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16 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

representante verdadeiro e legal da nação. A Carta Constitucional - e folgou de ouvir o Sr. João Franco pugnar pelo seu respeito - diz que a unica e efficaz salvaguarda das garantias individuaes reside no justo equilibrio dos differentes poderes do Estado.

Pois ha quasi dois annos que o poder legislativo é arrastado, escarnecido; não tem havido sessões regulares e o funccionamento das Côrtes está sujeito ao capricho, ao sabor, á vontade despotica dos Governos. Onde está então o justo equilibrio dos differentes poderes do Estado ? Ao poder moderador cabe manter esse equilibrio. E a sua funcção primacial. As Côrtes têem o direito e o indeclinavel dever de velar pela guarda da Constituição e do seu paiz. Pois em nome d'esse imperioso dever civico é que elle, orador, levanta a voz para dizer á camara, ao paiz e ao Rei, com acatamento sim, mas tambem com a hombridade e o desassombro dos antigos portugueses, que é necessario acatar as prerogativas do poder legislativo, que as Côrtes funccionem regularmente, de sorte que mio sejamos uma excepção em relação aos outros paizes constitucionaes.

O Sr. Presidente: - Lembra ao Digno Par que é a hora de entrar na ordem do dia.

O Orador: - N'esse caso pede a S. Exa. se digne consultar a Camara sobre se permitte que elle, orador, continue no uso da palavra.

(Consultada a Camara, resolve esta que o Digno Par Sr. Jacinto Candido continue falando).

O Orador: - Torna-se necessario que o poder legislativo não continue a representar o papel de mera chancella do poder executivo. lia uns tempos para cá que, após o discurso da Coroa, nos mandam embora, sem ao menos esperarem pela nossa resposta. Esta situação, unica, representa um verdadeiro estado de revolução, por ser a violação anarchica das disposições legaes.

E mister dizer a verdade, embora com acatamento e sem levantar questões pessoaes, que, sendo irritantes e deprimentes, dislocam a discussão dos verdadeiros interesses vitaes do paiz. Mas do que se trata agora é de uma questão de principios.

O programma do partido nacionalista declara a necessidade de manter-se a autonomia entre os differentes poderes do Estado e o legislativo, que deve regular-se pela sua auctoridade propria, e não pelos caprichos de quaesquer Governos.

Ultimamente só tem visto o engrandecimento do poder executivo com dictaduras, adiamentos, dissoluções e auctorizações parlamentares. Com eleições feitas e sem que se esperasse pela convocação das Côrtes, tem visto ainda derrubar Ministerios. Bem sabe que El-Rei não podia suspender a continuidade do poder executivo, mas tudo indicava que na actual conjuntura se houvesse organizado um Ministerio de caracter extra-partidario e que, após, ouvidas as Côrte, fosse então adoptada uma solução definitiva do problema politico. Pois não era isto que havia a fazer? Como se explica que já se apregoe a necessidade de dissolver as Côrtes?

N'um discurso por elle, orador, proferido n'esta Camara em 13 de fevereiro de 1903, já ventilara a mesma questão e chamara a attenção do Monarcha para tal assumpto. Recorda-se ainda das palavras então proferidas pelo Sr. José Luciano, quando S. Exa. mostrava o perigo de recorrer amiudadamente aos favores da Corôa para que os factos pessoaes não ficassem tão a descoberto.

Apoiara então S. Exa., e o apoio assim prestado subira de ponto quando o Sr. José Luciano protestava contra a falta de respeito pela Constituição, chegando a declarar que se tudo não entrasse em vida nova abandonaria a sua carreira politica.

Triste decepção! Novamente chamado aos conselhos da Corôa o Sr. José Luciano, o poder legislativo ainda era peor tratado, escarnecido, adiadas e dissolvidas as Côrtes, que não chegaram a funccionar senão para dar ensejo ás verrinas do Sr. José Luciano contra os dissidentes, e d'estes contra o Sr. José Luciano. E foi para isto que os nossos maiores derramaram sangue nas luctas da liberdade?!

As incoherencias são terriveis nos seus effeitos. Lá temos agora o Sr. José Luciano a prestar apoio ao Sr. João Franco, o que deve ser para o orgulho politico do Sr. Presidente do Conselho o seu maior triumpho.

Vae já longe o tempo em que na politica portugueza tinha curso o axioma de que o Rei era a força. Pois a elle, orador, parece lhe que nunca como hoje tal axioma tem cabimento. Teem os Reis os seus logares marcados nas Constituições, mais ai d'aquelle que saía fora da sua esphera de acção!

O Sr. Presidente: - Lembra ao orador que tem de restringir-se propriamente ao assumpto.

Vozes: - Não saíu da ordem.

O Sr. Presidente: - O Digno Par não pode discutir a pessoa do Rei.

O Orador: - Tem, como todos, o mais subido respeito pela pessoa do Rei. Mas está discutindo actos e não pessoas, e d'esse direito não prescinde. (Apoiados dos Dignos Pares Srs. Sebastião Baracho e José de Alpoim). O que acaba de dizer já antes o dissera no discurso a que ha pouco se referiu.

O Sr. Presidente: - Satisfaz-se com as declarações do Digno Par.

O Orador: - Desculpe a Camara o seu ardor, mas é que vem tonificado pelo ar das montanhas onde esteve, e d'ahi o parecer talvez rude. As considerações que acaba de fazer, já o Sr. José Luciano as expusera n'esta mesma Camara.

Sempre que a Corôa saía da orbita de acção que lhe está marcada, entra no dominio da discussão, passa a ter responsabilidades moraes, que não podem ser julgadas por quaesquer processos ordinarios, mas sim extraordinarios.

Ha de sempre pugnar pelas regalias do poder legislativo. Tinha feito a si mesmo a promessa de que, aberto o Parlamento, ali as viria defender, fossem quaes fossem as circumstancias. Desempenha-se pois d'essa promessa.

Pelo que respeita ao programma do Governo aguarda, para discutil-o, a resposta ao Discurso da Corôa, se acaso agora não continuar a ficar sem resposta como tem acontecido aos ultimos...

O Sr. Sebastião Baracho: - Já ha três, nessas circunstancias.

O Orador: - Então dirá o que entender, embora declare desde já que folga em ver no programma do Governo mencionadas algumas das medidas que fazem parte do programma politico do seu partido, taes como descentralização administrativa das colonias, independencia judicial e reorganização das forças de mar e de terra.

Poderão ter parecido descabidas as considerações que acaba de fazer, mas, como ultra-conservador que é, não pode deixar de apregoar o respeito á lei, visto que abandonado esse caminho se entra na anarchia e para ahi é que o não arrastara nem a sua indole nem as suas convicções.

Quer o respeito á lei, pois a força que d'elle deriva é a unica capaz de amansar as ondas revoltas da mais violentos despeito". Falou em nome da lei e dos interesses conservadores.

(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra, e em appendice, quando S. Exa. tenha revisto as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): - Tres Dignos