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38 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Um correligionario meu dizia-me que tinha uma grande dificuldade n'uma freguesia porque aquelles que lá tinham maior influencia se negavam a acompanhar os seus antigos amigos, porque se os acompanhassem, diziam elles, o Governo não os deixaria vender o vinho, tal era a ideia de que o Governo, por medidas de caracter eleitoral, queria incluir ou excluir os concelhos de Murça e Valpaços da região do Douro.

Na primeira sessão d'esta casa, recebi eu uma representação da Camara Municipal de Murça, pedindo me que a enviasse para a mesa d'esta Camara, em que ella reclamava contra a injustiça que lhe foi feita no decreto de 30 de julho.

Vi a injustiça a caminho de ser reparada, mas não me dispensei de mandar para a mesa a representação que recebi para cumprir o meu mandato.

E certo, Sr. Presidente, que o Governo apresentou uma proposta de lei para resolver a questão; não a venho discutir agora, não a venho contrariar e muito menos fazer politica de um assumpto tal como este, mas desejo fazer umas perguntas ao Governo para procurar a tempo collaborar com elle, para que a proposta deixe de ser o que é, e se torne uma proposta de lei viavel.

Devo dizer a V. Exa., Sr. Presidente, que n'esta questão falo só em meu nome. Não tenho procuração dos lavradores do Douro para apresentar quaesquer opiniões ou alvitres, tendentes a beneficiar os seus interesses, assim como não tenho procuração dos lavradores do sul.

Falo em meu nome só, com a minha responsabilidade só, e falo pelo conhecimento pessoal que tenho do assumpto, e com aquella isenção, com que costumo tratar todas as questões.

Tem-se alvitrado para salvação do Douro o constituir-se uma companhia monopolizadora da exploração d'aquella região, o que é incomprehensivel; tem-se alvitrado a restricção da barra do Douro, que é o principio adoptado na proposta de lei apresentada pelo actual Governo; tem se alvitrado o systema de prover por maneira indirecta á exportação pela barra do Douro, e este é o meu projecto.

O que é que se fez no projecto que foi apresentado ás Côrtes?

Apresentou-se uma ideia, que pode ter dificuldades na sua execução, mas que é digna de approvação: é a restricção da barra do Douro á exportação de vinhos licorosos que não sejam do Douro.

É uma ideia que anima e até certo ponto dá satisfação aos interesses do Douro, mas esta proposta, este alvitre, estas bases fundamentaes são rodeadas de taes difficuldades que Sr. Presidente, chego a recear que ella soffra quebra, na sua viabilidade, e a questão continue a ser uma questão morta.

.E sempre difficil fazer uma lei de excepção que sirva determinados interesses economicos, e, sendo difficil fazer uma lei nestas condições, a difficuldade sobe de ponto quando a essas excepções a essas restricções outras se addicionam.

O Governo restringe, na proposta que apresenta ás Côrtes, a barra do Douro á saida de vinho licorosos.

O Governo estabelece na proposta de lei apresentada ás Côrtes que exclusivamente os vinhos da região do Douro podem sair pela barra do Porto. Mas ainda ha mais restricções na proposta. Restringem-se na area do Douro as qualidades de vinhos que se podem cultivar, restringem-se os lavradores que podem produzir vinhos, restringem se os titulos e as marcas, e até os commerciantes que podem importar vinho.

Não é preciso dizer mais nada, para quem tem conhecimento das difficuldades que acompanham uma proposta d'esta ordem. Com tantas restricções, a satisfação não pode ser completa, mas com umas ligeiras modificações o Porto acceita como boa a proposta, sendo tambem preciso harmonizar todos os interesses para que a proposta seja viavel.

O commercio do Porto protesta contra a proposta de lei apresentada ás Côrtes, e no sul a agricultura vinicola protesta tambem contra a applicação d'essa proposta em circumstancias que dificultam a sua viabilidade, e eu vejo que a questão do Douro ameaça continuar sem resolução.

A exportação dos vinhos do Douro tem diminuido em quantidade e em valor. Emquanto os vinhos finos de primeira qualidade são offerecidos a 12$000, 1$$000 e l8$000 réis, para cada uma plantação é necessario gastar por vez 800$000, 900$000 e 1:000$000 réis. Os do sul são exportados pela barra do Douro e calcula-se em 50:000 pipas a exportação d'esta região.

Levanta-se o Douro e diz: eu não lucto contra os interesses de ninguem; não combato os interesses da viticultura do sul; mas, com o nome de vinho do Douro, exporta-se vinho que o não é. Isto representa aos olhos da justiça uma offensa aos nossos direitos e reclamamos providencias do Governo. E apresentada uma proposta que é fundamentalmente justa. O Governo providencia. O Governo tem a opinião que ao Douro se deve dar o que é do Douro e não figure como sendo do Douro o que de lá não é. Isto é muito justo, mas é preciso dar uma satisfação a todos os interesses. Foi, pois, para dar satisfação a todos os interesses prejudicados, que eu, estabelecendo processos muito simples para distinguir os vinhos generosos que podem ser exportados pela barra do Douro, tratei de harmonizar todos os interesses antagonicos.

Eu não comprehendia, como não comprehendo, que n'um paiz que lucta com abundancia de vinhos, que lucta com uma verdadeira plethora de vinhos, que excede muito as necessidades do consumo interno e externo, eu não comprehendo que, luctando a agricultura viticola com uma crise que deriva da superabundancia de vinhos e da difficuldade de aguardente extrahida do vinho, não comprehendo que esta crise possa existir com um regimen de alcool industrial, não comprehendo que a aguardente de vinho continue muitas vezes armazenada pelos productores, e se vendam oito a nove milhões de litros de alcool industrial. (Apoiados).

Sr. Presidente: por ser assim, eu no projecto de lei, que tive a honra de mandar para mesa, harmonizava como entendia os interesses do Douro, com os interesses da agricultura do sul, e com os dos fabricantes de alcool, que tambem eram legitimos.

Pode-se dizer que o vinho applicado no fabrico de aguardente tem um preço que não é remunerador; mas eu devo afirmar a V. Exa. que os commerciantes do Porto, que compram grande porção de pipas de vinho para misturar com os vinhos do Douro, não lhe dão um preço que remunere o productor.

O meu projecto estabelecia a prohibição do alcool industrial, dificultava a importação do alcool estrangeiro,, ficando a adubação a ser feita exclusivamente com aguardente de vinho. D'esta maneira não se podia o sul queixar de ser preterido nos seus interesses, por excepções feitas a favor do Douro, e tanto se não podia queixar que se não queixou.

O projecto teve uma larga distribuição, não digo que tivesse um coro unanime de applausos, mas a verdade é que foi recebido com completa approvação, e não houve ainda um unico signal de dissentimento contra elle.

Podia alguem manifestar o seu desacordo ás ideias do projecto, suppondo que elle me trazia a minha fortuna politica, mas o certo é que no sul não houve discrepancia, e a approvação foi, portanto, unanime.

O projecto foi tambem recebido com applauso na região do Douro e obteve applauso manifesto do commercio dos vinhos do Porto, o que prova que foi bem elaborado.

Mas tambem se comprehende que não se podia reduzir á miseria os capitães empregados nas fabricas de ai-