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DIARIO DO GOVERNO.
da hoje se pagavam, e ellas recahiam sobre o capital: que a collecta de um por cento nas doações se pagava em Portugal e tambem recahia sobre o capital; e que em França e na Gram-Bretanha havia tributos que recahem sobre o capital e toleravam-se. Respondia aos economistas que sendo este imposto, por occasião da transmissão das heranças, lançado com referencia ao capital por ser uns tantos por cento em relação ao valor das mesmas heranças, como era eventual e não periodico e annual, vinha a recahir sobre o rendimento liquido do primeiro anno de fruicção, que nunca era absorvido pela collecta. Que tinha mais a vantagem de ser pago quando o contribuinte melhorava de fortuna e gosava accrescimo de rendimento na occasião de pagar. Que perguntava a razão porque, sendo o imposto dos dizimos tão gravoso, e tão avultado, elle era pago tão suavemente pelos collectados? Que certamente por ser pago na occasião da abundancia e da fartura, em que o lavrador pagando um, ainda lhe restavam nove no celeiro.
Que convencido, pois, da necessidade que havia de impôr tributos para equilibrar a receita com a despeza, sem o qual equilibrio não podia haver nação nem casa bem governada, parecia-lhe ser este, pelo modo com que era lançado nestes primeiros artigos, suave e justo, e votava por, elle.
O sr. ministro da justiça, observando que a parte essencial da substituição proposta se reduzia á alteração do quantum do imposto, disse que nisto consistia o capitulo principal da lei, pois que se o principio consignado na substituição se vencesse, o negocio mudava inteiramente de figura. Que o sr. conde de Lavradio substituindo tres por cento sobre o rendimento aos tres por cento que no projecto se impunham sobre o capital, reduzia o imposto, n'uma herança (por exemplo) de cem mil cruzados, de 1:200$ a 48$ réis. — Em vista do que, e por parte do governo, declarava que seria melhor não haver tal imposição do que approva-la assim substituida, porque realmente isso importava a destruição do projecto.
Quanto ás outras provisões, que na substituição se continham, disse que na discussão poderia averiguar-se a utilidade e razão dellas, persuadindo-se de que a camara (como elle orador por parte do governo) não havia de objectar áquellas que tractavam da isenção de mais alguns estabelecimentos; entretanto que (repetia) não poder acceitar o principio essencial da mesma substituição — a mudança do quantum.
O sr. C. de Lavradio tractou de responder aos argumentos expostos pelo sr. Serpa Machado, o que fez demoradamente, apresentando além disso varias considerações geraes ácerca do projecto; seguiu-se (o membro da commissão).
O sr. V. de Oliveira, que disse não poder partilhar a opinião do auctor da substituição a respeito do assumpto que se discutia, por quanto, equivalendo a mudança de um maximo em um minimo, matava o projecto. Observou que, segundo os principios da sciencia era facil sustentar a imposição na transmissão da propriedade, quando leve, mas que a questão hoje não era essa. Que este imposto já existia pela lei de 1838, constituindo parte da dotação da junta do credito publico, a qual ultimamente fôra trocada pela quantia correspondente tirada do rendimento liquido do Estado; e por tanto, achando-se o governo obrigado á satisfação dessa quantia á mesma junta, não era já possivel alterar a base em que o projecto se fundava: que se o governo não fosse dotado com o rendimento presumivel, que aqui se estabelecia, elle seria obrigado a fazer certa despeza, que a lei determina, dos rendimentos do thesouro sem compensação alguma; e portanto a substituição não podia adoptar-se.
O sr. C. do Farrobo, declarando que não tinha estado presente quando na commissão se tractará deste projecto, pedia aos seus collegas que o quizessem esclarecer sobre se, quando no mesmo projecto se fallava em transmissão de propriedade, se entendia só que era por causa de morte, pois que, não sendo assim, via graves inconvenientes nesta lei, se iriam tributar as apolices das companhias e outros titulos similhantes, embaraçando-se assim o andamento do commercio e as transacções que com taes papeis se fazem: terminou dizendo que, se esta sua duvida se podesse obviar, não teria duvida em votar pelo projecto, quando não, desde já declarava que votaria contra.
O sr. Silva Carvalho (relator da commissão) conveio em que a theoria dos impostos excluia em geral as imposições sobre os capitaes; todavia que, em algumas circumstancias (como aquellas de que tractava o projecto), era admissivel o impôr tributos tambem nos mesmos capitaes, quando isso se fizesse na occasião em que o contribuinte os podesse pagar.
Em resposta ás citações (feitas pelo sr. conde de Lavradio) das opiniões de diversos economistas, disse que Adam Smith, as quaes elle (orador) muito se honrava de seguir, expressamente fallava neste caso, reputando toleravel um tributo sobre a transmissão da propriedade pela facilidade que tem de o solver qualquer individuo no momento em que recebe uma herança ou doação, etc.
Reflectiu, porem, que actualmente se não tractava de um tributo novo, e sim de um imposto já estabelecido pela lei de 21 de fevereiro de 18:33.
Quanto a dizer o digno par (Lavradio) que se não achava habilitado para poder votar tributos, por não saber se os actuaes bastariam, disse que o governo tinha apresentado o orçamento no principio do anno passado, e depois outro em junho, dos quaes constava o deficit existente, e que o meio de o supprir, em parte era este imposto: que a proposta respectiva, com outras de meios, se achavam annexas ao mesmo orçamento, e, além dellas, o relatorio do ministerio, em que toda esta materia vinha detalhada.
O orador insistiu na razão (apresentada pelo sr. visconde de Oliveira) sobre a substituição da importancia deste imposto pelo equivalente fornecidos á junta do credito publico directamente pelos rendimentos liquidos do thesouro, cujo projecto havia apresentado depois de consultado o tribunal, e ouvido o procurador da fazenda, concordando todos a este respeito. — Observou mais que, estando em vigor a lei de 1838, se o projecto cahisse, era necessario tambem revogar aquella lei.
Que no artigo em discussão não havia outra differença da lei actual senão o accrescentamento da palavra nomeação, a fim de que os prasos nomeados houvessem tambem de pagar este imposto.
Quanto á duvida do sr. conde do Farrobo, disse que não podiam comprehender-se nesta lei as apolices, porque a transmissão dellas se fazia de mão para mão, e aqui se não tractava mais do que de doação, legado ou successão, sendo aquelle objecto puramente commercial.
Terminou dizendo que o sr. ministro da justiça havia expendido tudo quanto bastava para rejeitar a substituição: que á razão della (annullar o projecto) se não podia dar resposta.
O sr. C. de Lavradio pediu que a sua substituição fosse remettida á commissão, (Nada se deliberou.)
Como tivesse dado a hora, declarou o sr. presidente que ámanhã se reuniriam as commissões: deu para ordem do dia de quinta feira (18) a continuação da discussão do projecto, que se acabava de interromper, e fechou esta sessão depois das quatro horas.