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SESSÃO N.° 16 DE 26 DE FEVEREIRO DE 1896 147

tal como ella subsistia, se procure dar remedio e obviar aos inconvenientes e males derivados d’essas origens, ou pela extirpação d’elles, ou pela substituição das medidas em vigor por outras em que esses males não se manifestem.

Não precisa levar muito tempo á camara, nem empregar esforços de argumentação para convencer aquelles que o ouvem de que effectivamente as instituições parlamentares estavam longe de inspirar respeito e merecer confiança ao paiz.

Factos repetidos, publicos e indiscutiveis tinham durante os ultimos annos accentuado constantemente a falta d’essa confiança na acção parlamentar, e por outro lado patenteado quanto o paiz se mostrava indifferente ao modo como se renovavam os corpos legislativos.

Não vae indagar agora os motivos ou as rasões disto. Notará apenas, como causa mais remota, que nós temos, infelizmente, falta de educação civica, e que o paiz de um momento para o outro se viu dotado com instituições que não se coadunavam, nem com a nossa tradição, nem com a indole e psychologia do nosso povo, condição esta que em outras nações tornam mais facil e prompta a acclimação das instituições representativas. Mais de espaço se referirá logo á proposição que está avançando.

Alem d’estas causas, deram-se factos posteriormente, uns de ordem internacional, outros de ordem interno-financeira, que vieram aggravar ainda mais esse desprestigio e essa falta de confiança, dizendo-se até que as instituições parlamentares não tinham sabido evitar os males do paiz. A disposição do espirito publico era como a estava pintando á camara. Proclamava-se, era uma phrase muito em voga, ser necessaria e urgente uma larga dictadura.

Quando as cousas assim estavam, quando era este o estado do espirito publico, abriu-se a camara dos senhores deputados em outubro de 1894.

Os tumultos da opposição começaram logo na primeira sessão da junta preparatoria. Ninguem ignora como elles se aggravaram nos ultimos dias de novembro. Todos os esforços empregados pelo governo no proposito de pôr cobro a um tal estado de cousas, e de cuja existencia e boa vontade podem dar testemunho mais de um membro desta camara, foram inefficazes, inuteis. A presidencia e a maio da camara dos deputados em vão procuraram resolver o conflicto por meio de modificações no regimen interno d’aquella casa. Os tumultos continuaram. As novas disposições foram desacatadas, como o haviam sido as anteriores.

Dadas estas circumstancias, nenhum homem de governo, nenhuma pessoa de simples de bom senso, avançaria a opinião de que o ministerio devesse demittir-se perante tumultos propositados, perante arruaças que obedeciam evidentemente ao plano de provocar uma crise politica. A demissão do governo n’estas condições constituiria um precedente tão perigoso para a ordem social, como nefasto ao prestigio das proprias instituições parlamentares.

O governo obtivera em successivas votações, n’uma e outra casa do parlamento, fortes e significativas maiorias em moções de confiança politica. Essa era a indicação constitucional, que lhe cumpria attender. Se, pois, na camara dos senhores deputados se tinha conseguido impedir materialmente o seu regular e proveitoso funccionamento, era obrigação do governo, era seu dever impreterivel, ainda tendo de recorrer a medidas de caracter extraordinario, restabelecer a normalidade parlamentar, levantar o prestigio da, instituição que é a base, a pedra angular do systema representativo.

Possuido d’este pensamento, não cuidou de o occultar, antes quiz expol-o, franca e lealmente, ao chefe do estado e ao paiz. No relatorio que precede o decreto de 15 de dezembro de 1894, sobre contribuição industrial, clara e detalhadamente apresentou o governo o seu programma de reformas politicas, declarando bem positivamente, que ligava a execução d’elle á sua existencia.

A esse programma foi dada a mais larga publicidade quer por meio da imprensa, quer por intervenção das proprias auctoridades administrativas, por expressa recommendação do governo, para que o paiz tivesse o mais amplo e profundo conhecimento das suas vistas em materia de reformas.

Todos sabem como as opposições responderam ao plano governamental. Responderam-lhe com os mais violentos protestos, publicados nos jornaes, e com o appello nos comicios, que procuraram realisar em toda a parte, unindo-se elementos nionarchicos e republicanos n’um mesmo esforço, sem que o governo lhes procurasse obstar, antes pelo contrario, por ver n’isso mais um meio de bem claramente se conhecer para que lado propendia a opinião do paiz.

Que aconteceu? Os protestos, os comicios não encontraram echo na opinião, ficaram sepultados sob a indifferença publica. O paiz approvava assim tacitamente o programma do governo, o paiz entendia com elle que era chegado o momento de reformar o nosso regimen parlamentar.

Se outra tivesse sido a manifestação da opinião publica, o governo teria dado a sua demissão, e não entraria no caminho das reformas, porque reformas não se fazem contra a vontade do paiz.

Seja qual for a opinião sobre a proficuidade de certas medidas, essas medidas nunca poderão impor-se, nem nunca hão de ser uteis e proficuas, se o paiz não as quizer acceitar.

Não é em plena paz, — porque a não ser na camara dos senhores deputados não havia a menor sombra de agitação,— não é em plena paz, repete, que se póde reformar a constituição do estado, se o momento não for opportuno. Essa opportunidade, porém, veiu.

O governo desejava realisar as reformas pelos meios constitucionaes; era esse não só o seu desejo, mas o seu interesse.

Não o pôde, porém, fazer, porque a camara dos senhores deputados não podia funccionar, em consequencia das manifestações que ali tinha havido.

Ainda assim, tem muito prazer em dizer á camara, para que ella possa julgar dos actos do governo, que antes de se publicar o relatorio que precede os decretos de 15 de dezembro, procurou, por intervenção do actual sr. ministro da marinha, ver se era possivel reabrir-se a camara dos senhores deputados, com a certeza de que, muito embora a opposição discutisse pela fórma a mais intransigente e violenta os actos do governo, não se repetissem mais nenhuns factos que impedissem o bom andamento das sessões parlamentares.

Mas nada pôde conseguir.

Que restava, pois, fazer ao governo, dopois da approvação tacita do paiz ao seu programma de reformas politicas, especialmente de reformas parlamentares? Decretar uma nova lei eleitoral, decretar a reforma da camara dos dignos pares.

Antes de entrar na apreciação desta ultima reforma, e para isso pediu a palavra, entende que lhe corre a obrigação de dizer quaes eram, na opinão do governo, as origens do desprestigio e enfraquecimento da camara dos senhores deputados.

Aqui o orador mostrou as origens da decadencia do parlamentarismo, quanto á camara dos deputados. Alem das causas remotas a que já se referira, e de que a principal era a falta de eleitor, concorrera muito para a decadencia dessa camara a lei de 1878 com o alargamento do suffragio, e com a organisação das suas commissões de recenseamento, que davam origem a factos como este. No Porto, com uma população de 130:000 almas, appareciam n’um recenseamento 1:000 eleitores como chefes de familia e 82 sabendo ler e escrever. No circulo de Felgueiras, circulo rural, 5:000 eleitores como chefes de familia e 5:000 sabendo ler e escrever.