como as indispensaveis providencias que tanto as Côrtes como o Governo tem de dar a bem daquelles Dominios Portuguezes, se consigam, e executem por um modo regular, e prompto: nestes termos a Commissão tem a honra de appresentar o seguinte

Projecto de Lei.

Artigo 1.º Tanto os assumptos de qualquer naturesa que sejam, e pertencerem aos Dominios da Corôa de Portugal na Asia, Africa, e Ilhas adjacentes, como as Ordens a elles relativas, serão dirigidas, e passadas a todas as Auctoridades estabelecidas, ou que se acharem nos differentes pontos dos mencionados Dominios, por meio d'uma unica Repartição do Ministerio, que será a Secretaria d'Estado dos Negocios do Ultramar.

Art. 2.º O Governo fica auctorisado para annexar essa nova Secretaria d'Estado a qualquer das seis, ora existentes, conforme julgar mais conveniente para facilidade do expediente; e a organisará de modo, que não possa gravar o Thesouro Publico com novos ordenados.

Art. 3.º Fica revogada toda a Legislação em contrario. Palacio das Côrtes 8 de Abril de 1835. — Conde de Linhares, Par do Reino. — Visconde de Sá da Bandeira, Par do Reino. — A. T. de Moraes Sarmento, Par do Reino.

Terminada esta leitura, abriu o Sr. Vice-Presidente a discussão, e disse

O Sr. Sarmento: — Parece-me que o objecto desta Proposição é muito simples, ainda que lhe faltam as assignaturas de dous Dignos Pares, um delles o Sr. Conde da Taipa, que por motivos de economia não conveiu a principio na opinião da maioria da Commissão, postoque conhecesse a necessidade de reunir em um centro todos os negocios ultramarinos.

O Sr. Conde da Taipa: — Como estou persuadido da grandissima utilidade desta Proposição, ainda que, como disse o Sr. Sarmento, tivesse primeiro votado contra o estabelecimento de sua Secretaria separada das que hoje existem, declaro que estou arrependido, porque actualmente conheço a sua necessidade.

O Sr. Sarmento: — Bom é o arrependimento quando elle vem a tempo.... (Riso) Esta opinião, que o Digno Par acaba de proferir, foi a minha primeira idéa, mas em fim principios de conciliação fizeram com que eu retrogradasse, todavia não querendo enfadar a Camara com uma discussão de policia colonial, direi quanto baste para apoiar este pequeno Projecto.

Muitos Dignos Pares não estarão talvez bastantemente informados do estado em que se acham as nossas possessões ultramarinas, para a necessidade em que estão as Côrtes de lhes applicar os principios de administração, que se acham em practica entre as Nações que possuem estabelecimentos ultramarinos. Eu podéra repetir aqui algumas passagens dos escriptos de Brougham, ou de Burke a respeito da policia colonial das Potencias Europeas; porém para que tocar o tempo aos Dignos Pares com principios geraes de Politica colonial? — Posso todavia affirmar que em Inglaterra offereceram os nossos exten-

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sos dominios em Africa alguma consideração, quando o Ministerio Britanico em certa épocha deu idéas aos Miguelistas de que seria abandonada a Causa da nossa Augusta Rainha. O futuro destino daquelles dominios, em quanto de todo se não apagasse na Terceira o Governo em nome da Soberana, foi causa que influiu muito no Ministerio Britanico para não precipitar à decisão do reconhecimento do usurpador da Corôa Portugueza. — Estes estabelecimentos d'Africa e Asia fazem uma parte importantissima na Politica Portugueza; importancia que se augmenta consideravelmente com a abolição do trafico dos escravos Africanos. Basta que nos persuadamos que a vida da America do Sul vinha da Africa para alli. O commercio da escravatura levava á America Meridional os primeiros elementos da sua industria, os braços com que eram revolvidas as terras, cujas producções são as principaes cadêas que prendem a Europa á America. Esta alavanca da industria Americana existe na Africa em poder dos Portuguezes; e se nós podessemos olhar para estas cousas, com a attenção que merece a sua importancia, teriamos ainda em Lisboa uma nova épocha de grandeza, e seria assim levantada das cinzas em que a poseram a mudança da Séde da Monarchia para o Brasil, a invasão dos Francezes, e outras causas posteriores; e o Rio Tejo, que hoje cobrem poucos navios Portuguezes, com a abundancia de generos coloniaes, poderá em breve offerecer ao amortecido porto de Lisboa um novo interposto; isto não são fantasias, nem uma idéa gigantesca: basta considerar o estado em que se acham alguns pontos da Africa, por exemplo, a visinhança com Cabo Verde; e ha outras rasões, com que eu não desejaria cançar a Camara, mas que são o resultado de bastantes indagações, que tenho feito a este respeito desde que tive a honra de ser Membro da Commissão do Ultramar instaurada nas Côrtes das Necessidades em 1821. As muitas providencias que precisam os dominios ultramarinos, não são cousas que se possam fazer d'uma só vez; cada uma dellas deve ser objecto de Leis particulares, que convém ser bem calculadas, assim no Concelho de Ministros, como no d'Estado, e depois no Grande Concelho Nacional, que são as Côrtes.

Ha muitas cousas que podem vir a mudar a sorte destes estabelecimentos da costa d'Africa; em cujo numero entram as experiencias que se estão actualmente fazendo para alterar as communicações actuaes do commercio do Oriente. Verdade é que não se póde exactamente saber quaes sejam as vistas do Gabinete Britanico, que é o mais interessado nesta mudança; porque o poder Britanico em Colonias é hoje maior que o Imperio Romano, e talvez igual ao de Filippe 2.º Muitas cousas me fazem ver que a Inglaterra, apesar de ter dado passos, e mesmo consignado sommas de consideração para ensaios de abrir as antigas communicações do Oriente, como investigaram Huet, Montesquieu, Robertson e outros, ou na phrase do nosso Historiador Castanheda, quando as riquezas daquelles Paizes se vazavam pelo Mar Roxo, que a posição da Gram-Bretanha, apesar do seu poder maritimo, e postos militares, que hoje occupa no Mediterraneo, não é a mesma da França, da Italia, e da Hespanha, que são banhadas pelo Mediterraneo, e cuja visinhança com o Egypto, e Asia Menor lhes offerece maiores conveniencias, para que se mude a communicação com o Oriente, e torne ao estado em que estava antes do nosso Gama dobrar o Cabo da Boa Esperança.

Mas seja o que fôr, a importancia dos nossos estabelecimentos em Africa, sobre tudo as possessões das Ilhas desde Cabo Verde até á extremidade da Africa Oriental, são d'uma ordem incalculavel, considerando-se mesmo como pontos, sem relação ao commercio da Asia. Os generos coloniaes cultivados nestas possessões não sómente em rasão da abundancia de braços, como pela barateza dos fretes, podem vir a fazer de Lisboa um armazem, para serem distribuidos por preço commodo ás praças da Europa, poupando-se a estas a navegação distante e despendiosa da America Meridional. — Muitas outras considerações nascem a respeito deste assumpto, e que por obvias é desnecessario proferir. As nossas possessões Asiaticas, esse manto retalhado de nossas antigas glorias, podem vir a ser do maior serviço. O mesmo ponto em Diu, até hoje idolatrado como monumento historico das façanhas que alli aconteceram, poderá vir a ser de muita utilidade para facilidade da navegação por vapor. Ou as embarcações que partirem da costa do Malabar demandem o Golfo Persico, ou o Mar Roxo, a estação em Diu é de importancia para um dos armazens de combustiveis. Sei que é muita affouteza, e até certo ponto se poderá taxar de imprudencia o fallar do futuro; porém não serei demasiado affouto quando chamar a attenção dos Dignos Pares, e a do Governo, para medidas promptas a bem dos nossos estabelecimentos, tanto na Asia, como na Africa. (Apoiado.)

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — O Projecto de que se tracta é evidentemente de utilidade publica, e sobre o qual não pódem recahir considerações de partidos, não podendo conseguintemente tambem ser decidido, senão pela convicção da conveniencia que póde trazer á marcha dos negocios publicos.

Depois da chegada do Duque de Bragança a Lisboa, e quando se poz em andamento na Capital o Governo Constitucional, assentou-se com alguma rasão que era de desejar se attendesse, quanto possivel fosse, a todos os dominios Portuguezes fóra da Europa; então os negocios do Ultramar (que até alli sempre tinham sido centralisados em uma só Secretaria) se dividiram por todas as Secretarias d'Estado, indo, os que por sua natureza pertenciam ao Reino, a esta Repartição, os da Marinha de Goa, por exemplo, á de Marinha, e assim os mais. Mas deste methodo não tem resultado bom effeito; a experiencia tem mostrado que não havendo uma Repartição que se julgue mais specialmente incumbida de olhar para aquellas partes da Monarchia (quero dizer as possessões ultramarinas) fica o que lhes é relativo um pouco esquecido comparativamente aos negocios da mesma qualidade no Reino; padecendo assim os Povos, bem como o serviço Nacional. Portanto, creio que nada ha mais acertado do que regularem-se os homens (principalmente os que governam) pelas lições da experiencia; e, como se tem visto, a da divisão dos negocios do Ultramar, não me parece trouxesse vantagens, mas antes inconvenientes. —

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Recorre-se agora ao mesmo systema que antes estava em practica, isto é, a reunir todos os negocios pertencentes ás Colonias, em uma só Secretaria d'Estado, a qual se considera in totum como responsavel pelo seu andamento; este methodo julgo preferivel ao que ora se segue.

Quanto á escolha dessa Secretaria, se se houver de apontar uma designadamente, não ha duvida que deve ser a da Marinha; é das seis Secretarias d'Estado actualmente existentes, a que por agora tem menos trabalho; ha porém ainda outro motivo, e vem a ser porque as communicações com as Colonias são todas por mar, e isto faz uma relação mais directa. Entretanto póde haver circumstancias em que o Ministro da Marinha tenha mais a fazer por algum motivo (como agora acontece que o Sr. Ministro da Repartição se acha encarregado da da Guerra) e então longe de ser um dos que tem mais tempo, talvez seja dos mais occupados, caso em que não poderia ainda sobrecarregar-se com as cousas ultramarinas. — Eu confesso que na minha theoria particular tudo o que imagino pertencer ao mechanismo do Ministerio em um Paiz Constitucional, intendo que deve deixar-se ao Governo, dando-lhe a maior latitude possivel, para que distribua os differentes negocios áquelles individuos que, ou estejam mais desembaraçados nessa occasião, ou se julgue terem uma aptidão para serem encarregados de certas incumbencias; e por isso desejaria eu que a Lei, quanto possivel fosse, permittisse ao Governo fazer esta distribuição á sua vontade; isto é, conforme o bem do Estado parecesse exigilo. — Entretanto, na nossa posição actual, não insistirei nesta idéa; sei que existem seis diversas Secretarias d'Estado determinadas por Lei; sei que para haver uma septima, sem expediente marcado (ou sem pasta), foi necessario vencer-se uma discussão renhida na outra Camara Legislativa, discussão em que me não parece necessario tornar a entrar neste momento; com tudo não posso deixar de apoiar o systema de dar certa liberdade ao Governo para este effeito, o que eu julgo será muito conveniente, no menos para o que diz respeito á Secretaria que ora se vai formar; e com o tempo talvez mesmo que o Ministerio fique habilitado a unir o expediente ultramarino a qualquer das outras Secretarias d'Estado que elle para isso julgue mais appropriada.

O Sr. Margiochi: — Este Projecto é simples, e por isso a Camara decidiu que se não imprimisse: mas se a Proposição é simples, a sua resolução é que me parece não o ser; e por isso peço licença á Camara para dizer alguma cousa sobre a historia desta Secretaria do Ultramar, e da sua Legislação.

Foi creada esta Secretaria por um Alvará de 28 de Julho de 1736, dando para isto a rasão, de que então não haviam senão duas Secretarias d'Estado, as quaes não eram sufficientes para dar sahida a todos os negocios; e então se fazia necessario que os do Ultramar se reunissem em uma só Secretaria. Durou esta perto de um Seculo: este Seculo realmente não foi o 16, não foi tambem o Seculo 17, em que nos perdemos de tornar a haver muitas de nossas possessões ultramarinas: este Seculo foi muito funesto para as nossas Colonias, foi util realmente para uma que então possuiamos, o Brasil, porque talvez não tivesse menos de tres milhões de homens pretos que foram cultivar o Brasil; primeiro para tractar das minas, e outros para tractarem do terreno, a fim de sustentar os primeiros, e realmente fizeram-se alli grandes estabelecimentos; porém a costa d'Africa não lucrou nada; e então fallando-lhe agora o commercio da escravatura, estão aquellas Colonias muito desgraçadas. Ora já se vê que de terem estado unidos em uma só Secretaria os negocios do Ultramar naquelle Seculo, não se prova que isso fosse de utilidade. — Em Setembro de 1821 propôz Manoel Fernandes Thomaz que se dividissem os negocios ultramarinos por todas as Secretarias d'Estado; não se tractou deste negocio até 31 de Outubro, e então, sem discussão, julgou-se que era conveniente approvar a Proposta, por uma unica rasão que o seu auctor deu, a saber, que não conhecia um homem só com tanta capacidade que podesse tractar de todos os negocios do Ultramar; em o mesmo anno, (sendo o nosso Vice-Presidente hoje, então Presidente daquelle Congresso) lavrou-se um Decreto, o qual o Sr. D. João 6.º teve a bondade de publicar, para a separação dos negocios do Ultramar: mas esta separação durou só dous annos, porque em 1823 o Conde de Subserra, que se julgava capaz para indo que era poder, não contente com a Secretaria da Guerra tinha a de Marinha, e dos Dominios ultramarinos, e então reuniu outra vez todos os negocios, mas dando uma rasão, (que não era muito plausivel) que foi haver confusão na separação. Ora é possivel que houvesse alguma, porque existia então um Conselho ultramarino, no que talvez houvesse incompatibilidade por querer fazer alguma cousa; e póde ser que disto resultasse a confusão nas Secretarias. Disse mais que a experiencia de dous annos tinha mostrado que a reunião não correspondia ao que se desejava; mas esta experiencia só os Povos daquellas terras a poderiam fazer, e dizer se estavam, ou não satisfeitos; porém isso não se podia saber ainda, porque os dous annos eram precisos para haver essas primeiras informações: não se podia por tanto saber se aquelles infelizes estavam contentes. — Em fim o Sr. Duque de Bragança, que gostava de saber todas as cousas, e concorrer para tudo aquillo que podia unir os Portuguezes, dividiu outra vez, em 28 de Julho passado, (ainda não ha um anno), por todas as Secretarias os negocios ultramarinos; e eis aqui, quando a experiencia ainda nada mostrou, que já queremos reunir outra vez todos os negocios do Ultramar. Parece-me muito prematura esta medida; mas comtudo vamos a ver se haverá algum motivo que possa obrigar-nos a lançar mão della. O principal parece-me que deviam ser requerimentos daquelles Povos queixando-se da separação; taes requerimentos não existem: o outro motivo seria uma Proposta do Governo, que é quem melhor sabe desta materia, e até me parece que nisto devia ter a iniciativa; é elle quem devia vir representar; mas tal não se tem feito, em consequencia parecia-me que deviamos esperar ouvir os inconvenientes, que tem resultado daquella separação.

Vamos agora ver se pelos principios da Carta tambem se encontra algum obstaculo: diz o Artigo 101 = Haverá diversas Secretarios d'Estado, a Lei designará os negocios pertencentes a cada uma, etc. = Não determina pois que haja Secretaria d'Estado para as

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possessões, ou negocios ultramarinos, mas para os negocios de Portugal. Outro Artigo da mesma Carta, ensina que as possessões ultramarinas são uma parte de Portugal; e diz mais (Artigo 145 § 12) que a Lei é igual para todos. — Aqui temos as Ilhas dos Açôres, e Madeira para quem está medida não é applicavel, e então os outros dominios que estão mais longe, não poderão ter a mesma vantagem de requerer pelas diversas Secretarias; isto é offender aquelles Povos sem dahi tirar utilidade alguma: porque, se é por estarem mais remotos, o mesmo navio que traz as suas representações para uma só, póde trazelas para as diversas Secretarias; tanto que até acontecendo perderem-se alguns papeis na Secretaria do Ultramar, esta póde obtelos recorrendo ás outras.

Eu tenho ouvido differentes pessoas sobre este objecto; uma (que foi do antigo Conselho do Ultramar) disse-me que era impossivel deixar de haver um Ministro destes negocios, e que era preciso haver um Conselho. Ouvi tambem outro que tinha sido Governador e Capitão General em um dos pontos dos nossos dominios ultramarinos, e disse-me que não era possivel ter possessões ultramarinas, sem haver uma Repartição do Ultramar: este alegava os exemplos das outras Nações. — Os Officiaes-maiores das Secretarias tambem não olharam bem esta divisão, e a dizer a verdade, tiveram a rasão do commodo porque lhes resulta mais trabalho, sem haver augmento de emolumentos, visto que hoje em dia os emolumentos se dividem por todas as Secretarias; não estive por nada disto. — Ouvi tambem um que me disse ser procurador de uma Provincia do Ultramar, e me affirmou ser-lhe mais conveniente ir a uma só Secretaria, do que andar por todas; porem nada disto impediu que a Secretaria do Ultramar fosse dividida por todas as outras Secretarias, ás quaes o Ministro tinha de recorrer, para todo o expediente que não era da Marinha; e assim muitas vezes se achava em grandes difficuldades, porque os Ministros olhavam sempre primeiro para os negocios da sua Repartição, em que tinham muito que fazer. Se eu (quando era Ministro) queria mandar artilheria para o Ultramar, tinha de recorrer ao Ministro da Guerra; se queria mandar um Juiz de Direito, ao das Justiças; e assim a respeito de todas as outras Repartições. Realmente o Ministro da Marinha via-se muito embaraçado antes de poder fazer alguma cousa. — Eis aqui as rasões porque foram separados aquelles negocios; e se a Camara adoptar a idéa de se tornarem a unir, então por economia devem tirar-se de cada uma das Secretarias aquelles Officiaes necessarios para fazer a do Ultramar; e a experiencia mostrará em muito pouco tempo todos os embaraços que apontei.

Tenho mostrado os motivos porque se separaram os negocios ultramarinos, os quaes pareceram os mais conformes com a rasão, com a Carta, e muito mais conformes ainda com o bem do serviço.

O Sr. Ministro da Marinha: — Estando actualmente no Ministerio da Marinha, não posso deixar de dizer alguma cousa a respeito desta questão. — Ouvi as rasões que deu o Digno Par, para provar que é impossivel encontrar-se em um só individuo quantos conhecimentos são necessarios para dirigir todos os negocios ultramarinos. Devo observar que bastando-lhe os conhecimentos geraes de um homem de Estado, tambem me inclino a que os negocios ultramarinos sejam incumbidos a um só Ministro, porque assim se lhe dá uma acção mais prompta em utilidade das Colonias. — Segundo o Projecto que hoje se leu admittem-se auctoridades solidarias, e a administração é comettida a estas auctoridades, que necessariamente serão pessoas capazes, cuja escolha é do Ministerio, que deve procurar tenham conhecimentos dos differentes ramos de que se compõem aquella administração, e que sejam aptas para dar as providencias convenientes para as melhorar; porque em todas as Provincias ultramarinas distantes, não póde cada Ministro ter uma acção tão immediata, como nos Açôres, e no interior do Reino; e por isso acho que para as primeiras deve a administração ser entregue ás auctoridades locaes que se hãode nomear.

Não vejo pois difficuldade em que se reunam todos os negocios ultramarinos á Secretaria da Marinha, nem intendo que haja difficuldade pelo maior trabalho que se lhe accumula com esta reunião, porque de facto o Ministro da Marinha é actualmente aquelle que tem menos ingerencia nos negocios das nossas possessões ultramarinas, tendo-a sómente a respeito do material da Marinha, porque tudo mais passa pelas outras Repartições e auctoridades ministeriaes, como são Guerra, Fazenda, Justiça, etc. Ora eu vejo que esta dependencia causa algum atrazo ao andamento dos negocios, e que pelo contrario sendo todos elles entregues a um só individuo, será mais simples; e mais expedito o seu andamento. — Diz-se que não ha Officiaes de Secretaria capazes, eu creio que ha um numero sufficiente delles proprios para o expediente destes negocios. — O Ministerio ainda não appresentou um Projecto a este respeito, porque as Camaras tem estado muito sobrecarregadas de trabalhos, mas acho que é muito util e necessaria esta união de negocios em um centro, muito particularmente nas actuaes circumstancias.

O Sr. Sarmento: — Talvez que o Artigo não esteja bem claro: as Ilhas da Madeira, e os Açôres não devem ficar comprehendidas nelle, porque sempre foram reputadas parte do Reino; não fallo geographicamente, porque a posição da primeira é na Africa; mas as Nações tem poder para tudo, menos para fazer de um homem uma mulher. (Riso.)

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Direi alguma cousa sobre este Artigo. — Em primeiro logar concordo completamente com o Digno Par sobre ficarem excluidos deste Projecto os Açôres, e Madeira, porque não entram no numero das nossas possessões que se chamam dominios ultramarinos, e que geralmente fallando são de Cabo Verde para o Sul. — A conveniencia de attender ás nossas Colonias é obvia, e o Sr. Sarmento acabou de fazer a este respeito mui acertadas reflexões; Portugal tem obrigação de fazer por melhorar a sorte de todos os seus dominios, mas actualmente tem necessidade specialmente de ver se póde tirar algum partido mais vantajoso das possessões que lhe restam na Asia e Africa, para supprir d'alguma maneira a grande perda que fez com a separação do Brasil: tentando buscar se dahi lhe resultam algumas vantagens commerciaes.

As observações do Sr. Margiochi (ainda que não ouvi senão parte dellas, por haver sahido de Sala,

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quando fallava o Digno Par) são judiciosas; mas se quiz justificar a medida que se tinha adoptado de dividir os negocios do Ultramar pelos diversos Ministerios, não sei se o alcançaria, estou persuadido de que para isso houve muito boas rasões; e que, quando tal se decretou, foi com o desejo de informar a Administração de todos os Estados pertencentes á Corôa; e que tambem foi pela vontade de extender as vantagens do Systema Constitucional que esse arbitrio se operou: entretanto mostrou a experiencia que dahi não resultavam os interesses que se tinham concebido. Talvez com o tempo, quando aquellas possessões tiverem maior população, e prosperado mais, talvez então possa convir não só renovar essa mesma disposição, mas tambem conservar a outra que se adoptou, e que vi produsida em um Projecto appresentado hoje nesta Camara por um Digno Par, o qual tracta de effectuar a divisão das auctoridades, Militar, Civil, e de Fazenda nas Colonias, como o estão no Reino. — Neste momento, tambem creio que essa divisão não é util, não é mesmo possivel. — Comtudo não é desse ponto que tractâmos, nem talvez haja tempo para se tractar na presente Sessão. — O Governo tinha sem duvida pensado o mesmo que acaba de propôr-se, em uma Lei geral de organisação do Ministerio, de que tinha trazido o Projecto; mas a multidão de negocios que houve a decidir nestas duas Sessões Legislativas, e tambem o preceito da Carta para que a iniciativa do Governo só tenha logar na Camara Electiva, foram os motivos de não chegar a appresentar o mencionado Projecto; e por isso vê com muita satisfação que alguns Dignos Pares se lembrassem de o propôr nesta Camara. Entretanto hoje prova-se que a centralisação dos negocios do Ultramar é da maior necessidade, porque as Colonias estão, por assim dizer, como engeitadas; que nenhum Ministro se incumbe specialmente de seus negocios, nem póde tomar nelles o interesse devido, por não ter debaixo dos olhos todas as differentes circumstancias que podem influir para tomar as deliberações precisas sobre um ou outro objecto: e para prova disto, viu-se o Ministerio obrigado extra-officialmente a formar uma Commissão de pessoas muito habeis e benemeritas (cujos Membros se tem prestado graciosamente a este encargo) para supprir momentaneamente a falla d'um Ministro special, e se reconcentrarem de facto os negocios do Ultramar em quanto o não estão de direito, de maneira que se possam adoptar as medidas que mais necessarias pareçam, combinando-as, e concentrando-as todas em uma só Repartição. Isto é o que existe agora, e a essa Commissão pertence um dos Dignos Membros desta Camara, que como já disse se tem prestado graciosamente á tal incumbencia.

O Sr. Conde da Taipa: — Tem-se fallado muito a respeito das Colonias ultramarinas, e do que se tem feito a respeito dellas; e eu digo que tudo quanto se tem feito são de propositos, não tendo havido a attenção que se devia ter com ellas. O que disse o Sr. Margiochi relativamente á separação dos negocios ultramarinos por todas as Secretarias em 1821, apesar de ser de Manoel Fernandes Thomaz foi uma tontice, assim como outras muitas que se fizeram naquelle tempo. Entre tanto digo que as nossas Colonias são de grandissimo interesse; Moçambique principalmente, porque tem muitos generos, tem ouro, e ainda muitas minas que se não tem descoberto por falta de industria que se precisa animar. Qual é pois o modo de fazer isto? É organisar uma boa administração nas Colonias, promover alli companhias, e animar os emprehendedores, concurrendo para a civilisação daquelles Povos, e não pondo-lhe lá um Prefeito, e um Governador Militar, porque, quando menos, ha de haver conflictos. — A idéa do Sr. Sarmento é excellente, porque em havendo uma Secretaria privativa dos Negocios do Ultramar, e um Ministro que unicamente seja incumbido desta Repartição, promover-se-ha a civilisação e industria daquelles Povos, por todos os meios necessarios assim como o fazem os Inglezes e Francezes. Um Prefeito será bom para governar a Beira Baixa, ou outra Provincia do Reino, mas não aquelles Povos; porque as circumstancias do Paiz são differentes, e não permittem tal fórma de governar. — Quando se mandou o Mousinho Prefeito para a Madeira, elle recusou por não querer conflictos com outras auctoridades; acharam que tinha razão; e então disseram-lhe vá Vm. Sr. Prefeito, e seja tambem Governador das Armas. — Em quanto isto assim não fôr, está tudo perdido. — Concluindo, voto pela Secretaria do Ultramar e até por um Secretario d'Estado privativo, com tanto que seja um homem, que não cuide de outra cousa, que não sejam só aquelles negocios e todos os interesses daquellas partes — Não levarei a questão mais adiante, porque teria ainda muito que dizer; mas desejo que termine este debate, até porque quero ainda hoje fazer duas Proposições que já annunciei á Camara. — Entretanto offereço esta Emenda, que se tomará na consideração que merecer. — Leu-a; é a seguinte

Emenda.

Os Negocios do Ultramar serão derigidos por uma Secretaria d'Estado creada exclusivamente para as Colonias e Conquistas Ultramarinas, e regida por um Ministro d'Estado dos Negocios do Ultramar. — Palacio das Côrtes, em 11 do Abril dê 1835 — Conde da Taipa, Par do Reino.

O Sr. Sarmento: — Não terei duvida alguma em adoptar a emenda do Digno Par o Sr. Conde da Taipa, que aliàs fallou com aquella franqueza, que (ainda quando outras provas não tivessemos de suas qualidades) bastava, para que eu me não offende-se de alguma expressão que em seus discursos se podesse ás vezes notar; posto que eu lhe tenha dado carta branca para dizer o que quizer. (Riso.) Suas optimas intenções são de todos conhecidas.

A primeira intenção da Commissão, era fazer esta Secretaria d'Estado inteiramente separada das outras; porque realmente o trabalho della, quando de veras se trabalhar, hade ser muito grande. — Eu tenho estudado alguma cousa, sobre o que diz respeito aos negocios do Ultramar; comecei a tractar disto em 1821, nas Côrtes das Necessidades, sendo Membro da Commissão Ultramarina, (do que V. Exc.ª é testemunha) olhei, e dei muita attenção a differentes documentos que para alli foram mandados, e dos quaes uma parte era importantissima, e apesar des minhas diligencias, sei muito pouco da materia; de-

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vendo por isso estar em peiores circumstancias, as pessoas, que a ella se não tiverem dedicado algum tempo. — Ora para cuidar de tão variados negocios, era quasi indispensavel que elles fossem reunidos em uma só Secretaria d'Estado separada das outras. Entretanto a opinião de um dos Dignos Pares na Commissão, foi contra a creação desta nova Repartição, e eu assenti a este parecer por motivos de conciliação, e tambem porque o Sr. Presidente do Conselho, e o Sr. Ministro da Marinha pareciam ir para esta idéa, desejosos de que um Projecto de Lei começado desta Camara, encontrasse o menor numero de opiniões; e mesmo porque não sabia se na outra Camara haveria alguem que alli o quizesse defender com amor. — Taes foram as razões porque a Commissão assim procedeu, mudando de parecer. — Pelo que pertence ao que se tem dito, são cousas muito acertadas, mas terão mais logar quando se tractar de constituir definitivamente os governos em Africa, e Asia: com tudo devo reflectir que assim como na maior parte das Possessões Ultramarinas ha muito espirito Nacional, ha tambem algumas preocupações a que os Legisladores devem attender, porque nascem dos costumes, que não é facil, nem talvez conveniente, destruir. Angola carece de cousas, talvez diversas daquellas, que façam prosperar Moçambique. N'uma palavra é necessario transigir, por assim me explicar, com as differentes Possessões com particularidade as Africanas; porque em fim são Paizes para onde se mandavam degradados, e delles provém uma grande parte da sua população. — Esta materia é de si delicada, e quando eu tiver a honra de appresentar á Camara um mais amplo Projecto a este respeito, então desinvolverei os seus motivos, e mostrarei a exactidão de algumas asserções que hoje tenho proposto. — Concluo pedindo a V. Exc.ª queira perguntar á Camara se julga admissivel a emenda do Sr. Conde da Taipa; é este o ponto preciso a que me parece se deve resumir a questão.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Direi só duas palavras para obviar a questão, porque creio que todos desejam se vote. — Não entrarei agora no ponto relativo á conveniencia, ou não conveniencia de uma septima Secretaria d'Estado: a idéa do Ministerio foi sómente reunir todos os negocios do Ultramar em uma das seis existentes, idéa unica que póde encontrar facilidade na sua adopção; nem isto prejudicará qualquer outro Projecto que de futuro haja de appresentar-se; por tanto seria de parecer que simplesmente se posesse á votação o Projecto tal qual.

O Sr. Ministro da Marinha: — Eu fallando com o Digno Par, só concordei na reunião de todos os negocios ultramarinos em Uma só Secretaria d'Estado.

O Sr. Sarmento: — A Commissão quisera reunir todos os negocios do Ultramar sem differença alguma. — Devemos porém considerar este negocio, não em relação á antiga Monarchia, mas á épocha em que nos achamos reflectindo que isto, como outras muitas cousas, está ainda in fieri. O que acabou de dizer o Sr. Margiochi é exacto; antigamente assim acontecia, porque havia Conselho do Ultramar, Conselho da Fazenda, e o Presidente do Erario, o qual não como Secretario d'Estado, mas como Logar-Tenente d'El-Rei, tractava de certos negocios; porém nós hoje não temos este emprego; o Ministro da Fazenda é apenas Ministro como os outros, e então só naquella qualidade poderá ter ingerencia. Havia tambem outra razão, e era, que sobre todos os objectos de Fazenda o Concelho do Ultramar era consultado, e decidia alguns pontos: actualmente não ha esse Tribunal, a unica pretenção que houve, foi, que uma só Secretaria d'Estado reunisse em si todos os negocios do Ultramar, e que se intendesse com todas as mais Secretarias: o que em outras épochas fazia o Ministro da Fazenda era como Logar-Tenente d'El-Rei, que hoje não existe, como já disse. — O Sr. Ministro da Fazenda está presente, e póde dar melhores informações do que eu a este respeito. — O Ministro dos Negocios da Fazenda é em todos os Paizes o que tem maior latitude de poder, por isso que distribue as graças; entre nós talvez seja o da Repartição do Reino; e o da Fazenda tem a mesma auctoridade, que outro qualquer dos Ministros. Por tanto não vejo se possa fazer uma divisão exacta dos negocios Ultramarinos; os Ministros lá farão essa distribuição entre si, propondo cada um ao Ministro encarregado desta Repartição o que precisar; a Commissão teve unicamente em vista reunir todas estas dependencias em uma só Repartição por intender ser conveniente para o seu melhor andamento, e expediente.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo 1.º posto á votação, e approvado.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros propôz a seguinte

Substituição ao ultimo Periodo do Artigo 1.º

As Ilhas da Madeira e dos Açôres serão administradas como as Provincias do Continente de Portugal. = Duque de Palmella.

Foi logo entregue á votação e approvada.

Passando-se a discutir o Artigo 2.º disse

O Sr. Sarmento: — É a este Artigo que me parece admissivel a emenda do Sr. Conde da Taipa. (leu-se.)

O Sr. Vice-Presidente: — Duas questões se podem suscitar ácerca deste Artigo; a primeira se hade formar-se uma nova Secretaria d'Estado, e a segunda se deverá Unir-se a qualquer das existentes.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu o que supponho ser a mente dos Dignos Pares que fizeram esta Proposta, é que se constitua a nova Secretaria com empregados das outras, mas que fique ao arbitrio do Governo o encarregala ao Ministerio que lhe parecer.

O Sr. Sarmento: — Sem o Ministro desta Repartição ficar separado de outra não é possivel; ainda quando elle tivesse um livro, como costuma haver nas audiencias civeis, estava sempre subjeito á maior confusão.

O Sr. Conde de Linhares: — As Secretarias d'Estado tem attribuições diversas, e então não póde haver duvida em que, tractando-se de negocios speciaes, se lhes dê uma certa organisação. — O Artigo de que se tracta permitte esta organisação conforme se intender, e julgar conveniente: por isso o approvo.

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O Sr. Sarmento: — O Artigo da Carta é o mais explicito possivel; mas devemos lembrar-nos que não ha nada como a practica, e a experiencia para nos guiar em qualquer cousa. Houve um processo muito celebre quando Artigos da Carta foram desprezados pelo Poder Executivo com o fim de ajudar a execução das Leis: fallo do processo do façanhoso Prior de Christo. Por mais que os Juizes o quizessem salvar, elle havia de ser castigado serrão fosse a confusão, que causaram as innumeraveis Portarias do Governo. — Por isso torno a dizer que nada ha como as lições da experiencia. A existencia de Secretaria da Justiça é uma anomalia constitucional, estabelecido o principio da independencia de Poder Judicial. Entretanto é preciso ver que a Carta foi tão previdente que deixou este ponto ao inteiro arbitrio das Côrtes; por conseguinte em quanto se tractar de Secretarias d'Estado não se offende a Carta nem levemente, pois o Poder Legislativo póde dar-lhe a forma que intender ser mais conveniente para o serviço publico. As Côrtes estão auctorisadas para as organisar como acharem conveniente.

O Sr. Conde da Taipa: — A minha emenda consiste em que haja uma Secretaria d'Estado privativa de todos os negocios ultramarinos, e um Secretario d'Estado encarregado delles, sem ter que tractar de outros objectos.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Peço licença para fazer uma observação. — Sem me pronunciar contra a idéa, em abstracto, de haver uma septima Secretaria d'Estado, para os negocios do Ultramar, não me acho disposto a votar por ella, pela simples rasão de que sobre este ponto o Governo não tomou ainda uma deliberação em Concelho; nem é um objecto tão insignificante, principalmente se se attende á sua relação directa com o pessoal do Ministerio, que possa votar-se sobre elle sem o seu accordo.

O Sr. Bispo Conde: — Eu deixaria ficar o Artigo como está, eliminando-lhe a clausula de não gravar o Thesouro; porque não sei como o Governo possa organisar convenientemente esta nova Secretaria, senão ficar auctorisado a nomear alguns Officiaes, que sejam proprios para ella. Forçar o Governo a servir-se dos mesmos, (que talvez não estejam habilitados para isso) só para poupar uma pequena despeza, não me parece acertado; mas a Camara o decidirá.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Não posso votar nesta materia, em quanto se disser que esta nova Secretaria fica annexada a outra; porque não posso considerar utilidade nesta Repartição a continuar como estava: é preciso que para alli se chamem individuos que tenham conhecimentos do Ultramar, porque de contrario ir-se-ha confundir tudo, e nenhum melhoramento se obterá com esta Lei: é necessario que cada Ministro, e seus Officiaes se occupem só dos negocios da sua Secretaria.

O Sr. Sarmento: — Apoio inteiramente a opinião do Sr. Bispo Conde. — Esta lembrança de economia é certo que ás vezes transtorna os mais bem concertados planos. — É possivel não encontrar entre os Officiaes das actuaes Secretarias todos os que são necessarios com aquelles conhecimentos particulares que as cousas do Ultramar exigem; e então esta phrase de não querer gravar o Thesouro, iria atar as mãos ao Governo para fazer uma melhor escolha. — Como Membro da Commissão, torno a dizer que convenho se elimine.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Duas palavras, Sr. Presidente. — Eu por economia intendo ordem nas despezas; e as que são necessarias ao Estado, não são despezas são necessidades. É preciso poupar, mas nunca em objectos de grande conveniencia: e como esta Camara reconhece a necessidade urgentissima que ha desta Secretaria, segue-se que ella deve ter os Officiaes capazes, e por tanto habilitar o Governo para os poder nomear, e pagar-lhes. Conseguintemente adopto a opinião do Sr. Bispo Conde.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — É preciso pôr termo a esta questão, para o que não ha senão dous meios; um é o que propõem a Commissão, e se reduz a reconcentrar em um só expediente todos os negocios do Ultramar, deixando ao Governo que os reuna a uma das Secretarias d'Estado hoje existentes; o outro meio é designar-se na Lei qual hade ser essa Secretaria, que neste caso convém seja a da Marinha.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não duvido de que isso assim seja, mas o caso está em ver se é necessario uma Secretaria e Secretario para estes negocios; porque o grande objecto é olhar com interesse para as nossas Colonias: se entregarmos isto ao Ministro da Guerra (por exemplo) elle sempre hade ter predilecção por militares, e assim os Ministros das outras Repartições: é pois necessario um homem que esteja apartado de todas estas vistas particulares, é necessario que não tenha mais que fazer senão o que fôr relativo no Ultramar; as nossas Colonias estão em estado de se perder de todo se lhe não acudirmos, mas é indispensavel olhar para os governantes com relação aos governados: é forçoso attender a todas estas circumstancias, e ás que se tem appresentado na discussão.

O Sr. Marquez de Loulé: — A idéa apontada pelo Sr. Presidente do Conselho de que se deixe este negocio ao Governo, é contra a Corta, porque ella diz assim (leu); de maneira que quer dizer, que só era virtude de uma Lei isto se póde determinar; e então essa Lei ás Camaras pertence o fazela.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Porém essa Lei ainda não está feita, e terá de ser appresentada pelo Governo.

O Sr. Marquez de Loulé: — Parecia-me mais facil que os Senhores Ministros dissessem a qual das Secretarias tinham tenção de unir estes negocios, e assim determinar-se aqui positivamente.

O Sr. Conde de Linhares: — Esta palavra Lei que está no Artigo da Carta, quer dizer em geral, que uma Lei marcará os negocios que pertencem a cada Secretaria, e por isso parece-me que por esta Lei se póde deixar ao arbitrio do Ministerio o fazer uma outra se o julgar conveniente, pois que a Carta mesmo parece inculcar que poderá haver uma mudança nos negocios que incumbem a cada Secretaria; por tanto não me parece que haja obstaculo em deixar ao arbitrio do Governo o poder unir estes negocios ultramarinos a uma ou outra Secretaria d'Estado.

O Sr. Marquez de S. Paio: — A minha opinião é que esta Secretaria d'Estado se separe inteiramente

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das outras; a experiencia o aconselha. Do consenso unanime de todos os homens, que tem amor da Patria, e alguma idéa das nossas Colonias, não póde deixar de resultar a importancia dellas, entretanto a practica tem mostrado que são mal administradas, e que o defeito capital dessa administração e a ignorancia dos interesses politicos e commerciaes das mesmas Colonias, e dos meios de as fazer prosperar: o que não podia deixar de acontecer, por isso mesmo que os seus importantissimos negocios andavam espalhados pelas diversas Secretarias d'Estado, cujos chefes, pelo muito que tinham a fazer, consideravam o que dizia respeito aos dominios ultramarinos, como secundario. Estabeleça-se pois um systema completo e constante sobre os mesmos dominios; isto obtem-se concentrando-se todos os seus negocios em uma unica Secretaria, por isso mesmo que nesta hypothese o Ministro respectivo fica responsavel e obrigado a procurar os auxilios de que carecer para a decisão do que lhe é incumbido; para este effeito póde ter junto a si homens conhecedores, não simples theoreticos, mas que por seus conhecimentos practicos possam habilitar o mesmo Ministro a obrar com conhecimento de causa. Se isto assim se fizer poderemos tirar vantagens das chamadas Colonias, e não só algumas, porém muitas, de outro modo ficarão ellas como até aqui.

Senhores, os dominios do Ultramar são da maior importancia para Portugal, principalmente depois da perda do Brasil. Que utilidades se não podem tirar das Ilhas de Cabo Verde, e das outras duas Ilhas de S. Thomé e Principe? Immensas. Quem póde desconhecer as vantagens que devem trazer ao commercio e á industria Nacional os estabelecimentos de Angola, Moçambique, e o magnifico emporio da Costa Oriental da Africa? Como haverá quem não presinta as vantagens, que podem resultar para Portugal, se souber tirar partido dos grandes estabelecimentos que ainda tem na India? — Todas estas rasões nos obrigam de necessidade a fazer convergir todos os negocios do Ultramar em uma só Secretaria d'Estado; por isso voto neste sentido, e para que á mesma Repartição se não annexe outro negocio algum.

O Sr. Sarmento: — Sobre a Ordem. — Parece-me que por ora devemos tractar sómente da emenda do Sr. Conde da Taipa. É uma observação feita, que o optimo é muitas Vezes inimigo do bom; creio que foi Voltaire quem disse isto pela primeira vez. O que propõem o Sr. Conde da Taipa me parede bem, mas igualmente me fizeram impressão as considerações appresentadas pelo Sr. Presidente do Conselho, relativamente nalgumas difficuldades, que poderiam sobrevir: não podendo pois conseguir o optimo, consigamos alguma cousa boa. — O Sr. Marquez de Loulé fez nina observação, que parece exacta em relação a um Artigo da Carta; mas devo reflectir que o logar citado quando falla em Lei, quer talvez dizer a ordem de governar; mas isto não tira que para o caso façamos uma Lei particular. Eu sou muito inimigo de que as cousas se façam de uma vez, em materia de administração publica, por julgar que não podem sahir com total acerto; para isso não ha outro meio senão a experiencia. — Entretanto quando se adopte a emenda do Sr. Conde da Taipa, tenho objecção á palavra Colonias que nella se acha. Lembro-me ter lido em uma das Comedias de Terencio (é a Andria) que um certo escravo fazendo grande apreço da sua manumissão sómente lhe pesava que o senhor lhe lembrasse aquelle beneficio. — Não é bom lembrar aos estabelecimentos Portuguezes que foram Colonias; são partes da Monarchia, e a Carta dá aos reus habitantes os mesmos direitos que aos outros Cidadãos. Creio que o Digno Par, Auctor da emenda, não terá duvida na substituição do termo.

O Sr. Margiochi: — Tambem me parece que uma Secretaria só dos Negocios do Ultramar, e um Secretario, terá muito pouco que fazer, porque das possessões ultramarinas que temos mais perto, só de seis em seis mezes temos communicações, e quanto ás outras hão de dar-lhe logar para muito descanço; agora se se quer um Secretario d'Estado para estudar o que hade fazer no Ultramar, então acho isto bom; porque despacho não o terá de certo senão cada seis mezes; por tanto parecia-me que por ora nos contentassemos com o que está vencido, que é unir todos os negocios em uma só Secretaria, e para o futuro quando se tiver observado o andamento dos negocios, então se nomeará um Ministro d'Estado, mas por agora não lhe acho utilidade.

Vozes na Camara: — Votos, votos.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo 2.º posto á votação, e approvado, eliminando-se-lhe a clausula contida nas palavras = de não gravar o Thesouro, = na fórma proposta pelo Senhor Bispo Conde.

O Artigo 2.º foi approvado sem discussão.

O Sr. Conde da Taipa obteve a palavra para ler a seguinte

PROPOSIÇÃO.

Proponho que esta Camara dirija uma respeitosa Mensagem a Sua Magestade a Rainha, rogando-Lhe queira ajustar quanto antes o Seu Casamento, por assim convir, e se fazer mister para a estabilidade do Throno, e segurança do Estado.

Palacio das Côrtes em 11 de Abril de 1835. — Conde da Taipa, Par do Reino.

Foi admittida unanimemente, e por acclamação.

O Sr. Vice-Presidente: — Em regra geral deveria esta Proposição ter remettida a uma Commissão, formalidade que eu não posso omittir sem que a Camara o determine.

O Sr. Conde da Taipa: — Peço á Camara que decida hoje mesmo este negocio. (Apoiado. Apoiado.) As rasões em que se funda são tão conhecidas por todos, que fiada me resta a dizer.

Vozes na Camara: — Nada, nada. — Não é preciso.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Basta conhecer a materia.

O Sr. Sarmento: — Esta é daquellas que vai por acclamação geral; é de importancia tão conhecida que seria perder tempo dizer alguma cousa a este respeito.

E fazendo-se logo segunda leitura da mencionada Proposição, dispensadas as formalidades do Regimento, abriu o Sr. Vice-Presidente a discussão sobre ella.

(P.)

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Teve a palavra em primeiro logar, e disse

O Sr. Conde de Linhares: — Eu acho conveniente que este negocio vá a uma Commissão, porque me consta que da outra Camara hade vir uma Lei a este respeito....

O Sr. Marquez de Fronteira: — Como ha de vir a esta Camara nós a tomaremos na consideração que merecer, sem com tudo deixarmos de dicidir a Proposta que agora se appresenta.

O Sr. Conde de Linhares: — Esta Proposta não póde passar como uma Lei; mas como ouvi dizer que da outra Camara virá em breve uma igual Proposta, é por isto que acho a proposito que o negocio vá a uma Commissão como disse; até por um certo melindre para com Sua Magestade que acaba ha poucos dias de inviuvar; não me opponho por tanto á Proposta mas desejaria que ficasse addiada por um ou dois dias, quando se intenda que não deve ir a Commissão.

O Sr. Conde da Taipa: — Esta questão não tem nada com o que ouviu dizer o Digno Par: o que sabemos todos, é que é muitissimo necessario que a Rainha case. (Apoiado.) A respeito da decencia, neste caso seria cousa muito louvavel em uma pessoa particular, mas não em uma Rainha; porque Sua Magestade não casa por perdilecção para com este ou aquelle, mas por perdilecção para com os Seus Subditos, visto que isso é conveniente para a Nação. Ora para salvar a decencia é que eu quero que a Camara lhe lembre o Casamento; os Portuguezes assim o havemos mister, e esta Camara assim o pede: por tanto faça-se conhecer isto já á Rainha, e depois é que se ha de tractar da Lei. Todo o caso está agora em approvar a medida proposta, e quanto antes, mesmo pela decencia de Sua Magestade.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — A Camara creio que está unanime sobre esta questão; mas devo dizer que se os Membros do Ministerio não tomaram a iniciativa na proposta, e mesmo não apoiam de uma maneira mais directa o andamento deste negocio, é porque consideram que a sua posição relativamente a Sua Magestade, os constitue em uma obrigação restricta de não accelerar o exito de uma medida, que não póde directamente ser promovida por ninguem que se supponha executar as ordens de Sua Magestade.

O Sr. Vice-Presidente: — Pergunto ao honrado Membro que faz a proposição, se estas palavras = quanto antes = são formaes. Tendo eu de votar, quero fazelo segundo a intelligencia precisada proposta, porque conforme tal precisão é que hei de dar o meu voto: por isso conservadas aquellas palavras, voto de uma maneira, e de outra se forem supprimidas.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu o que quero é que a Rainha case quanto antes....

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Immediatamente.

O Sr. Conde da Taipa (proseguindo): — Esta é a minha intelligencia; e que assim se faça saber a Sua Magestade o mais depressa possivel.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Dê-me licença o Sr. Conde da Taipa; mas diga-se immediatamente.

O Sr. Conde da Taipa: — Immediatamente não póde ser.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Póde ser, porque quer dizer, o mais depressa possivel.

O Sr. Vice-Presidente: — Que a Camara depois de passar a Lei para o Casamento de Sua Magestade, envie uma Mensagem para mostrar á Rainha o interesse que toma pela conclusão do negocio, nisto convenho eu, e estou prompto a dar o meu voto nesse sentido; mas que essa Mensagem preceda aquella Lei, e que nella se diga a Sua Magestade que case quanto antes, não me parece conveniente; e por isso a minha opinião seria que esta materia fosse addiada até que a Camara tracte da Lei; hypothese em que votarei a favor.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Voto contra o addiamento; já o declaro á Camara e peço se lance na Acta.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu vou dizer a V. Ex.ª o que peço na proposta. — Eu desejo que a Mensagem vá logo, porque não podemos esperar que venha a Lei para o Casamento da Rainha, porque não sabemos quando os Srs. Ministros a promoverão: ora como eu (e muita gente) acho que é de summa utilidade politica que Sua Magestade case quanto antes, por isso propuz a Mensagem para já; porque enviada que seja, já nem ha aquella rasão de convenance, como dizem os Francezes. O Ministerio que proponha a Lei quando lhe parecer, e a Camara dando este passo não faz nisso violencia alguma, porque V. Ex.ª sabe muito bem que, quem se subjeita a ser Rei, ha de subjeitar-se tambem a casar quando os interesses da Nação o exigirem. (Riso.)

O Sr. Ministro da Marinha: — Como o meu Collega, e amigo que se assenta ao pé de mim já se explicou, eu não direi mais senão que concordo nos motivos de interesse que ha para que Sua Magestade se case outra vez; porém como tenho de votar na Proposta do Digno Par, sempre manifestarei como a intendo; e é, que se exprima a Sua Magestade o desejo que esta Camara tem, cujo desejo é independente de qualquer Lei, e simplesmente um voto expontaneo. Neste sentido é que eu dou intelligencia á Proposta do Sr. Conde da Taipa.

O Sr. Sarmento: — Apoio a Proposta do Sr. Conde da Taipa. — Tractamos de uma expressão de patriotismo, e de lealdade a Sua Magestade, e não de uma Lei, que vamos discutir, na qual nem mesmo podiamos ter a iniciativa, por motivos de conveniencia. Na Mensagem que vamos dirigir ao Throno, torno a dizer, não ha mais do que uma verdadeira expressão de amor da Patria, e de respeito á Rainha: além de que até vêmos que a practica auctorisa este procedimento, não menos que a rasão d'Estado. — Quando se tractou o casamento da Princeza D. Izabel com o Duque de Saboia houve antes uma negociação preliminar de Gabinete. Ultimamente se procedeu desta fórma com os contractos de nupcias da nossa actual Soberana, e o Principe D. Augusto que está em Gloria. Ainda que se não tivesse manifestado qual era a vontade deitas Altas Personagens, sabia-se todavia quem estava escolhido para Esposo de Sua Magestade, e só se esperava para concluir o Casamento que acabasse a guerra civil, e se podessem convocar as Côrtes.

Por tanto acho muito appropriado que esta Camara leve aos pés do Throno a expressão dos seus sen-

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timentos sobre tão importante objecto. Para satisfazer um escrupulo da decencia publica, é que se ha de mister esta Mensagem; porque (como bem disse o Digno Par o Sr. Conde da Taipa) os Reis, por isso mesmo, que gosam de grandes prerogativas, tem outros deveres, mais pesados a preencher: e, na verdade, quando se considera que o cadaver do Marido da Rainha está ainda quente, grande sacrificio é para Sua Magestade o tractar já de outro Casamento; mas a nossa Augusta Rainha ha de conhecer que tanto sacrificio é exigido pelo bem da Nação: as Suas Nupcias no caso presente, são um negocio não pessoal, mas por assim dizer Nacional.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Farei algumas observações como Membro desta Camara, e não como Ministro da Corôa. — Na minha opinião manifesta-se maior delicadeza para com Sua Magestade, por meio desta Mensagem, fazendo-lhe supperar qualquer aversão, que neste momento possa ter, em pensar em similhante assumpto, sacrificando-a toda ao bem da Nação, e aos deveres que contrahiu quando subiu ao Throno; em logar do que se se discutisse aqui a questão da Rainha poder casar com um Principe Estrangeiro, antes desta Mensagem, e da Resposta de Sua Magestade, parece-me que se anticipava o juizo que a Camara houvesse de fazer sobre tão delicado negocio.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida; disse

O Sr. Vice-Presidente: — Creio que a Camara me dará licença para propôr á votação de dois modos, a Proposição do Sr. Conde da Taipa.

A Camara manifestou convir; pelo que S. Ex.ª propôz os seguintes quisitos:

1.º Que a Camara dirija uma respeitosa Mensagem a Sua Magestade a Rainha, rogando-lhe queira ajustar o Seu Casamento, por assim convir e se fazer mister para a estabilidade do Throno e segurança do Estado! — Não foi approvado, (votando pró, sómente o Sr. Vice-Presidente).

2.º Que a Camara dirija uma respeitosa Mensagem a Sua Magestade a Rainha, rogando-lhe queira ajustar quanto antes o Seu Casamento, por assim convir e se fizer mister para a estabilidade do Throno e segurança do Estado? — Foi approvada geralmente.

Concluidas as votações, disse

O Sr. Marquez S. Paio: — Attenta a natureza da materia, pediria que hoje mesmo fosse a Mensagem appresentada á Rainha.

O Sr. Vice-Presidente: — Ámanhan vai uma Deputação (de que faz parte o nosso Presidente) appresentar á Sancção a Lei sobre os Academicos; e segundo o Aviso que acabo de receber do Ministro dos Negocios do Reino, já Sua Magestade designou hora para a receber: assim se á Camara parece conveniente poderá esta mesma Deputação encarregar-se da Mensagem. (Apoiado.)

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — A Deputação que vai ámanhan tenho eu a honra de a presidir, porque assim está convencionado; estou sempre prompto a cumprir os meus deveres como Membro desta Camara (que mesmo prefiro a quaesquer outras): entretanto desejo que os Dignos Pares se persuadam de que a mesma rasão de delicadeza que ainda ha pouco ponderei, pede que eu seja dispensado de tão honrosa Commissão.

O Sr. Vice-Presidente: — Consta-me que o Ministro dos Negocios do Reino perguntou se a Camara enviava alguma Mensagem á Rainha; talvez que isto tenha relação com o que tambem me consta se dicidira na Camara dos Srs. Deputados sobre o mesmo objecto.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Esta Camara nada tem com o que se passa na outra, nem tão pouco com o Ministro do Reino.

O Sr. Marquez de Loulé: — Sou de opinião que se não leve negocio nenhum à presença de Sua Magestade sem antes ser prevenida, o contrario seria uma falta de respeito.

O Sr. Vice-Presidente: — Por tanto pedir-se-ha dia e hora em que deve appresentar-se a Mensagem a Sua Magestade, e para esse fim são nomeados os Dignos Pares seguintes, (além do Vice-Presidente da Camara)

Os Senhores Marquez de Loulé,

de Fronteira,

de Valença,

de S. Paio,

Conde de Paraty,

de Linhares,

de Lumiares,

Visconde da Serra do Pilar,

Margiochi,

Braamcamp,

Machado,

Gamboa e Liz.

Eu não tenho outra cousa a fazer senão repetir a Sua Magestade a Proposta approvada pela Camara.

O Sr. Conde da Taipa tem a palavra para ler a outra Proposta annunciada á Camara. Então

O Sr. Conde da Taipa appresentou a seguinte.

Proposição.

Proponho que esta Camara nomeie immediatamente uma Comissão encarregada de redigir, e appresentar um Projecto de Lei que regule os Direitos da Successão ao Throno Portuguez.

Palacio das Côrtes em 11 de Abril de 1835. — Conde da Taipa, Par do Reino.

E proseguiu: — Parece-me que não haverá duvida em se nomear esta Commissão, mas desejava eu que isso fosse feito de maneira que este negocio passasse nesta Sessão. (Apoiado.)

A Camara admittiu a Proposição, por unanimidade; e, sendo julgada urgente, do mesmo modo e a requerimento do seu Auctor, foi lida segunda vez, posta á votação, e logo approvada.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Proponho que a Commissão seja nomeada por V. Ex.ª hoje mesmo, e composta de sete Membros. (Apoiado.) — Convindo a Camara, nomeou o Sr. Vice-Presidente para formarem a mencionada Commissão aos Dignos Pares.

Os Senhores Marquez de Fronteira,

Bispo Conde,

Conde de Linhares,

da Taipa,

Sarmento,

Margiochi,

Gerardo de Sampaio.

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O Sr. Vice-Presidente: — A Secção de Legislação juntou-se hoje para tractar do Projecto sobre o desinvolvimento das bases Judiciaes; ahi esteve premente o Ministro da Repartição, que mostrou a necessidade que ha de se terminar esta questão, dalgum modo, na actual Sessão da Legislatura, pedindo-me propozesse á Camara a urgencia delle. — Ha já dois dias que se mandou imprimir o Projecto principal, e deve agora estar distribuido: com tudo a Secção não pôde ainda concluir o seu trabalho a este respeito, e desde já previno a Camara de que a opinião da sua generalidade não é conforme ao Projecto na dos Senhores Deputados: conhecendo que isto póde dar logar a emendas, e que não sendo acceitas na outra Camara, tem de haver uma Commissão Mixta; proporia eu que, contando com o Parecer da Secção cuja natureza referi, os Dignos Pares meditassem o Projecto impresso, a fim de poder discutir-se na Segunda feira, attendendo á sua urgencia.

O Sr. Sarmento: — É a falta de tempo o que faz com que a Secção de Legislação não appresente já o seu parecer em fórma. Deveras houve muitas opiniões contra a Proposição da outra Camara: de mim direi que fui um daquelles Pares que sustentaram a opinião do Governo, quando intendi que ella era conforme á justiça; mas ninguem poderá alcançar de mim que eu vá com uma cousa, que me parece contraria á Carta; é o que acontece com esse Projecto do desinvolvimento das bases judiciaes. Os Povos tem muitos direitos, mas por isso mesmo se não deve fazer electivo o que de sua natureza depende de nomeação Regia, como são estes empregados. Pois julga-se que o Governo deve nomear algumas pequenas entidades, que são como um meio termo entre o Administrativo e o Executivo, e póde negar-se-lhe essa mesma attribuição naquillo que é expressamente declarado na Carta? — Isto no meu modo de pensar é um absurdo. Torno a dizer que sustentei o Governo, quando as suas idéas eram as minhas, quando me pareceram conformes á justiça, e ás doctrinas da Carta; mas agora que intendo o contrario da opinião delle, francamente declaro não me ser possivel apoialo.

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Sobre a Ordem. — Sr. Presidente, acho muito justo que V. Ex.ª exponha á Assembléa qual hade ser o objecto da sua tarefa; porém que previna a Camara no que hade fazer não o acho muito proprio; e por tanto peço que se diga o objecto de que se hade tractar, e a pressa que exige é se objecto; mas daqui não podemos pasmar.

O Sr. Vice-Presidente: — Tambem assim o intendo, e era justa, e unicamente o que eu ia propôr á Camara, que examinasse o Parecer.

O Sr. Gerardo de Sampaio: — De mais, Sr. Presidente, V. Ex.ª já emittiu a idéa de que o Parecer da Commissão não era conforme, recommendando toda a madureza na decisão de um objecto tão interessante; em consequencia parece-me que devemos fugir de todas as idéas de prevenção.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não sei a rasão, nem haverá quem a possa dar, da obrigação em que se está de fechar as Camaras: se acaso são necessarias estas Leis que aqui nos vem todos os dias com urgencia, o Governo tem o poder de conservar as Camaras abertas e fechem-se daqui a dous ou tres mezes; porém estar assim legislando de afogadilho, a fallar a verdade, é cousa que não posso intender; e aqui estou persuadido que não é falta do meu intendimento. Chegado o dia 20 d'Abril, o Governo tem na sua mão o meio; conserve as Camaras abertas para se concluirem as Leis que são urgentes; o contrario não intendo; e digo que nada depressa em negocios de tal natureza.

O Sr. Gyrão: — Este Projecto, Sr. Presidente, é de muita urgencia pela materia de que tracta; de maneira que ainda quando não houvesse a urgencia de se estarem a fechar as Camaras, havia a de se tractar da materia: por tanto eu peço tambem a urgencia, e até por uma rasão, para mostrarmos que se não podemos decidir todos os negocios, a culpa não foi nossa, porque fizemos a diligencia pelos concluir.

O Sr. Marquez de Loulé. — Eu não acho necessidade de estarmos a prolongar esta questão; V. Ex.ª póde consultar a Camara a este respeito, e o que ele lá decidir nos servirá de regra.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Creio que é uma das attribuições do Governo o pedir nas Camaras Legislativas a urgencia de qualquer assumpto interessante...

Uma voz da Esquerda: — Ainda a não pediu.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (proseguindo): — Levanto-me para a pedir. — A materia de si é urgente, o tempo tambem urge, porque a Sessão actual se approxima ao seu termo, pois que (sem prejuiso da deliberação do Poder Moderador) pela Carta devem as Côrtes Ordinarias encerrar-se no fim de tres mezes; e porque ha uma grande incerteza, e mesmo seria grande questão o saber se convém ou não prorogar-se, podendo por tanto esta Camara concurrer para simplificar essa questão, creio que fará bem. A Camara conhece que o seu dever é fazer por uma parte quanto ser possa, para que se terminem as Leis necessarias com a maior perfeição, eu o confesso, mas tambem, attendendo á sua necessidade, com a maior urgencia: é este ocaso em que póde considerar-se a Proposição sobre o desinvolvimento das bases judiciaes, e por isso peço quanto antes se discuta.

Não se fazendo outra observação, resolveu a Camara, sobre proposta do Sr. Vice-Presidente, que dispensadas as formalidades do Regimento, fosse discutida na segunda feira 13 do corrente a Proposição a que se referira a instancia do Sr. Presidente do Conselho de Ministros.

O Sr. Conde de Linhares: — O que peço é que se ponha á discussão a Proposição tal qual veiu da Camara dos Senhores Deputados, e no progresso deu lá poderá a Camara tomar em consideração as emendas appresentadas pela Secção de Legislação, se assim lhe parecer.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu tinha annunciado á Camara que havia de propôr-lhe um Projecto de Lei para se permittir a cultura do tabaco nas Ilhas dos Açôres. Um Sr. Deputado fez a mesma proposta na respectiva Camara; foi mandada a uma Commissão, e nunca mais se tractou desse negocio: ora como aqui ha menos que fazer do que na Camara Electiva, tenho a esperança de que poderá passar na presente Sessão. — Eu mostrarei, na exposição

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que fizer sobre os seus motivos que a adopção da medida em nada vai intender com as finanças, porque só o dizimo daquella producção, nas terras que estão hoje incultas, hade cubrir o deficit que resulta do abatimento do preço do contracto. — Passo a ler a Proposta, e rogo á Camara que a mande á Secção de Fazenda: é a seguinte

PROPOSIÇÃO DE LEI.

Sobre a liberdade da cultura do Tabaco nas Ilhas dos Açôres.

Artigo 1.º É permittida a cultura do Tabaco em todas as Ilhas dos Açôres, assim como a liberdade de exportação da folha do Tabaco, e a sua fabricação.

Art. 2.º O Governo fará um abatimento ao presente Contracto do Tabaco, pela perda do monopolio naquellas Ilhas até ao fim do termo contractado.

Palacio das Côrtes, em 11 de Abril de 1835. — Conde da Taipa, Par do Reino.

Foi admittida, julgada urgente, lida segunda vez, tomada em consideração, e remettida á Secção de Fazenda.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu dous Officios do Governo pelo Ministerio do Reino: 1.º remettendo os esclarecimentos pedidos pela Commissão de Petições, ácerca do requerimento da Condessa de Subserra, D. Isabel: — 2.º participando haver recebido copia da Resolução desta Camara, sobre o modo mais prompto de se publicarem os extractos das suas Sessões; ficando inteirado igualmente do que na mesma Resolução se determina a respeito da Aula publica de Tachigraphia. — O 1.º foi remettido á Commissão de Petições, e o 2.º passou ao Archivo.

O Sr. Vice-Presidente deu para Ordem do dia da Sessão de segunda feira, 13 do corrente, a discussão da Proposição vinda da Camara Electiva, sobre o desinvolvimento das Bases Judiciaes; e, havendo tempo, a de outra sobre a applicação dos rendimentos de alguns Concelhos da Comarca do Porto. — Sendo quatro horas e dez minutos, disse que estava fechada a Sessão.

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