O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SESSÃO N.° 8 BE 3 DE FEVEREIRO DE 1896 61

sr. presidente do conselho se digna assistir ás sessões d'esta camara.

Vejo-me, portanto, na necessidade de me dirigir a s. exa., comquanto a responsabilidade dos actos a que tenho de alludir pertença inteira a outras pastas.

Sr. presidente, eu não assisti á sessão em que um digno par, o sr. conde de Lagoaça, interpellou o sr. presidente do conselho sobre as recompensas a dar a alguns dos expedicionarios.

Li nos jornaes que o digno par e meu amigo o sr. conde do Bomfim disse algumas palavras com as quaes eu concordo plenamente, e aqui tem o digno par o sr. conde de Carnide como eu demonstro, n'esta concordancia de idéas com aquelle digno par, a injustiça das censuras ao modo por que eu tenho entrado nas discussões.

O digno par o sr. conde do Bomfim disse que nenhum dos individuos que compõem a nobre classe militar fazia a menor opposição a qualquer mercê ou distincção com que o governo entendesse dever galardoar os que se distinguiram, nas campanhas de Africa.

Na outra casa do parlamento um sr. deputado apresentou uma proposta, que o sr. ministro da guerra acceitou e, não só a acceitou, mas chegou a declarar que por todos os modos e maneiras a havia de defender na commissão de guerra.

Esta commissão reuniu, e todos sabem o que n'ella se passou.

Surgiram quaesquer difficuldades, e, para as resolver, decidiu-se que aquella commissão reunisse conjunctamente com a commissão de marinha para cortar o nó gordio.

Estas commissões reunidas, porem, não funccionaram, e houve até um sr. deputado que interpellou um membro da commissão, o qual respondeu que effectivamente ha muito que não via o sr. ministro da guerra.

Eis como do importante negocio mereceu a attenção do governo!

Por consequencia, essa questão ficou completamente adiada.

Hoje, porém, vejo nos jornaes que está absolutamente posta de parte a idéa de dar um posto por distincção com ou sem prejuizo de antiguidade, e que se vae reformar a ordem da Torre Espada, creando-se expressamente um grau para o sr. coronel Galhardo, e distribuindo-se tambem differentes recompensas honorificas d'essa ordem a outros officiaes.

Sr. presidente, é bem contrariado que eu venho novamente fallar n'esta camara sobre este assumpto que, no meu entender, não devia ser tratado nem na camara dos senhores deputados, nem n'esta. Este assumpto devia ter sido resolvido pelo governo. Era ao governo que pertencia propor á corôa as recompensas que julgasse necessarias, vindo depois dar conta d'isso ao parlamento, e não mandar para quaesquer commissões um assumpto que está hoje collocado n'um pé bem delicado, bem melindroso, e cujas consequencias ninguem póde prever.

O que é verdade é que, a dar-se credito a tudo quanto os jornaes têem dito sobre este assumpto, vê-se que a solução d'este grande problema foi a solução da crise ministerial.

Soffram aquelles que foram a Africa; falte o paiz a tudo quanto deve a esses homens, mas salve-se o ministerio.

Venha a santa paz continuar no seio d'essa familia, embora façamos nós a mais triste das figuras, não dando a recompensa que merecem os serviços d'aquelles bravos!

Pois póde alguem, sr. presidente, suppor que isto é uma questão para debater em familia?

Não têem todos conhecimento de que o governo communicou ás nossas legações no estrangeiro os feitos heroicos d'aquelles soldados, a prisão do Gungunhana, e tudo quanto se tem dado relativamente á Africa?

Não sabemos nós que os soberanos estrangeiros felicitaram El-Rei?

Que os governos felicitaram igualmente o governo portuguez?

E o governo portuguez cobriu-se com todos aquelles louros, envolveu-se no manto d'aquella grande victoria, mas não distinguiu os bravos senão com a medalha e algum dinheiro, porque outras distincções trariam como consequencia fatal uma crise politica; e antes de tudo, salve-se o governo, e esqueçam-se os serviços dos verdadeiros heroes.

Oh! sr. presidente! Que figura fazemos nós?!

Que se dirá daqui a trinta annos, quando se souber que aquelles a quem por escala não pertencia fazer aquelle serviço, que não tinham obrigação de ir a Africa, porque não havia lei alguma que a isso os forçasse, foram voluntariamente; e que mesmo esses que foram voluntariamente, havia alguns a quem não pertencia esse serviço?

Ao coronel Galhardo não pertencia ir nomearam-no, e elle foi.

E assim como este, muitos outros officiaes estão nas mesmas circumstancias.

Pois, após todos estes sacrificios, depois dos feitos praticados por aquelles soldados, nada se lhes dá,

Não se diga que aquelles expedicionarios bateram só o Gungunhana e os regulos seus alliados; fizeram mais e melhor, salvaram a provincia de Moçambique e a honra nacional.

Imagine v. exa., sr. presidente, por um momento, que em logar da victoria eramos batidos? Quaes seriam as consequencias?

Estava perdido todo o dinheiro gasto na expedição, perdidas muitas vidas, e a provincia de Moçambique perdida tambem.

Se em vez de alcançarmos victorias houvessemos sido batidos, os flibusteiros que se dirigiam para o Transvaal teriam caminhado para Lourenço Marques. E uma vez de posse de Lourenço Marques, nunca mais lá entrariamos, nós, os portuguezes.

Pois a recompensa para todos esses serviços foi um Te Deum para os vivos e uma missa campal para os mortos, missa que aliás não chegou a realisar-se, sendo substituida por umas exequias na Sé.

Eu protesto quando penso que tudo isto é o resultado de uma baixa politica e de uma crise ministerial que foi preciso abafar.

Empregam-se todos os meios para que os officiaes, a quem é devida uma recompensa, não do governo, mas nacional, se contentem, com uma venera da Torre e Espada.

Sr. presidente, o que é levantarem-se difficuldades por causa de dois, tres, quatro ou oito postos por distincção?!

Quem é que se prejudica?

Aqui a meu lado está sentado um digno par, que todos respeitam, que recebeu ordem do governador Amaral para occupar o Congo, e que teve um posto por distincção quando ali desembarcou e bateu os rebeldes. Pois não houve uma voz de official de marinha que se levantasse contra este facto.

Esse governador não recebeu distincção alguma; recebeu-a quem praticou o acto de bravura.

Dois mezes depois, continuando a guerra, recebeu o mesmo official outro posto por distincção, e não houve tambem uma só voz de official de marinha que se levantasse contra o acto.

Mas, sr. presidente, ha mais exemplos.

Quando foi concedido um posto de accesso a Capello e a Ivens, os officiaes da armada queriam que esse posto fosse com prejuizo de antiguidade!

E agora?

Agora os homens que salvaram Moçambique, que salvaram a honra nacional, têem apenas um Te Deum!

Diz-se: mas os que não foram é porque os não mandaram.