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SESSÃO N.° 4 DE 10 DE OUTUBRO DE 1906 51

O Sr. Presidente do Conselho declarou hontem assumir a responsabilidade do que se tinha feito depois do dia 20 de maio.

Pois então ainda não estava concluida a investigação policial e o Sr. Presidente do Conselho, sem sequer procurar inteirar-se do que essa investigação produzia, ordenou que fosse remettida para o poder judicial?

S. Exa. abdicou de uma attribuição sua, porque, desde que esse processo era necessario para a applicação de penas disciplinares, conhecesse dos resultados que dava a investigação e procedesse consoante os que se apurassem.

Isto absolutamente em nada prejudicava a acção dos tribunaes, o regular andamento dos processos que fossem instaurados.

Não o fez; não o quiz fazer?

A responsabilidade é sua.

Mas o que S Exa. não pode, o que não tem o direito de fazer é arguir-me de eu ser peco no cumprimento dos meus deveres em presença dos factos occorridos, quando S. Exa. mais não fez, antes menos, do que eu proprio fizera.

Demonstrado como fica que não dei ordem para se acutilar o povo de Lisboa, que não autorizei violencias nem crueldades, repugnantes ao meu caracter e ao meu sentir, mas apenas cumpri a lei, porque esse cumprimento era o meu dever, cabe-me o direito de perguntar como é que o Sr. Presidente do Conselho tem deixado correr, na imprensa que lhe é affecta, que fui eu que mandei acutilar o povo de Lisboa?

Prove-o.

Intimo-o a que o prove.

E com isto tenho dito. Vozes: - Muito bem.

(O Digno Par não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): - Ao ouvir a primeira parte do discurso do Digno Par Hintze Ribeiro, eu nem sequer estava disposto a pedir a palavra.

S. Exa. fazia a explicação e justificação dos seus actos, e não seria eu, de forma alguma, quem procurasse apresentar-lhe qualquer contestação.

Mas desde que, na segunda parte, o Digno Par, deixando a sua propria defesa para fazer a minha arguição, terminou de uma forma tão intimativa, V. Exa. comprehende que é do meu dever, o mais imprescriptivel e rigoroso, responder a S. Exa. dando-lhe e a toda a Camara explicação plena dos meus actos.

Disse o Digno Par que na sessão de hontem eu o tinha arguido.

Ora eu não dirigi a S. Exa. arguição absolutamente nenhuma.

Nem fui eu quem trouxe á discussão o assumpto de que se trata, nem aqui vim de motu proprio.

Vim, porque o Digno Par João Arroyo se dirigira ao Governo desejando saber que destino tivera a syndicancia ordenada pelo Sr. Hintze Ribeiro só ore os acontecimento" de 4 de maio; e porque o Sr. Ministro da Justiça, que não tinha conhecimento proprio da materia, respondeu que me transmittiria o desejo manifestado por aquelle Digno Par.

Apressei-me a vir immediatamente ao Parlamento, por um dever de cortesia e consideração para com a Camara e para com o Digno Par que se me dirigira, a fim de dizer precisamente o que se passara.

E como na mesma sessão o Sr. Hintze. Ribeiro acrescentou que, alem da syndicancia que mandara fazer por intermedio do commandante da policia, recommendara ao juiz de instrucção criminal que instaurasse um processo acêrca dos factos occorridos, entendi que me corria o dever de explicar á Camara a razão por que, trazendo a copia da syndicancia, nenhuma informação podia dar sobre o segundo ponto a que o Sr. Hintze Ribeiro se referira.

Esta foi exactamente a minha exposição na sessão de hontem, em que absolutamente não argui ninguem, não accusei ninguem, nem trouxe á discussão quaesquer elementos ou factos que a pudessem alargar ou restringir.

E se digo isto, é, não pelo receio, que não tenho, de quaesquer consequencias que pudessem provir de ser-me attribuida uma arguição que não fizera; mas simplesmente pela comprehensão dos deveres do cargo que occupo, que me não permitte arguir ninguem, más tão somente justificar os meus actos.

Simplesmente para me defender da arguição que me fez o Digno Par Hintze Ribeiro na segunda parte do seu discurso, preciso referir os factos taes como foram do conhecimento official do Governo desde o dia 20 de maio em que assumi a Presidencia do Conselho, embora os decretos de nomeação dos Ministros tenham a data de 19 de maio.

No dia seguinte eu quiz saber pelo commandante da policia o que havia acêrca dos acontecimentos de 4 de maio, e assim a primeira pergunta que lhe fiz foi quaes eram as instrucções que o Sr. Presidente do Ministerio transacto tinha dado relativamente á manifestação que se sabia estar preparada para quando chegasse o Sr. Bernardino Machado.

O commandante da policia disse-me o teor das instrucções que tinha recebido; as quaes eu desejei que elle escrevesse, a fim de que, vindo eu aqui referil-as, não pudesse por qualquer palavra minha produzir na Camara uma impressão diversa d'aquella que poderiam produzir as suas palavras.

O que o commandante da policia disse textualmente, e está escripto e assignado por elle, foi o seguinte:

"Instrucções dadas pelo exmo. Presidente do Conselho ao commandante da policia relativas ao serviço policial na noite de 4 de maio do corrente anno, na estação do Rocio, á chegada do Sr. Conselheiro Bernardino Machado:

"Prevenir com antecedencia os maioraes do partido republicano que n'essa occasião ali se encontrassem, que se lhes não permittiam gritos subversivos, nem manifestações contra as instituições, permittindo-se-lhes unicamente vivas e palmas a qualquer individuo, á liberdade e á patria; fora da estação não consentir manifestação de qualidade alguma. No caso de não serem acatadas estas advertencias e haver manifestações hostis, a policia empregaria toda a energia para as acabar e restabelecer a ordem publica. = José A. de Moraes Sarmento".

N'este documento não ponho, não accrescento, nem omitto uma unica palavra; não faço senão referir ou ler perante a Camara aquillo que pelo commandante da policia me foi dito.

O Sr. Sebastião Baracho: - Essas instrucções foram dadas por escripto?

O Orador: - O que sei é que estão aqui reproduzidas por escripto e assignadas pelo commandante da policia.

Sr. Presidente: este foi o primeiro facto de que tive conhecimento.

E a mim não me competia averiguar senão uma cousa: quaes os factos, as occorrencias, que se haviam dado desde 4 de maio até ao dia 20, em que eu assumia as responsabilidades do Governo.

O que é que tinha havido entre o dia 4 e o dia 20?

Não se trata de uma queda Ministerial immediata a esses factos.

O Ministerio presidido pelo Sr. Hintze Ribeiro, no qual tambem S. Exa. era Ministro do Reino, occupou ainda os Conselhos da Coroa durante quinze dias, e este tempo era sufficiente para eu por elle poder avaliar, não por palavras, mas por actos, qual era o sentir do chefe do Governo transacto acêrca do modo como haviam sido executadas as suas instrucções.

V. Exa. comprehende que eu não tinha obrigação nem direito de me dirigir ao Sr. Hintze Ribeiro a perguntar-lhe se as instrucções dadas ao commandante da policia eram aquellas que este funccionario me referia e escrevia,