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60 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

mantermos inteira e impoluta a nossa dignidade, o nosso direito e a nossa independencia pela affirmação da boa fé e da justiça do nosso procedimento.

Sr. presidente, de tudo isto o que deve restar é a certeza de que eu, sejam quaes forem as eventualidades em que me encontre, e quando digo eu, fallo tambem em nome do governo a que pertenço, não posso nem poderia jamais subscrever qualquer acto menos honroso para a nação a que me honro de pertencer. A politica do governo é conhecida, e eu não podia fazer parte d'elle sem estar consubstanciado com a sua politica.

Findo este incidente, vou tratar agora dos pontos principaes a que se referiu o digno par, o sr. marquez de Vallada. Direi primeiro a s. exa. que levo apenas vinte e tantos dias de gerencia dos negocios do ministerio de que me acho encarregado, e durante esse tempo não me tenho encontrado felizmente em conflicto algum, nem com a Inglaterra, nem com nenhuma outra nação estrangeira; o que porém tenho encontrado ainda, apesar dos esforços sucessivos dos ministros que me antecederam, são defeitos na administração das nossas colonias, defeitos que vem de muito longe, o carecem de muita pertinacia e paciencia para poderem extirpar-se.

Para este empenho devem convergir os esforços sinceros de todos nós, tanto mais quanto é justo lembrarmo-nos de que as nossas colonias de mais valia são vizinhas das colonias de uma nação que sabe ser colonial.

S. exa. referiu-se principalmente á gerencia do nosso Oriente; e quando fallo no Oriente refiro-me á nossa india, á nossa Africa oriental, a Macau e a Timor.

Deseja s. exa. saber se o governo intenta fazer a colonisação, qual o processo que tenciona usar?

Sr. presidente, a nossa India, que conta apenas vinte leguas de comprido por dez de largo, é comtudo a parte mais formosa do mundo (Apoiado do sr. arcebispo de Braga.) é para nós ao mesmo tempo um epico padrão de gloria como nenhum povo teve ainda nas suas mais honradas tradições, e um montão de ruinas que angustia o coração verdadeiramente portuguez ao entrar por aquellas regiões tão cheias de memorias dos nossos illustres avós. (Apoiado do sr. arcebispo de Braga.)

A india, sr. presidente, não carece de colonisação, carece de alguns melhoramentos nas suas instituições, talvez de aperfeiçoamento no modo de ser da sua propriedade, mas não creio que requeira reformas radicaes.

Tem cultura e tem população; rende para si, poda render mais, mas não convem esperar muito mais.

O estado tem ali, entre outras, uma riqueza importante; são as matas que abundam em arvores do teca, a melhor madeira para construcções nauticas, mas é preciso e é urgente melhorar a administração d'essas matas.

Folgo de fallar na presença de um illustre prelado que melhor do que eu conhece a India, os cuidados de que precisa e os grandes recursos que nos póde fornecer, apesar de pobre como lhe chamam aquelles que mal a conhecem. As matas principaes de teca são as da Praganá.

Já, depois que tive a honra de ser chamado aos conselhos da corôa, dei ordem para que continuasse um tombamento, que se tinha começado depois que saí da India, e agora não sei por que motivo posto de parte.

Espero que regularisada a administração da Praganá, ha de vir d'ali um excedente de receita para o estado, que alem de cobrir amplamente as despezas de Damão, ha de chegar para subvencionar as despezas a fazer com a velha e nobre Diu, ilha pobre e safara o os deficits que appareçam igualmente no orçamento de Goa.

A heroica Diu só poderia esperar um futuro lisonjeiro, se porventura fosse por diante a idéa, que em tempo se aventou, de fazer-se o caminho de ferro, que infelizmente está longe da sua realisação o qual percorrendo o extenso valle do Eufrates fosse dar ao golpho persico.

É possivel talvez que mais tarde parta da Russia algum caminho de ferro que descendo pelo reino de Cambaya, se approxime de Diu e a torne um ponto importante ao commercio.

Isso porém está longe de ser pensado, quanto mais realisado. Por ora aquella praça é só uma recordação, que deve ser acariciada e venerada com todo o affecto, mimo e toda a devoção dos corações verdadeiramente portuguezes.

A India, no meu entender, póde fornecer-nos grandes elementos para a realisação das idéas do governo a respeito da Africa oriental.

Antes, porém, de expor quaes são essas idéas, peço aos dignos pares que não tomem as minhas palavras senão como exposição do pensamento geral do governo, que é o campo para onde fui chamado pelo illustre interpellante.

A traducção por miudo d'esse pensamento ha de mais tarde e opportunamente ser trazida e submettida ao parlamento.

A India póde hoje dar-nos, entre outros, dois elementos de progresso para as outras provincias do ultramar, e principalmente para a Africa oriental.

Nós precisâmos de força publica. Não só póde fazer a colonização em parte nenhuma, sem que haja força para proteger o commercio, a industria, o transito e a navegação; e quanto maior for a escala em que se fizer a colonisação, mais necessaria é a força para garantir a ordem e a segurança.

Na minha opinião, a força publica na Africa oriental deve ser fornecida pela India.

Nas Novas Conquistas ha certamente os soldados do que precisa a Africa oriental. Os maratas, por exemplo, são excellentos soldados não só pelo seu valor, estando costumados a lutar denodadamente com as feras mais terriveis do Oriente, mas pela sua sobriedade. Ao passo que o soldado europeu não póde fazer marchas, senão a umas certas horas da manhã e da tarde, e carece de uma alimentação despendiosa, não podendo aguentar os grandes invernos dos tropicos, o soldado indiano marcha sem inconveniente toda a hora do dia e da noite; debaixo do sol mortifero ou de diluvios, com uma apa no seu cambolim, apa que o alimenta com a ajuda de uma pouca de agua limpida que acaso encontra n'uma fonte perdida na montanha.

Eis o que lhe basta para o seu sustento um dia inteiro. Isto em parte alguma o póde fazer, e muito menos na Africa ou na India, o soldado europeu. Isto sem fallar da facilidade da sua alimentação em Africa. Fallo por fortuna, diante de pessoas que conhecem aquelle paiz e sabem que e perfeitamente exacto isto que digo.

Se pois poder vingar o pensamento do governo, filho de uma convicção profunda, ha de empregar-se toda a diligencia para estabelecer-se um corpo na India, com o fim de destacar para o Oriente, Macau, Timor e Africa oriental; e outro em Lisboa para poder occorrer a qualquer necessidade da Africa occidental, isto é, dividir em dois o batalhão do ultramar, ficando um deposito em Lisboa e tendo outro em Goa.

Um dos elementos pois que a India póde prestar-nos com grande vantagem para a metropole e para o Oriente, é sem duvida este da força armada. O outro elemento que aquelle estado póde fornecer é a colonosição.

Eu estou fallando, como já tive a honra de dizer, na presença de quem conhece a India melhor do que eu, e ante v. exa., que tantas vezes tem sido ministro e honrado as cadeiras do poder.

Estimo ter esta occasião para lhe prestar esta homenagem. Posso n'uma ou n'outra questão politica, ser levado a combater a marcha do governo, a que v. exa. preside, mas nunca o faço com intensão offensiva, nem isso me inhibe de prestar agora o testemunho de consideração que tenho pela pessoa de v. exa., pelo seu saber, a sua prudencia e os seus incontestaveis serviços.