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SESSÃO DE 18 DE ABRIL.

O Sr. Vice-Presidente occupou a cadeira sendo dez horas da manhan; e feita a chamada pelo Sr. Secretario Barão d'Alcobaça, se verificou estarem presentes 25 Dignos Pares, faltando além dos que ainda não compareceram, os Srs. Duque da Terceira, Conde de S. Paio, e Gerardo de Sampaio, sem motivo conhecido, e mais seis com causa motivada. — Tambem estava presente o Ministro dos Negocios do Reino.

O Sr. Vice-Presidente disse que estava aberta á Sessão; e lida a Acta da precedente pelo Sr. Secretario Conde de Lumiares, foi approvada sem reclamação.

Tambem deu conta de dois Officios do Governo, pelo Ministerio do Reino, um dirigido ao Sr. Presidente da Camara, e outro ao mesmo Sr. Secretario, participando em ambos que Sua Magestade a Rainha, receberia ámanhan 19 do corrente pelo meio dia no Paço das Necessidades, qualquer Deputação que esta Camara tenha a dirigir á sua presença. — Ficou inteirada.

O referido Sr. Secretario deu mais conta da ultima redacção da Proposição sobre o lançamento da decima e impostos annexos. — Julgando — se conforme ao vencido, foi approvada, e se mandou remetter á Camara dos Senhores Deputados.

Continuando a mencionar o expediente, leu tres Officios da Presidencia da Camara Electiva, que incluíam outras tantas Proposições da mesma Camara; a 1.ª approvando as pensões conferidas pelo Poder Executivo á Viuva e filhos do Conselheiro d'Estado José Antonio Guerreiro; assim como ao Visconde de Itabaiana: a 2.ª, approvando a Doação de cem contos de réis feita ao Sr. Duque de Palmella: e a 3.ª para que sejam admittidos na compra dos bens Nacionaes os titulos desta Doação. — Todas as ditas Proposições passaram á Secção de Fazenda.

O Sr. Gyrão pediu e obteve a palavra para appresentar a seguinte

Declaração de voto.

Declaro que na Sessão de quarta feira á noute, 15 do corrente mez e anno, fui de voto que se conservasse o Artigo da Proposição de Lei sobre o lançamento das decimas, respectivo aos Provedores de Concelho, tal qual tinha vindo da Camara dos Senhores Deputados pelas seguintes rasões.

1.ª — Por ser muito mais liberal e conveniente aos Povos, que assistam aos ditos lançamentos, as auctoridades Administrativas, do que as fiscaes de Fazenda.

2.ª — Por serem aquellas auctoridades a quem isto compete, n'um systema em que os diversos ramos de Administração devem estar separados, para que nunca se confundam as attribuições de quem deve lançar a derrama com as que tem aquelles a quem pertence cobralas, pois nisto é que consiste a belleza do mesmo systema; e o contrario fórma um cáhos tal que deve encher de immensos obstaculos a practica dos lançamentos.

3.ª — Porque não é possivel nomear com acerto 810 delegados do Procurador da Fazenda com os requesitos de serem letrados e conhecedores das Leis sendo tambem evidente, e claro que os Sub-delegados, para as Freguezias não podem ser melhores do que os Sub-delegados dos Provedores.

4.ª Porque a falta desta Lei, se acaso não passar na Camara dos Senhores Deputados com as emendas que leva, dará causa a que se não cobrem as declamas em muitas partes, e se passar com ellas fica imperfeitissima, e quasi inexequivel. — Palacio das Côrtes 18 de Abril de 1835. = Antonio L. de B. F. T. Gyrão, Par do Reino. = D. Filippe de Souza

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e Holstein, Par do Reino. = Manoel de Macedo

Pereira Coutinho, Par do Reino.

Depois de lida, se mandou depositar no Archivo.

O Sr. Mello Breyner: — Sr. Presidente, peço palavra para ler uma petição dos Officiaes e Officiaes inferiores da Brigada Real da Marinha em que pedem augmento de soldo, e rogo a V. Ex.ª queira mandala á Commissão Militar. (Leu e mandou-a para a Mesa.)

O Sr. Vice-Presidente: — Fica em cima da Mesa, para quando se tractar de identico objecto relativo aos Officiaes do Exercito.

Passando-se á Ordem do dia, leu o Sr. Secretario Barão de Alcobaça o Parecer da Secção de Fazenda, appresentado na Sessão extraordinaria de lo do corrente, relativamente á Proposição sobre as bases da Administração geral, assim como esta Proposição. (Vid. pag. 328.)

O Sr. Vice-Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

Obtendo logo a palavra disse

O Sr. Sarmento: — Sei que devemos ser economicos em palavras, porque não ternos mais que esta Sessão, e a que se ha de fazer á noute; mas por isso mesmo me parece que não podêmos entrar na discussão geral do Projecto; e até por outro motivo, o qual é que cada um de seus Artigos contém materia separada, e distincta.

O Sr. Vice-Presidente: — Se a Camara convier nisso, mais tempo se poupa.

Consultada a Camara relativamente á observação do Sr. Sarmento, dicidiu que a discussão da Proposição fosse por Artigos: pelo que foi lido o seguinte

Artigo 1.º Haverá no Reino até dezessete districtos administrativos. Cada districto será administrado por um Magistrado de nomeação Real, e nelle haverá uma Junta de districto electiva, que terá as mesmas attribuições que pelo Decreto de 16 de Maio de 1832, N.º 23, competiam ás Juntas Provinciaes. Os districtos administrativos serão subdivididos em Concelhos. O territorio do Ultramar será dividido em districtos administrativos que se julgarem necessarios para o bem do serviço, e commodidade dos povos.

Sobre a sua materia obteve a palavra em primeiro logar e disse

O Sr. Sarmento: — Levanto-me para dizer que tractando deste 1.º Artigo desejava offerecer-lhe como emenda os trabalhos (reduzidos a um mappa) os quaes foram feitos em 1828. Não me obriga a fazer esta proposta o ter concorrido para esses trabalhos, por ter tido a honra de ser então Deputado; mas sim porque não é possivel deixar de dar o nome de Comarcas ao que o Projecto chama Districtos; porque este nome é da Carta. Como não ha outra divisão, senão de Provincias, e de Julgados, resta uma outra que é a que aqui se chama Districtos, e que se póde determinar por um termo mais proprio, e mais Nacional, como é o de Comarcas. — Em 1828 fez-se esta divisão de dezessete Comarcas. Para poupar tempo não entro agora nos motivos porque assim se fez, só direi que aquelles trabalhos se fizeram com todo o esmero, e não é possivel dar-se agora mais attenção a este objecto do que então se lhe deu, espero que isto seja tomado em consideração. Desejaria que este Magistrado de que aqui se falla fosse chamado Magistrado de Comarca, isto para evitarmos o odioso de nomes antigos e modernos, que o vieram a ser. Esta é uma emenda, e a outra é que os dezesete Districtos se chamem dezessete Comarcas, tomando os nomes conforme o mappa a que me referi, porque estes nomes são os dos mesmos logares, nomes de Geographia antiga, e alguns até nomes historietas, que dão muita honra á Monarchia Portugueza, como é a Comarca de Montes Claros, Comarca de Ourique etc.

Eu não leio este mappa porque levaria muito tempo, entretanto se assim parecer a V. Ex.ª um dos Senhores Secretarios terá a bondade de o fazer. Em conclusão digo que voto pela primeira parte do Artigo assim emendado; e quanto á segunda que seja eliminada.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Eu darei as rasões porque na Camara dos Senhores Deputados se não adoptou a palavra Provincia, nem tambem a denominação de Comarcas. Não se adoptou a primeira, porque se intendeu que fazendo-se dezessete Provincias ficariam pequenas, e mesmo porque esta palavra era indifferente; além do que poderia esta Lei de Administração ir involver-se com a das eleições, a qual devia ser inteiramente estranha e separada d'aquella, para evitar inconvenientes, que necessariamente haviam de occorrer; sobre isto houveram grandes debates, e a final venceu-se como está no Projecto, para fazer inteiramente independentes as Leis, isto é, que se não adoptasse a palavra Provincia. — Tambem se não adoptou a palavra Comarca, para não prejudicar o determinado no Decreto de 16 de Maio de 1832, e porque se não julgou essencial. Taes foram os motivos porque isto foi adoptado na Camara dos Senhores Deputados; e talvez aqui se vença o mesmo, uma vez que se conheça que uma palavra prejudica a outra (na hypothese que mencionei) e visto que a palavra Districto é uma dicção vaga que nada influe; por esta rasão não conviria eu em que se adoptasse outra palavra; tanto mais porque esta Lei é provisoria, e hade ser reformada, provavelmente quando se fizer a Lei das eleições. — Intendeu-se igualmente que não se devia marcar o numero dos Districtos, mas dizer sómente = até dezessete = e nisto convim eu, porque não sei se será melhor haver doze, se treze, se dezesseis: o que actualmente sei, é, que oito não são bons, porém a experiencia mostrará quantos bastam; ignoro se serão dezessete ou menos, e não querendo prejudicar esta questão, pedi em consequencia que se adoptasse a palavra = até, = por isso mesmo que a Lei era provisoria, e então me dava occasião de eu poder adoptar o numero que mais conviesse. — Portanto insisto em que se adopte a opinião da Camara Electiva a este respeito, não se alterando no Artigo a palavra Districtos, e que o numero delles se não determine precisamente seja o de dezessete.

O Sr. Sarmento: — É certo que quando se tracta de legislar provisoriamente sempre se encontra a maior difficuldade, entretanto parece que é possivel achar um ponto, ainda que não seja difinitivo, o qual sirva para fixar as idéas: seja como fôr, o caso é que se não póde alterar um Artigo da Carta que determina se chame Comarca o que aqui se denomina Districto; diz elle (leu.) Isto não se deve alterar

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porque é uma determinação expressa da Carta para cuja derogação não conheço auctoridade, tanto assim que com esta nova Lei de Administração acaba a antiga divisão de Comarcas, e fica por executar o que a Carta determina. — Parece-me que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino quer de algum modo, confundir a divisão administrativa com a divisão eleitoral, porém isto é que eu não quero de modo nenhum, para que as eleições se não façam debaixo da influencia de auctoridade alguma; sendo esta a rasão principal porque impugno que as eleições sejam feitas por Districtos, e sim por Provincias. Nós estamos tractando de uma Lei de que muito necessitâmos, e por isso tendo eu mais alguma cousa que dizer, o não faço por não gastar tempo que é tão precioso.

O Sr. Gyrão: — Farei sómente uma reflexão a respeito deste nome Magistrado, o qual me faz aqui sua duvída; e acho que se deve declarar de alguma maneira, qualquer que ella seja: não sei a rasão porque tem causado tanto odio a palavra Prefeito; é um nome Romano e special, quando Magistrado é termo generico; poderemos pois procurar uma palavra que corresponda á idéa seja aquella qual fôr, e assim parece-me que se deverá aqui fazer pelo menos alguma declaração. É esta a unica observação que eu tinha a fazer.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — É da ultima evidencia que a esta auctoridade se ha de dar um nome: e é pena que contra o de Prefeito se tenha manifestado tanta animosidade, porque realmente diz tudo. O nome de Governador civil, com que este cargo tinha sido appresentado no Projecto proposto á Camara dos Senhores Deputados, não agradou alli, parecendo muito empolado, ou que mesmo era susceptivel de confundir-se com a idéa de Governador militar; e então se regulou que o Artigo fosse redigido, sem que nelle se desse nome algum especificadamente a estes Magistrados. — Ora se esta Lei deve ainda, por outro qualquer motivo, voltar á Camara Electiva, não haverá difficuldade em que se adopte qualquer nome que occorra para designar esta auctoridade, emendando-se este Artigo, ou pondo esse nome no seguinte: e como se elimina a palavra Provedor, substituindo-a por Administrador de Concelho, parecia-me que por analogia se chamassem Administradores de Comarca, os empregados de que tracta o Artigo 1.º; maneira esta porque tambem se designaram na Constituição de 1822. — Em todo o caso a questão é de nome, e quasi que indifferente neste logar, porque a denominação de Magistrado Administrativo é bastante significativa e se não confunde.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo 1.º posto á votação, e approvado tal qual estava.

Passou a discutir-se o seguinte

Art. 2.º — Tres Membros da Junta de Districto os mais proximos da cabeça delle, e mais antigos substituirão os Conselhos de Prefeitura, excepto na parte contenciosa administrativa, que fica devolvida aos Magistrados civis.

Pediu a palavra em primeiro logar e obtendo-a, disse

O Sr. Gyrão: — Esta ultima parte do Artigo é uma das maiores monstruosidades que eu tenho visto, e nunca esperei vêr uma cousa tal; é ainda peior do que aquillo que existia no tempo do Governo despotico. O Governo despotico tinha a sua Administração mal arranjada, mas tinha o Concelho da Fazenda a quem pertencia o contencioso, e agora que elle não existe, o que estabelece o Artigo é evidentemente um absurdo, e por isso eu proponho que se elimine a ultima parte delle. Ora se acaso por vingança uma Camara qualquer lançar uma quota muito forte a um homem que a não póde pagar; isto é uma injustiça evidente, é n'uma questão de tal natureza recorria-se a um juiz proprio que a dicidia por um prudente arbitrio; mas não é possivel que se entregue a juizes similhantes. — Eu não quero argumentar mais sobre este objecto, não quero de modo algum embaraçar o Governo, porque, conheço a exigencia das circumstancias, mas quando vejo absurdos de tal natureza não posso deixar de fazer algumas reflexões.

O Sr. Conde da Taipa: — O Digno Par está discorrendo, como se se tractasse de constituir definitivamente a Administração; mas nós o que estamos a discutir é uma Lei provisoria, por assim dizer, uma Lei de circumstancia, auctorisando por ella o Governo a tomar algumas medidas, para remediara confusão em que o Reino se acha relativamente a este ponto. — Estes Conselhos de que aqui se falla, para substituir os Conselhos de Prefeitura, são muito uteis; ainda que eu seria de opinião que o contencioso tambem por elles fosse decidido; porque casos ha em que deve prevalecer a equidade ao espirito da Lei, e por tanto seria util este Tribunal particular, principalmente no estado actual em que as idéas dos juizes (e peço perdão a um Digno Par, esperando que me não dê outra vez castigo por fallar nelles) estão mais costumadas a puxar para o fisco do que para a parte contraria. Por isso acho eu que seria muito mais liberal entregar o contencioso (de que falla o Artigo) a um Conselho eleito pelo Povo, do que ás Justiças ordinarias: isto sómente em quanto os juizes não tomarem aquella independencia que lhes compete no exercicio de suas funcções, para o que é preciso tempo, e que as novas instituições se arreiguem em Portugal. — Quanto ao mais eu estou firme no principio de que os juizes devem decidir todas as questões, como acontece nos Estados-Unidos, onde até decidem da constitucionalidade ou inconstitucionalidade das Leis; porque n'aquelle paiz, se um Estado faz qualquer Lei, o supremo Conselho de Justiça póde decidir, se ella é ou não constitucional, o que é uma auctoridade até contra os desvios das Camaras Legislativas.

Ora eu vejo uma necessidade eminente, que é um codigo particular para o contencioso administrativo, onde se definam certos limites e se estabeleçam certas regras; mas em quanto o não tivermos, será forçoso que as questões desta specie sejam decididas pelos Juizes de Direito.

Quanto á denominação de Districto, acho que é a mesma cousa que a de Comarcas, porque na essencia correspondem ambas as palavras á mesma idéa: é verdade que a ultima é a da Carta, mas nós agora não tractâmos tanto de organisar definitivamente, como de estabelecer a Administração do Reino provisoriamente, e para poder acabar de fazer entrar

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as cousas era ordem, permanencia dos Provedores tambem é impossivel, porque o Governo não póde conhecer novecentos individuos a quem para esse cargo nomeie: e para tomar medulas acertadas, era preciso que pensassemos muito nestas cousas, para o que não ha tempo, nem isso era materia que se podesse conter n'um Artigo de tres linhas; e assim por mais emendas que se proponham sempre ficará circumscripto, e nenhuma ha de produzir cousa sufficiente. — Portanto voto pelo Artigo tal qual se acha, e creio que a Camara terá intendido as rasões porque a respeito delle sustento uma opinião contrario á do Digno Par que me precedeu.

O Sr. Souza e Holstein: — Levanto-me unicamente para observar que me parece laboraram n'uma falsa intelligencia os dous Dignos Pares que fallaram sobre o Artigo 2.º, por quanto suppozeram que os individuos de que elle tracta eram juizes; mas eu creio que elles sómente são empregados puramente administrativos; e nesta hypothese cahem todas as observações que se tem feito. — Eu tambem me opporia á intervenção do Poder Judiciario no contencioso administrativo, não por intender que os juizes serão mais contrarios aos interesses das partes do que aos do fisco, como se disse, mas porque julgo que áquillo sobre que selem de pronunciar, não são propriamente cousas, e por tanto não deve ser decidi; do pelas auctoridades judiciaes, mas sim administrativas. Conseguintemente não terei duvída em approvar este Artigo tal qual se acha redigido, se se assentar que estes empregados são auctoridades que fazem parte do ramo administrativo.

O Sr. Sarmento: — Desejava que se me désse uma explicação relativamente a este Artigo, que para mim labora em muita obscuridade. — E antes de tudo direi que todas as questões que incidentalmente se tem tractado nesta Proposição, mereciam mais pausada discussão. — Eu pretendo que a inspecção da Administração seja sim encarregada em cada Comarca a um Delegado do Governo, mas que tudo o mais fique commettido ás respectivas Municipalidades. O bom resultado de um systema similhante apparece, até em os póvos que são governados por Governos absolutos. O Conde de Tournon que foi Prefeito de Napoleão, quando Roma foi reduzida a um dos Departamentos de França, depois da usurpação dos Estados Pontificios, publica que em Roma Papal havia melhores institutos de administração interna do que em a França regenerada. Os hospitaes que alli existem são instituição de origem Municipal. Talvez que o mesmo se possa dizer em relação ao nosso Paiz . O pouco que possuimos de obras publicas; os restos que ainda apparecem de antigas estradas, de fontes, calçadas, e mesmo o estabelecimento dos hospitaes, albergarias, Misericordias, são sim da protecção Real, porém sua origem em geral são de legados dos moradores aonde tais instituições existem, sem que o Governo tivesse parte em as crear. — O poder Municipal é a instituição mais respeitavel que existe na Europa civilisada. Quando outra cousa não houvesse, para o provar bastaria lançar os olhos para a historia antiga, e reflectir qual era a sua importancia entre os Romanos nos tempos da Liberdade. Este poder foi a auctoridade elementar dos Povos, e a mais sagrada que tem havido no mundo, porque ella foi a origem da representação, nacional, como é bem facil de ver depois das investigações que os sabios tem descuberto, tanto na historia de Inglaterra, como, de Hispanha, e da nossa mesma, com particularidade nos reinados dos Senhores D. João I, e D. João IV. — Se dermos attenção ao estado do nosso paiz, qual era (antes dos ultimos acontecimentos extraordinarios) a unica sombra de representação nacional, que nos restava, senão as Municipalidades? — Por consequencia querer encarregar a um Delegado do Governo aquillo que por sua naturesa pertence aos Povos, é cousa em que não possuo convir, porque tenho a maior repugnancia em assentir a que as auctoridades do Governo se intromettam no que é propriamente municipal; e porque estou persuadido, de que tendo o Governo um Administrador seu em cada Provincia, ou Districto, ou Comarca, tem o que é sufficiente para a boa ordem publica, e para manter a suprema auctoridade do mesmo Governo. — Tambem não sei o que será a parte contenciosa de que falla o Artigo; mas seja o que fôr, intendo que é cousa pertencente ao fôro, e que portanto deverá depender do poder judicial.

Concluo que se me tirarem estas duvidas, não deixarei de sustentar aquillo que o Governo propoz, e que reputa necessario, para o andamento da administração; mas emquanto assim não acontecer, estou longe disso, porque emfim fallando dentro deste respeitavel recinto, não devo ter medo neste mundo senão de Deus, e da minha consciencia.

O Sr. Conde da Taipa: — O contencioso administrativo é quando ha uma duvida entre o particular, e a administração: isto é que se chama contencioso administrativo. Supponho eu que é assim, e é o que intendo, do menos assim o tenho lido em livros de Administração Franceza: Bonin e outros que tem escripto a este respeito, confirmam o que eu acabo de dizer. Ora no Artigo quer-se fazer uma differença entre as causas que podem occorrer, e das quaes algumas deveriam ser julgadas administrativamente; eu estou por ella, vista a urgencia desta Lei, ainda que na minha opinião particular seja que aos Povos se dá mais segurança resolvendo estas duvidas pela administração do que pelas auctoridades judiciaes.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Lamento que este Artigo fosse decidido na Camara dos Senhores Deputados, com demasiada prevenção, porque realmente a redacção com que se acha, não póde sustentar-se. O grande odio que havia contra as Prefeituras, e Concelhos de Prefeituras (que pareciam constituir um Tribunal de nomeação Real) fez que se désse uma nova fórma a esses Concelhos; fórma que eu tive a honra de indicar ao auctor do Projecto; mas nem assim pararam, antes continuaram as mesmas prevenções, por isso no Artigo apparece uma specie de contrasenso, que não sei como possa passar sem novamente voltar á Camara Electiva.

Em França varia alguma cousa a demarcação da questões, cuja decisão se attribui aos empregados administrativos e ao poder judicial, começando algumas (que são da mais alta monta) n'aquellas auctoridades, e subindo depois ao Conselho d'Estado: ora assim como isto não está demarcado em França, menos se póde demarcar entre nós. — Com a idéa de cortar os estorvos, que esta Lei póde ter em seu an-

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damento, tinha eu feito uma resenha a este respeito, a qual tencionava publicar quando ella e posesse em practica, e que se reduzia a estabelecer uma verdadeira linha de demarcação nominal, entre o que é contencioso administrativo, e o que póde reputar-se judicial. — E isto é tanto arbitrio, que quando em França, depois de 1830, se tractou de similhantes species, muitas questões que ele então eram administrativas, são hoje levadas aos juizes. Todas as que se levantam sobre eleições, são decididas administrativamente, mas com appellação para as Relações dos Districtos; e entretanto estas eram daquellas privativas dos corpos administrativos. Entre nós tambem seria facil estabelecer alguma base para o mesmo effeito: assim as questões sobre recrutamentos, serão administrativas; as questões sobre contribuições directas, quando não tenham sido julgadas pelas Juntas administrativas, pertencerão a mesma classificação; os limites dos Concelhos uns com os outros, o que diz respeito a obras de utilidade publica dos districtos, como estradas, canaes, etc., estarão no mesmo caso: e assim successivamente, com facilidade se poderá fazer esta designação, marcando-se tambem de alguma fórma as attribuições destes Concelhos administrativos. — O Prefeito, para muitos casos, vai ser substituido pelo Magistrado administrativo de Districto com o respectivo Concelho, que deve servir de o auxiliar, e que é uma specie de Conselho d'Estado (se me é licita a expressão) junto a cada um dos Administradores, que com o seu voto deve guiar a marcha do negocios do Districto.

Acho por tanto que este Artigo não poderia passar sem uma emenda em que se declare que = o contencioso propriamente tal fica devolvido aos Magistrados judiciaes. = É esta a verdadeira redacção do Artigo; porque (não posso deixar de o repetir) uma questão póde começar administrativa, e tornar-se judicial, caso em que a declaração é indispensavel.

O Sr. Conde da Taipa: — Proponho que este Artigo volte á Commissão, porque é impossivel fazer aqui uma emenda de improviso. (Apoiado.)

A Commissão que sáia já, e vá propôr uma emenda, segundo as ideas que se tem emittido.

O Sr. Sarmento: — Peço que a Commissão ouça o Sr. Ministro dos Negocios do Reino; parece-me que assim é necessario.

O Sr. Conde da Taipa: — Sim Senhor, assim será, mas é preciso definir o que é contencioso administrativo, e depois dizer quem hade julgar disto: nenhuma destas cousas se póde fazer aqui na Camara.

O Sr. Margiochi: — Pedi a palavra sobre a Ordem, e fui privado della; quereria sómente dizer, antes que a discussão progredisse, que me parecia conveniente se determinasse bem o que significa este titulo «Magistrados Civis» e que e interpretasse bem que nesta Lei se fica intendendo estes Magistrados Civís segundo se intendem hoje; porque quem tiver de executala se póde servir dentas palavras no sentido antigo, e por isso eu julgava mais conveniente que se eliminasse esta parte do Artigo, por quanto seria cousa muito difficultosa definir aqui agora o que é contencioso administrativo; julgo isto de uma difficuldade immensa; e em consequencia parece-me que o melhor é supprimir estas ultimas palavras, para que a Lei possa passar convenientemente.

O Sr. Gyrão: — Eu não quero fazer a injustiça á Camara dos Senhores Deputados de suppôr que por se eliminarem estas ultimas palavras do Artigo ella o não approvará, e tanto mais que hoje todos conhecem que isto passou com grande precipitação. — O Conselho de Prefeitura era das instituições mais liberaes que tem havido nesta nova Administração: todos conhecem que muito bem preenche as vistas dos principios de liberdade; assim o Rei tem o seu Delegado que é o Prefeito: tambem o Povo tem alli aquella Junta para vigiar o Prefeito: entretanto eu não darei para isto o meu voto, nem por vinte Corôas como a de Portugal; e em consequencia digo que juntar-se de novo a Commissão para ouvir o Sr. Ministro não tem logar, porque levaria muito tempo, além daquelle que nós temos, e por isso não seria possivel concluir-se, mas até porque eu alli votaria da mesma fórma que já o fiz. Em summa peço a V. Ex.ª queira propôr a eliminação das ultimas palavras do Artigo, é a verdadeira emenda, e a unica porque eu votarei.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu proponho que se elimine a ultima parte deste Artigo, ou então que sé substitua por esta emenda = Todas as questões puramente contenciosas ficam devolvidas ao Puder Judicial.

O Sr. Visconde da Serra do Pifar: — Eu peço A Camara que se vote este Artigo em duas partes: primeira até á palavra = Prefeituras = segunda o resto do Artigo. (Apoiado.)

O Sr. Marque de Loulé: — Eu pediria a V. Ex.ª que propozesse á Camara, antes de nenhuma outra cousa, se este Artigo deve voltar á Commissão; porque uma vez que assim se decida ella terá em vista todas as emendas.

O Sr. Ministro da Marinha: — As emendas são minto simples, e sobre bases em que se póde tomar já uma deliberação.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo entregue á votação e approvado até á palavra Prefeitura: e em logar da ultima parte delle, approvou-se, para a substituir, a emenda offerecida pelo Sr. Conde de Linhares.

Entrou logo em discussão este

Art. 3.º Haverá em cada Concelho um Agente da administração geral, que se denominará — Administrador do Concelho — escolhido pelo Governo, sobre lista triplice, nos Concelhos cuja Municipalidade só tiverem até cinco Membros, e quintupla nos outros Conselhos feita por eleição directa e pela mesma forma das eleições das Camaras Municipaes, mas em urna separada. O Governo nomeará tambem da mesma lista, um para Substituto.

Sobre elle disse

O Sr. Sarmento: — Parece-me que aquillo, que neste Artigo se designa para uma nova auctoridade com a commissão de agente da administração geral, bastaria encarregara aos Presidentes das Municipalidades; porque será muito difficultoso em alguns Concelhos encontrar pessoas com a necessaria capacidade para esse fim. E neste caso, para que augmentar auctoridades? A multiplicidade dellas, traz comsigo conflictos, e estes quasi sempre a falta da execução da Lei. Isto deve considerar-se, mórmente quando este Projecto se reputa provisional. — De mais, se esta

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Lei já tem algumas imperfeições, para que havemos de incorrer ainda na de amontoar tantas auctoridades em um Concelho? — Grande parte do nosso transtorno publico, tem sido originado da amontoação de empregos, e empregados, que por falta de regimentos entraram uns nas attribuições dos outros. Além de que, a separação dos Conselhos não convêm que seja tal, que fiquem intermedios sem alguma união de auctoridade: os differentes Poderes publicos devem ter certo nexo; isto desde o Legislativo até á Policia correccional; da mesma maneira o poder Municipal, não deva existir inteiramente separado do Administrativo, e Economico. — Ora o Governo basta que tenha um delegado seu nos Districtos geraes, e depois da existencia das Juntas, que o ajudam, não sei para que seja necessario mais auctoridades da nomeação do Poder Executivo. É verdade que eu sou apaixonado de dar ao poder Municipal a maior extensão possivel, e por esta razão insto que de modo algum se estabeleçam empregados do Governo em meio dos dos Concelhos e Districtos municipaes, porque em fim o Governo tem tanto poder sobre as auctoridades Municipaes, que talvez não convenha que esta Lei lhe dê mais. A multiciplidade de empregados não é das melhores cousas; o que é preciso é que elles sejam sufficientes, e que intendam bem as Leis e os seus deveres. — Concluo que me parece não ser necessario crear esta entidade de Administrador do Concelho, mórmente se se estabelecem as Juntas de Parochia, como julgo indispensavel, (ao menos para Lisboa e Porto) para muitos objectos de Fazenda, e Policia municipal. Portanto em logar da auctoridade, de que falla o Artigo, as funcções correspondentes sejam encarregadas aos Presidentes das Municipalidades.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Não pude bem intender qual era a organisação Administrativa de que tractou o Digno Par; direi comtudo que os principios geraes de Administração são simplices, ainda que na applicação delles ás vezes apparecem intervallos distantes entre si. — Se o Poder Executivo exerce a sua auctoridade nas Provincias, não posso intender como os delegados da Administração nos Concelhos, hão de ser puramente municipaes, e como depois se hão de confundir na machina Executiva. — A base da Administração publica, no systema Constitucional, é que o deliberar seja de muitos, e o executar de um só; aquillo se attribue ordinariamente ao Povo, isto ao Rei. (Apoiado.) Agora se se disser que por uma concessão, que tem exemplo em alguns Paizes, se recorra a certos corpos electivos, para indicarem os homens de que o Governo deva lançar mão, convenho: mas confundir os empregados propriamente administrativos, com os municipaes, ou querer que os Presidentes das Municipalidades se tornem uns agentes directos do Poder Executivo, sem que este tenha alguma acção directa sobre elles; não intendo que possa ser.

Mas o que eu não sei é o que seja Poder municipal; não o vejo na Carta, nem me parece exista constitucionalmente definido. — Questione-se embora sé os ordens do corpo municipal, hão de ser levadas a effeito por um agente propriamente seu, ou se é mais conveniente que isso se encarregue a algum de Poder executivo; mas que este deixe de ter o seu agente Administrativo junto a cada Concelho, isso quanto a mim não admitte questão. — Estas auctoridades hão de substituir os Juizes de Fóra (de alguma maneira); mas porque os Juizes de Fóra, eram ao mesmo tempo Presidentes dos antigos corpos municipaes, e exerciam alguma auctoridade, que de certo não era attribuida a essa presidencia, segue-se que actualmente devam os Presidentes das Camaras, continuar nessas attribuições? Não julgo isto admissivel. Tudo quanto se póde fazer a este respeito, e que o suffragio da população designe tres individuos d'entre os quaes o Poder Executivo escolha um para ser como seu delegado. O Governo tinha proposto que em todas as Municipalidades, se nomeasse mais um membro, e que entre todos elle escolhesse quem executasse essas funcções, a exemplo do que tem logar em França; entretanto propôz o Sr. Deputado Oliveira o methodo do Artigo, que foi acceito pelo Ministerio, para tolher que acontecesse o mesmo que já se vira com os Provedores; pois se os Povos fizerem má escolha, não tem que queixar-se dos Ministros. Mas, desde o momento em que tiver logar essa escolha, não tem a auctoridade electiva nada com esses empregados; e tanto que se nenhum dos tres indicados agradar, o Governo póde mandar proceder a nova eleição; mas acabada ella, expirou o poder, ou a ingerencia da urna. — Concluo pois que nem os Presidentes das Camaras municipaes, nem outra alguma auctoridade que esteja fóra da acção do Governo, poderá servir para este cargo, por quanto tal funccionario se acha para a Municipalidade, na mesma rasão que o Administrador de Districto está para a sua respectiva Junta.

O Sr. Sarmento: — O Governo conheceu tanto a delicadeza de estabelecer um agente seu em cada Concelho, que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, confessa as vantagens que se seguem desse agente ter origem na urna: logo nisto se conhece a propensão de que esta auctoridade administrativa, de sua natureza seja eleita; que é tambem o que quer dizer municipal. — Se ha poder que tenha uma existencia fundada em tudo que ha de mais respeitavel, é sem duvida o poder municipal. Eu já tive a honra de fazer observações, sobre as utilidades, que as Municipalidades trouxeram á Europa, e que foram como os precursores da revolução geral, que deu origem ao systema representativo. — As Camaras, que se estabeleceram, principalmente na Hispanha, desde o anno de 1200, deve a Europa a Liberdade civil, e politica. Verdade é que esse poder depois se reuniu ao poder Real para escravisar, como aconteceu na mesma Hispanha: porém não vem para a presente questão.

Não entrarei agora na theoria da divisão dos poderes publicos; mas basta dizer que o municipal se regula por principios eternos de direito social; embora tenha havido Municipalidades, cujo procedimento illegal deteriorasse esta instituição patriarchal, e dos tempos mais antigos: o poder municipal é um colosso, que se acha firmado em sólidas bases: é a elle que a Hispanha deve a sua Liberdade, as suas Côrtes e os seus institutos de civilisação: foi elle quem conseguiu muitas concessões beneficas da Soberania; e venerandos restos ainda hoje subsistem dos tempos em que muitas povoações eram governadas municipalmente. Estas opiniões, que eu sustentei são con-

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firmadas por observações ultimamente feitas no Oriente da Europa; alli povos subjeitos ao jugo dos Turcos vivem sem o vexame, que se podia suppôr, sómente porque gosam senão da liberdade politica, e civil, de outra que lhe chamarei municipal. Eis o que revellou a toda a Europa um novo explorador, homem de credito, de talento, e de saber, meu amigo Urqhuart. Observações identicas se acham em Mr. Thiersch. Eu já citei o Conde de Tournon, o qual mostrou no exame, que fez do systema de administração nos Estados do Papa, quanto póde a liberdade municipal ainda mesmo nos Governos despoticos. Foi em favor desta mesma liberdade municipal que tanto clamou o patriota Jovellanos.

Quando Combati a doctrina do Artigo, não foi para tirar auctoridade ao Poder Real, mas para lha dar: o que eu não quero é que o Governo tenha agentes amontoados em cada terra, como se fosse um enxame de abelhas. O resto são questões de pontinhos, ou de pequenas cousas, que nada valem. O Presidente da Camara Municipal póde bem levar a effeito as ordens do Governo na parte administrativa. E que mais poderá pretender-se n'um Concelho de 800 almas, por exemplo? Quererá o poder Executivo exercer a sua influencia até dentro das casas dos cidadãos? Certamente que não, e o contrario seria usar de uma omnipotencia que só pertence a Deus. Com os empregados actuaes, e os que ainda talvez se hão de crear, acho que se tem gente sufficiente, para fiscalisar a execução das Leis, e manter a ordem na Sociedade; o mais seria amontoar auctoridades, com pouco fructo do serviço publico. Por conseguinte, firme na minha opinião, voto contra a existencia deste novo agente, chamado Administrador, ou Provedor, por convicção e não por capricho: não tenho outra cousa em vista nesta organisação administrativo, senão que as cousas se façam da maneira que intendo ser mais proprias.

O Sr. Gyrão: — Depois do que tem dito o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, pouco me resta a accrescentar. Se acaso se fizer Administrador de Concelho o Presidente da Camara, será o mesmo que não haver Administração. Em quanto ao poder chamado Municipal, declaro que eu não reconheço senão os Poderes politicos que a Carta marca, e bem claro é o Artigo da mesma a este respeito, que diz (leu): logo não ha tal poder Municipal, isto é uma invenção de ha dois dias. Existem as Camaras Municipaes, porém o serem boas não constitue um poder politico; e esta idéa tem-nos feito muitissimo mal, e della tem tambem procedido todas as questões. Este Artigo em theoria está muito bom, mas receio-lhe alguma difficuldade na practica; voto por elle mas não porque o ache perfeito. Agora, se se deve dar auctoridade ao Governo Executivo para que elle possa marchar, isso é tão claro, que até acho escusado estar a dar mais rasões a tal respeito: mas é necessario que o homem a quem se entregar esta Administração seja responsavel. E como se póde fazer responsavel o Presidente da Municipalidade? Nestas listas triplices e quintuplas tem o Governo por onde escolher, e o fará como melhor lhe pareça: assim mesmo ha nisto muitos inconvenientes, mas nas circumstancias actuaes é o melhor que se póde fazer. Deus nos livre da idéa de que as Municipalidades executem o que o Governo mandar, porque o seu modo de fazerem justiça é entrarem n'uma terra e degolar tudo!

O Sr. Conde da Taipa: — Em Portugal está-se sempre em uma confusão porque se não olha para as cousas como se deve. Tem havido esta confusão não só a respeito do poder Municipal como a respeito do Poder Executivo; o poder Municipal não sei eu o que é, mas a Municipalidade é o Poder Executivo dos interesses particulares da sociedade Municipal, e assim são os que tractam immediatamente do interesse dos Povos, postoque fazem um corpo separado, e não tem nada com a ordem publica; o poder Municipal não tem nada com o Poder Real, nem nelle ingerencia alguma, mas deve ter uma administração completa dos interesses particulares da Sociedade a que pertence. Tenho dado as minhas rasões a este respeito, talvez não muito fortes, mas bem claras, e digo que me não troco por muita gente, apesar da difficuldade que tenha de me expressar.

O poder Municipal é um poder sanccionado por Lei e para administrar os interesses particulares de cada circulo social; estes interesses devem ser administrados sómente pelos seus agentes, que não devem intrometter-se com nenhum agente dos negocios publicos, esta é a rasão porque se lhe chama poder. — Os corpos Municipaes tem sempre offerecido uma resistencia que provém da sua natureza, e o Governo tem tido sempre muito ciume destes corpos; o caso é que a Lei marque bem os limites de cada um nas suas attribuições, para que uns não possam entrar nas dos outros. — O Sr. Ministro do Reino disse muito bem, que o Poder Executivo é sómente do Rei. A eleição que aqui se faz tem um fim; é um conselho que se toma com o povo. Esta administração faz-se gratuita, mas não se sabe a pessoa que se ha de empregar que póde ir roubar em vez de administrar. E então o que faz o Governo? Aconselha-se com os Povos; isto (como disse) não é mais do que consultar a vontade do povo sobre a escolha do homem que será habil para ir exercer aquelle emprego, porém este homem é um agente do Poder Executivo, assim como o é um Secretario d'Estado. O caso todo está, para a boa ordem, em que se designem bem os interesses publicos e os interesses municipaes; esta Junta o que deve é administrar os interesses da Freguezia, sem que lá entre nenhum agente da Municipalidade. O caso está em separar bem as cousas, que já não ha confusão e tudo entrará na ordem não excedendo cada um os limites das suas attribuições: a rasão porque achâmos confusões é porque não designâmos bem as cousas; eu tenho idéas claras a este respeito, sei o que são os Corpos Municipaes e o ciume que sempre tem havido delles; nesta Lei não ha nada de Municipalidade, é tudo executivo; as attribuições das Municipalidades estão-se tractando na outra Camara, que decidiu, que uma Commissão fosse encarregada de appresentar uma Lei a este respeito neste intervallo da Sessão.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Quasi que nada tenho a accrescentar ao que o Digno Par acaba de produzir, que no meu modo de ver, classificou exactamente o que diz respeito á Administração.

Muito se tem gritado contra os abusos dos Prefei-

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tos e dos Provedores, e talvez com rasão, mas nada se tem dito contra os abusos das Camaras Municipaes. Se o Poder Legislativo lhe der attribuições de mais, de si se queixe; se lhas der de menos, de si se queixe; o Governo não tem nada com isto, porque sempre que elle conte com um representante seu em cada Concelho, nada mais tem a exigir. — As distincções feitas pelo Digno Par que me precedeu, são as mais conformes a todos os principios de Administração: o homem de que tracta o Artigo em discussão é o agente do Governo, é o executor das ordens do Ministerio: mas como este é obrigado a fiscalisar o procedimento das Camaras Municipaes segue-se que aquelle agente, não póde fazer parte das mesmas Camaras, ou ter nellas um voto deliberativo. Do contrario, haveria occasiões em que elle fosse obrigado a dizer ás Municipalidades, = essa decisão que tomais não está de accordo com o regimento, e está em contradição com as ordens que eu recebi: = o que poderia ser um principio de grave conflicto. Debaixo deste ponto de vista intendo eu que tal agente se torna nullo, desde que elle seja collocado em circumstancias de não poder cumprir as ordens da Municipalidade, na hypothese de fazer parte della. — Esta questão fica pois em pé; por isso que todos convêm em que o Governo não póde deixar de ter um agente em todos os Conselhos, e demonstrada fica a impossibilidade delle ser membro do Corpo Municipal. — Em consequencia peço a V. Ex.ª proponha á Camara a approvação do Artigo, debaixo da principal consideração que se appresenta, o ser este Administrador um empregado puramente do Governo. Salvo este principio, o Ministerio ha de tractar com a maior circumspecção do desinvolvimento delle no Projecto de Regulamento das Camaras Municipaes, o que não é possivel fazer-se no que actualmente se discute. Por ultimo declaro que não tenho ciume algum do poder das Municipalidades, mas reconheço que esse poder é, como qualquer outro, susceptivel de abusos.

O Sr. Conde da Taipa: — Quando fallei em ciumes do Governo para com as Municipalidades, declaro que não quiz atacar o Sr. Ministro dos Negocios do Reino.

O Sr. Sarmento: — Desejaria que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, antes de terminada a discussão deste Projecto, se não retirasse, sem ter a paciencia de me ouvir; porque tenho a propôr-lhe alguma cousa muito interessante em relação á existencia da Rainha e da Carta.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi e o Artigo 3.º posto á votação e approvado como estava.

Entrou depois em discussão o seguinte

Art. 4.º Os Magistrados administrativos de Districto vencerão em Lisboa 3:000$000 de réis, no Porto 1:600$000 réis, e nos outros Districtos 1:200$000 réis. Os seus Secretarios vencerão em Lisboa e Porto 800$000 réis, e nos outros Districtos 600$000 réis.

Os Administradores de Concelho não vencerão ordenado algum, servirão por dous annos, e podarão ter reeleitos.

Abriu a discussão, e disse

O Sr. Gyrão: — Não me levanto para dizer cousa alguma sobre os ordenados que aqui se estabelecem aos Administradores Civís, porque alguem poderia julgar que eu advogava os meus interesses particulares; o maior que tenho é servir o Estado em quanto poder: desejo sómente fazer alguma observação sobre o ordenado que se estabelece aos Secretarios. Nas Provincias talvez que os seiscentos mil réis seja bastante, porém aqui em Lisboa oitocentos mil réis parece-me muito pouco; porque para este cargo é necessario uma pessoa que se não empregue em outra cousa, e que além disso tenha muita honra e probidade, e portal ordenado não parece que possa servir. Quando se tracta de economias deve ser só para o que é desnecessario; e eu desejava que a Camara olhasse para isto com attenção, reflectindo que não é possivel que um homem esteja trabalhando desde pela manhan até alta noute, por um ordenado que lhe não chega para se sustentar. Além de que este novo systema é muito mais dispendioso do que o antigo, sem que possa haver nelle economia, pois que se houver menos de dezessete Districtos a Administração hade ser má; só as correspondencias dão um trabalho immenso, assim como as circulares, as quaes é preciso repetir tantas vezes, quantos são os Administradores, e todo este trabalho recahe sobre o Secretario. Em consequencia parece-me que é necessario, e de justiça que ao Secretario em Lisboa se estabeleçam mais de oitocentos mil réis, pois que o trabalho que elle aqui faz é muito grande. Aqui tenho a estatistica de um anno, relativa á Prefeitura desta Provincia: (leu.) Á vista disto parece-me que se conhece a necessidade de augmentar o ordenado dos Secretarios de Lisboa e Porto, porque o trabalho de cada um delles é da maior magnitude: peço á Camara olhe para isto, e proponha alguma emenda a esta parte da Lei, que estou persuadido será acceita na outra Camara, a quem eu não quero fazer a injustiça de presumir que rejeitará um augmento rasoavel nos ordenados destes empregos, dos quaes alli não haverá noticia circumstanciada do seu immenso trabalho.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Sou obrigado a confessar que eu combati este Artigo na outra Camara, e o continuarei a combater na dos Dignos Pares. — Pouco tenho que accrescentar ao que está dito, nem a materia é abundante. Estes ordenados não chegam para servir os empregos com dignidade: não tenho direito de iniciativa nesta Camara, mas a têlo proporia que fossem elevados a 2:400$ réis; porque 1:600$ réis, nas Provincias mesmo, me não parece muito. Os ordenados dos Secretarios são evidentemente diminutos; um Official de Secretaria d'Estado tem mais do que no Artigo se determina para aquelles; — além de que, estes logares em França (donde podêmos tirar algum exemplo para o caso) são muito graduados, pois que os Secretarios das Prefeituras, alli se consideram como Sub-Prefeitos: é claro pois que se lhes devem dar tres mil cruzados pelo menos, por isso que nas Provincias precisam ter certa representação. Convém muito não ter odio ás auctoridades; e embora o tenha havido, são estas quem estão encarregadas de conservar a ordem publica. — Não é possivel que um Administrador de Districto possa passar com 1:200$ réis fóra de Lisboa, mesmo porque tem despezas extraordinarias a fazer: entretanto a Camara tomará o que

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acabo de expôr, debaixo da sua consideração, uma vez que a Lei tenha de voltar á outra Camara para ver se em sua sabedoria intende que estes ordenados são, como me parece, pequenissimos, e fazer-lhe a conveniente alteração.

Esquecia-me dizer que um dos argumentos que na Camara Electiva s opposeram ao augmento dos ordenados designados no Artigo, foi a comparação com aquillo que vencem os Generaes das Provincias; argumento, a meu ver, muito mal trazido, porque se os Officiaes militares entre nós tem um pequeno soldo, e por tanto participam disso os Generaes, é necessario observar que além dos soldos tem esses Generaes, (na hypothese de governarem as armas de alguma Provincia) tem, digo, gratificações que são maiores do que os ordenados que o Artigo destina aos Administradores de Districto.

O Sr. Sarmento: — Não me levanto para me oppôr ás idéas expendidas pelo Sr. Ministro dos Negocios do Reino; confesso que os ordenados, que se expecificam no Artigo, não são demasiadamente grandes, e por consequencia não terei duvida alguma em apoiar qualquer lembrança, que se appresente para o seu rasoavel augmento: entretanto farei breves reflexões relativamente no que disse o Digno Par, que fallou em ultimo logar.

O Sr. Gyrão partiu de um ponto que não é exacto, isto é, do grande trabalho, que havia nas Prefeituras. A este respeito observarei que uma parte do que nellas actualmente ha a fazer, terá de passar a outras mãos; porque até aqui as Prefeituras quasi que eram as unicas auctoridades para onde tudo se encaminhava. Ora os Administradores de Districtos, que a presente Lei estabelece, tambem são em maior numero do que os Prefeito, e por isso o muito trabalho que estes tinham, agora ficará mais dividido por aquelles, desapparecendo o montão de officios recebidos, e dirigidos, de que fallou o Digno Par. — Accresce ainda a estas rasões outra importantissima, e que aliviará as Administrações de muitas cousas com que até aqui se tem occupado; e é que eu espero que com o andar do tempo desappareçam certas cousas, que se tem feito até agora nas Prefeituras, tomadas de outros Paizes; pois realmente não sei para que sirvam certas enxertias. — Relativamente a passaportes (por exemplo) vejo que um Paiz como Inglaterra, onde ha tanto transito, como sómente se póde persuadir quem o fôr alli vêr, e testimunhar, ninguem é incommodado por um passaporte; de que serviria o estabelecer boas estradas, e facilidade de communicações, continuando a existir o tropeço dos passaportes? Eu não acho no uso dos passaportes outra vantagem senão dar consummo ao papel das nossas fabricas; o mais é ainda resto do poder arbitrario, e esta extravagancia tem chegado ao ponto de qualquer auctoridade querer ir saber da vida dos Cidadãos. Mas o Governo não carece de similhantes cousas para conservar a ordem publica: todos os extrangeiros devem poder viajar em Portugal com a mais ampla liberdade, uma vez que respeitem as Leis, e os costumes do Paiz. É isto o que muito tem concorrido para que o antigo Aragão, e a moderna Inglaterra sejam na historia do mundo as terras classicas da liberdade. Por consequencia eu de boa vontade acabaria com os passaportes, pois vejo que em Inglaterra todo o mundo viaja sem o menor embaraço, e sem assustar o Governo, e estou desenganado que tal invenção para nada serve senão para opprimir os bons, porque os máus sempre sabem illudir todos estas invenções. Quando neste Reino se acabarem os odios originados pelas nossas dissensões politicas, tudo se poderá precaver com mais franqueza, e não serão necessarias certas medidas violentas para obstar ao transtorno da ordem publica.

Voltando á questão do Artigo, quererei sempre que empregados desta cathegoria tenham os necessarios meios para administrar os seus Districtos com independencia, porque o seu caracter vai ser de grande representação, e importancia. Seria vergonhoso que algum extrangeiro illustre chegasse á sua porta, e este Magistrado não estivesse em circumstancias de lhe offerecer de jantar, não só se offendia o sagrado principio da hospitalidade, mas até se compromettia a Nação pela triste idéa, que desse facto de mesquinhez, e sordidez se argumentasse fóra de Portugal, e com rasão. — Por isso convenho em qualquer augmento rasoavel, que se proponha nos ordenados destes Magistrados, como já tive a honra de o dizer á Camara.

O Sr. Gyrão: — Levanto-me para responder alguma cousa a respeito de passaportes; e direi que se não se prendesse gente por falta delles não se teriam prendido muitos officiaes miguelistas, assim como um agente aos cartistas, os quaes poderiam dar grande incommodo á nossa Causa. Quanto ao trabalho não só não tem diminuido antes augmentado, e cada vez augmentará mais; é preciso uma escripturação continuada, e de uma duração muito grande; pois que com a extincção do Conselho da Fazenda quasi tudo passou para a Prefeitura; e agora intendo que ainda hade augmentar mais esse trabalho, porque a boa administração é o principal ramo de uma Nação, e para a ter é preciso trabalhar. O Exercito tem o destino de defender o Estado, mas este de boa vontade lhe pagaria o sustento para elle estar em descanço; porém a Administração é cousa muito differente, quanto mais trabalha melhor, porque mais bens tem o Estado; por tanto não se imagine que a administração hade ter menos que fazer do que houve até aqui, pelo contrario cada dia hade ir em augmento. — Isto é só o que tinha a dizer, e quando se votar sobre o Artigo peço licença para me retirar.

O Sr. Conde da Taipa: — Fallou-se por incidente em passaportes a cujo respeito não posso deixar de dizer que os considero como a cousa mais contraria á liberdade dos Cidadãos. Haverá maior despotismo, de que terem-me preso em Lisboa, e querer eu ir a Santarem, ou a outra qualquer parte, e não o poder fazer sem pedir licença ao Administrador? E que utilidade se tira disto? É que eu que não vou fazer mal não posso ir, e vai todo o malfeitor. — França é o Paiz dos Passaportes, mas quando D. Carlos quiz sahir de Inglaterra, e ir para Hespanha passou com passaporte provavelmente legalissimo. Será pois a instituição de similhante cousa um principio de liberdade? Eu creio que não. — Disse o Sr. Gyrão que quanto mais trabalha a Administração, melhor é; e eu digo que melhor será a que menos fizer e que deixar aos Cidadãos toda a liberdade para tractar dos

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seus negocios e interesses sem lhes pôr obstaculos; e só quando alguem inflingir a Lei, prendelo, e então castigalo: quando a Administração fôr só esta, será então o melhor governo, sem nenhum accessorio da parte do Governo, castigando unicamente os crimes; tudo o mais são meios que atacam os principios de liberdade. Em consequencia digo eu que um Paiz mostrará a sua civilisação quando menos trabalhar a sua Administração; porque deixa a todo o Cidadão a liberdade de tractar do que lhe convém sem lhe querer ensinar o que hãode fazer; tudo que sahir disto são vistas despoticas, que longe de garantirem a segurança publica, só tem por fim estorvar a liberdade individual.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu desejava pedir ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino que me esclarecesse se dos emolumentos que se pagam nas Prefeituras, alguma parte é applicada para os Secretarios.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Creio que sim, mas eu não conheço Lei que auctorise emolumentos alguns ás Prefeituras; não estou cabalmente informado, mas para informação da Camara aproveitarei esta occasião para ler parte da Lei das Prefeituras (leu e proseguiu. —) De maneira que não passando este Artigo acha-se o Governo auctorisado para conservar nesta parte as cousas como se acham actualmente, o que não sei se convirá.

O Sr. Conde de Linhares: — Pedi a palavra para requerer se elimine a primeira parte do Artigo, e fazer uma emenda quanto á segunda; e era esta que se dissesse, que servirão querendo, pois não vejo motivo para obrigar ninguem a que sirva contra sua vontade; em consequencia julgo que deve ser permittido a cada um servir temporariamente, e em quanto lhe fizer conta; pois não sendo este o seu modo de vida, nem lhe rendendo cousa alguma, não se deve obrigar ninguem a que sirva contra vontade.

O Sr. Marquez de Loulé: — Parece-me que os Administradores de Concelho estarão na regra geral de todas as outras auctoridades eleitas, que são em certo modo obrigadas a servir: tambem intendo agora o que é que se devia declarar, que não serão obrigados a servir por mais de um anno; quanto ao mais julgo estas auctoridades no caso de todas as outras da specie que referi.

O Sr. Conde de Linhares: — É muito differente que um homem seja obrigado a servir por alguns dias os encargos do Concelho, ou dar-se inteiramente á Administração Publica; tendo de fazer viagens e jornadas com despezas, e sem proveito, abandonando uns as suas fabricas ou estabelecimentos, e outros a sua lavoura; se este serviço convém ao Estado, é necessario que o pague.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Creio que a intenção da Camara dos Senhores Deputados, quando neste paragrapho determinou que os Administradores de Concelho não recebessem ordenado, foi relativamente a ordenado designado nas despezas do Orçamento, porque já está decretado na Lei de l6 de Maio de 1832, Art. 33 (que fica em seu vigôr excepto no pessoal) que estes empregados tenham um quantitativo do rendimento dos Concelhos ou para melhor dizer que não tivessem ordenado como os Conselheiros de Prefeitura. Entretanto não é justo que os primeiros deixem de ter algum vencimento, logo que forem escolhidos pelo Governo. — É difficil entrar logo no andamento da administração, e necessario que estes Administradores estejam por muito tempo nesta commissão, para o que dous annos seram bastantes, ou talvez que o não sejam: mas a experiencia o mostrará, e por isso o Artigo creio que poderá passar como está.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu sustento ainda a minha emenda, que seja livre ao individuo acceitar ou rejeitar: e pela minha parte declaro que se me nomeassem não acceitava.

O Sr. Conde da Taipa: — A Lei não obriga ninguem a servir. Nós devemos ir experimentar se isto será bom; o que é sciencia de Governo em um Paiz não o é em outro; o que será bom em França poderá não ser admissivel em Portugal; porém devemos fazer a experiencia, e conservarmos a medida se fôr boa, ou rejeitala se lhe acharmos inconvenientes na practica. Nós estamos agora na transicção do Governo arbitrario para o Governo Constitucional, devemos estabelecer o que nos parecer possivel de adoptar, e depois se a experiencia mostrar que errámos, veremos o modo porque havemos de remediar o que fizemos mal.

O Sr. Marquez de Loulé: — Nós estamos aqui delegando todos os dias as nossas attribuições no Governo, e vai isto indo de modo tal que em pouco tempo não será preciso convocar as Côrtes.

O Sr. Sarmento: — Eu tenho toda a confiança no Governo, que attendendo ás differentes circumstancias do Reino, ha de dar aquelles ordenados que julgar indispensaveis: agora quando se tractar de entregar ao Governo cousas que sejam da attribuição propria das Camaras, então certamente eu lhe negarei essa auctoridade, nem sou menos cioso della que o Digno Par.

O Sr. Sousa e Holstein: — Eu tinha pedido a palavra para confirmar o que disse um Digno Par da esquerda. Nós não sabemos ainda qual ha de ser o numero de Districtos, e parece-me que só depois da estabelecida a Administração é que se póde saber o trabalho que terão estes empregados para se lhes arbitrar ordenado; é por esta vez sómente que se dá esta faculdade ao Governo, e parece-me que é muito mais importante a que já se lhe deu de fixar o numero dos Districtos; portanto quem concede o mais deve conceder o menos, para não cahir em contradicção.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu não concedi o mais, nem agora tenho tenção de conceder o menos; diz a Carta Constitucional (leu.) Em consequencia auctorisar o Governo para estabelecer estes ordenados, é o que não cabe nas nossas attribuições, e é a isso que eu me opponho.

O Sr. Conde de Linhares: — Como eu tinha proposto a eliminação, peço a V. Ex.ª que a ponha á votação, por ser cousa muito simples.

O Sr. Conde da Taipa: — O Artigo não se póde eliminar, não está nas nossas attribuições o fazelo; se os Dignos Pares acham os ordenados pequenos, proponham-nos maiores, mas venham a um ponto porque o mais é anti-constitucional. Portanto o meu voto é que alguem faça uma emenda ou que o Sr. Ministro do Reino, se quizer, proponha um augmen-

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to de ordenado; em fim que se decida alguma cousa.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Isto foi um corte que se fez na outra Camara, mas o Sr. Ministro do Reino disse que convinha no augmento, que já alguem aqui lembrou.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Eu acho que um Administrador nas Provincias tem necessidade de mais ordenado, porque é alli quem figura são elles as primeiras pessoas: em Lisboa não, porque quem figura é o Governo, em consequencia parece-me que o estipulado para Lisboa será bastante, mas quanto ás Provincias, votarei por algum augmento, porque realmente é pouco.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — O caso é que é preciso dar dinheiro a homens que tem trabalho e responsabilidade, para que elles sirvam bem; o contrario é o mesmo que dizer, = vá V. m. para aquella terra ser Administrador e roube á sua vontade. Antigamente davam-se a um Juiz de Fóra 80$ rs. de ordenado, e elle roubava quarenta mil cruzados se podia: creio que não queremos que continue esta practica, e assim devemos propôr algum augmento a estes empregados.

O Sr. Conde da. Taipa: — Quando se dá a um homem um ordenado qualquer, se elle rouba é ladrão, mas então ha um premio para quem tem estas habilidades que é a forca. — Agora quanto aos ordenados eu intendo que para as Provincias é bastante, acho um ordenado muito sufficiente para que os homens que forem nomeados para estes logares poderem desempenhar as suas funcções, porém quanto a Lisboa augmentaria alguma cousa. Devemos attender que ha economias que deixam de o ser, é preciso termos rasão para castigar quem delinquir, é preciso impôr a Lei e ser inexoravel; portanto voto que para Lisboa se augmente um pouco mais o ordenado do Administrador.

O Sr. Sarmento: — O dizer-se (como é costume) que, quando um empregado publico não póde servir com pequeno ordenado tem o recurso de não acceitar, quanto a mim não póde vir á questão. O ponto de debate é, se o ordenado, de que falla o Artigo é pequeno, e tambem, se deve ser o mesmo para todos os Administradores. — O que ficar em Lisboa, deve ter mais, do que os que tiverem de residir em terras baratas das Provincias: mas eu não faria differença alguma nos ordenados, dando a todos o de 2:400$ rs e, sendo necessario accrescentaria uma ajuda de custo aos das terras mais importantes; porque fallando claro, quem vai ficar em contacto com gente mais civilisada, carece de certos meios. — Além de que, é preciso contemplar que alguns destes Magistrados tem de ir amançar gente brava, mórmente na presente occasião em que os espiritos se não acham ainda de todo repousados, e que por isso não lhes deve faltar meio algum de o conseguirem. Não sei se é da intenção do Governo que alguma parte dos edificios publicos seja destinada para habitação, e officinas destas auctoridades; porque nesta consideração, a questão muda de aspecto; e esta foi uma das rasões porque eu fui de voto se encarregasse ao Governo esta designação. Em fim isto depende de conhecimentos de facto, que só elle póde ter com exactidão: entretanto se se assentasse no augmento dos ordenados, eu elevaria os dos Administradores até 3:000$ rs.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu acho que para Lisboa e Porto é bastante 2:400$ rs, e 1:800$ rs. para as Provincias; e por isso me opponho aos tres contos quantia que já lembrou.

O Sr. Margiochi: — O modo de sahir deste embaraço, visto o muito trabalho que estes empregados vão ter, parecia-me que era accrescentar a cada um destes numeros, mais quatrocentos mil réis; e assim conserva-se ainda tudo na mesma proporção em que no Artigo se acha estabelecido.

O Sr. Barradas: — Convenho, mas relativamente aos Administradores de Concelho, póde dizer-se que, não vencerão ordenado algum fixo.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Todos os Empregados tem a liberdade de querer ou não acceitar os empregos do Governo, quanto mais estes a quem decerto o Governo não póde obrigar a que sirvam; digo isto em referencia ao que ouvi a um Digno Par.

O Sr. Conde da Taipa: — A Lei não obriga ninguem a ser empregado do Governo, por tanto acho que é tempo perdido estarmos suscitando mais duvidas sobre este assumpto.

O Sr. Conde de Linhares: — Isto é uma Lei, e o que diz no Artigo 3.º é que estes Administradores serão eleitos por listas triplices, para que o Governo possa escolher aquelle que quiser; e neste Artigo diz (leu.) Se isto é uma Lei como eu creio, está claro que o homem póde ser constrangido a servir pela obrigação que ella lhe impõem; tanto mais sendo um logar da escolha do Governo, e que tem funcções importantes a exercer. Por consequencia ainda sustento a minha emenda.

O Sr. Souza e Holstein: — Eu desejaria responder ao que disse um Digno Par, que ninguem é obrigado a servir cargos publicos. — Estes empregados vão ser eleitos como os Membros dos Corpos Municipaes, os quaes são obrigados a servir; e por isso me parece que convém fazer a declaração proposta.

O Sr. Conde da Taipa: — Aqui não ha natureza mixta de eleição, é nomeação que deixa ao Governo a escolha para aquelle caso, e então torna-se o individuo um empregado propriamente do Governo, e que não póde ser obrigado; o Governo não póde constranger ninguem a que seja seu agente: por tanto o homem nomeado póde recusar querendo, e então é ocioso estar com esta questão.

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo 4.º posto á votação, tal qual se achava na Proposição, e rejeitado. Votando-se então sobre a substituição do Sr. Margiochi, que consistia em augmentar 400$ réis, a cada um dos ordenados estabelecidos no Artigo, foi a mesma substituição approvada, declarando-se que os Magistrados ficariam vencendo em Lisboa 2:400$ réis, no Porto 2:000$ réis, e nos outros Districtos 1:600$ réis: e os Secretarios em Lisboa e Porto 1:200$ réis, e nos outros Districtos 1:000$ réis. Tambem se approvou que no ultimo membro do Artigo se accrescentasse depois da palavra = ordenado = a palavra fixo, na fórma indicada pelo Sr. Barradas.

Passou a discutir-se o seguinte

Art. 5.º O Governo fica auctorisado a fazer provisoriamente a divisão administrativa do Reino na conformidade destas Bases, assim como os Regulamentos indispensaveis para a sua execução, appresen-

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tando tudo ás Côrtes na primeira seguinte Sessão, para o sanccionarem, se o julgarem conveniente.

Sobre o qual disse

O Sr. Sarmento: — Usarei da palavra para perguntar ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino se tem em vista dar attenção ás palavras da Carta relativamente á divisão administrativa do Reino. Acha-se este agora dividido, quanto á parte judicial, em districtos de Relações, e estes em Comarcas: é este mesmo systema, que eu reclamo se applique á Administração, persuadido ser de necessidade que neste ponto (como em todos) se execute a Carta litteralmente. Portanto a palavra Comarca achando-se expressamente designada nella, não póde substituir-se por outro nome, e desejo chamar sobre isto a attenção de Sua Ex.ª

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Tomarei em consideração esta lembrança do Digno Par, quando o Governo tractar da divisão que o Artigo auctorisa, para dar a estes districtos o nome que mais convier.

O Sr. Sarmento: — A minha lembrança tem só por fim excitar esta recordação quando se tractar deste objecto.

Não se fazendo outra observação, foi o Artigo 5.º posto á votação, e approvado como estava.

Passou a discutir-se o

Art. 6.º O Governo porá, em harmonia com estas Bases, os demais ramos de administração.

Pediu a palavra, e disse

O Sr. Sarmento: — Tambem chamarei a attenção do Sr. Ministro dos Negocios do Reino sobre o que poderá fazer-se em consequencia deste Artigo. — É preciso considerar o estado da Nação, a qual bem que esteja pacificada, contém restos de um partido violento, e a historia mostra quantas precauções é mister usar para com elles. Este meu argumento vem para mostrar a necessidade de que o Governo de Sua Magestade estabeleça nas Provincias um Logar-Tenente, ou delegado seu, para occorrer aos casos de rebellião declarada; por me persuadir que a existencia de tal auctoridade póde evitar grandes inconvenientes. — O caso do Marquez de Chaves acontecido em 1823, e repetido depois em 1826, reforça a minha opinião a este respeito, pois se então houvesse a auctoridade revestida do poder, que lembrei, talvez que nenhum daquelles factos tivesse o exito que os seguiram. Os Congressos daquelle tempo tiveram de fazer Leis speciaes, e tardias; e a organisação da Junta, que teve logar no Porto, depois do levantamento do Marquez de Chaves em 1823, foi tal que o Governo apezar de conhecer que aquillo era uma extravagancia, não a quiz annullar em rasão da segurança publica. Ora nada disto aconteceria se houvesse uma auctoridade com as attribuições sufficientes para occurrer a qualquer novidade, e até talvez que o ultimo daquelles levantamentos se tivesse suffocado em seu principio; mas foi necessario que as auctoridades militares em 1825, 1827, e 1828 tomassem medidas irregulares, que sempre desacreditam muito o Systema Constitucional. Esta foi igualmente umas das grandes causas, que concurreram para o partido rebelde, se declarar abertamente contra a Carta.

Tudo se deve evitar a tempo, o Governo agora vai ficar sem as Camaras Legislativas para consultar em qualquer extraordinaria circumstancia; por isso deve haver uma auctoridade em cada Provincia, propriamente ad hoc. Não pretendo com esta opinião que se estabeleça o que restrictamente se intende por Logar-Tenente d'ElRei; mas uma pessoa capaz, e com a firmeza propria para affrontar qualquer perigo; pois se em todos os Paizes os empregados publicos a precisam, muito mais em Portugal, aonde presentemente está apparecendo o habito de calumniar, em logar de ajudar o Governo no desempenho de seus cargos. A primeira auctoridade das Provincias deve ser uma auctoridade grande pelas qualidades, pela força, e ainda mais pelo seu valor nos casos extraordinarios, em que as Côrtes não possam logo convocar-se. — Não sei quaes serão as vistas do Governo a este respeito; mas a prudencia humana, mesmo no socego em que nos achâmos, deve prever com medidas adequadas qualquer imprevisto acontecimento, porque um axioma nos ensina que é preferivel prevenir os males a castigalos. — Por ultimo direi que achando-se alguns miguelistas em Hispanha, e podendo suppôr-se desta minha recordação dirigida ao Governo que me refiro a elles, declaro que de modo algum eu duvidaria do resultado em favor da liberdade, em qualquer luta que com taes homens houvessemos de ter: entretanto para evitar a rebellião possivel, postoque não provavel, quizera eu que o Governo tomasse todas as necessarias providencias. Não sei se os Magistrados, de que tracta esta Lei, serão bastantes para esse fim, ou se deixando a cada um delles a faculdade de fazer aquillo, que o seu zelo lhe dictar pela ordem publica, ficaremos certos de que, ella se não interromperá; tudo isto pertence ao Governo, e por consequencia desejaria ouvir o parecer do Sr. Ministro dos Negocios do Reino sobre o assumpto para ficar socegado.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Reflectindo sobre as palavras, que o Digno Par teve a bondade de me dirigir, responder-lhe-hei que o Governo tem assentado que não ha precisão de auctoridade nova para occurrer aos casos mencionados, fim quanto as garantias constitucionaes estiverem, como estão, em seu vigôr, é claro que não póde haver outras auctoridades, além daquellas que se acham designadas por Lei; e quando aconteça que em qualquer parte seja necessario lançar mão de meios extraordinarios, intendo eu que os Prefeitos estão auctorisados para dar todas as providencias que julgarem convenientes, visto que, entre outras cousas, podem fazer reunir a Guarda Nacional dos seus respectivos Districtos, e reclamar o auxilio da força armada, debaixo da responsabilidade dos Generais das Provincias, quando lhe neguem esse adjutorio. Em consequencia creio que tem tudo quanto é necessario para momentaneamente acudir, e ter mão em qualquer acontecimento que possa sobrevir, e que seja da naturesa daquelles que referiu o Digno Par. Debaixo deste ponto de vista não creio haja necessidade de crear uma auctoridade nova, sómente para occurrer a algum caso possivel, nem que a Legislação vigente auctorise o Governo para estabelecer medidas extraordinarias de prevenção; tudo o que se póde fazer é estar alerta para acudir a qualquer ponto, onde se receie algum levantamento; mas ainda então o Gover-

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no e os Administradores de Districto são as unicas auctoridades competentes para o suffocar, dispondo prudentemente as força do Exercito, e da Guarda Nacional. Contra isto ha só um inconveniente que é o de diminuir os circulos administrativos, entretanto não poderei dizer se elles serão dezesete, ou menos. — Concluo que em resposta ao Digno Par, que suscitou a specie de que acabo de fallar, não me occorre meio algum de precisão, além dos que indiquei, e mesmo me não parece actualmente necessario; se comtudo occurrer qualquer lembrança a este respeito, o Governo a tomará devidamente em consideração.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu fallei na necessidade das Juntas Parochiaes: ninguem se oppoz a esta idéa, nem mesmo o Sr. Ministro dos Negocios do Reino deixará de a tomar em consideração, porque tem algumas utilidades: por conseguinte eu vou mandar á Mesa um additamento a este respeito, para ser incluido na Proposta em discussão.

Assim o fez o digno Par; é o seguinte

Artigo addicional.

Poderá haver em cada Freguezia uma Junta de Parochia eleita pelos seus habitantes para administrar os interesses particulares della. — Conde da Taipa, Par do Reino.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Eu acho que as Juntas de Parochia são um grande elemento mesmo para o Governo, e que dellas se devem tirar bastantes vantagens em relação aos Concelhos que tenham menos extensão, e para dar uma certa força ás Municipalidades. Tambem poderão ser de utilidade para a eleição dos jurados, porque ha muitos Concelhos que hoje não podem ter nem um jurado. Esta idéa appareceu na primeira discussão do Projecto, mas foi combatida na Camara dos Senhores Deputados, debaixo do ponto de vista de se ir estabelecer uma rivalidade entre as diversas Juntas; mas isso a verificar será mais pela falta de Regimento, do que por outra causa: mas em todo o caso reputo a instituição como um elemento que póde ser muito util, principalmente nos Concelhos de grande extensão, onde as Municipalidades serão auxiliadas pelo trabalho destas Juntas, que por si mesmas farão muitas cousas que hoje estão encarregadas ás Camaras.

O Sr. Souza e Holstein: — Com facilidade admitto o Artigo, mas parece-me que era melhor collocado entre o 3.º e o 4.º, e não no fim da Lei; parece-me aquella o logar mais proprio.

O Sr. Conde da Taipa: — Quanto ao logar em que deve ir não tractarei, porque isso para mim é indifferente; agora quanto á redacção, tem ahi tres vezes a palavra Parochia, e então parecia-me que se deveria tirar uma para ficar menos repetida; puz ahi = poderá haver = porque talvez haja Freguezias tão pequenas aonde não seja possivel reunir a Junta.

O Sr. Margiochi: — A palavra que me parecia melhor adoptar neste mesmo Artigo 6.º seria em vez de se dizer = o Governo porá — dizer = o Governo podera etc. = O Sr. Sarmento: = Apoio a idéa das Juntas de Parochia; e como o Senhor Ministro do Reino posto que tambem a approvasse, se referiu a uma observação, que póde cansar algum escrupulo, (por ter sido feito na outra Camara) e vem a ser ás rivalidades, que estas Juntas podem suscitar, digo eu que essas mesmas rivalidades é o que se quer, e havemos de vêr aqui em Lisboa, que em logar da emulação excitar um mal excitará um bem, para cada Parochia ter as suas ruas mais limpas, mais bem allumiadas, e com melhor policia.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Para conhecimento da Camara repeti um argumento, pelo qual talvez fosse rejeitado este Artigo, mas estou persuadido de que se actualmente fosse outra vez votado, na Camara Electiva, passaria.

Não se fazendo outra reflexão foi o Artigo addicional (offerecido pelo Sr. Conde da Taipa) posto á votação e approvado; resolvendo-se tambem que se juntasse ao Artigo 6.º

O seguinte foi approvado sem discussão.

Artigo 7.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Pediria a V. Ex.ª, se a Camara o permittisse, que hoje mesmo fosse expedida á Camara dos Senhores Deputados a Proposição que acaba de approvar-se para ver se póde passar nesta Sessão.

Manifestando a Camara convir neste requerimento, se mandou fazer a ultima redacção da mesma Proposição; e sendo uma hora e vinte minutos, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Interrompe-se a Sessão.

Tendo dado hora e meia continuou a Sessão.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu o seguinte

DECRETO.

Sendo chegado o ultimo termo da Sessão annual das Côrtes segundo o que se acha determinado no Artigo dezesete, Capitulo primeiro, Titulo quarto da Carta Constitucional da Monarchia Portugueza; Hei por bem designar o dia vinte do corrente mez d'Abril para a Sessão Real de Encerramento da Sessão actual, no Palacio das Côrtes, pela uma hora da tarde, reunidas ambas as Camaras: e assim o communico á Camara dos Dignos Pares do Reino para sua intelligencia. Palacio das Necessidades, em 15 de Abril de 1835. = RAINHA. = Agostinho José Freire.

A Camara ficou inteirada.

O mesmo Sr. Secretario mencionou o seguinte expediente: — 1.º Um Officio da Presidencia da Camara dos Senhores Deputados participando que alli se tinham adoptado, e iam levar á Sancção Real, as Proposições desta Camara; — para reunir todos os negocios do Ultramar em uma das seis Secretarias d'Estado. Sobre a liberdade da cultura do tabaco nas Ilhas dos Açôres, — para substituir nos Dominios Ultramarinos os Capitães Generaes por Governadores que reunam as attribuições civis e militares; — as emendas á Proposição para o lançamento da decima e impostos annexos.

2.º Outro Officio da Presidencia da Camara Electiva, incluindo uma Proposição, fazendo extensivas ás Ilhas da Madeira, e Porto Santo as disposições do Decreto das Côrtes de 18 de Abril de 1835. — Passou á Commissão do Ultramar.

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3.º Outro Officio incluindo uma Proposição da mesma Camara para augmentar os soldos aos Officiaes subalternos do Exercito em effectivo serviço. — Passou á Secção de Guerra.

4.º Outro Officio incluindo uma Proposição para ampliar e declarar o Artigo 8.º do Decreto de 28 de Novembro de 1831. — Passou á Secção de Legislação.

5.º Um Officio do Sr. Presidente do Conselho de Ministros, remettendo, para ser depositado no Archivo da Camara, o authographo do Decreto das Côrtes de 8 de Abril deste anno, relativo a alguns Estudantes da Universidade e Academias, já sanccionado por Sua Magestade a Rainha. — Teve o destino indicado.

Passou a Camara á discussão da Proposição da Electiva, sobre as indemnisações dos prejuisos causa dos pela usurpação a qual foi lida, assim como o Parecer da Commissão Special que a examinou, e que fôra appresentado em Sessão de 15 do currente. (Vid. pag. 301.)

O Sr. Vice-Presidente: — Parece-me que esta Proposição está no caso de se lhe omittir a discussão em geral (Apoiado.) Discutir-se-ha por tanto Artigo por Artigo.

A Camara se conformou com a indicação de Sua Ex.ª

O Sr. Conde da Taipa appresentou um requerimento assignado por um grande numero da Cidadãos pedindo a decisão da Proposição referida.

Tendo-se feito a leitura delle, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Está em discussão o Artigo 1.º

É como se segue:

Artigo 1.º São habeis para haverem indemnisações todos aquelles que por sua constante, e invariavel fidelidade á Carta Constitucional, e ao Throno legitimo soffreram prejuiso em sua pessoa, agencia, ou bens, e bem assim os seus herdeiros, e cessionarios.

Sobre elle pediu a palavra, e disse

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Este Projecto passou na outra Camara, depois de uma longa discussão em que se agitaram as paixões da Nação inteira, e os seus interesses foram discutidos e pesados debaixo de todos os pontos de vista imaginaveis. Estas bases que agora se propõem, parecem ser uma garantia, e talvez a unica, de união, e de paz, assim como da cessação de prejuisos, por uma parte, e de receios e odios por outra. Conseguintemente espero e desejo que sejam adoptadas por esta Camara quasi unanimemente, ou unanimemente se fôr possivel.

Não pedindo a palavra nenhum dos outros Dignos Pares, foi o Artigo julgado discutido, posto á votação, e unanimemente approvado.

Tambem o foram, e sem discussão os seguintes.

Artigo 2.º O Governo indemnisará os prejuisos causados para a defesa propria, ou aggressão contra o inimigo; e bem assim os prejuisos causados pela usurpação, cujos auctores forem incertos, ou insoluveis. No caso de inhabilidade parcial, o Governo indemnisará a parte sómente que faltar.

Art. 3.º Os prejuisos mencionados no Artigo antecedente dividem-se em reaes, e pessoaes, tanto os já liquidados, como os não liquidados, o serão uns e outros, segundo o regulamento que o Governo decretar.

Art. 4.º Os soldos, e ordenados continuarão a ser liquidados pelo modo actualmente estabelecido.

Art. 5.º Os lucros cessantes, em consequencia da interrupção do exercicio da profissão de cada um dos indemnisados, serão liquidados por Commissões, que arbitrarão a indemnisação correspondente a cada profissão.

Lido o seguinte

Art. 6.º O praso fixo para a liquidação das indemnisações será de dez mezes, contados do dia em que a presente Lei fôr publicada nas respectivas localidades.

§ 1.º Este praso será de dous annos para os subditos fieis que se acharem fóra da Europa.

Disse sobre a parte principal do mesmo

O Sr. Sarmento: — Parece-me este praso muito curto: no Artigo antecedente se fez dependente de uma Commissão a liquidação destes direitos, isto hade levar muito tempo, e então parece-me muito pequeno o praso marcado; não poderei dizer de improviso qual elle deva ser, mas julgo necessario chamar a attenção da Camara, sobre este objecto, para se dar mais tempo aos interessados a fim de poderem obter aquillo a que tem direito.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Se a Camara julgar com effeito que este praso é curto, e o quizer prorogar, não me opporei a essa emenda, entretanto parece-me que isso é contrario directamente ao interesse das partes, porque o pagamento não póde fixar-se senão depois de fixada a liquidação, como diz um Artigo desta mesma Proposição, e perante as Camaras Legislativas; por isso o praso que aqui se indicou é, pouco mais ou menos, o intervallo destas ás seguintes Côrtes Ordinarias, servindo tambem esta designação para, por mais uma maneira, ensinar que o methodo do pagamento, ha de ser determinado pelo Corpo Legislativo.

O Sr. Sarmento: — Intendo muito bem o raciocinio do Digno Par. Claramente se vê que esta Lei está dependente d'outras, e que aquelles que julgam vão ter uma Lei de indemnisações, se enganam, por quanto aqui não ha senão uma esperança dellas. Aquillo, que agora se legislar fica na dependencia do que em outras Côrtes se ha de ainda resolver; como aqui expressamente se determina; mas isso não tira que ás pessoas, que julguem ter direito a ser indemnisadas por qualquer modo se dê o tempo, e os meios de se habilitarem. Mas taes difficuldades poderá haver, e taes embaraços, que o praso aqui marcado não baste. Parecia-me por consequencia que elle fosse de dous annos, tanto para o Reino, como para as Provincias Ultramarinas. Alguns dos indemnisandos hão de achar muitas difficuldades, e talvez que mesmo seja preciso dar algumas justificações fóra do Reino: nem isto seria novo em Portugal, porque em questões de outras éras, se exibiram justificações dadas em Aragão e Castella; porque estas ás vezes só pódem constituir prova, procedendo das terras onde estão os proprios. Se assim se não fizer, se não se augmentar este praso, muitos individuos ficarão inhabilitados, para se poderem indemnisar, porque em fim podem haver pontos essenciaes, para a habilitação, que sejam de difficilima justificação.

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O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Torno a repetir que me não oponho á prorogação do praso; o meu receio é que isso venha a ser contra o interesse das pessoas ás quaes se pretende attender; e me parece que se a alguma dellas occurrerem difficuldades para apromptar suas provas, nesse caso não poderão taes individuos ser privados de reclamar o seu direito, e obter uma excepção. — Esta Lei não é sómente uma esperança, como se disse, é uma promessa positiva de indemnisações: é verdade que não póde verificar-se senão depois de liquidada e conhecida a importancia (ao menos approximadamente) dessas sommas; mas para que isto se conheça, é que se determina este praso, a fim de não ficar a uma distancia demasiada, a épocha em que effectivamente se ha de tractar do modo destes pagamentos.

O Sr. Margiochi: — Eu tinha pedido a palavra para fallar quasi no mesmo sentido, em que acaba de fallar o Sr. Presidente: está bem claro que este praso de dez mezes é para se prepararem os processos para as indemnisações, que devem ser appresentados ás Côrtes futuras; o por isso me parece que o Artigo deve passar como está.

Julgada a materia discutida, foi posta á votação, e approvada a parte principal do Artigo 6.º

Sobre o § 1.º delle, disse

O Sr. Marquez de Loulé: - Este paragrapho é que me parece se deveria eliminar: diz o Artigo já approvado (leu): por consequencia não sei que privilegio tenham os habitantes das possessões Ultramarinas para se lhes conceder um praso maior; porque feitas as liquidações dous mezes depois da publicação da Lei, parece-me que é quanto basta tanto para os habitantes de Portugal como para os do Ultramar.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Parece-me que a intenção com que se redigiu este paragrapho, é destinar que as liquidações, que se houverem de fazer fóra da Europa (supponha-se, para indicar um exemplo, na India) alguma maior demora hãode soffrer em consequencia da distancia, pois que pela localidade não podem essas reclamações ser aqui terminadas antes de dous annos: isto não quer dizer que entretanto não seja possivel fazer alguma liquidação antes de terminar este praso, mas para o tempo que é necessario para chegar ao conhecimento da Commissão central que fôr encarregada de fazer a somma, e appresentar o mappa destas liquidações, intendo que não é excessivo, como se acha determinado no paragrapho.

Não se produzindo outra observação, foi o mesmo § posto á votação, e approvado tal qual se achava, assim como o foi igualmente, mas sem discussão, o seguinte

Art. 7.º Concluidas as liquidações mencionadas nos Artigos antecedentes, as Côrtes decidirão se a indemnisação deve ser integral, ou quantitativa.

Leu-se depois este

Art. 8.º Os prejuisos causados directa, individual, e expontaneamente pelos sectarios da usurpação, serão indemnisados pelos seus auctores.

Sobre o qual disse

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Está aqui uma palavra (expontaneamente) que me parece se devia tirar, porque de certo agora não haverá nenhum destes homens, que diga que fez o mal por sua vontade, todos dirão que foram obrigados por qualquer motivo; mas como se não póde saber torna-se o adverbio irrisorio.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu não me opponho ao desejo do Digno Par, entretanto pela intenção com que esta palavra aqui foi posta, é claro que não se hade receber a declaração dos homens que fizeram o mal; quer dizer que será reparado o mal causado pelos agentes da usurpação, ou por aquelles que sem auctorisação que possam pretextar commetteram essas iniquidades por sua livre vontade.

O Sr. Conde de Linhares: — Mas creio que seria necessario haver aqui uma declaração, e por isso desejaria se accrescentasse uma clausula ao Artigo, e neste sentido proponho a emenda que tenho a honra de mandar para a Mesa. (leu-a.)

O Sr. Ministro da Marinha: — Eu creio que a emenda do Digno Par é inutil, porque isto suppõem o caso de alguns prejuisos em que se possam achar as pessoas que os causaram, e quem foi prejudicado tem certamente o direito de os demandar; em consequencia é necessario uma demanda pelos meios ordinarios.

O Sr. Conde de Linhares: — Poderia intender-se que seriam estas Commissões quem decidisse; a isto é que eu queria obviar, tendendo a tranquillisar uma grande parte de individuos que estão receiosos.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — V. Ex.ª sabe que esta Lei soffreu grande opposição na outra Camara, onde houve a maior difficuldade possivel para fazer passar este Artigo, posto que não haja determinação mais clara, positiva, e terminante do que o que elle contém, mas tal é as vezes a prevenção, que eu mesmo, por defender a sua materia, fui um pouco mal tractado por alguns dos Membros da Opposição, em consequencia de nelle se acharem muitos adverbios: mas eu assento que esta redacção é a mais conveniente: uma vez que se diz (leu) é claro que isto não poderá ser senão em virtude da sentença do Poder Judicial, porque as Commissões, de que falla o Artigo 5.º, são sómente para arbitrar a cada um o que lhe compete em consequencia da interrupção da sua respectiva profissão. Conseguintemente parece-me que os desejos do Digno Par estão satisfeitos, e que tendo o Projecto de voltar á outra Camara não vale a pena da emenda.

O Sr. Conde de Linhares: — Então á vista do que disse o Sr. Ministro do Reino, retiro a minha emenda, porque acho que já está preenchido o meu objecto, visto que este é o parecer de toda a Camara, o qual se manifestou por meio desta discussão, que acclarou o objecto; e então tem os individuos todos os motivos para ficarem tranquilisados, que era o que eu pretendia.

O Sr. Sarmento: — Acho muito claro, e bem concebido este Artigo; para elle ter effeito hade ser por meios contenciosos, e lá estão os jurados, que bem averiguem os factos. Por tanto não só apoio o Artigo, mas até acho que de todos os deste Projecto é o mais claro; devendo por isso approvar-se sem maior discussão.

Não se produzindo outra observação foi o Artigo 8.º posto a votos, e ficou approvado.

Sobre o

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Art. 9.º Fica revogado o Decreto de 31 de Agosto de 1833, e toda a Legislação em contrario, excepto a Carta de Lei de 19 de Dezembro de 1834.

Disse

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Queria propôr a este Artigo uma emenda meramente de redacção, que procede de observação não minha. — Lembraram-me que nesta mesma data (19 de Dezembro de 1834) ha cinco Cartas de Lei, que se não acham numeradas; e por tanto parecia-me bom especificar qual é a que se quer referir, quero dizer, expressar ser aquella que excluiu para sempre da successão do Reino o ex-Infante D. Miguel, e seus descendentes.

O Sr. Conde da Taipa: — Nessa data não ha outra Lei que tenha referencia a este negocio; por isso talvez não seja necessaria a declaração.

O Sr. Souza e Holstein: — Não intendo a relação que possa ter a Lei da desauctorisação de D. Miguel com esta das indemnisações.

O Sr. Conde da Taipa: — É a da applicação dos bens do ex-Infante.

O Sr. Barradas: — O objecto de cada uma dessas Leis é essencialmente diverso, e por isso não é preciso fazer declaração alguma. (Apoiado.)

Sem mais discussão foi o Artigo 9.º posto á votação e approvado; ficando-o assim toda a Proposição na fórma que o havia sido na Camara Electiva.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu a ultima redacção da Proposição sobre as Bases da Administração Geral. — Achando-se conforme o vencido foi approvada, e se mandou remetter á Camara dos Senhores Deputados.

O mesmo Sr. Secretario leu uma Resolução desta ultima Camara para continuar a pensão concedida á viuva de Manoel Fernandes Thomaz. — Passou á Secção de Fazenda.

Tambem deu conta d'um Officio da Presidencia daquella Camara, incluindo uma Proposição della sobre os direitos que deve pagar o gado vaccum que entrar pelas raias.

O Sr. Mello Breyner: — Se fosse possivel tractar hoje mesmo desta Lei, seria muito conveniente por que é de grande interesse para os lavradores do Alemtejo, ainda que estes direitos não pareçam de grande ponderação; creio que esta Lei não encontrará opposição alguma, e por tanto peço que se discuta.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Apoio.

A Camara resolveu que a mencionada Proposição passasse á Secção de Fazenda.

O referido Sr. Secretario leu mais outro Officio da Presidencia da Camara Electiva, incluindo uma Proposição para serem admittidos afazer acto de formatura certos estudantes da Universidade. — Passou á Secção de Instrucção Publica.

O Sr. Secretario Barão d'Alcobaça leu a Proposição vinda da outra Camara sobre as vantagens que devem conferir-se aos Officiaes das extinctas Milicias que foram fiéis á Rainha e á Carta, assim como o Parecer da Secção de Guerra que lhe é relativo (Vid. pag. 302.)

A Camara resolveu que se omittisse a formalidade da discussão em geral, e que a mesma Proposição fosse immediatamente tractada por Artigos.

Pelo que, tendo sido successivamente lidos os sette de que ella se compõem, foram postos á votação uns depois de outros, e todos approvados sem precedencia de discussão; ficando-o por este modo a Proposição originaria da Camara dos Senhores Deputados, que se mandou reduzir a Decreto para ser levado á Sancção Real.

Leram-se os seguintes Pareceres das Secções, os quaes ficaram sobre a Mesa para serem discutidos na Sessão proxima: 1.º da Secção de Guerra sobre o augmento de soldo aos Officiaes Subalternos do Exercito, que estiverem em effectivo serviço: — 2.º da Secção de Fazenda sobre a reforma da Moéda: — 3.º da Secção de Legislação sobre a concessão de premios aos auctores dos Codigos Civil e Criminal.

O Sr. Vice-Presidente: — As Commissões devem agora retirar-se, para concluir os seus trabalhos, e vêr se esta noite se poderão expedir todas as Proposições que estão pendentes, ainda que isso me parece impossivel.

O Sr. Sarmento: — Desejo fazer algumas observações á Camara sobre o destino de uma Proposição mandada á Commissão do Ultramar, de que sou membro. Tracta-se nella de revogar uma Lei, e portanto não sei se será conveniente que se decida hoje mesmo. A Proposição de que fallo é relativa ao governo da Ilha da Madeira; e esta Camara, e a dos Senhores Deputados já declararam que essa Provincia, apesar de estar situada na Africa, fazia parte dos Dominios Portuguezes na Europa. Quero dizer com isto que a Proposição a que alludi não é da naturesa daquellas, que mais instam, e portanto desejaria saber a opinião da Camara, a respeito da sua urgencia, para servir de governo á Commissão: além de que, a decisão della, hade ir em combinação com o Sr. Ministro dos Negocios do Reino, porque a Madeira não pertence á Secretaria do Ultramar.

O Sr. Vice-Presidente: — A Commissão quando poder dará conta desse trabalho.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Peço que na Sessão desta noute se tracte a Lei relativa ao augmento de soldo aos subalternos.

O Sr. Ministro da Marinha: — Tambem pedirei a discussão da Lei que tracta das auctorisações concedidas do Governo.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Sou obrigado a dizer que o Governo sem alguma destas auctorisações não póde marchar, e como esta Camara não póde privar-se da faculdade de fazer algumas emendas a essa Lei se assim o intender, se se não discutir quanto antes, talvez fiquemos privado da sua decisão.

O Sr. Vice-Presidente: — Não é possivel discutir-se agora. — A Sessão seguinte começara pelas outo horas da noute, e então a Camara discutirá as Leis que julgar mais importantes.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — A dos Subalternos leva cinco minutos.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Levanto-me para pedir á Camara a discussão da Proposição sobre o augmento de soldo aos Subalternos: é de sua naturesa tão simples que pouco tempo levará á Camara.

O Sr. Marquez de Loulé: — O meio de satisfazer a todos é levantar a Sessão; cada um dos Dignos Pares recommenda o seu Projecto, e assim não se póde dar a preferencia a nenhum.

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O Sr. Conde de Linhares: — Peço á Cantara que ponha agora em discussão a Proposição sobre a reforma da moéda.

O Sr. Vice-Presidente: — Pelo amor de Deus? Se a Commissão nem ainda deu o seu Parecer sobre ella.

O Sr. Conde de Linhares: — Peço que se declare Sessão permanente.

O Sr. Presidente de Conselho de Ministros: — A Lei das auctorisações ao Governo foi proposta na outra Camara pela Commissão de Fazenda, e apoiada pelo Governo. O mais interessante neste momento é sem duvída habilitar o Governo com poderes speciaes, e votos de confiança para poder desempenhar as obrigações que lhe estão impostas pela sua posição; e a este respeito estou seguro de que as intenções são as mesmas tanto da Camara dos Senhores Deputados, como da dos Dignos Pares, e ainda de quaesquer lados das mesmas Camaras; porque todos devem concordar em que não é possivel deixar de tomar em consideração esta materia antes que se feche a actual Sessão das Côrtes.

O Sr. Gyrão: — A Commissão não tem nada a dizer senão que approva essa Proposição; por minha parte digo que se dispense a formalidade do Parecer, e se discuta.

O Sr. Vice-Presidente: — Se não ha mais nada a dizer está levantada o Sessão. Tinham dado tres horas.

SESSÃO EXTRAORDINARIA DE 18 DE ABRIL.

Sendo oito horas da noute occupou a Cadeira o Sr. Vice-Presidente; e fazendo-se logo a chamada, verificou o Sr. Secretario barão d'Alcobaça estarem presentes 29 Dignos Pares, e que faltavam, além dos que ainda se não appresentaram, os Senhores Bispo Conde, Visconde de Sá da Bandeira, Gerardo de Sampaio, Gamboa e Liz, e Barradas, todos com causa motivada.

Então disse o Sr. Vice-Presidente que estava aberta a Sessão.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu a Acta da precedente. — Antes de approvar-se, entrou o Sr. Ministro da Fazenda, e disse

O Sr. Marquez de Loulé: — Pedi que certo logar da Acta fosse lido mais alto, para ver o que ahi se dizia sobre a approvação do Artigo 4.º do Projecto das bases da Administração geral: está conforme o que se venceu na Camara, porém consta-me se deu uma interpretação diversa á emenda proposta pelo Sr. Margiochi: não sei o motivo disso, talvez fosse algum erro na copia do authographo, por quanto eu intendi que o augmento de 400 mil réis se venceu tanto para os ordenados dos Administradores, como para os dos Secretarios. Parecia-me pois que isto mesmo quanto antes se officiasse á Camara dos Senhores Deputados, para que a Lei não subisse á Sancção com esta incorrecção.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Tanto mais que essa foi a intenção da Camara.

O Sr. Vice-Presidente: — Como a Lei ainda não passou, parece-me ter logar o remediar este engano.

O Sr. Ministro da Fazenda: — A Lei já passou, como fôr da Camara dos Dignos Pares, mas não sei se haveria alguma equivocação.

O Sr. Vice-Presidente: — Em todo o caso creio que se deve officiar á outra Camara.

O Sr. Marquez de Loulé: — Não advogo o caso, antes votei contra elle, mas como é uma determinação da Camara, parece-me que se deve fazer com que tenha effeito da maneira que se venceu.

O Sr. Ministro da Marinha: — Antes que continue esta questão, permitta-se-me tambem que eu diga o que intendi quando se votou sobre este objecto. Na discussão houveram varias opiniões, uma era que se supprimisse o Artigo, e se deixasse em vigôr o da Lei das Prefeituras, no que diz respeito aos ordenados; esta opinião foi rejeitada pela Camara: propoz-se que antes se fixasse um ordenado, e o Sr. Ministro do Reino disse que no primeiro Projecto appresentado se tinha fixado o ordenado de seis mil cruzados aos Prefeitos; de maneira que toda a questão versou simplesmente sobre o ordenado dos Prefeitos, e eu confesso ter intendido que o augmento dos 400 mil réis era só para elles, e neste sentido votei.

O Sr. Marquez de Loulé: — O que se intendeu foi a emenda do Sr. Margiochi, e tanto assim que desta fórma está lançado na Acta.

O Sr. Margiochi: — Eu propuz quatrocentos mil réis de augmento para todos, e foi neste sentido que se approvou a minha emenda.

O Sr. Conde de Lumiares: — Até o Sr. Margiochi medisse que todo o augmento importava em trinta e quatro mil cruzados.

O Sr. Sarmento: — A emenda do Sr. Margiochi era bem clara; e ainda que se não debateu o ponto, votou-se o augmento de 400 mil réis para cada um dos Empregados da Administração, de que fallava o Artigo: nem vejo que este augmento seja dinheiro desperdiçado, porque estamos longe das idéas antigas que faziam differença a este respeito de um Escrivão, e de um Magistrado.

O Sr. Vice-Presidente: — Seja como fôr, é o vencimento da Camara, o qual se deve sustentar.

O Sr. Margiochi: — Até eu disse que era necessario accrescerá r a cada uma daquellas cifras quatrocentos mil réis, por me parecer que todas ellas eram. diminutas.

A Camara resolveu que se fizesse a participação requerida pelo Sr. Marquez de Loulé: e não havendo outra reclamação ficou a Acta approvada. (Pausa.)

O Sr. Vice-Presidente: — Peço licença para ler o Officio que dirijo á Camara dos Senhores Deputados, sobre a exacta votação que nesta teve logar a respeito do Artigo 4.º da Proposição das bases da Administração, (leu.)

O Sr. Ministro da Marinha: — A este respeito não posso deixar referir o que se passou comigo na outra Camara: um Deputado estando em duvida se esta tinha sido a votação, perguntou-me qual ella fôra, e eu disse-lhe que me parecia tinha sido simplesmente quanto aos Prefeitos; porém dirigio-o a V. Ex.ª para que verificasse o facto.

O Sr. Ministro da Fazenda: — O que eu não sei é como isso possa ser; quero dizer, como por um simples Officio se poderá alterar uma Lei que passou

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ambas as Camaras, e a qual a esta hora eu supponho que já terá sido levada á Sancção Real.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Primeiro que tudo, isto é uma questão de ordem, em que o Sr. Ministro da Fazenda não tem direito a fallar.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Pergunto a V. Ex.ª se eu como Ministro da Corôa posso, ou não fallar sobre este objecto.

O Sr. Vice-Presidente: — Não tenho certeza disso: pela Carta, e pelo Regimento podem os Membros do Governo entrar nas discussões das Leis, entretanto não sei se esta faculdade se estende ao que são propriamente questões de ordem: mas a Camara o decidirá.

O Sr. Ministro da Marinha: — Isto é uma questão de ordem....

O Sr. Marquez de Fronteira: — Apoiado.

O Sr. Ministro da Marinha: - Não necessito ser apoiado, o que necessito é que me respondam com argumentos, e se os não tem que me não interrompam. — Ainda que eu não estava presente na Camara, vi que já aqui se quiz estabelecer aos Ministros um direito muito mais forte, este direito foi-lhe impugnado, e os que o quizeram sustentar allegaram muito boas rasões; pois não era decerto o mesmo que um Ministro fallar sobre uma Lei proposta pelo Governo, e em que por isso tinham alguma parte.

O Sr. Marquez de Fronteira: - Eu não disse que o Sr. Ministro da Fazenda não tinha direito a fallar, se se discutisse a Lei; agora tractando-se de uma questão de ordem, ainda sustento que o Sr. Ministro não póde entrar nella.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Uma Lei proposta pelo Ministerio na outra Camara, veiu remedida a dos Dignos Pares, foi aqui discutida, voltou lá, com emendas, e passou: agora ouço ler um Officio ao Sr. Vice-Presidente para declarar uma votação, que houve sobre a mesma Lei, levanto-me para fallar a esse respeito, e um Digno Par sustenta que eu o não posso fazer; desejo pois que a Camara decida este ponto.

O Sr. Marquez de Fronteira: — E eu peço além disso que a votação seja nominal.

O Sr. Marquez de Loulé: — Tambem peço se ponha á votação se o Sr. Ministro da Fazenda póde fallar nesta questão, eu não tenho difficuldade nenhuma em que Sua Ex.ª falle, mas não desejo que se estabeleça um precedente irregular; além de que esta discussão não é já simplesmente de ordem: tracta-se de uma votação, mas a Carta diz que os Ministros, que não forem Membros da respectiva Camara, não podem estar presentes quando se votar: por consequencia, não sendo o Sr. Ministro da Fazenda Membro desta Camara, é claro que não póde entrar nesta questão, porque tem de rectificar-se uma votação.

O Sr. Conde de Linhares: — Levanto-me para motivar a minha opinião de se dever conceder a palavra ao Sr. Ministro da Fazenda. — Como questionar pois a Sua Ex.ª, achando-nos simplesmente involvidos em uma conversação parlamentar, (em que se inicia de dar explicações sobre um facto que não se passou meramente neste recinto, e quando importa esclarecêlo) de ouvir as informações importantes que nos póde dar, do que se tenha passado em outro recinto, de que Sua Ex.ª faz parte, e de que por tanto está melhor informado do que qualquer dos Membros desta Camara? — Não quero agora entrar na questão, se Sua Ex.ª não sendo Membro desta Camara podia ou não ter a palavra para fallar sobre uma questão de ordem, visto que de tal questão senão tracta, porém o que me parece inquestionavel, é que a tenha, quando se tracta de uma questão desta natureza, que, por mais que se diga, não é outra cousa senão uma conversação parlamentar, e que como tal seria neste caso uma injustiça, e uma sem rasão negar-lhe a palavra.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Nós estamos perdendo tempo; e eu rogo a V. Ex.ª queira pôr á votação se um Ministro que não Membro da Camara póde fallar em uma questão de ordem; peço a V. Ex.ª a votação neste sentido, e espero que algum Digno Par me apoie.

O Sr. Conde de Linhares: — Torno a dizer que não sei como se possa chamar nina questão de ordem, o que é puramente uma conversação parlamentar.

O Sr. Ministro da Marinha: — Eu tinha pedido a palavra para dizer simplesmente que se estava em uma discussão relativa a um facto particular desta Lei, e sobre este facto particular julgava eu, e ainda julgo, que o Sr. Ministro da Fazenda tinha direito a fallar. Como talvez não fosse bem intendido, julguei dever explicar a minha opinião,

O Sr. Sarmento: — Toda esta questão nasce de uma equivocação. O Sr. Ministro da Fazenda com muita rasão se persuadiu que aquillo de que se tractava era uma questão verdadeiramente de finanças; porque quando entrou se estava n'um debate a respeito de certas palavras da Acta: ora tractando-se da redacção desta, e de uma questão de votação é evidente que nessa discussão não podem tomar parte os Senhores Ministros, que não são Membros da Camara: mas esta mesma questão, ainda que aliàs importante, é ainda menos que de ordem: entretanto estou persuadido que se Sua Ex.ª tivesse ouvido que se tractava da redacção da Acta não teria nem talvez começado a fallar.

O Sr. Conde da Taipa: — Esta é uma daquellas cousas que deveriam espantar, mas que a mim me não espantam, reflectindo que é o resultado de fazer as cousas tanto á pressa, como as Leis que desta Camara tem sahido estes dias. — Digo que a minha intenção quando votei, foi augmentar o ordenado sómente aos Administradores....

O Sr. Marquez de Fronteira: — Mas não foi a intenção da Camara.

O Sr. Conde da Taipa (proseguindo): — Agora, se se decidiu o contrario, isso é que eu não sei.

O Sr. Vice-Presidente propoz se o Sr. Ministro da Fazenda poderia tomar parte nesta, questão, e a Camara resolveu negativamente. — Sua Ex.ª proseguiu: —

A maioria da Camara manifesta que a sua intenção tinha sido votar a favor do augmento do ordenado, tanto dos Administradores como dos seus Secretarios. — A duvida que ora se tem suscitado, é uma consequencia necessaria, e por mim prevista, de pôr á votação emendas que não são escriptas. — Em summa quando a generalidade da Camara mostra que votou num sentido, e nesse se acha a Acta redigida,

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parece-me que não póde haver duvída em rectificar qualquer engano que possa ter insinuado no authographo da Lei. (Apoiado.)

O Sr. Mello Brayner: — Eu estimaria saber como a Lei foi da Mesa para a Camara dos Senhores Deputados.

O Sr. Vice-Presidente: — Creio que foi com a emenda de duzentos mil réis para os Secretarios dos Administradores.

O Sr. Marquez de Loulé: — Então como póde a Acta estar redigida em sentido contrario.

O Sr. Sarmento: — O caso é que houve algum transtorno, que se tracta de emendar da maneira possivel, porque o já feito não póde evitar-se.

O Sr. Presidente da Conselho de Ministros: — O melhor modo, segundo me parece, é deixar o negocio no estado em que daqui foi na Proposta para a outra Camara.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Não estou nessa opinião, porque então não era a Camara, mas sim a Mesa quem legislava.

O Sr. Vice-Presidente: — (dirigindo-se ao Sr. Presidente): — Sim Senhor, mas já está decidido pela Camara.

O Sr. Presidente do Conselho: — Então foi antes de eu chegar.

Vozes: — Foi, foi.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Peço a V. Ex.ª me permitta ler uma declaração de voto connexa com a materia sobre que até agora se tem conversado. — Assim o fez o Digno Par, e é a seguinte

Declaração de voto.

Declaro que na Sessão de hoje pela manhan votei que os Magistrados administrativos vencessem em Lisboa dous contos de réis, no Porto um conto e seiscentos mil réis, e nos outros Districtos um conto e duzentos mil réis; os seus Secretarios vencessem em Lisboa, e Porto outocentos mil réis, e nos outros Districtos seiscentos mil réis, porque contando-me que ha um deficit, não me parece conveniente augmentar os ordenados dos Empregados publicos. — Palacio das Côrtes, 18 d'Abril de 1835. — Marquez de Ponte de Lima, Par do Reino.

Mandou-se depositar no Archivo.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares deu conta da ultima relacção de duas Proposições approvadas na Sessão de manhan: 1.ª sobre os Officiaes das extinctas Milicias que permaneceram fieis á Rainha e á Carta: 2.ª — sobre indemnisações dos prejuisos causados pela usurpação. — Estando conformes aos respectivos vencimentos, foram approvadas, e se mandaram redusir a Decretos para subirem á Sancção Real.

O mesmo Sr. Secretario leu dous Officios da Presidencia da Camara dos Senhores Deputados, incluindo duas Proposições da mesma Camara: — 1.ª para fazer extensivas ás ilhas da Madeira e Porto Santo as disposições do Decreto das Côrtes Geraes, datado de hoje, sobre a liberdade da cultura e exportação do tabaco nas Ilhas dos Açôres: — 2.ª sobre ser permittido aos secularisados egressos das Ordens Religiosas, e a todos os Religiosos da Ordens extinctas o poderem herdar e testar.

Sobre a ultima disse

O Sr. Conde da Taipa: — Eu desejava que hoje mesmo se podesse discutir essa Proposição relativa aos egressos. É uma verdade que aos frades se tirou o beneficio da fradaria (por assim me explicar), e por tanto é necessario que gosem os mesmos direitos civis que os outros cidadãos: uma vez que para elles se acabou a clausura, herdem e testem. Por tanto acho esta Lei de muitissima importancia, e se discuta já, pois que daqui até á nova convocação das Côrtes podem ficar já privados de algum beneficio que della lhes haja de provir.

O Sr. Vice-Presidente: — Póde o Digno Par ficar certo que eu diligenciarei que possa discutir—se.

(Nenhuma das mencionadas Proposições teve, por então, destino.)

Então passou a Camara a ordem da noute que era a discussão da Proposição da Electiva sobre diversas auctorisações conferidas ao Governo: e dando o Sr. Vice-Presidente a palavra ao Relator da Secção de Instrucção Publica, leu o Sr. Marquez de Loulé o seguinte

PARECER.

A Secção de instrucção Publica, e Negocios Ecclesiasticos, examinou a Proposição de Lei vinda da Camara dos Senhores Deputados da Nação Portugueza, sobre diversas auctorisações conferidas ao Governo, e suscitando-se na Commissão alguma duvida sobre a extinção da auctoridade que se dá ao Governo no Artigo 2.º ácerca do ensino publico, e tendo conseguintemente ouvido a declaração que fez o Sr. Ministro Secretario d'Estado do Negocios do Reino informando a Commissão de que as suas intenções eram sómente relativas ao melhoramento da instrucção primaria, e das scholas speciaes de Medicina, Philosophia, e Chymica, julga a Commissão que este, e os mais Artigos da Proposição podem ser adoptados sem emenda alguma.

Palacio das Côrtes, 18 d'Abril de 1835.

Os dous Membros da Commissão, Marquezes de Fronteira, e de Loulé, declaram que não poderam dar o seu assentimento ao 3.º Artigo. — Marquez de Fronteira. — Thomaz de Mello Breyner. — Bispo Conde, Fr. Francisco. — Conde de Paraty. — Marquez de Ficalho — Visconde de Sá da Bandeira. — Marquez de Loulé.

Proposição a que se refere o Parecer supra.

Artigo 1.º Fica o Governo auctorisado para occorrer ás despezas necessarias para a formação do Cadastro.

Art. 2.º Fica igualmente auctorisado para reformar e organisar o ensino publico do modo mais conveniente sem augmento da despeza que actualmente custa este ramo.

Art. 3.º Tambem fica auctorisado para dispôr da quantia annual de cem contos de réis (além da somma que será decretada no Orçamento) para o costeamento de obras de interesse publico. Sobre este capital poderá o Governo effeituar as transacções necessarias para dar o maior desenvolvimento e effectividade a estas obras.

Art. 4.º Fica tambem auctorisado para soccorrer cada uma das Religiosas do Reino necessitadas, até á quantia de quatrocentos réis diarios.

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Art. 5.º Na próxima Sessão dará o Governo ás Côrtes uma conta circumstanciada de todos os actos publicados em virtude das presentes auctorisações, a fim de obterem a Sancção legislativa na parte em que fôr necessaria.

Ar 6.º Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 14 de Abril de 1835. = Antonio Marciano de Azevedo, Presidente. = Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario. = Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario.

Terminada esta leitura, resolveu a Camara que (omissa a formalidade regulamentar) a mesma Proposição fosse logo discutida por Artigos; pelo que, tendo-se lido o 1.º, obteve a palavra, e sobre elle disse

O Sr. Sarmento: — Desejava que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino nos dissesse alguma cousa relativamente ás suas intenções a respeito da formação do cadastro. Eu algum tanto intendo da materia; mas como este Artigo vai ser objecto de uma das votações da Camara, desejo proceder conforme aquillo que Sua Ex.ª manifestar: elle sabe quanto o tempo é estreito, mas quanto o assumpto é de gravidade.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Eu intendo a respeito da formação do cadastro, que deve dar-se a maior extensão possivel a esse trabalho: não resumo isto sómente á divisão topographica do paiz, mas acho que desta organisação se podem tirar muitas vantagens, estendendo-a ás confrontações da propriedade, e á discripção do producto della. Conseguidos estes trabalhos, e tendo alcançado o maior numero de dados statisticos, que se poderem obter, tractar-se-ha do que diz respeito ás diversas povoações, o seu movimento, os melhoramentos de que são susceptiveis, os artigos de sua cultura, exportação, etc.; n'uma palavra, a comprehensão geral de todas as partes do cadastro, propriamente tal, da statistica, e em fim (para não prometter muito, e fazer pouco) a descripção phisica e moral, que naquelle termo se comprehende. — É claro que este trabalho hade ser de grande difficuldade, mas de muita utilidade para os habitantes das diversas terras do paiz, que muito ganharão em ter as suas propriedades tombadas, quando se fixarem as suas relações para com o Governo, ou quando se estabelecer a contribuição directa; conseguintemente deverão elles concurrer para esse trabalho da maneira que se julgar conveniente; por isso o Governo, ainda que podia proceder a formação do cadastro com os meios que tem á sua disposição, não sendo estes sufficientes, intendeu que devia ficar auctorisado para os que lhe faltam, ou verdadeiramente para fazer as despezas necessarias com este objecto, e nas Côrtes futuras appresentará o seu plano, para nelle se fazerem as modificações que se julgarem convenientes.

O Sr. Sarmento: — Estou satisfeito com a explicação dada pelo Sr. Ministro: voto pelo Artigo.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Se o Governo intende que deve fazer o cadastro ex-officio, não necessita para isso da minha auctorisação: como individuo não lhe serve ella de nada, e como Par do Reino não posso em minha consciencia conceder-lha, porque me lembro que quem auctorisa para os fins auctorisa para os meios; pois intendo que não póde dizer-se ao Governo, por exemplo, que faça um bom lançamento da decima sem ficar ao mesmo tempo obrigado a fornecer-lhe aquillo que elle julgar necessario para o effectuar. — Por conseguinte se ao Governo parecer que póde ir fazendo o cadastro com aquelles meios que tem actualmente á sua disposição, que o faça, mas dar-lhe eu auctorisação para nova despeza não posso, e por tanto voto contra o Artigo.

O Sr. Margiochi: — Parece-me que este primeiro Artigo é de uma natureza tal que o Governo não precisa delle talvez o precisasse antes de ter passado a Lei das Administrações, mas agora depois que esta se acha approvada julgo-o desnecessario, porque o Governo póde mandar fazer todos os trabalhos que julgar convenientes, sem a auctorisação que pede neste Artigo, que a meu ver de nada serve.

O Sr. Conde de Linhares: — Os Administradores que se votaram esta manhan não pode ser obrigados a encarregar-se deste trabalho de formar o cadastro, e por tanto julgo necessario que se auctorise o Governo a poder fazer essa despeza, e em consequencia voto pelo Artigo tal como está.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Julgo que o Governo não pede a auctorisação como necessaria para fazer o cadastro, mas para alguma despeza que possa julgar-se indispensavel para esses trabalhos; porque os Administradores talvez não bastem, e seja preciso empregar outras pessoas, visto que elles são extensos e complicados: e como nenhuma das despezas que não são decretadas pelas Côrtes e appresentadas no Orçamento se reputem licitas, este o motivo porque o Governo pede a auctorisação de que tracta este Artigo.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não me opponho, entretanto devo observar que se o Governo pede dinheiro e auctorisação para as despezas da formação do cadastro, temos duas cousas a notar para este fim; a primeira é a discripção topographica do Paiz, isto é muito util, mas se se nomear uma Commissão para isto (que vem a ser o inventario de Portugal) então não se aproveita nada. Se os Administradores forem, como devem ser, encarregados de o fazerem, dando-se-lhes os competentes quadernos para encherem relativamente aos diversos pontos statisticos e mais esclarecimentos que poderem obter, tanto a respeito dos factos politicos como administrativos; assim é que se póde formar o cadastro, porque sobre esses factos, (e as suas diversas occurrencias que se devem ir notando á medida que acontecerem) repousa a totalidade de que constitue um cadastro. Se se nomearem Commissões speciaes para isto, então ha de gastar-se dinheiro, e tarde ou nunca se conseguirá cousa capaz, mas se pelo contrario forem nomeados bons Administradores cuidadosos e intelligentes, então sim, elles irão fazendo isto pouco a pouco, e em poucos annos estará este trabalho concluido; de outra forma não e possivel. Portanto no que fôr relativo á discripção topographica do Paiz certamente votarei, mas a creação de uma Commissão para a formação do cadastro, é contra a minha opinião porque não vejo que della se possa tirar nenhum resultado; mas só sim quando tal incumbencia for uma das obrigações dos Administradores.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Não

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ha a mais pequena duvida que as idéas do Digno Par são exactas. Os Administradores hão de ser os primeiros elementos para este trabalho; mas a Camara estará persuadida de que elle deve ser immenso, e portanto é necessario que todos concorram com o seu contingente. Convirá talvez nomear uma Commissão central para este objecto, a qual se intenda com as diversas Repartições, uma das quaes é o Archivo Militar que ha de prestar um grande subsidio a esta tarefa; mas independente de tudo isto ha despezas importantes a fazer; despezas geraes, e despezas speciaes sobre cada um dos objectos para confrontar as fazendas dos individuos; e portanto os Povos devem, saber que tambem hão de concurrer com uma pequena quota da suas rendas, para fixar os limites da suas propriedades; mas mesmo para este caso é preciso que o Governo seja auctorisado. — Em França trabalha-se ha quarenta annos no cadastro, e não está acabado, entretanto que alli ha grandes meios, um dos quaes e de que se lançou mão, é a Carta de Cassini, uma das mais perfeitas. — O Governo ha de ir propondo successivamente ás Camaras a adopção destes meios, mas deseja ficar desde já auctorisado para ir fazendo alguma cousa no intervallo desta á outra Sessão das Côrtes, pois que, como disse, este trabalho é immenso, porém do maior interesse, pois em quanto não houver cadastro não ha igualdade verdadeira nas contribuições, nem exactidão na parte administrativa da Nação, nem em outra que não é indifferente, o movimento da população. É para isto que o Governo pede auctorisação.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não me opponho á nomeação de uma Commissão central, antes acho que ella é essencial, para o andamento destes trabalhos: no que sim me opporia era a que essa Commissão fosse ella mesma dirigilos; convenho pois em que haja uma Commissão central a quem os Administradores remettam os seus mappas e trabalhos particulares; porque estas Commissões é que estão em contacto com os negocios e interesses de uma Nação; e á medida que estes trabalhos forem apparecendo vão firmando as partes de que deve resultar o cadastro. Esta era a minha idéa, e a explicação que eu queria dar.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, foi o Artigo 1.º posto á votação, e approvado tal qual se achava na Proposição.

Passou logo a discutir-se o Artigo 2.º, sobre cuja materia pediu a palavra e disse

O Sr. Sarmento: — Depois das explicações, que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino deu nu Commissão, e das que elle teve a bondade de me dar a mim particularmente, não tenho duvida em dar o meu voto a este Artigo, postoque o ache concebido muito genericamente. Á primeira vista, nós iamos delegar um poder, para o que não tinhamos auctorisação; mas agora sou de differente opinião, visto que a mente do Governo e estabelecer algumas scholas uteis, que hoje não existem, e de modo algum reformar a Universidade de Coimbra, a qual ainda que pareça gothica, contém muitas cousas boas; e, em relação a algumas Sciencias, que alli se ensinam, outras ha pelos Paizes estrangeiros, onde esses conhecimentos são processados mais superficialmente: aprendendo-se a parte historica das Sciencias, em vez daquelle estudo arduo, e profundo dellas, como se costuma em Coimbra, o qual se tem alguma desvantagens, de certo é essencial para conhecer a habilidade dos estudantes, que se applicam alli ás differentes disciplinas. Entretanto é innegavel que a Universidade carece de uma reforma, porque ha muitos annos que alli foram feitas alterações, que hoje não estão em proporção com o adiantamento das Sciencias naturaes, ainda que estou persuadido que nas faculdades juridicas, pouco ha a reformar; das outras, nada direi com individuação, porque não professo essas disciplinas. Todavia teria muito desgosto que, a não ser o Corpo Legislativo, alguem tocasse naquelle templo das Sciencias; até por um motivo particular, que consiste em que, a mania do nosso tempo é destruir, e não edificar; para deitar abaixo bastam mãos pigmeas, mas para crear são necessarios braços herculeos. — Concluindo direi que ainda que eu ostentasse a maior repugnancia em dar tão ampla auctorisação ao Governo, por julgar que ella não podia sahir do Corpo Legislativo, comtudo voto agora pelo Artigo; depois de ter ouvido as explicações francas, nobres e claras, que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino deu sobre as intenções do Governo, relativamente ao uso desta auctorisação.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Quasi todo este Artigo seria muito bom e eu teria a maior confiança no Sr. Ministro dos Negocios do Reino para o approvar, senão fosse a triste experiencia que temos debaixo dos olhos. — Estou persuadido de que Sua Ex.ª não abusará desta faculdade, nas medidas que tomar a este respeito, mas tambem não quero ficar com a responsabilidade dellas, porque não vejo aqui cousa de tanta utilidade, que me deva arriscar a isso. Se, por exemplo, se quizer fazer alguma alteração no methodo de ensinar grammatica Portugueza, digo eu se o Governo actualmente não executa as Leis existentes, como posso eu persuadir-me que para o futuro execute aquillo para que eu agora der o meu voto. — Quem pede cem contos de réis para fazer as obras que quizer, póde gastar cento e cinco para o ensino da lingoa Grega ou de Logica, ou em outra cousa em que se perde o tempo, e que seria melhor pagar a quem as não aprendesse: e como eu não quero que o odioso de taes medidas recáia sobre mim, por isso é que não voto por similhante auctorisação, porque ainda que eu tenha grande confiança no Sr. Ministro actual, quem me diz a mim que com o tempo haja outro que em consequencia desta auctorisação, deite de cangalhas, todos os estabelecimentos que hoje temos em Portugal? Por consequencia como não tenho certeza na pessoa que hade tomar essas medidas, e ignoro quaes ella serão, concluo que não posso votar a favor deste Artigo.

O S. Ministro dos Negocios do Reino: — Sinto não ter sido presente nesta Camara a primeira vez que se tocou na materia em discussão, para então dar os esclarecimentos, que já dei na Commissão. Appresentarei agora, primeiro que tudo, os motivos porque fui levado a pedir o voto de confiança, relativamente á organisação do ensino publico. Quando na Camara Electiva se fallou desta organisação, fui eu obrigado n dar algumas explicações a este respeito; entre outras cousas fiz ver quanto era para lamentar que se gastassem cento e setenta con-

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tos de réis, para ter um ensino o mais mal organisado: porquanto havendo quatorze Cadeiras de Grego, onde se ensinavam doze discipulos, sabia cada um delles no fim do anno o alphabeto: ou para melhor dizer fazia o Estado uma grande despeza para elles não saberem Grego. Quanto ás aulas de Logica, nellas se ensinavam as doctrinas de Genuense, que talvez sirvam de embrutecer o intendimento, e nas trinta e duas cadeiras desta disciplina, o termo medio annual de estudantes era de quatro ou cinco em cada uma, para saber ou fingir que sabiam aquella Sciencia. Ha tambem duzentas e quarenta Cadeiras de grammatica latina, e o numero das que existem de primeiras letras, não está certamente em proporção com a necessidade deste ensino elementar. Nestas circumstancias lembrava-me a mim que fazendo retrogradar os mestres de umas para outras Cadeiras, ou para melhor dizer os das de disciplinas maiores para algumas menores, teriamos conseguido vantagem, porque ao menos assim ficariam muitos dos professores de grammatica applicados a um ensino de grande conveniencia, qual o de ler e escrever de que mais se carece. — Resultou daqui que os Senhores Deputados José Alexandre de Campos, e Ferreira de Castro, disseram logo que se devia dar um voto de confiança ao Governo, appresentando algumas idéas que lhe poderiam servir de base: sem deixar de ter a modestia necessaria sobre este objecto, intendi que este voto era muito util, atrevendo-me mesmo a pedilo nessa occasião pelo apoio que encontrei na Camara.

Então disse eu, e digo ainda agora, que neste plano entra sómente a organisação dos estudos que se chamam preparatorios, tractando-se quanto antes de algumas modificações nelle, para em Outubro seguinte se poder fazer algum ensaio sobre o novo methodo de ensino, com o fim de ser presente ás Côrtes. Disse tambem que a minha intenção era nomear uma Commissão, composta de pessoas que já tractaram o objecto, que se encarregasse de o melhorar, esperando eu dê suas diligencias o melhor resultado; porque nem eu, nem outro algum Ministro se atreveria a fazer um plano de ensino publico, que houvesse de durar tres mezes e ser depois rejeitado pelas Camaras. Debaixo deste ponto de vista, e só delle, é que me aventurei a pedir este voto de confiança. — Mas além dos objectos indicados ha ainda outro, a que o mesmo voto deve ser applicado, se a Commissão de que fallei o julgar conveniente; fallo das scholas de Medicina. Realmente é contra todas as luzes que estas scholas estejam confinadas em um só ponto, onde se não encontram todos os habitos, vicios, modos de vidas differentes, e mais circumstancias de que dependem, ou que influem nas diversas molestias: e a este respeito intendo eu que assim como em Lisboa ha uma schola de Cirurgia e outra no Porto, poderá igualmente haver outra de Medicina; nem eu vejo que faça mal a Portugal que os estudantes do Algarve e do Alemtejo, deixem de ser obrigados a ir a Coimbra habilitar-se para esta Faculdade.

Este objecto é vasto, nem seria facil appresentar agora qualquer plano com a perfeição que desejo, para que a Camara podesse firmar o seu juizo sobre esta auctorisação, a qual por outra parte não é cousa tão nova que ainda ha pouco não fosse dada para a organisação do Collegio Militar; nem vejo mesmo que deva haver o menor receio a este respeito, uma vez que o Governo tem de restringir-se nos limites que já indiquei, havendo tambem de dar conta ás Camaras dos que dentro nelles fizer.

O Sr. Sarmento: — De modo algum poderia deixar de fazer a maior confiança no actual Ministerio, ainda que a opinião do Sr. Marquez de Ponte de Lima, seja a este respeito diversa da minha; mas cada um póde ter as idéas que quizer, pois que sobre pontos de crença não ha auctoridade alguma, constitucional, ou anti-constitucional, que possa obrigar um homem a pensar desta ou daquella maneira. — Portanto eu pela minha parte declaro que está longe de mim fazer ao Ministerio a menor imputação de querer transtornar os estudos, qualquer que seja a minha opinião: passarei a outros pontos.

Espero que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino nas alterações que fizer nos estudos menores, dê alguma attenção á lingua Grega; é ella muito importante, e os que a souberem estarão senhores de uma das tres partes das definições nas sciencias naturaes, Bentham della se serve para alguma parte da linguagem nas Sciencias moraes. Julgo portanto que não será nestas cadeiras, que o Sr. Ministro assente a espada da sua reforma, pois que a rasão de haver poucos estudantes, me não parece sufficiente, para a Reducção das aulas. — A Nação Portugueza, a mais antiga em descubertas do Oriente, não tem uma schola de linguas Orientaes, e Arabigo; as linguas do Indostão, e a Persiana, são desconhecidas entre nós, apesar de serem hoje vulgares entre os sabios Europeus: julgo que uma unica schola de Arabe, que tinhamos acabou, o que me não parece conveniente visto que o estudo desta lingua não é um ponto de mero luxo scientifico, e em todo o caso a falta della é um descredito para a civilisação da Nação. Póde ser que se essas aulas de que fallei, estivessem abertas, nem um estudante lá concurresse no principio do estabelecimento, mas isto não é rasão bastante, para que se não estabeleçam. São linguas de primeira difficuldade, e pura cuja acquisição se necessita muita applicação da parte de quem as estuda. — Tambem me parece que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino não perderá de vista o conservar e melhorar alguns seminarios, que temos no Reino; entre outros, lembra-me o de Braga, que foi o primeiro que se estabeleceu em Portugal, depois do Concilio Tridentino. Supprimidas, como se acham, as Ordens regulares, vamo-nos pôr em circumstancias de ter um clero ignorante, a não se tomar alguma medida de prevenção; porque eu julgo seria melhor não o ter, do que têlo inteiramente destituido de instrucção. O Governo póde melhorar o seminario de Coimbra, ao qual, sem duvida, são necessarias novas scholas, porque é indispensavel dar aos ecclesiasticos uma illustração que, com raras excepções, até agora não tinham; e para isso, começar por escolher bons mestres e dar-lhes ordenados sufficientes.

O meu parecer seria (isto longe da idéa de querer aconselhar o Ministerio) que em cada Freguezia, sendo possivel, houvesse uma schola de ler, e escrever, para cada um sexo. (Apoiado.) A este respeito me lembra uma circumstancia, que reputo de influencia moral, e vem a ser a necessidade de se abolir o castigo das palmatoadas: em Hispanha se

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acha proscripto similhante uso, do que se tem alcançado bom resultado, que na verdade quadrava melhor aos seculos barbaros (de que tal castigo é um monumento) do que ao tempo em que nos achâmos, porque o genero humano já se não leva por certas cousas. — Para tudo isto peço eu a attenção do Sr. Ministro dos Negocios do Reino, para não sermos menoscabados na geração vindoura; e concluirei pedindo desculpa á Camara de lhe ter tomado o tempo, que foi necessario para dizer estas cousas a S. Ex.ª, já que elle com tanta franqueza se prestou na Commissão a dar explicações as mais amplas sobre este objecto.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Tambem me julgo com direito de pedir ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino que se não metta com seminarios ecclesiasticos, e que deixe isso aos Bispos, que lá o farão como quizerem, e se não quizerem que passem sem elles. — O Digno Par que acaba de fallar, pediu que se acabasse o uso da palmatoria nas scholas: a este respeito direi que não ha outro castigo que mais convenha para rapazes; e assim longe de apoiar o Sr. Sarmento, pediria ao Sr. Ministro quizesse mandar pôr em cada aula, doze palmatorias, em logar de uma que tem hoje: (Riso prolongado) porque estou persuadido de que outro qualquer castigo só serve de fazer perder a vergonha nas pequenas idades.

Agora pedirei perdão ao Digno Par pela opinião que emitti contraria á sua relativamente aos seminarios; porque isso pertence exclusivamente a Igreja: a unica cousa que póde fazer-se é marcar o numero de seminarios que se julgarem precisos, mas ainda que nada se faça sobre tal assumpto, pouco se perderá por agora, porque temos Padres para mais de vinte annos.

O Sr. Conde da Taipa: — Os Dignos Pares que fallaram, tem divagado muito sobre planos de estudos, mas não tractâmos agora de tal objecto; tractâmos unicamente de ver se é conveniente, ou não dar ao Governo um voto de confiança; e em principio eu sou contra esses votos. O caso está em não gastarmos tempo em dizer que plano e hade adoptar, porque não é possivel agora saber se o de Lord Byron ou outro; isto é, até alheio da questão; o nosso objecto é dar ao Governo a faculdade de organisar o ensino publico, como elle intender, e sobre isto e que deve versar a discussão, o mais seria questão para muito tempo, e que nos levaria muitos dias discutindo cada um dos diversos pontos; como para tractar de scholas normaes, de primarias, de secundarias etc. seria necessario longas discussões, e ainda assim não sei se alcançariamos o poder adoptar um plano geral. Portanto parece-me que a questão é simples, e que mesmo já se tem dito bastante pró e contra, conseguintemente peço a V. Ex.ª queira consultar a Camara sobre se a materia está sufficientemente discutida.

Assim foi resolvido, sobre proposta do Sr. Vice-Presidente, o qual propondo logo tambem o Artigo 2.º á votação, ficou approvado tal qual se achava. Passando-se a discutir o Artigo 3.º, disse

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Votei contra os dous artigos precedentes, pela despeza que elles trazem comsigo, attendendo principalmente a que no Orçamento (que vi extra-officialmente) temos um deficit de quatro mil contos de réis; por conseguinte ainda voto contra este Artigo 3.º, porque não posso auctorisar o Governo a gastar mais cem contos, quando elle não tem cem réis de que dispôr. — Além de que, temos visto em Portugal até ao Reinado da Senhora D. MARIA II, que todos os Governos que se metteram a administrar se tem perdido; entre outros, vimos um que se metteu em fabricar sedas, e, apesar do exclusivo que foi mister dar a esse estabelecimento para ir avante, não fez fortuna. O Governo acho eu que é para governar e não para negociar; como já tem negociado de mais, d'aqui em diante, tracte de governar.

No Orçamento que aqui se distribuiu impresso, se diz = que depois de feitas algumas economias, faltaram ainda para as despezas do Estado cousa de quatro mil contos de réis = ora se nestas circumstancias as Côrtes disserem ao Ministerio = Vossês gastem cem contos de réis em obras publicas; = não tendo elle cousa alguma que gastar, será uma auctorisação quasi irrisoria, e que eu não quereria se fosse membro do Governo. — Como o Orçamento não chegou a discutir-se, não sei outra cousa delle, além do deficit, e assim perguntaria ao Sr. Ministro que está no banco, (porque não vejo bem qual é) donde faz o Governo tenção de tirar estes cem contos de réis; se m'o disser talvez que eu diga que sim, mas de outra forma não intendo, porque póde ser que m'os queiram tirar a mim, mas isso é que eu não consinto. — Parece-me portanto que este Artigo não tem nenhum logar, porque se o Governo lhe sobram cem contos gasta-os, e se os não tem é irrisoria esta auctorisação. — Farei ainda outra reflexão. Tem o Governo dinheiro para pagar os juros Reaes e os das tenças? Não se sabe; mas é sem duvida que elle hade apromptar meios para occurrer ás despezas do Exercito, da Marinha, e para os ordenados dos empregados publicos, assim como para satisfazer em Londres os bonds, e outras obrigações contrahidas: ora não vejo que o Ministerio possa haver dinheiro para tudo isto. Por consequencia digo que lhes não invejo os logares: e que pódem morrer e vir outros que façam o mesmo que os Ministros de D. João VI, os quaes desmanchavam tudo o que seus antecessores estabeleciam. Se o Ministerio actual se não julga ligado ao que prometteu o do Regente, para o anno vem outros Ministros, e tambem lhes não importará aquillo a que os de hoje se obrigarem. Estes votos de confiança, e a auctoridade de contrahir obrigações com os bens Nacionaes, é cousa muito importante, mas que um Ministro se não julgará talvez obrigado a cumprir. Quer dizer que um homem que emprestar o seu dinheiro ao Governo (futuro, e não o actual) póde muito bem ficar desembolçado delle; e para isto é que eu nunca heide dar o meu voto: quando houver um Governo que se julgue obrigado a satisfazer as obrigações dos que lhe antecederam, então poderei pensar diversamente a este respeito; mas não é provavel que assim aconteça, (ao menos os precedentes não me dão esperança disso) e portanto não posso eu dar o meu voto de confiança, porque a não tenho. — Remato, repetindo o que já disse, isto é que se ao Governo sobram cem contos das suas despezas póde gastalos, e se os não tem, seria irrisorio dar-lhe o meu voto para isso; por conseguinte rejeito o Artigo.

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Não pedindo a palavra outro Membro da Camara julgou-se discutido, foi entregue á votação, e approvado o Artigo 3.º

Lido o 4.º, disse a respeito delle

O Sr. Sarmento: — Desejava saber se este Artigo se intende para todas as Religiosas do Reino.

Uma voz: — Para as necessitadas.

O Sr. Sarmento: — Já se sabe; mas os Conventos de exilados são muitos, e eu não sou de opinião que o Governo tome sobre si o sustentar todas as freiras, mas sómente as pobrissimas, e aquellas a quem para isso acompanhem os principios de justiça. Mas eu creio que a intenção do Ministerio a este respeito é socorrer aquellas a quem se tiraram juros Reaes, e dizimos; idea em que eu convenho, mas de maneira alguma que isso se faça a todas, porque o Estado não tem meios para isso, e primeiro estão os deveres de justiça, e a fé publica.

Além de que é preciso applicar a este caso os principios de direito, e temos satisfeito a elles, quando o Governo pague a divida de justiça, que é sustentar aquelles conventos que estão desgraçados em rasão das reformas, que foi mister fazer: ora eu creio que muitos delles se acham nestas circumstancias, e então não se terá feito pouco. — Do que acabo de dizer ninguem pode tirar a consequencia de que eu sou inimigo das freiras: não o sou certamente, não me parece que ninguem possa sêlo de umas desgraçadas, que não tem meios de subsistencia: já aqui fallei a respeito dellas, e o Digno Par, Prefeito da Extremadura, me disse que não era possivel soccorrelas por então. Por tanto já se conhece que o meu coração não vai contra o soccorro que se queira dar a miseraveis, mas a bolsa publica é objecto da maior fiscalidade. — Vejo em inglaterra que o Governo nem sabe se existem freiras, e ellas existem todavia. Eu tomara tambem que chegasse o dia, para Portugal, em que ninguem se embaraçasse com a vida privada dos outros, e que cada um, respeitando as Leis, viva descançado como quizer. Eu espero esse dia, ainda que não sou tão patriota que tencione então cantar o nunc dimittis servum tuum. Concluo que voto pelo Artigo em discussão, na intelligencia que manifestei, isto é, que o Governo socorra as Religiosas, que tiverem direito a isso, por perda soffrida em sua propriedade, e além dessas as que estiverem pobrissimas, porque não devem acabar á mingua dentro de quatro paredes, e em terra Portugueza. (Apoiado)

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Este Artigo não foi pedido pelo Governo; foi imposto ao Governo pela Camara Electiva, a qual intendeu que elle podia ter á sua disposição meios para dar o soccorro necessario ás Religiosas que perderam tudo pela abolição dos dizimos, e de outros rendimentos: o Governo pois acceita a auctorisação, porque é preciso dar sustentação ás Religiosas necessitadas em quanto se não conclue um trabalho a respeito dos conventos do sexo feminino; em consequencia serão reduzidos o mais que fôr possivel, juntando alguns de certas Ordens, e applicando as rendas de todos para a sustentação commum, a fim de não ficar a cargo do Thesouro. Comtudo é necessario saber se as freiras tiveram algumas perdas pela nova Legislação, a fim de serem indemnisadas do modo possivel, e attendendo ás circumstancias particulares de cada um dos conventos. — Os 400 réis de que falla o Artigo parecem-me muito, mas assim passou na Camara Electiva; porém isto deve ser quando não haja outro algum meio de provêr á sua subsistencia pelas rendas proprias. — É o ponto de vista em que o Governo olha esta auctorisação, a qual, torno a dizer, não foi proposta, foi imposta.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — O que acaba de dizer o Sr. Ministro dos Negocios do Reino é a accusação mais virulenta que póde fazer-se á Lei que providenciou sobre as perdas dos dizimos. Ha freiras que viviam de dizimos e que tinham bens, ou freiras que viviam da caridade publica; quanto ás primeiras o Governo não tocou nos seus bens, e tambem me não parece justo que se intrometta com aquellas que vivem de esmolas; intendo igualmente que nós não devemos estar fazendo Leis para um Governo que não executa Lei alguma, e por isso julgo desnecessario este Artigo... (Sussurro.) Eu já tenho fallado quatro vezes sobre este Projecto, o que é contra o nosso Regimento; porém como fallo poucas vezes espero merecer a indulgencia dos Dignos Pares que fallam sempre, e quantas vezes querem, visto que eu tenho o mesmo direito que elles; e que se lembrem do que outro dia aqui se passou. — Torno pois a dizer que não posso votar por este Artigo, porque o Governo tem feito muito mal em não executar a Lei de 30 de Julho de 1832, que fizeram na Terceira, quando o Sr. Mozinho da Silveira tinha tanta ambição de legislar; tempo em que nós, os subditos da Rainha, e seus defensores, não tinhamos senão um palminho de terra; — se tivessem deixado essa obra para tempo competente, e mais proprio do que aquelle, não teriam havido tantos embaraços como apparecem nas taes Leis. Parece-me pois que se não deve dizer a um Ministerio que tem um deficit de 4:000 contos, = Sustente mais 4:000 ociosas... (Ordem) Eu creio que estou na ordem, e que tenho tanto direito de fallar, e dizer o que intender como os Dignos Pares que fallam todos os dias. — Não querendo demorar a attenção da Camara voto contra o Artigo; se isto não agrada a todos, a opinião publica me fará justiça pela independencia com que sempre voto nesta Camara.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Em primeiro logar, e para tranquilisar a consciencia do Digno Par, direi que segundo o Regimento póde elle fallar mais de uma vez em cada Artigo, e por isso ninguem se lembrou, nem podia lembrar, de lhe coarctar a palavra; conseguintemente não vem a proposito o episodio do que aqui se passou outro dia: então não dirigi eu accusação pessoal contra ninguem, longe disso, fui eu mesmo ao usado, e até certo ponto insultado, sómente porque censurei a mania de atacar, e desacreditar o Governo vagamente.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Quando toquei nisso, foi sómente para citar um exemplo do direito que tinha a não ser interrompido.

O Sr. Conde da Taipa: — A questão de outro dia, a que se referiu o Sr. Presidente do Conselho, tinha acabado: entretanto como o Digno Par, voltando a ella, fallar na mania dos que pretendem vagamente desacreditar o Governo, direi eu que tambem é mania querer estar no Governo sem ter a força necessaria para governar.

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Julgada a materia do Artigo sufficientemente discutida, foi posto á votação, e approvado.

Tambem o foram, sem discussão, os Artigos 5.º e 6.º: ficando por esta fórma approvada a Proposição como veiu da outra Camara; mandando-se por tanto reduzir a Decreto para subir á Sancção Real.

O Sr. Secretario Barão d'Alcobaça leu o seguinte Parecer que havia sido appresentado pelo Digno Par Relator da Secção de Fazenda.

PARECER.

A Secção de Fazenda e Administração interna examinou a Proposição vinda da Camara dos Senhores Deputados sobre os direitos que deve pagar o gado vaccum, que entrar no Reino de Portugal pela raia sêcca: parece á Secção que se deve approvar, e pedir a Sua Magestade a Rainha a sua Sancção. Palacio das Côrtes, em 18 de Abril de 1835. — Conde do Farrobo, Par do Reino. — Antonio L. de B. F. T. Gyrão, Par do Reino. — Conde de Linhares, Par do Reino. — P. J. Machado, Par do Reino. — J. F. Braamcamp, Par do Reino.

Proposição a que se refere o Parecer supra.

Art. 1.º O gado vaccum que entrar no Reino de Portugal pela raia sêcca, ficará d'ora em diante subjeito a pagar um direito de entrada regulado pela maneira que determinam os seguintes Artigos.

Artigo 2.º Os novilhos até dous annos de idade pagarão por cabeça mil e duzentos réis; de dous até quatro annos mil e seiscentos réis, e além desta idade tres mil réis.

Art. 3.º As novilhas até dous annos pagarão por cabeça seiscentos réis; de dous até quatro annos novecentos réis; passando esta idade mil e trezentos réis.

Art. 4.º Estes direitos serão pagos nas Alfandegas por onde os gados derem entrada, e nellas serão estes marcados com ferro, e se passarão as guias que o devem acompanhar no transito para os mercados.

Art. 5.º Todo o gado estrangeiro que fôr encontrado sem guia, será reputado descaminho, e como tal subjeito ás penas da Lei.

Art. 6.º Ficam revogadas as Leis em contrario. Palacio das Côrtes, 18 de Abril de 1835. — Antonio Marciano de Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. — José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Terminada esta leitura, resolveu a Camara que immediatamente se passasse a discutir a referida Proposição por Artigos, dispensando para isso no Regimento.

Lido o 1.º pelo Sr. Secretario Barão d'Alcobaça obteve a palavra, e disse

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Para votar, necessito que o Sr. Ministro dos Negocios do Reino me diga se ainda está em vigôr uma Lei sobre a abolição da sisa dos gados que foi feita no Porto.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Essa medida foi provisoria, e filha de circumstancias.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Perdôe V. Ex.ª, mas creio que a medida foi geral.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: — Eu creio que actualmente existe a prohibição, e assim o disse esta manhan ao Digno Par o Sr. Conde da Taipa.

O Sr. Conde da Taipa: — Depois de V. Ex.ª assim m'o dizer, vim eu a confirmar-me no facto de que entrava por contrabando; ora para não dar principio a este estou eu sempre contra augmentar direitos, porque está provado que a prohibição absoluta tende a promover os contrabandos: por tanto como a entrada é com um tributo modico por isso votarei pela Lei. — Esta medida foi proposta pelos Deputados do Alemtejo, e a todos ouvi eu fallar a favor della, incluindo mesmo o Sr. Mozinho da Silveira que professa as theorias de restricção: n'uma palavra o que eu intendo é que a entrada do gado era prohibida, e que agora se vai permittir pondo-lhe um direito, só para augmentar a renda do Estado, e não para proteger o gado dos creadores do Paiz, porque essas protecções sempre vem a redundar contra o mesmo Paiz

Não se fazendo outra observação foi o Artigo 1.º posto á votação, e approvado tal qual se achava; sendo-o igualmente, e sem discussão, os 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, e 6.º; e ficando por esta fórma approvada sem alteração a Proposição da Camara Electiva, que se mandou reduzir a Decreto para ser levado á Sancção Real.

O Sr. Gyrão, como Relator da Secção de Fazenda, leu o seguinte

PARECER.

A Secção de Fazenda e Administração interna examinou as approvações dadas pela Camara dos Senhores Deputados, em conformidade do Artigo 75 § 11 da Carta Constitucional, ás propostas do Governo para se concederem as doações, e para estas poderem entrar na compra dos Bens Nacionaes, aos Duques de Palmella, e Terceira, e ao Marechal Marquez de Saldanha, no valor de cem contos de réis cada uma.

Igualmente examinou as approvações das pensões annuaes e vitalicias do Conde de Cabo de S. Vicente, de dous contos e quatrocentos mil réis. — De D. Maria Joanna de Montaury Guerreiro, de quatrocentos mil réis, e a cada um de seus filhos, em numero de cinco, trezentos mil réis. — E D. Maria Maxima Fernandes da Cruz, viuva de Manoel Fernandes Thomaz, seiscentos mil réis; e ao Visconde de Itabayana um conto e duzentos mil réis.

Parece á Secção que estas doações e pensões merecem a approvação desta Camara, e se deve pedir a Sua Magestade a Rainha a Sua Sancção.

Palacio das Côrtes, 18 de Abril de 1835. — Antonio L. de B. F. T. Gyrão, Par do Rei no. — Conde do Farrobo, Par do Reino. — Conde de Linhares, Par do Reino. — J. F. Braamcamp, Par do Reino. — P. J. Machado, Par do Reino.

RESOLUÇÃO.

A Camara dos Deputados da Nação Portugueza, sobre Proposta do Governo, resolveu em Sessão de hoje dar a approvação requerida pelo Artigo 75 § 11.º da Carta Constitucional, para o fim de se con-

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ceder ao Duque de Palmella a doação de cem contos de réis, feita por Sua Magestade Imperial o Duque de Bragança, quando Regente em Nome da Rainha, devendo o seu pagamento verificar-se em Bens Nacionaes podendo o Governo para esse fim emittir os Titulos convenientes, que serão recebidos como dinheiro na venda dos mesmos bens.

Palacio das Côrtes, em 15 de Abril de 1835. — Antonio Marciano de Azevedo, Presidente. — Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario. — José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Decreto.

Tomando na mais bem merecida consideração os muitos e relevantissimos serviços, que tem feito á Causa da Legitimidade, e á do brio, e da honra da Nação Portugueza o Marquez de Palmella, Par do Reino, sendo o primeiro, que em Paiz Estrangeiro deu ás Legações Portuguezas o nobre exemplo de opposição corajosa, logo que se manifestou o primeiro symptoma de uma usurpação tão extraordinaria, que apenas naquella épocha se podia accreditar possivel; continuando desde então a pugnar pelos Sagrados Direitos de Minha Augusta Filha, e sustentando neste leal empenho uma lucta, de principios por extremo desigual, com aquella dexteridade, para que de longo tempo o haviam habilitado os seus distinctos talentos, e consummada experiencia, e quando Eu Houve por bem Nomealo Membro da Regencia, estabelecida em Nome da Rainha, na Ilha Terceira, possuido do zelo de tão penoso serviço, abandonou generosa e completamente os interesses de sua familia, e á custa de sacrificios de todos os generos foi affoutamente affrontar o bloqueio inimigo naquelles mares, e a despeito de todos os perigos e contrariedades surgir no Baluarte, para sempre memoravel, da honra e da lealdade Portugueza, e ahi partilhar as grave responsabilidades, que as circumstancias impunham a tão difficil encargo: cabendo-lhe, entre muitos outros serviços importantes, grande parte no ousado pensamento de restituir, como com effeito, um punhado de bravos restituiu, a Rainha, e á sua Liberdade os dignos Povos de todo o Archipelago Açoriano; e Havendo-o Eu, depois da Minha chegada á Europa, chamado ao Continente, ahi se conservou junto á Minha Pessoa, ajudando-Me com seus conselhos, e madura experiencia dos negocios, na gloriosa empreza, que Tomei de assentar Minha Augusta Filha sobre o seu Throno, até que á testa do Exercito Libertador aportei nestes Reinos, onde continuou a servir aquella Causa Com o mesmo zelo, interesse, e boa vontade, com que até então o havia feito; por tantos, tão justos, e tão honrosos motivos, Tendo como um acto de justiça, para Mim muito agradavel, dar-lhe um testemunho não equivoco do reconhecimento da Rainha, e da Nação Portugueza, a que tão uteis, e tão leaes serviços tem prestado: Hei por bem, em Nome da Mesma Augusta Senhora, conceder ao referido Marquez de Palmella, Par do Reino, o Titulo de Duque do Fayal de juro e herdade, com a doação, que em tempo competente será decretada, para ser approvada pelas Côrtes. O Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Reino o tenha assim intendido, e faça executar com os despachos necessarios. Palacio no Porto, 4 de Abril de 1835. = D. Pedro, Duque de Bragança. = Candido José Xavier. = Está conforme. = José Balbino de Barbo a Araujo.

Proposição sobre serem admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se conferirem em doação ao Duque de Palmella .

Artigo 1.º São admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se conferirem ao Duque de Palmella, pela doação de cem contos de réis, conferida pelo Poder Executivo, e approvada pelas Côrtes Geraes.

Art. 2.º Fica revogada a Legislação em contrario. Palacio das Côrtes, em 15 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario. = José Marcellino da Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

RESOLUÇÃO.

A Camara dos Deputados da Nação Portugueza sobre Proposta do Governo, resolveu em Sessão de hoje dar a approvação requerida pelo Artigo 75 §. 11.º da Carta Constitucional, para o fim de se conceder a cada um dos Marechaes, Duque da Terceira, e Marquez de Saldanha a doação de cem contos de réis, feita por Sua Magestade Imperial o Duque de Bragança quando Regente em Nome da Rainha, devendo o seu pagamento verificar-se em Bens Nacionaes, podendo o Governo para esse fim emittir os titulos convenientes, que serão recebidos como dinheiro, na venda dos mesmos bens.

Palacio das Côrtes, em 15 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

DECRETO.

Tendo Eu, com o auxilio da Divina Providencia, levado felizmente ao cabo a guerra civil, o maior flagelo das Nações, e Tomando na merecida consideração os altos feitos dos Marechaes do Exercito Duque da Terceira, e Conde de Saldanha, que na porfiosa lucta entre a Legitimidade e a usurpação contaram tantas victorias quantas as batalhas pelejadas contra os inimigos da Rainha Fidelissima, e da Carta Constitucional da Monarchia; e devendo pela Minha parte galardoar serviços de tamanha importancia, ainda que já premiados pela estima e simpathia dos Amigos da Patria. Hei por bem em Nome da Mesma Augusta Senhora, Fazer Mercê ao Duque da Terceira das honras de Duque Parente, e ao Conde de Saldanha, do Titulo de Marquez de Saldanha, com perpetua doação de cem contos de réis, verificada em Bens Nacionaes, que haverão como proprios, e livres de todo o encargo, qualquer que d'antes fosse a sua natureza, carecendo todavia esta Mercê da confirmação das Côrtes, ás quaes será opportunamente submettida. O Ministro e Secretario

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d'Estado dos Negocios do Reino assim o tenha intendido e faça executar, expedindo os despachos necessarios.

Palacio das Necessidades em 27 de Maio de 1834. = D. Pedro, Duque de Bragança. = Bento Pereira do Carmo = Está conforme = José Balbino de Barbosa Araujo.

Proposição sobre serem admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se conferirem em doação aos Marechaes Duque da Terceira, e Marquez de Saldanha.

Artigo 1.º São admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se conferirem aos Marechaes Duque da Terceira, e Marquez de Saldanha, pelas doações de cem contos de réis a cada um, conferidas pelo Poder Executivo, e approvadas pelas Côrtes Geraes.

Art. 2.º Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, 15 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente = Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

RESOLUÇÃO.

A Camara dos Deputados da Nação Portugueza, sobre Proposta do Governo, resolveu em Sessão de hoje, dar a approvação requerida pelo Artigo 75 §. 11.º da Carta Constitucional, para o fim de se conceder ao Conde do Cabo de S. Vicente a pensão annual e vitalicia de dois contos e quatrocentos mil réis, feita por Decreto de 22 de Outubro de 1831.

Palacio das Côrtes em 15 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario. = Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario.

DECRETO.

Achando-se o Conde do Cabo de S. Vicente elevadora esta dignidade pelos altos feitos que practicou em prol da Legitimidade, e da Carta Constitucional da Monarchia Portugueza, e que tão poderosamente contribuiram ao seu brilhante e mais rapido triumpho, havendo-se tornado assim credor da Minha particular consideração, e da Gratidão Nacional; e Querendo Eu dar a esta Mercê, com que foram reconhecidos seus distinctos, e relevantes Serviços, toda a amplitude que elles merecem, e juntamente habilita-lo a sustentar o decoro daquella dignidade: Hei por bem conceder-lhe uma pensão annual e vitalicia de dois contos e quatrocentos mil réis, para verificar-se depois da approvação das Côrtes. — O Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Reino assim o tenha intendido e faça executar.

Palacio das Necessidades, em 22 de Outubro de 1834. = Rainha = Bispo Conde, Frei Francisco. = Está conforme = José Balbino de Barbosa e Araujo.

RESOLUÇÃO.

A Camara dos Deputados da Nação Portugueza, sobre Proposta do Governo, resolveu em Sessão de hoje, dar a approvação requerida pelo Artigo 75 §. 11.º da Carta Constitucional, para o fim de se conceder a D. Maria Joanna de Montaury Guerreiro, a pensão annual de quatrocentos mil réis; e a de tresentos mil réis tambem annual a cada um de seus filhos Bento José de Montaury Guerreiro, José Antonio de Montaury Guerreiro. D. Maria das Dores de Montaury Guerreiro, D. Maria da Conceição de Montaury Guerreiro, e D. Anna Izabel de Montaury Guerreiro; e bem assim a pensão de um conto e duzentos mil réis ao Visconde de Itabayana, que foram a todos, concedidas por Decreto de 26 de Fevereiro do currente anno.

Palacio das Côrtes, 15 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Resolução.

A Camara dos Deputados da Nação Portugueza, sobre Proposta d'um de seus Membros, resolveu em Sessão de 15 do presente mez, que a pensão conferida por Decreto das Côrtes Constituintes, a D. Maria Maxima Fernandes da Cruz, viuva de Manoel Fernandes Thomaz, e suspensa por ordem posterior, fique subsistindo, e se pague na quantia de seiscentos mil réis annuaes.

Palacio das Côrtes, em 18 de Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Terminadas estas leituras, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Está em discussão a parte do Parecer da Secção de Fazenda, relativamente á Resolução da Camara Electiva que confirma a doação de cem contos de réis, conferida pelo Poder Executivo ao Sr. Duque de Palmella.

Obtendo a palavra, disse

O Sr. Sarmento: — Não posso dar o meu voto sobre esta materia sem o motivar. — Tracta-se da Resolução da Camara dos Senhores Deputados, relativamente á doação para o Digno Par o Sr. Duque de Palmella. Tenho para fallar neste objecto, os motivos da honra da amizade que me ligam a Sua Ex.ª — Desde que em 1809 tive conhecimento de Sua Ex.ª desde logo avaluei as suas eminentes qualidades: com tudo apesar do lavor da amizade, com que o Digno Par faz a honra de me tractar, direi que poucos individuos se acham, a seu respeito, em circumstancias de maior independencia do que eu. No seu Ministerio apenas recebi o unico despacho da demissão (que requeri) do emprego de Enviado na Côrte de Madrid; (mercê, que não julgo de difficil concessão) sentindo que o mesmo Digno Por não esteja presente, para affiançar, se eu até hoje lhe pedi alguma graça, para mim ou para os meus, e se guardei a palavra que lhe dei em Londres de nunca lhe pedir mercê alguma para mim. Por conseguinte de modo algum me posso julgar prevenido para dar a minha opinião sobre a materia de que se tracta.

Talvez a historia não mencione um facto tão singular como a importancia, e consideração do nobre

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Duque, cujos serviços, estamos fiscalisando, para a decisão de uma Causa Nacional.

Quando os extraordinarios acontecimentos da usurpação, obrigaram parte da Nação Portugueza a emigrar, para os reinos estrangeiros, póde dizer-se que o unico esteio (sem excepção alguma) que protegeu o edificio da Liberdade, para não aluir de todo, foi o nome que o (então) Marquez de Palmella, tinha no Corpo Diplomatico! Affirmar o contrario seria não só faltar á verdade, mas até ingratidão; eu fallo assim claro á face da Nação Portugueza, hoje que ella vai fazer uma retribuição, mui pequena a tão distinctos serviços. — Se o Duque de Palmella senão achasse em Londres naquella occasião, e se não expozesse com dignidade, a salvar a Liberdade da sua Patria, e a Corôa da sua Soberana, não sei qual seria hoje o destino de Portugal. Resistiu ás insinuações de alguns dos seus collegas na Diplomacia, quando o tentavam para abandonar aquelles dous sagrados objectos, perdeu não só a amizade de homens poderosos, mas até soffreu o ser ameaçado de o levarem ante os Tribunaes Ordinarios, como réo de crimes, pois como taes se chegou a considerar a tenacidade da lealdade á sua Soberana. Mas o Duque de Palmella, por effeitos d'um heroismo digno de conservar-se em perpetua memoria, encarou todos os riscos, e obteve fazer sempre jazer em incerteza a causa da rebelião, ainda nas épochas das suas melhores esperanças. — Depois de um procedimento tão primoroso, de um obrar tão heroico, não sei se poderia entrar em duvida que o Duque fosse digno de uma recompensa Nacional.

O meu sentimento, é, que as nossas circumstancias não permittam dar-lha mais avultada: quando isto digo, não tenho diante dos olhos senão os serviços do Digno Par, assim como a independente amizade, que começámos debaixo dos riscos da invasão Franceza em 1809; é verdade que os perigos communs tem à força de ligar os homens, principalmente quando elles tem por fim os interesses da Patria, e a gloria da Nação, além dos motivos particulares da sua honra; foi talvez esta uma das rasões, porque me uni ao Digno Par naquella épocha. Porém os acontecimentos ultimos vieram deparar ao mesmo nobre Duque outra occasião de ganhar honra de que nunca sabe affastar-se um descendente daquelles, que mais brilham entre os nobres Portuguezes, e cujo procedimento envergonhará os d'esses, que tendo prestado um juramento, não tiveram depois o valor de o sustentar. O nobre Duque por differentes vezes teve motivos para dar por perdida aquella Causa, que elle tão lealmente abraçara, e da qual por muito tempo foi o principal cabeça; não quer porém transigir, para não perder o seu nome.

O Digno Par tinha então poder bastante, se quizesse pactuar com o tyranno da sua Patria, e tirar disso grande partido; teve insinuações, teve mesmo propostas para esse fim, mas a tudo soube resistir com dignidade, e tudo rejeitou. Este facto deve saber-se e é tempo de se vulgarisar.

Finalmente o seu nome hade ser superior as lembranças de pequenas injustiças; e o tempo o hade fazer triumphar de quaesquer pequenas rivalidades.

Concluo dizendo á Camara que nunca me levantei com tanta satisfação como agora o faço, dando o meu voto inteiramente a esta doação já approvada na Camara Electiva a favor do Sr. Duque de Palmella; e que, se de mim dependesse, eu lhe daria ainda um mais amplo testimunho publico dos seus grandes serviços, e constante lealdade. (Apoiado.)

Como nenhum dos outros Dignos Pores pedisse a palavra, julgou-se a materia sufficientemente discutida, e entregue á votação foi unanimemente approvada a mencionada Resolução, que confirma a doação conferida ao Duque de Palmella; sendo-o igualmente, e sem discussão, a Proposição da Camara Electiva sobre serem admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se emittirem em virtude da mesma doação.

Tambem foi approvada sem discussão a Resolução da Camara dos Senhores Deputados, que confirma as doações de cem contos de réis conferidas pelo Poder Executivo a cada um dos Marechaes Duque da Terceira, e Marquez de Saldanha; assim como a Proposição da mesma Camara sobre serem admittidos na compra dos Bens Nacionaes os titulos que se emittirem em consequencia das mencionadas doações.

Consecutivamente foram lidas, e, pelo mesmo estilo, approvadas as seguintes Resoluções da Camara Electiva:

Confirmando a Pensão annual e vitalicia de dois contos e quatrocentos mil réis concedida ao Almirante Conde do Cabo de S. Vicente: — Confirmando a Pensão annual e vitalicia de um conto e duzentos mil réis conferida ao Visconde de Itabayana: — Confirmando as Pensões tambem annuaes e vitalicias concedidas a D. Maria Joanna de Montaury Guerreiro, e a cada um de seus filhos, em numero de cinco; a saber, á primeira de quatrocentos mil réis, e aos ultimos de tresentos: — Restituindo a D. Maria Maxima Fernandes da Cruz, viuva de Manoel Fernandes Thomaz, a Pensão de seiscentos mil réis, conferida pelas Côrtes Constituintes, e suspensa por ordem posterior.

Todas estas Resoluções e Proposições, se mandaram reduzir a Decretos.

Terminadas as votações precedentes pediu a palavra e disse

O Sr. Conde de Linhares: — Por occasião de se terem approvado estas Resoluções, que nos foram remettidas pela Camara dos Senhores Deputados, ouso o lembrar á Camara dos Pares a oportunidade de não serem por ella esquecidos os serviços de um outro benemerito da Patria, cujo nome está intimamente associado com as recordações que ella está destinada a transmittir á posteridade. — Não terá talvez escapado á perspicacia de Vossas Excellencias que lhe desejo lembrar o honrado Marquez d'Angeja, cujos distinctos serviços não podem ser com justiça jámais esquecidos, serviços que forão gloriosamente auxiliados por um Membro illustre desta Camara, de cujo apoio me vejo privado neste momento, achando-se ausente deste recinto por motivos de delicadeza; tendo-se tractado de uma votação que lhe dizia respeito. Eu poderia fazer destes uma longa enumeração, mas elles são todos bem conhecidos de Vossas Excellencias, e por tanto a esta hora adiantada da noute não ultrapassarei os limites que devo á concisão, e ás suas indulgencias; e só lembrarei que a conducta do nosso antigo Collega se não desmentiu um instante na

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crise de desgraçada recordação em que tantos Membros desta Camara se esqueceram do seu dever. O illustre Marquez elevado ao Pareato que acceitou com pleno conhecimento dos deveres sagrados, e imperiosos impostos a tão elevada magistratura, continuou á Patria aquelles serviços distinctos, que ella esperava do seu patriotismo na crise que então se desinvolveu. E ainda que a sua saude se achava em estado bem precario, como o facto subsequente o prova, esta consideração cedeu na sua alma varonil ao impulso do seu dever. Na minha mão se acham alguns documentos honrosos que o provam, e a sua morte quasi immediata á gloriosa campanha de que tinha dirigido as operações como General em chefe, é de todas as provas a mais exuberante.

Agora passarei o chamar a attenção de Vossas Excellencias sobre os individuos que interessam mais de perto d memoria do illustre Marquez de Angeja, e em favor de quem faço votos para que se manifeste a generosidade e justiça Nacional, e a munificencia da Augusta Soberana como dignos della. É de sua preclara viuva de quem fallo primeiro, victima das perseguições da infausta usurpação, herdeira do odio que a conducta patriotica de seu marido lhe grangeou, e presa uma grande parte do tempo que durou a usurpação, sorte que mui naturalmente teria tido toda a sua vida se as nossas armas victoriosas, na sua entrada inesperada em Lisboa, a não tivessem libertado, assim como a todos os nossos amigos que gemiam nas masmorras da usurpação. É tambem em segundo logar de uma infeliz orfan, filha reconhecida do Marquez de quem vos fallo, reconhecida pelas formalidades das Leis, e que hoje sobrevive unicamente a sua irman herdeira legitima de sua casa, com cuja morte a usurpação consummou um dos seus pensamentos, extinguindo o nome do Marquez em um ramo que lhe era hostil: não foram baldadas pois as perseguições atrozes feitas a esta illustre infeliz menina, separada violentamente daquella que lhe servia de mãe, e continuadamente perseguida em quanto vivendo odio d'um partido implacavel. Ella succumbio finalmente, e com sua morte passou no tempo da usurpação esta casa a uma das familias mais inimigas da nossa Causa, e, para dizer tudo, acha-se desta sorte associado o nome do grande Albuquerque com o da infausta recordação do Marquez de Chaves. — O objecto pois da minha proposição é impedir quanto possivel fôr que um tal deslustre tenha logar definitivamente, e lembrar que já um precedente de familia salvou as recordações historicas do grande Albuquerque na pessoa illustre de um seu filho illegitimo. Renove-se pois este honroso precedente de um Soberano grato e magnanimo, e seja esta illustre menina, unica vergontea de tão illustre ramo, salva pela Patria agradecida, e pela protecção Real de uma Soberana generosa, e munificente.

Proponho pois que para se obter este fim, se dirija ao Throno uma mui respeitosa mensagem para recommendar a Sua Magestade a sorte da illustre viuva do Marquez d'Angeja, muito pouco favorecida pela fortuna, assim como de sua filha reconhecida de ambos como objectos dignos da consideração Real. (Apoiado. Apoiado.)

O Sr. Sarmento: — Não tenho duvida, antes apoio quanto acaba de dizer o Sr. Conde de Linhares, para que se dê um testimunho de gratidão á memoria do Digno Par Marquez de Angeja. Eu que tive a honra de ser Deputado da Nação em 1827, tive tambem occasião de avaluar os seus serviços naquelle tempo, e disso dei um testimunho publico na Sessão daquella tormentosa epocha. Tanto mais importantes me pareceram aquelles serviços por serem feitos em uma crise em que grande parte dos individuos da sua classe abandonaram a Causa da Rainha, e da Carta. Olhando pois ás circumstancias do paiz, o Sr. Marquez de Angeja se fez credor de corôas civicas. Foi mandado governar a Provincia do Minho, estando a de Traz-os-Montes revolucionada pelo Marquez de Chaves: cubriu-se então de gloria, e os seus serviços são bem notorios, porque havia então a tendencia para o perjúrio. É por tanto muito justo que a Patria tenha em devida conta a sua honra; honra que elle conservou illesa, expondo seus dias no campo de batalha, cercado de perigos de toda a specie; isto n'uma épocha em que póde ser que se o commando do Minho estivesse em outras mãos, fossem bem fataes seus resultados. Depois de um exemplo destes, é necessario que algum acto publico mostre que a Nação se não esqueceu delle. Não sei o que o Sr. Conde de Linhares intenta propôr, porque elle ainda está escrevendo a sua indicação, mas seja o que fôr, quanto redundar para honrar a memoria do Digno Par Marquez de Angeja achará certo o meu apoio.

O Sr. Vice-Presidente: — O Sr. Conde de Linhares propõem que por esta occasião a Camara dirija a Sua Magestade uma respeitosa mensagem a favor da Marqueza de Angeja.

O Sr. Conde de Linhares: — Não sei se a Camara sobre este objecto quererá ouvir algumas peças justificativas.

O Sr. Sarmento: — Creio que não, ao menos eu pela minha parte (e independentemente do conhecimento dessas peças) não só me não opponho, mas antes apoio a indicação do Digno Par, como já manifestei.

O Sr. Vice-Presidente: — Como a maioria da Camara parece inclinada a approvar a moção do Sr. Conde de Linhares, convido o Digno Par a reduzila a escripta, enviando-a á Mesa para poder votar-se sobre ella.

O Sr. Conde de Linhares, assentindo á lembrança do Sr. Vice-Presidente, escreveu a sua moção que remetteu á Mesa: é como se segue.

MOÇÃO.

Proponho que se dirija a Sua Magestade uma respeitosa Mensagem para que se digne tomar em Sua alta consideração os relevantes e distinctos serviços do Par do Reino o Tenente General Marquez de Angeja, Commandante em Chefe do Exercito Portuguez em 1827, os quaes foram feitos ao Throno de Sua Magestade, e á Causa Constitucional, recahindo as provas da generosidade Nacional em a sua viuva, e na sua filha reconhecida por util Decreto. — Conde de Linhares, Par do Reino.

Sendo lida, pediu a palavra, e disse

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Eu creio que essa moção é ociosa: se o homem morreu pela Causa da Rainha e da Patria, o seu objecto já está

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providenciado por Lei que se executa; havendo além disso uma ampliação dessa mesma Lei sanccionada nas duas Camaras. Por consequencia não sei o que se hade ir dizer á Rainha; porque, para Sua Magestade fazer executar as Leis não é necessario mensagem, nem que nós lho indiquemos, portanto parece-me inutil tal Proposição; e ainda mais, querer nesta occasião comparar os serviços que fez o Digno Par Marquez às Angeja com os serviços dos Dignos Pares Duque de Palmella, e da Terceira, e outros, não me parece exacto. O Digno Par Marquez de Angeja achava-se commandando uma Provincia, fez o que pôde em desempenho dos seus deveres, (não sei se muito, ou pouco); mas não está no caso dos outros: — por exemplo, Guerreiro não era militar era desembargador muito apto e capaz, a quem o Governo da Senhora D. MARIA II disse «V. m. vá para uma Praça de guerra, na certeza de que se o apanharem no caminho hade ser enforcado;» elle foi, arriscou-se a tudo, e fez muitos serviços. — Concluindo, digo que não vejo justo termo de comparação entre uns e outros individuos, e por este motivo sou de voto que nos deixemos de tal mensagem.

O Sr. Vice-Presidente: — O Digno Par não estava presente quando se appresentou vocalmente esta moção; a generalidade da Camara manifestou approvala, por isso se reduziu a escripto: conseguintemente a questão actualmente quasi que deve ser sómente sobre a redacção; mas a Assembléa o decidirá.

Não pedindo a palavra outro Digno Par, foi a moção entregue á votação, e approvada.

Leu-se depois o Parecer infra, que fôra remettido á Meza pela respectiva Secção.

PARECER.

A Secção de Legislação tendo examinado a Proposição que veiu da Camara dos Senhores Deputados, sobre concederem-se premios aos Auctores dos Codigos Civil, e Criminal; é de parecer que a dita Proposição está nos termos de ser approvada por esta Camara, e de se pedir a Sua Magestade queira conceder-lhe a Sua Real Sancção. Palacio das Côrtes, em 18 de Abril de 1835. = Francisco Manoel Trigozo d'Aragão Morato. = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento. = Manoel de Macedo Pereira Coutinho. = Roque Ribeiro d'Abranches Castello Branco. = Bispo Conde Fr. Francisco. = Fernando Luiz Pereira de Souza Barradas. = D. Filippe de Souza e Holstein.

Proposição a que se refere o Parecer supra.

Artigo 1.º Será paga pelo Thesouro Publico uma gratificação de 16:000$000 réis por uma vez sómente ao Auctor d'um Projecto de Codigo Civil que até ao dia 10 de Janeiro de 1837 o appresentar a alguma das Camaras Legislativas sendo por ambas estas julgado digno de ser admittido para entrar em discussão. O Projecto conterá o Codigo Civil propriamente dito, e o de processo respectivo.

Art. 2.º Ao Auctor do Projecto que não obtivera preferencia, porém merecer a honra do accessit será paga pelo Thesouro Publico metade daquella gratificação por uma vez sómente.

Art. 3.º Será paga pelo Thesouro Publico uma gratificação de 8:000 000 réis por uma vez sómente ao Auctor de um Projecto de Codigo Criminal que até ao dia 10 de Janeiro de 1837 o appresentar a alguma das Camaras Legislativas, sendo por estas ambas julgado digno de ser admittido para entrar em discussão. Este Projecto comprehenderá o Codigo Criminal propriamente dito, e o de processo respectivo.

Art. 4.º Ao Auctor do Projecto que não obtiver a preferencia, porém merecer a honra do accessit será paga pelo Thesouro Publico a metade da gratificação

estabelecida em o Artigo 3.º

Art. 5.º Todos os Projectos que vierem ao concurso terão sua epigraphe, e serão acompanhados de cedulas fechadas que contenham, cada uma o nome do Auctor, para serem abertas aquellas sómente que acompanharem os Projectos, que forem premiados; as outras serão queimadas em publico. — Palacio das Côrtes, em 15 Abril de 1835. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. = Francisco Xavier Soares d Azevedo, Deputado Secretario. = José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Depois desta leitura, resolveu a Camara que a Proposição da Camara Electiva, fosse immediatamente discutida por Artigos, dispensada a formula usual da discussão na generalidade.

Lido portanto o Artigo 1.º, pediu a palavra e sobre elle disse

O Sr. Souza e Holstein: — Creio que ninguem se opporá, nem será necessario um grande discurso para sustentar esta Proposição, pois que todos conhecem o estado em que se acha a nossa Legislação, e por isso facil é de conhecer tambem a necessidade de promover algum meio de termos os Codigos. — Tanto no reinado da Senhora D. Maria I, como no tempo das Côrtes Constituintes se propôz um similhante Projecto, do qual este é uma perfeita recapitulação; não estou certo se era inteiramente identico, mas as bases principaes eram as mesmas; e portanto concluo instando pela necessidade da sua approvação.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Isto não é mais do que uma repetição do que se tem feito em todas as Côrtes desde 1820 até agora, como acaba de dizer o Digno Par; a necessidade dos Codigos é de evidencia: por conseguinte voto pela Proposição.

O Sr. Souza e Holstein: — É verdade o que disse o Sr. Marquez; porém os Membros da Camara Hereditaria desse tempo não eram muito amigos de reformas; talvez que eu, esteja enganado, entretanto se o estiver, tambem estou prompto a retractar-me. Este Projecto é o mesmo em substancia mas redigido de outra maneira.

O Sr. Conde de Lumiares: — Levanto-me para dar uma explicação que esclareça os Dignos Pares. — Em 1827 appresentou-se um Projecto de Codigo Civil e Criminal, que a Camara dos Pares adoptou sómente para que se dessem premios aos Auctores dos admittidos e não aos que obtivessem o accessit. Eu fui um dos que votei na materia, e por isso dei esta explicação: quando veiu o Usurpador, estava o Projecto na Camara dos Deputados com as emendas que tinham ido da dos Pares.

Não se fazendo outra observação, foi o Artigo 1.º posto á votação e approvado como estava.

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Igualmente o foram, sem discussão o 2.º, 3.º 4.º, o 5.º, ficando assim approvada tal qual a Proposição referida; a qual se mandou reduzir a Decreto para subir á Sancção Real.

O Sr. Vice-Presidente: — Agora consultarei a Camara sobre uma duvida que me occorre, e que procede da novidade do assumpto. — A Camara Electiva remetteu a esta varias Resoluções sobre doações e pensões, as quaes foram aqui approvadas; entre ellas ha duas que tem a fórma de Proposições de Lei, porque mandam admittir certos titulos na compra dos bens Nacionaes, ainda que são provenientes de doações. Lembrava-me que talvez fosse melhor reduzir tudo a Decreto, incluindo nelle cada uma destas Resoluções: este methodo me parece acertado, e o contrario seria multiplicar a escripta sem precisão.

O Sr. Ministro da Marinha: — Estes Projectos tiveram como deviam a sua origem na Camara dos Senhores Deputados; e creio que aqui se devem approvar por sua ordem conforme de lá vieram; nesta hypothese não podemos alteralos, pois qualquer modificação importaria uma emenda. São além disso differentes Leis e sobre objectos diversos que não se podiam reunir em uma só.

O Sr. Vice-Presidente: - Uma vez que a Camara convenha lavrar-se-hão tantos Decretos, quantas são as mesmas Resoluções.

O Sr. Secretario Barão d'Alcobaça leu o seguinte Parecer, que fôra antes appresentado pela Secção ahi mencionada.

PARECER.

A Secção de Fazenda e Administração interna é de parecer, que deve ser admittido á discução o Projecto de Lei vindo da Camara dos Senhores Deputados, sobre a reforma da Moéda Portugueza; reservando seus membros fazer algumas reflexões sobre cada um dos seus Artigos no acto da discussão. — Palacio das Côrtes, 19 de Abril de 1835. = Antonio Lobo de B. F. T. Gyrão, Par do Reino. = J. F. Braamcamp, Par do Reino. = Conde da Taipa, Par do Reino. = Conde de Linhares, Par do Reino. = P. J. Machado, Par do Reino.

Proporção sóbre a reforma da Moéda Portugueza, (a que se refere o Parecer supra)

Artigo 1.º Depois da reforma da casa da moéda, e ao mais tardar depois do dia trinta de Junho deste anno, toda a moéda de ouro e prata que se lavrar será decimal, e em proporção com o valôr da moéda que actualmente se acha em circulação.

Art. 2.º A nova moéda de prata será da Lei de onze dinheiros, e lavrada na rasão de sete mil setecentos e cincoenta réis por marco, que é a rasão media da moéda corrente.

Art. 3.º A nova moéda de ouro será fabricada segundo a Lei, e razão da moéda actual, a saber de ouro de vinte e dous quilates, e na rasão de cento e vinte mil réis por marco.

Art. 4.º As moédas de prata serão sómente dos valores de mil, quinhentos, duzentos, e cem réis. As moédas de mil réis correrão com o nome de «Corôas» e pelo que fica determinado no Artigo 2.º, terão de pezo oito oitavas dezoito grãos e cincoenta e oito centecimos de grão proximamente, de maneira que trinta e uma destes moédas, pezarão exactamente quatro marcos. As moédas de quinhentos réis, correrão com o nome de «Meias corôas»; terão a metade do pezo das antecedentes, e entrarão trinta e uma em dois marcos. As moédas de duzentos réis, terão de pezo uma oitava, quarenta e seis grãos e noventa e tres centecimos de grão, com pequena differença; e cento cincoenta e cinco destas moédas pezarão exactamente quatro marcos. As moédas de cem réis, terão a metade do pezo das antecedentes, e cento e cincoenta e cinco entrarão em dous marcos.

Art. 5.º As moédas de mil, e de quinhentos réis terão de um lado a Effigie da Rainha; na orla esta inscripção = MARIA II PORTUGALIAE REGINA = e por baixo da Effigie a era: no reverso o Escudo das Armas Nacionaes, e por baixo delle os numeros, = 1:000 R. = ou 500 R. = que designam em réis os seus valores respectivos. As moédas de duzentos, e de cem réis, terão de um lado a Effigie da Rainha, a inscripção e éra, como as antecedentes; porém no reverso terão sómente dous ramos de louro enlaçados ao longo da orla, e no meio delles os algarismos que designam os seus valores, a saber: = 200 R. = ou = 100 R. =

Art. 6.º Moédas de ouro lavrar-se-hão sómente dos valores de cinco mil réis, e de dous mil e quinhentos réis. As primeiras correrão com o nome de = Portuguezes = e terão de pezo duas oitavas e dous terços de oitava. — As segundas terão de pezo uma oitavo e um terço. Assim uma das primeiras, e uma das segundas valem juntamente sete mil e quinhentos réis, e pesam quatro oitavas que é o pezo das moédas correntes de sete mil e quinhentos.

Art. 7.º As moédas de ouro de cinco mil réis, e de dous mil e quinhentos réis, terão as marcas e inscripções das moéda de mil, e de quinhentos réis (Artigo 5.º) sómente com a differença dos algarismos correspondentes aos seus valores, os quaes, para estas moédas serão 5:000 R. = e 2:500 R. =

Art. 8.º As moédas fabricadas na conformidade dos Artigos antecedentes, correrão pelos seus respectivos e determinados valores conjunctamente com as moédas, que actualmente se acham em circulação.

Art. 9.º Poderão lavrar-se, como até agora, moédas de cobre, porém não as de bronze de quarenta réis, cuja fabricação cessará desde já.

Art. 10.º Fica em pleno vigôr toda a Legislação existente ácerca de moédas, e metaes preciosos, na parte em que não é revogada pela presente Lei.

Palacio das Côrtes, em 13 de Abril de 1835. — Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. — Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario.

Terminada a leitura, resolveu a Camara, que esta Proposição fosse logo tractada, e pelo estilo da precedente, dispensadas as congruentes formalidades.

Pelo que, tendo sido lidos os Artigos 1.º, 2.º 3.º, e, foram todos successivamente approvados sem discussão.

Sobre o 5.º disse

O Sr. Sarmento: — Aqui Sr. Presidente é que

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me parece deverá haver uma emenda; pois que não seria justo que a recordação de uma parte da Monarchia Portugueza fosse excluida da moéda, alterando a legenda que ella tem actualmente: esto perpetua, deve ser a nossa divisa a tal respeito.

O Sr. Gyrão: - Eu reservava-me para fazer algum as reflexões sobre este Artigo, pois que segundo a Carta parece-me que se não deve alterar a legenda actual da moéda, e sim conservar-se tal como ella está. Sinto que esta Lei tão importante nos fosse appresentada para decidir no fim da noute. Não pretendo fazer uma censura á outra Camara, mas não pude deixar de fazer esta observação; o Sr. Ministro da Fazenda, que presente está, poderá dizer-nos alguma cousa.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Se eu posso fallar nesta questão (cuja materia não foi proposta pelo Governo) direi qual foi a rasão porque se omittiu a palavra Algarbiorum. — Como a moéda é mais pequena era necessario fazelo assim, porque a palavra não caberia, e para isto teve-se em vista o Artigo 1.º da Carta que diz (leu): pareceu que dizendo-se Rainha de Portugal estavam comprehendidas todas as diversas partes da Monarchia. — Parece-me que esta foi a rasão porque na nova legenda se ommittiu parte da actual.

O Sr. Sarmento: — Sei muito bem essas circumstancias que houve, e até sei que os novos cunhos estão feitos, mas apesar disso ainda estou firme na minha opinião, porque os cunhos podem reformar-se; nem levará tanto tempo em fazer-se esta mudança, que cause um damno extraordinario. O fazer-se a vontade aos Povos, é sempre cousa muito attendivel; nem acho rasão que possa justificar uma mudança na inscripção da nossa moéda, a qual tem quasi tanta antiguidade como desde a grandeza da Monarchia, depois que o genio da navegação, e do commercio abriu as portas aos importantes descobrimentos de terras desconhecidas. Mesmo desde o tempo do Sr. Rei D. Affonso 3.º foi o Algarve considerado como um dos dominios da Corôa Portugueza, e entrou nos titulos dos nossos Reis, que em todo o caso se gloriavam com este titulo, practica de todos os Soberanos de muitos Estados, como entre outros os antigos Reis de França a respeito de Navarra, apezar da pequenez deste Reino em relação á França; porque nessas éras a ostentação destas cousas quasi que formava parte da grandeza historica dos Soberanos da Europa, e era um resumo historico que sempre tinham diante dos olhos, do gloria nacional. Como uma parte da antiguidade patria, de maneira alguma transigirei nesta parte do Projecto; confesso estar certo de que por ventura, me chamem antiquario; mas, longe de se me dar deste epitheto, terei muita satisfação em que m'o appliquem por similhante motivo; ajudarei quanto em mim estiver a concorrer para tudo, em que vá gloria Portugueza, e com igual força me não prestarei, nem a mais leve idéa de demolir ornamento algum da nossa Patria, e da Monarchia.

O Sr. Marquez de Loulé: — Além das rasões que o Digno Par apontou, ha ainda outra muito importante, que é a de não fazer innovações que não sejam de necessidade, pois que alterar usos e costumes antigos é sempre prejudicial; e o Povo vendo fazer alterações confunde muitas vezes as uteis com as desnecessarias, e daqui nascem inconvenientes. A rasão que deu o Sr. Ministro da Fazenda, quanto a mim, não tem fundamento, porque a moéda de que se tracta, e que hade ter esta inscripção, deve ser maior que o actual crusado novo, e a de 500 réis, quando não seja do mesmo tamanho pouco hade diferir. — Em consequencia não ha inconveniente em conservar a legenda actual, antes pelo contrario utilidade em não alterar usos antigos Nacionaes que sempre se devem respeitar.

O Sr. Conde de Linhares: — Em outros tempos possuiu Portugal outros terrenos na Mauritania, que se denominaram, como todos sabem, Algarves d'além mar, então decerto a fórma do plural designava uma realidade, que creio acabou quando abandonámos a ultima das nossas possessões nestas regiões. Se hoje quizessemos ser exactos, deveriamos pois mesmo reformar este plural, e contentar-nos do singular; mas quid inde? Será acaso esta legenda de tanto vigôr que não haja mesmo algumas moédas Portuguezas que a não tenham? Não julgo por consequencia isto de tanta importancia que torne necessaria uma emenda que teria graves inconvenientes e produziria, pelo termo em que se acha a Sessão Legislativa, embaraços ao Governo, procrastinando uma Lei que circumstancias tornam necessaria, devendo cedo terminar o curso permittido da moéda estrangeira. Penso pois que é mais conveniente sacrificar a legenda ao bom exito do Projecto, do que adherir a uma fórma de pouca ponderação actualmente.

O Sr. Sarmento: — Por termos perdido Mazagão, não quero eu que em outra épocha se diga dos Portuguezes de hoje que elles são da tempera daquelles seus antepassados; a Nação hoje tem outra gente, e os factos o mostram claramente. Eu quereria mesmo se pozesse a Cruz da Ordem de Christo no reverso da nova moéda, porque desejo que a Nação tenha perpetuidade, e que as nossas reformas levem o caracter de criminar o desleixo dos que viveram antes de nós; é preciso que chegue uma épocha em que se conheça que somos homens differentes daquelles, que largaram o que não deviam largar. Por tanto desejo que fique consignado no Diario desta Camara, e nas inscripções das moédas, que a Nação Portugueza vai tomar o logar que lhe pertence, e que oitenta ou noventa annos de Portuguezes amortecidos não poderam roubar-lhe.

Julgando-se a materia discutida, foi o Artigo 5.º posto á votação, e approvado, intercalando-se na inscripção as palavras = et Algarbiorum =, depois das primeiras = Maria II. =, na fórma proposta pelo Sr. Sarmento.

Lido o Artigo 6.º pediu a palavra, e disse

O Sr. Gyrão: — Visto que foi approvada uma emenda, farei outra reflexão sobre este Artigo; e vem a ser sobre este nome Portuguez, o qual póde dar occasião a dissabores. Em primeiro logar, nunca foi usado em nossas moédas, e para que se hãode assim innovar? Chamem-se corôas ou meias corôas de ouro, assim como já se approvou para as de prata; em consequencia peço á Camara que tome isto em consideração, e que aquella palavra Portuguez se elimine.

O Sr. Marquez de Loulé: — Visto ter havido uma emenda, é certo que não ha grande inconveniente em

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adoptar outra. — A palavra Portuguez não tenho eu muita simpathia por ella, e então desejaria substituir-lhe outra, mas não concordo com o Digno Par para que se lhe chame corôa; poder-se-hão chamar peças ou moédas; em fim para ir a uma cousa, a minha emenda é que se chamem moédas em vez de Portuguezes.

O Sr. Gyrão: — Na Commissão lembrou o nome de moéda, assim como o de peças, mas não pareceu conveniente, entretanto eu adopto qualquer nome que não seja o de Portuguez.

O Sr. Marquez de Loulé: — Parece-me que dizendo-se moédas, e meias moédas, ficava bem, e se satisfazia a todas as opiniões.

O Sr. Conde da Taipa: — Pôr-se-lhe esta denominação póde ter inconvenientes, por tanto é necessario adoptar-se alguma cousa visto que a Lei é necessaria pelas rasões que eu sei; não estejamos, em questões de corôas, ou meias corôas; adopte-se alguma cousa, que não seja o que está na Proposição, que eu voto por tudo. (Apoiado.)

Julgando-se o Artigo discutido, foi posto á votação, e não ficou approvado como estava, mas sim substituindo á palavra Portuguezes estas = Corôas de ouro; de maneira que as moédas de cinco mil réis ficassem com essa denominação, e as de dous mil e quinhentos réis, com a de Meias corôas de ouro = Como proposera o Sr. Gyrão.

O Artigo 7.º foi approvado sem debate, e com a emenda vencida para o 5.º

Tambem se approvaram, sem discussão, os Artigos 8.º, 9.º e 10.º, terminada assim, a de toda a Proposição de que se mandou fazer a ultima redacção.

O Sr. Conde da Taipa: — Peço se tracte da Lei sobre os egresos: como não fallei, ha pouco na freiras, peço agora licença para fallar nos frades.

O Sr. Vice-Presidente: — Não me esquece a recommendação do Digno Par, mas antes disto vai discutir-se outra mais urgente.

O Sr. Secretario Barão de Alcobaça leu o seguinte Parecer da Secção de Guerra e Marinha, o qual havia sido appresentado na Sessão de hoje de manhan.

PARECER.

A Secção de Guerra e Marinha, tendo examinado a Proposição vinda da Camara dos Senhores Deputados para o augmento dos soldos dos Officiaes subalternos do Exercito em effectivo serviço, é de parecer que a mesma seja adoptada sem a mais leve alteração. Palacio das Côrtes, 18 de Abril de 1835. — Marquez de Sampaio, Presidente. — Marquez de Santa Iria. — Duque da Terceira. — Visconde da Serra do Pilar. — Barão d'Alcobaça. — Conde de Lumiares, Secretario. — Marquez de Valença, Relator.

Proposição a que se refere o Parecer supra.

Art. 1.º Aos Tenentes do Exercito em actividade de serviço será abonado o soldo mensal de vinte e dous mil réis.

Art. 2.º Aos Alferes do Exercito em actividade de serviço será abonado o soldo mensal de vinte mil réis.

Art. 3.º Aos Ajudantes subalternos dos Corpos do Exercito em actividade de serviço será abonado o soldo mensal de vinte e dous mil réis.

Art. 4.º Os Cirurgiões militares vencerão os soldos correspondentes ás suas graduações.

Art. 5.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, 18 d'Abril de 1835. — Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. — José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Passando logo a discutir-se por Artigos, foram successivamente lidos e approvados sem discussão o 1.º e 2.º

Sobre o 3.º pediu a palavra, e disse

O Sr. Conde de Lumiares: — Os Cirurgiões-mores tem a graduação de Capitães os Ajudantes de Cirurgia a graduação de Tenentes, mas até aqui não tinham o soldo dessas graduações agora por esta Proposição deve-se-lhes dar o soldo correspondente ás graduações que tem cada um delles.

O Sr. Ministro da Marinha: — Eu não impugno a medida, mas desejava que se fizesse tambem alguma cousa a respeito dos Officiaes de Marinha, porque o soldo que tem, quando estão desembarcados, é muito pequeno; e como eu estou á testa desta Repartição, não posso deixar de exprimir o meu voto, esperando que a Camara o tome em consideração em occasião opportuna.

O Sr. Mello Breyner: — Eu appresentei hoje um requerimento dos Officiaes e Officiaes Inferiores de Brigada da Marinha pedindo augmento de soldo; vendo agora que esta Lei não é extensiva áquelles Officiaes, por isso tenho aqui um Projecto de Lei para este fim, pedindo a V. Ex.ª o queira mandar ler para a Camara o attender se o julgar justo. (O Digno Par remetteu á Mesa o alludido Projecto.)

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Eu pedia a V. Ex.ª que fizesse continuar a discussão a respeito dos subalternos, e depois de decidido este objecto então tractaremos dos outros, porque os soldos delles são tão pequenos, e os uniformes novos tão caros, que vale bem a pena de se lhes dar mais este augmento, visto que o Governo assim o quiz.

O Sr. Ministro da Marinha: — Só peço a palavra para dizer ao Digno Par que esta Lei foi apoiada pelo Ministerio, mas não proposta por elle.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Tambem requeiro continue a discussão do Projecto de que estavamos tractando.

Assim o resolveu a Camara; e tendo-se julgado o Artigo 3.º sufficientemente discutido, foi entregue á votação e approvado.

Tambem o foram, sem discussão, os Artigos 4.º e 5.º, ultimos de que se compunha a Proposição, a qual se mandou reduzir a Decreto para subir á Sancção Real.

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Uma vez que se acaba de vencer o augmento de soldo para os subalternos do Exercito, acho de justiça que se contemplem igualmente os da Brigada, como propoz o Sr. Breyner. O melhor seria talvez auctorisar o Governo para fazer esse augmento, que conformando-se com a Lei que ha pouca se discutiu, igualaria os sol-

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dos das respectivas classes tanto do Exercito como da Brigado, dando depois conta ás Côrtes na proxima Sessão.

O Sr. Conde de Lumiares? — Como Membro da Secção de Guerra não tenho duvida em adoptar a lembrança do Digno Par, a fim de se approvar a proposta do Sr. Breyner.

O Sr. Marquez de S. Paio: — Eu, como Presidente da mesma Secção, tambem apoio a proposta do Digno Par; mas parece-me que deve ser objecto de Lei separada da que se venceu.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Sem duvida deve ser uma Lei separada, até porque se se approvasse como additamento, tendo de voltar á outra Camara, talvez não houvesse tempo de passar na presente Sessão.

O Sr. Mello Breyner: — Para evitar essa complicação é que eu fiz um Projecto separado, parece-me que passando já nesta Camara haverá ainda tempo de ser decidido na dos Senhores Deputados.

O Sr. Secretario Barão d'Alcobaça leu então a Proposição appresentada pelo Sr. Mello Breyner: é a seguinte

PROPOSIÇÃO.

Artigo 1.º As disposições do Decreto das Côrtes Geraes datado de hoje, e relativas ao augmento de soldo dos Officiaes subalternos do Exercito em effectivo serviço, são extensivos aos Officiaes da Brigada da Marinha em identicas circumstancias.

Art. 2.º Fica revogada toda a Legislação em contrario. — Palacio das Côrtes, em 18 d'Abril do 1835. — Thomaz de Mello Breyner, Par do Reino.

Havendo a Camara resolvido que, dispensadas as formalidades, a mesma Proposição fosse immediatamente tractada; não havendo quem sobre sua materia pedisse a palavra, pôz-se á votação, e ficou approvada em ambos os seus Artigos; do que se mandou fazer a ultima redacção para passar á Camara dos Senhores Deputados.

O Sr. Vice-Presidente: — Sobre a Mesa não restam a discutir senão algumas Proposições vindas ultimamente da Camara Electiva, e sobre as quaes as Commissões julgaram que não havia necessidade de interporem o seu parecer; uma destas é a que diz respeito aos Egressos, a qual tambem se póde considerar como a repetição de outra que se fez em circumstancias muitissimo menos favoraveis; por consequencia pergunto á Camara se hoje mesmo deverá ser tomada em consideração, ou se convém que siga a marcha ordinaria.

A Camara resolveu pela primeira alternativa, pelo que o Sr. Secretario Barão d'Alcobaça leu a

PROPOSIÇÃO.

Sobre ser permittido aos secularisados Egressos a Ordem Religiosa, e a todas os Religiosos das Ordens Extinctas, o poderem herdar, e testar.

Artigo 1.º É permittido aos secularisados Egressos de Ordens Religiosas, e a todos os Religiosos das Ordens extinctas pelo Decreto de 30 de Maio de 1834, adquirir, alienar, testar, e dispôr de qualquer fórma que seja de seus bens, nos termos em que é permittido pelas Leis do Reino aos Clerigos seculares.

Art. 2.º Os secularisados Egressos e Religiosos das Ordens extinctas, continuam todavia a ser extranhos ás familias em que nasceram, para não poderem succeder ab intestato, nem prejudicar as legitimas dos que a ellas tiverem direito.

Art. 3.º Aos secularisados Egressos, e aos Religiosos das Ordens extinctas, que fallecerem sem testamento succederão seus parentes (não obstante não serem aquelles chamados á successão destes), observando-se neste caso as Leis geraes das successões, e excluido o fisco.

Art. 4.º Esta Lei é extensiva ás Religiosas que se acharem em identicas circumstancias.

Art. 5.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, 18 de Abril de 1835. — Antonio Marciano de Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario. — José Marcellino de Sá Vargas, Deputado, Vice-Secretario.

A Camara resolveu que, pelo estilo da precedente, fosse logo tractada em cada um dos Artigos de que se compõem; e não se exigindo a palavra sobre algum delles, foram todos successivamente lidos e approvados; ficando-o por isso a referida Proposição tal qual havia sido remettida da Camara Electiva; do que se mandou lavrar Decreto, para subir á Sancção Real.

O Sr. Vice-Presidente: — Devo inteirar a Camara que tambem houve uma equivocação na dos Senhores Deputados, lançando uma Proposição para fazer extensivas á Ilha da Madeira o Decreto das Côrtes relativamente nos Governos do Ultramar; isto, digo, foi um puro equivoco, por quanto acaba de chegar uma participação para o corrigir, a qual acompanha outra Proposição para applicar áquella Ilha o que sobre a cultura do tabaco se acha decretado para as dos Açôres; por conseguinte aquella primeira Proposição deve intender-se como se não fôra remettida a esta Camara, e em logar della discutir-se a seguinte

Proposição.

Sobre serem extensivas ás Ilhas da Madeira, e Porto Santo as disposições do Decreto de 18 d'Abril de 1835.

Art. 1.º As disposições do Derreio das Côrtes Geraes, datado de 18 d'Abril de 1835, sobre ser o Governe auctorisa lo se o julgar conveniente, intendendo-se previamente com os actuaes contractadores do tabaco, a permittir a cultura desta planta em todas as Ilhas dos Açôres, assim como a liberdade da exportação da sua folha, e a sua fabricação, são extensivas ás Ilhas de Madeira, e Porto Santo.

Art. 2.º Fica revogada a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 18 d'Abril de 1335. — Antonio Marciano de Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario. — José Marcellino de Sá Vargas, Deputado Vice-Secretario.

Terminada esta leitura disse

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O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Como se tracta simplesmente de uma auctorisação, não me opporei a que passe essa Proposição, ainda que talvez fosse de contraria opinião se se tractasse de decretala de uma maneira obrigatoria para o Governo; por quanto pela auctorisação que passou em outra Sessão diminuiu o contracto trinta ou quarenta contos de réis, e agora extendendo-se aquella medida á Ilha da Madeira, haverá talvez tanta, ou maior diminuição; comtudo repito que me não opponho a que se conceda a auctorisação julgando-se util, e sem inconvenientes, postoque deva dizer á Camara que o Governo a este respeito não póde desde já emittir uma opinião decisiva.

O Sr. Vice-Presidente: — Como é uma simples auctorisação parece que não haverá duvida.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Não Senhor.

Como se não produzisse outra observação, foi a mencionada Proposição posta á votação e approvada; mandando-se tambem reduzir a Decreto para subir á Sancção Real.

O Sr. Vice-Presidente: — As discussões das Leis estão acabadas. — Agora pergunto á Camara se será conveniente que se emende a equivocação com que d'aqui foi para a outra Camara a Lei da Administração; por quanto tendo eu escripto ao Presidente da dos Senhores Deputados a carta que li, e não tendo até agora recebido uma resposta cathegorica a este respeito, lembrava-me que talvez o melhor fosse fazer um novo Projecto de Lei, declarando nelle que os Secretarios dos Administradores de Districto, terão em seus ordenados o mesmo augmento que para estes se estabeleceu.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu creio que este negocio já está terminado.

O Sr. Vice-Presidente: — Está terminado, mas a legalidade com que cumpre tractar as decisões da Camara, faz com que eu lhe represente o que houve, a este respeito.

O Sr. Conde da Taipa: — Sr. Presidente este negocio está acabado, e parece-me que o melhor é ficar assim.

O Sr. Souza e Holstein: — V. Ex.ª segundo me disse ignora se a carta do Presidente da outra Camara foi escripta antes ou depois de alli haver noticia do caso; por isso parecia-me conveniente verificar esse facto primeiro que se tomasse resolução alguma.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Pelas informações que tive antes de entrar para a Sessão, vim a saber que na Camara Electiva passaram as emendas que foram no authographo desta Camara, sendo quasi cinco horas; portanto agora acho desnecessario, ocioso, e inutil votar de novo sobre a questão, porque seria o mesmo que votar para traz.

O Sr. Marquez de Loulé: — Eu creio que é indifferente que a carta que V. Ex.ª acaba de receber, fosse escripta antes ou depois de haver noticia na outra Camara do equivoco com que desta foi o authographo da Lei. O negocio em questão já foi tractado, e a Camara julgou dever participar á dos Senhores Deputados que o dito authographo não ía na conformidade do vencimento; portanto o negocio agora é todo da outra Camara, e por conseguinte acabou para nós.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Parece-me que em todo o caso se tracta de uma questão que em si não tem grande entidade quanto ao fundo; entretanto o mais acertado creio que será já agora approvar a redacção da Lei como daqui foi.

O Sr. Vice-Presidente: — Perdôe V. Ex.ª, mas como não assistiu á discussão, talvez não saiba que a Camara votou o contrario do que apparece escripto.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares: — Agora mesmo chega um Officio da outra Camara, a respeito do objecto em questão: eu o leio.

Assim o fez o Digno Par; é como se segue

Officio.

Illm.º e Exm.º Sr.

Tendo sido presente a esta Camara, o Officio que V. Ex.ª acaba de me dirigir ácerca de qual tinha sido a decisão da Camara dos Dignos Pares do Reino a respeito dos Ordenados dos Secretarios dos Magistrados Administrativos de que tracta o Artigo 4.º do Projecto sobre as bases da Administração geral, cumpre-me participar a V. Ex.ª para conhecimento da referida Camara dos Dignos Pares, que havendo sido examinadas por uma Commissão Special as emendas feitas na Proposição que tinha ido desta Camara sobre similhante assumpto, e approvado o Parecer que sobre ellas se offereceu foram reduzidas a Decreto, como já partecipei a V. Ex.ª, e os authographos foram entregues á respectiva Deputação. Nestes termos resolveu esta Camara não poder tomar conhecimento do objecto do referido Officio, por ter dado ao negocio o seu ultimatum. O que tudo V. Ex.ª se servirá de fazer presente a essa Camara. — Deus Guarde V. Ex.ª Palacio das Côrtes, em 18 de Abril de 1835. = Illm.º e Exm.º Sr. Francisco Manoel Trigozo d'Aragão Morato, Vice-Presidente da Camara dos Dignos Pares do Reino. = Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente.

Finda a leitura, disse

O Sr. Marquez de Loulé: — Á vista desse segundo Officio, não me resta outra cousa senão pedir aos Senhores Ministros que se acham presentes, aconselhem Sua Magestade a Rainha a fim de não dar a Sua Sancção a esta Lei por não ter sido approvada, em ambas as Camaras.

O Sr. Vice-Presidente: — Eu já tinha proposto um meio de evitar isso.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu creio que não será difficil achar um meio de remediar este engano; se houve alguma culpa neste erro foi desta Camara, e não da dos Senhores Deputados; por consequencia a esta Camara pertence tomar um precedente para que isto não torne a acontecer; mas já agora não devemos embaraçar que a Lei seja sanccionada, pois que passou de boa fé e portanto seria de opinião que se chamassem os Membros da Camara que estão fóra da Salla, e que decidissemos este negocio de alguma maneira.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Eu não sei como podesse haver equivoco; tinha-se proposto que se augmentassem quatrocentos mil réis a cada um empregado e comprehendendo o Artigo mais de uma pessoa, está claro que todas eram comprehendidas no augmento; portanto repito que não sei como podes-

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-se haver similhante equivoco! — Como eu votei contra o Artigo e contra qualquer augmento, posso fallar nisto alguma cousa menos prevenido do que os Dignos Pares que votaram a favor.

O Sr. Vice-Presidente: — Primeiro julgou-se que o authographo tinha ido em conformidade com o vencido, mas depois ao lêr-se a Acta pareceu haver engano e consultado o Tachygrapho a este respeito disse estar redigida segundo a votação; reconhecendo-se assim a verdade do facto officiei ao Presidente da Camara Electiva que responde com o Officio que ainda ha pouco os Dignos Pares ouviram ler: eis-aqui como passou este negocio.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Tinha tomado a palavra para dizer á Camara que talvez podesse haver algum inconveniente em fazer reviver esta questão. Estou persuadido que isto foi méramente um engano, e que não ha increpação que fazer a ninguem, porque certamente da parte de ninguem houve intenção de alterar o que se venceu na Camara: houve sim alguma differença no modo de interpretar o dicidido, e uma dessas intelligencias, foi a que se inseriu na Proposição que passou á outra Camara; essa foi alli approvada, e em consequencia reduzida a Decreto. Ora como se não tracta senão de remediar um erro involuntario, parece que se esta Camara declarar que rectifica o sentido em que o Projecto de Lei aqui foi redigido e remettido á outra Camara, parece digo que desapparecerá qualquer supposta illegalidade, tendo logar uma segunda votação fundada em rasão tão forte. Portanto peço se ponha á votação se a Camara adopta por uma segunda votação sendo necessario, a redacção da Lei em questão tal qual foi para a outra Camara.

O Sr. Ministro da Marinha: — Levanto-me para dizer que as reflexões que o Sr. Marquez de Loulé fêz sobre este objecto parecem justas; claro é que houve equivocação, e eu assim o intendo, mas é preciso attender á precisão em que nos achâmos agora de remediar as cousas. Sabe-se tambem que na Camara dos Senhores Deputados passou a Lei com a melhor boa fé, julgando-se que o authographo que se lhe remettera, fôra na conformidade do que aqui se approvou; porém depois que se conheceu o engano já se lhe não podia dar remedio; e então o unico recurso que restava era remetêlo a esta Camara, se para isso tivesse havido tempo; porém uma vez que o não houve e o Projecto subio á Sancção, já acho tarde para se remediar; visto ter elle passado em boa fé. Por conseguinte não acho justo o propôr-se a Sua Magestade que não dê a Sancção a uma Lei que passou com todo o cunho de legalidade; e tanto que eu pela minha parte, como Ministro da Corôa hesitaria muito em dar similhante conselho á Rainha.

O Sr. Margiochi: — Parece-me que uma votação sobre Lei já expedida não póde ter logar; porém o que a Camara poderia fazer a este respeito, era declarar que se não julgava offendida nas suas prerogativas, por a mesma Lei assim passar; pois que tendo approvado o mais, tambem approvava o menos; e por maior rasão visto não ser em detrimento da Fazenda Nacional. A Camara assim mostrará que se não

offende de que a Lei se publique; mas em todo o caso este negocio deve ficar entre as duas Camaras sómente.

O Sr. Marquez de Loulé: — Levanto-me simplesmente para dar uma explicação á Camara, relativa ao sentido em que ha pouco fallei neste negocio; e o interesse que tinha um que se rectificasse não era por me querer oppôr ao que fez a Camara dos Senhores Deputados, porque eu não votei pelo augmento dos Ordenados, proposto nesta: mas insisto em fallar na materia para que se vejam bem os inconvenientes que pódem resultar de tractar com pouco cuidado objectos de tanta importancia; pois realmente a posição em que nos achâmos é muito desagradavel. Entretanto não me opponho a que se tome qualquer medida para arranjar este negocio, accrescentando que estou persuadido de que a Camara Electiva obrou com a melhor fé a este respeito, porque o authographo da Proposição lhe foi daqui remettido de maneira que ella o approvou tal qual; mas a incoherencia que aqui houve em redigir a Acta de um modo, e aquelle authografo de outro, é cousa na verdade inconcebivel.

O Sr. Vice-Presidente: — Agora não ha outro meio de remediar o que se fez, senão por uma de duas maneiras; ou confirmando a Proposição como daqui foi, ou fazendo outro Projecto de Lei a esse respeito.

Não se produzindo outra observação, propôz o Sr. Vice-Presidente, e a Camara resolveu = Que dava por sanada qualquer irregularidade que tivesse havido na redacção do authographo dirigido á outra Camara, sobre as bases da Administração Civil do Reino, na parte relativa aos Ordenados dos Secretarios dos Administradores de Districto.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares deu conta da ultima redacção da Proposição adoptada sobre o augmento de soldo aos Officiaes Subalternos da Brigada da Marinha. — Julgou-se conforme o vencido, e se mandou expedir á Camara Electiva.

Leu tambem o mesmo Digno Par um Oficio daquella Camara, participando haver ella adoptado as emendas feitas por esta á Proposição sobre as bases d'Administração geral. — Ficou inteirada.

O Sr. Vice-Presidente: — A deputação que tem de appresentar as Leis vencidas ultimamente nesta Camara á Sancção Real, será composta dos Dignos Pares

Os Senhores Barão d'Alcobaça,

Marquez de Ficalho,

Conde de Linhares,

Visconde de Sá da Bandeira,

da Serra do Pilar,

Macedo Pereira,

Mello Breyner.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu a Acta da presente Sessão, a qual foi approvada. — Sendo meia hora depois da meia noute, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Convido a Camara para a Sessão Real, ámanhan pela hora para isso indicada.

Está fechada a ultima da Camara dos Pares da presente Sessão de Legislatura.

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