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SESSÃO N.° 3 DE 9 DE FEVEREIRO DE 1906 19

descredito pessoal do commerciante, tem progredido de anno para anno.

Quando, em consequencia da crise financeira, que tomou a sua maior evidencia em 1891, o cambio de Lisboa sobre Londres desceu, ainda no Douro se faziam avultadas compras. O agio do ouro subiu, até attingir cerca de 90 por cento em 1898. O producto da collocação dos vinhos do Porto nos mercados estrangeiros era recebido em ouro. Pela pipa de vinho do Porto vendida em Londres por 20 libras realizava-se no reino, em 1898, 171$000 réis. Quando o premio do ouro era, - e em volta da correspondente divisa oscillou o cambio sobre Londres, - de 50 por cento, cada pipa de vinho vendida por 20 libras produzia no reino 135$000 réis.

D'ahi a melhoria dos preços de acquisição dos vinhos do Douro e, portanto, os recursos de que os seus habitantes se serviram para poderem replantar em grande parte as suas vinhas.

Hoje, com um premio do ouro de 4 por cento, uma pipa de vinho nas circumstancias acima referidas produz apenas, em moeda corrente, 93$600 réis.

Alguns commerciante vendo diminuir os seus lucros pela reducção do premio do ouro, procuraram compensar-se do prejuizo, obtendo a materia prima mais barata onde mais barata ella é, sahindo do Douro.

A melhoria economica do paiz, traduzida na alta cambial - pela qual todos nos devemos felicitar - foi, todavia para o Douro, de consequencias menos felizes.

A preterição dos seus vinhos pelos do sul, e a queda do premio do ouro, fizeram a sua ruina, o que é grave, e promettem fulminar o nosso principal ramo de exportação e, portanto, de riqueza economica, o que é gravissimo.

Chegou tarde a reacção, mas chegou.

A ferida é larga e profunda. Precisa-se poderoso cauterio, de medicação decisiva, energica e de resultados promptos, sem o que veremos em breve perdida pela necrose uma parte importantissima do nosso organismo só ciai. A enfermidade aggravou se muito ha cerca de dois annos. Já em 1901 despertou a attenção do Governo. Pelo decreto de 14 de junho de 1901 foi concedido o premio de exportação réis l$000 por cada pipa de vinho licoroso e do Porto, exportado para países estrangeiros. Foi um beneficio grande feito ao commercio de vinhos do Porto, representando apreciavel sacrificio para as finanças do Estado. A importancia liquidada por esses premios foi de 46:641$000 em 1902; 40:894$000 em 1903; 35:718$000 réis em 1904.

Ainda na lei de receita e despesa para o exercido de 1903-1904 foi revogada a disposição da lei de 12 de abril de 1892, que mandava cobrar 5 decimos de real por cada litro de vinho exportado pela barra do Porto. Esta medida correspondeu a prescindir o Thesouro de uma receita que então fôra calculada em 27:800$000 réis. Sacrificios grandes são estes feitos pelo Thesouro, mas que, infelizmente, não evitaram o mal de que o Douro enferma hoje, talvez porque não era o Douro que recebia o beneficio, mas os que pela barra do Porto exportavam os vinhos, que n'outras regiões adquiriam.

É isto que precisa de remedio radical nos seus effeitos. Só para defender a região do Douro? Não. Tão interessada na questão devia estar a cidade do Porto, cuja decadencia economica é manifesta. Sem haver necessidade de procurar outras explicações, encontra se no desvio que se vem fazendo na acquisição dos vinhos destinados á exportação pela barra do Porto.

É tão intuitiva a explicação, que de estranhar é que a cidade do Porto se não tenha collocado á frente das reivindicações que o Douro pede para os seus vinhos. Dos 7:226 contos de réis, que representaram o valor do vinho do Porto exportado em 1886, a sua maxima parte refluia para a cidade do Porto. O lavrador do Douro não capitalizava os seus rendimentos. O amanho das suas vinhas consumia-lhe a maior parte das suas receitas, em salarios alguns, mas em bacalhau e arroz, que constituem a base da alimentação das classes operarias, em assucar para as classes abastadas, em tecidos, em alavancas, pás, carretas e outros utensilios de lavoura. O producto da venda dos vinhos na sua maior parte refluia para a cidade do Porto, cujo movimento commercial animava. Hoje, se é certo que, como em 1904, o valor do vinho do Porto exportado já desceu para 4:630 contos de réis, não o é menos que, sendo comprado em regiões cujo centro commercial não é a cidade do Porto, é fora d'esta que o producto da venda do vinho ha de ser empregado. O Douro vae a caminho de absoluta ruina. Se lhe não valerem a tempo, a cidade do Porto ha de fatalmente tirar de tal situação perniciosas consequencias. É isto tão obvio, que é de estranhar que assim não tenha sido comprehendido pelas entidades que primam em defender os interesses da segunda cidade do reino.

No Douro reconheceu-se que era chegada a hora de fazer intervir os poderes publicos. Pela propaganda, intelligente e suggestiva, como a do Sr. Alfredo Pessanha, pela acção, tenaz e insistente, dos Srs. Dr. Julio Vasques, Torquato de Magalhães, Affonso Chaves, Porphirio Rebello, Macedo Pinto e de alguns outros dedicados á causa, a questão do Douro é já tida como um dos grandes problemas nacionaes a resolver.

O Douro não estende a mão á caridade do Estado; somente quer que lhe defendam o que é seu; isto é, que com o seu nome se não exportem productos bem diversos, pelo local em que são produzidos e pela qualidade. O industrial tem uma lei a proteger os productos da sua invenção, e, por isso, são propriamente seus. Quem lh'os imitar, pratica uma fraude punivel pela lei.

Só o Douro ha de ver de braços cruzados, como se fôra seu, que se exporte vinho que vae procurar os seus mercados para lhe fazer concorrencia pela offerta, e o seu descredito pela inferior qualidade! Não. Não deverá mais acontecer assim.

O Douro tem direito a ser defendido.

Protegeu se por uma lei o alcool industrial, com o fundamento de que era preciso auxiliar a população de S. Miguel e da Terceira na collocação da sua batata doce. Nem sequer se hesitou em proteger o alcool industrial n'um paiz que soffre de uma plethora de vinho e, portanto, de aguardente de vinho!

Protegeu-se por uma lei a agricultura cerealifera, por maneira que no nosso paiz se consome o pão por um preço exageradamente caro. Em nenhuma cidade do mundo se consome o pão pelo elevado preço por que se vende em Lisboa.

Pela pauta de 1892 protegeram-se as nossas industrias, e o furor proteccionista custa ao Thesouro quantiosas sommas na defesa de algumas industrias que não teem razão de existir. Protegemos os productos coloniaes, cobrando d'elles apenas 50 por cento dos direitos cobrados por mercadorias similares estrangeiras.

Protegemos a navegação portugueza com leis diversas, e principalmente, com os privilegios de cabotagem dados á navegação portugueza para a costa Occidental da Africa.

Protege-se a agricultura do sul do paiz com privilegios a companhias vinicolas, com estações de distillação, premios para os vinhos de pasto de typos regionaes e marcas registadas que entrarem no consumo da cidade de Lisboa; premios de 250 réis por hectolitro de vinho de pasto nas mesmas condições que fôr exportado, garantias dadas a warrants aos productores de aguardente, conservando-a em seu poder, armazens geraes para a aguardente. Somente o Douro não tem pro-