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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO N.° 18

EM 7 DE NOVEMBRO DE 1906

Presidencia do Exmo. Sr. Conselheiro Augusto José da Cunha

Secretarios - os Dignos Pares

Luiz de Mello Bandeira Coelho
José Vaz Correia Seabra de Lacerda

SUMMARIO.- Leitura e approvação da acta.- Expediente.- O Digno Par Visconde de Monte-São manda para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao Ministro do Reino. - O Digno Par Francisco José Machado participa estar constituida a commissão de guerra, e em seguida justifica a apresentação de alvitres destinados a minorar a crise vinicola. Responde a S. Exa. o Sr. Presidente do Conselho.- O Digno Par Luciano Monteiro participa achar-se constituida a commissão de legislação, e requer que seja aggregado á commissão de negocios externos o Digno Par Sr. Villaça Este requerimento é approvado.- O Digno Par Sr. José de Alpoim refere-se ao caso do enterramento de uma criança no cemiterio de S. Pedro da Torre, concelho de Vianna do Castello. Responde a S. Exa. o Sr. Presidente do Conselho.

Ordem do diu, l.ª parte (eleição de commissões).- São eleitas as commissões do ultramar, e negocios ecclesiasticos.

Ordem do dia, 2.ª parte (continuação da discussão do projecto de resposta ao discurso da Corôa).- Usam da palavra: o Sr. Presidente do Conselho; em seguida é dada a palavra ao Digno Par João Arroyo. O Digno Par, no final do seu discurso, e depois de breves explicações trocadas com o Sr. Presidente, declara que deseja ficar com a palavra reservada para a sessão seguinte.- Encerra-se a sessão, e designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

Pelas 2 horas e meia da tarde o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Feita a chamada verificou-se estarem Apresentes 27 Dignos Pares.

Lida a acta da sessão antecedente foi approvada sem reclamação.

Deu-se conta do seguinte expediente:

Mensagem da Camara dos Senhores Deputados acompanhando as seguintes proposições de lei:

1.ª Approvando, para ser ratificada, a convenção entre Portugal e a Suissa, assignada em Berne em 20 de novembro de 1905:

2.ª Approvando, para ser ratificado, um additamento ao accordo commercial de 1899 entre Portugal e os Estados Unidos da America;

3.ª Approvando, para ser ratificada, a convenção entre Portugal e outras nações para protecção ás aves uteis á agricultura;

4.ª Approvando, para ser ratificada, a convenção que isenta dos direitos de porto os navios ambulancias em tempo de guerra;

5.ª Approvando, para serem ratificadas, as tres convenções assignadas em Haya para regular os conflictos de leis e jurisdições em materia de casamento, divorcio e tutela de menores; 6.ª Approvando o contrato provisorio com a Companhia Western, Eastern e a Europa e Açores, relativo á convenção do cabo submarino da Gran-Bretanha ao Faial e do Faial a S. Vicente (Cabo Verde).

(As cinco primeiras proposições foram enviadas á commissão dos negocios externos e a ultima á de viras publicas.

O Sr. Visconde de Monte-São: - Mando para a mesa o requerimento seguinte:

Requeiro que pelo Ministerio da Marinha seja enviado a esta Camara:

Relatorio e opinião do capitão Correia dos Santos, dado em Lourenço Marques acêrca da melhor espingarda para uso das tropas indigenas, appenso ao relatorio e protesto do inspector do material de guerra já recebido pelo requerente. =0 Par do Reino, Visconde de Monte-São.

O Sr. Francisco José Machado: - Por parte da commissão de guerra, participo a V. Exa. e á Camara que se acha constituida a mesma commissão, tendo escolhido para presidente o Digno Par o Sr. Francisco Maria da Cunha e para secretario a mim participante, havendo relatores especiaes.

Sr. Presidente: na sessão de 31 do mez passado, em que se votou o projecto do arrolamento dos vinhos licorosos, não pude desenvolver as considerações que me propunha apresentar á Camara, porque era urgente que o projecto fosse votado e eu não queria assumir a responsabilidade de fazer demorar essa votação, demora que, me diziam, podia prejudicar altamente a região do Douro.

Não gosto, pela minha attitude, prejudicar quem quer que seja, quanto mais uma região que está a debater-se n'uma grave crise.

Hoje mesmo não me alargarei em considerações para justificar umas propostas ou alvitres que vou mandar para a mesa no sentido de auxiliar a resolução da crise vinicola da região do sul (do Porto para baixo), crise que é afflictiva e horrorosa como tive occasião de mostrar á Camara quando usei da palavra sobre este assumpto.

N'este momento, estão reunidos em grande numero os vinicultores d'esta area na sede da Sociedade de Geographia e hão de vir pedir providencias

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contra essa crise que tende a aggravar-se cada vez mais se o Governo não adoptar providencias que attenuem a situação em que se encontra este ramo da industria agricola.

Se o Governo não empregar providencias urgentes para debelar esta angustiosa crise, grandes desgraças advirão aos viticultores.

Tenho constantemente pugnado para que se adoptem essas providencias e para que se evite., a falsificação do vinho, que se tem feito á vontade e de uma maneira extraordinaria por todo o paiz.

A este respeito tenho citado factos, indicado localidades e até apresentado nomes, sem que, todavia, os Governos nada tenham feito para remediar o mal. A fraude não se pratica só contra o vinho, pratica-se em quasi todos os generos de alimentação.

Os falsificadores não se arreceiam das autoridades que parece até gostam que a população se envenene.

Não existe só a liberdade de commercio, existe tambem a liberdade de roubar o consumidor e de prejudicar-lhe a saude.

Ainda ha pouco, aqui em Lisboa, diversas familias sentiram-se envenenadas e tiveram de ir curar-se ao hospital por causa de uma falsificação do azeite, com que temperaram as comidas.

Com o açucar e com a manteiga, co, o vinagre, emfim, com quasi todos os generos de consumo succede o mesmo.

Ha muitos annos, Sr. Presidente, que venho versando este assumpto, mas tenho clamado no deserto.

Em 1904 apresentei eu ao Parlamento uma nota de interpellação que desejo ler á camara para S. Exa. ver que não tenho descurado este assumpto, que reputo grave sob todos os pontos de vista.

A nota de interpellação dizia o seguinte:

"Desejo interpellar o Governo, sobre a falsificação dos vinhos que elle tem consentido e tolerado com perfeito conhecimento e depois de ter sido varias vezes avisado por muitas e differentes formas, sendo por isso responsavel pelo enorme prejuizo que a sua imperdoavel cumplicidade tem causado aos viticultores e commerciantes. É o Governo o unico culpado da grande baixa que teve o preço dos vinhos e das difficuldades que ha de haver na collocação da actual colheita, por isso deve vir dar conta á camara da tolerancia e complacencia que tem tido com os falsificadores.

Sala das sessões da camara dos Senhores Deputados, em 10 de outubro de 1904.= O Deputado, F. J. Machado".

Vê V. Exa., Sr. Presidente, que desde muito me tenho occupado d'estes assumptos que deviam ter merecido toda a attenção dos poderes publicos, mas que teem sido completamente desprezados.

Fora de Lisboa e dos grandes centros do paiz, o vinho está a vender-se a 10 e 15 réis o litro, mas para a en entrada em Lisboa paga o direito exageradissimo perto de 40 réis.

Este direito produziu, no anno de 1905, 1:598 contos de réis. N'estas circumstancias, como pode pedir-se ás nações estrangeiras que façam tratados de commercio comnosco para lá collocarmos os nossos vinhos em condições vantajosas?

Ellas poderão dizer que nós, na nossa propria casa, temos um direito que se pode dizer prohibitivo para a entrada do vinho nos grandes centros do paiz e queremos que elles dêem vantagens que nós não damos ao nosso principal producto.

Alem d'isso um direito tão elevado convida á falsificação, que, como eu disse e todos sabem, se faz por toda a parte.

É necessario tratar com muito cuidado d'estes assumptos e considerar que a industria vinicola é a primeira do paiz.

A industria agricola não tem merecido protecção; a não ser para os trigos, todos os outros generos teem sido desprotegidos e consente-se a falsificação.

Isto não pode ser e eu confio em que o Sr. Presidente do Conselho com a sua energia e boa vontade de remodelar os diversos serviços publicos empregará todos os meios ao seu alcance a fim de evitar a falsificação dos vinhos, o que tantos prejuizos traz ao paiz e a tantos viticultores honrados.

Lembre-se V. Exa., Sr. Presidente, e a camara que o vinho é ainda o primeiro genero de exportação.

Em 1885 foi de 14:831 contos de réis

"1886 " 16:972 " "
" 1887 11:416 " "
"1888 12:985 " "
"1889 12:456 " "
"1890 10:835 " "

Conservando-se quasi estacionaria até 1904 em que foi de 9:431 contos de réis. Vem em seguida a cortiça que tem orçado por 3:000 contos de réis. Assim

Em 1893 foi de 2:991 contos de réis

" 1894 " 3:064 " "

" 1895 " 3:668 " "

" 1896 " 3:649 " "

" 1897 " 3:709 " "

Sendo em 1904 3:023 contos de réis

É este um assunto que merece as attenções do Governo, que é na actualidade o mais palpitante e o mais urgente de todos quantos se podem apresentar á resolução para um Governo patriotico.

A industria agricola é, sem contestação, a primeira do paiz, mas tambem sem contestação a menos protegida.

Todas as outras são mais ou menos protegidas e não teem em si os elementos de que dispõe a agricultura. Basta lembrar que importam tudo, carvão, ferro, machinas, materia prima, e até muitas os dirigentes aproveitam só os braços. Tudo vem de fora a não ser a mão de obra, e comtudo estas industrias teem merecido dos poderes publicos todas as attenções.

A industria agricola, que tem tudo em si, não tem merecido a protecção dos poderes publicos condigna aos serviços que presta e aos braços que emprega. Protejam-se todas as industrias, mas não se- descure a agricultura, que em todos os países tem merecido os maiores cuidados dos poderes publicos.

Hoje a propriedade agricola principalmente a da região vinhateira está depreciada e ninguem a compra porque dá prejuizo. Todos fogem de empregar capital em propriedades rusticas e a prova está na grande massa de propriedades que hoje possue o Credito Predial, para as quaes não encontra compradores.

Quando n'uma das sessões passadas o Digno Par, o Sr. Baracho, disse que não tinha vinhas eu dei-lhe os meus parabens, porque hoje quem tiver vinhas é tanto mais pobre quanto mais vinhas tiver, o deficit é tanto maior quanto maior for o numero de vinhas que possuir.

Sr. Presidente: eu pedi a palavra para fazer estas ligeiras considerações e ler á Camara as propostas que eu então tencionava apresentar como elemento de estudo no intuito de ver se é possivel salvar esta industria. Todos estes elementos reunidos e estudados pelo Governo, juntos com outros apresentados por pessoas mais competentes e mais conhecedoras do assumpto, talvez pudessem concorrer para a solução da temerosa crise que estamos atravessando.

As minhas propostas são as seguintes:

1.° Abolindo o imposto do consumo, o que levaria Lisboa a consumir mais de 140:000 pipas de vinho, que ninguem falsificaria, pela sua barateza.

Os 1:598 contos de réis que rendeu o imposto de consumo sobre o vinho em 1905 podiam ser distribuidos em addicionaes á contribuição predial rustica e por um imposto de licença sobre as casas de venda, isto depois de abatida

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a despesa que se faz com a fiscalização, despesa que deixaria de fazer-se quando fosse abolido este imposto.

2.° Fazendo o Governo a régie da aguardente de vinho, podia pagar o vinho ao preço da tabella 2,62 por grau centesimal e por litro, o que dava para os vinhos de 12 graus o preço 628,8 réis por 20 litros, que já era remunerador para os annos de grande producção.

3.° Patrocinando a formação de uma companhia, de modo a poder introduzir os nossos vinhos, bem preparados, nos mercados estrangeiros e nos annos de abundancia poder conservar o excesso da producção, o que muito lhe convinha para os annos de escassez.

4.° Barateando as tarifas dos caminhos de ferro para a cascaria cheia e o transporte gratuito para a vazia e obter os vagons reservatorios para a conducção dos vinhos e aguardentes, como se faz em diversos paizes.

5.° Fazendo contratos com as companhias de navegação para o transporte reduzido dos nossos vinhos, como fez a Italia, que nos tem conquistado os mercados do Brasil.

6.° Dando em vez do café uma ração de vinho ás tropas.

7.° Estudando bem os mercados africanos, onde se pode augmentar immenso o consumo dos nossos vinhos.

8.° Prohibir o tempero dos vinhos com alcool industrial e só o permittir com aguardente de vinho.

9.° Prohibir por uma fiscalização efficaz a falsificação dos vinhos, impondo penas severissimas aos falsificadores.

10.° Criando typos de vinhos uniformes e garantidos.

11.° Estabelecer depositos devidamente fornecidos em differentes paizes para a propaganda dos nossos vinhos onde os actuaes tratados de commercio permittissem praticamente a sua introducção.

12.° Não consentir que o vinho para a Africa, chamado de preto, tivesse mais de 20° e diminuindo de dois em dois annos 2° até chegar aos 14°, pagando 1 real por litro de direitos de exportação e outros 1 real de direitos de importação, isto é 2 réis em litro.

13.° Tributando em quantia elevada cada arvore frutifera em Africa d'onde o preto pudesse utilizar os frutos para fabricar alcool, como o capieiro, canheira, macieira, palmeira de surra, etc., etc. Este vinho devia ser temperado só com aguardente de vinho. Garantem-me que com estas providencias só a provincia de Moçambique poderá consumir o excesso da nossa producção vinicola.

14.° Permittirmos a emigração livre e voluntaria de todas as possessões ultramarinas para as minas do Transvaal, e o Governo do Transvaal, alem de todas as licenças e taxas que já paga hoje, compromettia-se decerto mais a dar a cada indigena 4 decilitros de vinho portuguez por dia, sem pagamento de direitos ahi, cobrando o Governo 2 réis de direitos de exportação.

15.° Isenção de direitos para a chapa de vidro destinada ao revestimento de depositos de vinhos, aguardentes, etc., etc.

16.° Auxiliar algumas tentativas com o Japão, onde se consome já grande quantidade de vinho de pasto, e igualmente com o Canadá.

17.° Fomentar o estabelecimento de deposito em diversos paizes estrangeiros e nas nossas colonias.

18.° Mandar publicar durante dois ou tres annos annuncios nos jornaes mais lidos de Londres, chamando a attenção do commercio inglez para o nosso vinho, indicando o mercado central para dar todas as informações.

19.° Augmentar as decimas prediaes das propriedades plantadas de vinhas em terrenos de alluvião visto que a sua producção é enorme.

20.° Reduzir de 25 por cento as decimas prediaes das propriedades plantadas de vinhas, inferiores a 5 hectares, isto pelo espaço de alguns annos.

21.° Desnaturação de alcool industrial e procurar applical-o aos meios industriaes, como illuminação, forca motriz, etc.

22.° Estabelecer medidas praticas, promptas e efficazes para o aperfeiçoamento do fabrico do vinho, pondo o Governo á disposição dos lavradores os empregados competentes para os elucidarem.

23.° Prohibir o plantio da vinha em terrenos de alluvião, mas que fossem proprios para outras culturas. = F. J. Machado.

Sr. Presidente: peço desculpa á Camara de lhe ter tomado tanto tempo, mas como eu conheço a vida angustiosa dos povos da região Torreana, chamo a attenção do Governo para estes problemas economicos que são de grande alcance.

Limitando aqui as minhas considerações peço a V. Exa. a fineza de mandar inserir as minhas propostas nos Annaes d'esta Camara.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - As propostas do Digno Par terão o destino que S. Exa. deseja.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer ao Digno Pa que ouvi, com a attenção que merecem, as palavras que S. Exa. proferiu acêrca de um assumpto importante, que não pode deixar de prender a attenção do Governo, visto que interessa á economia do Estado.

Não é este o momento do Governo dizer se está ou não de accordo com as propostas apresentadas por S. Exa., mas com o que o Governo não pode deixar de estar de accordo é com as observações do Digno Par, relativas á saude publica e á necessidade de evitar a falsificação dos vinhos e outros generos importantes da nossa alimentação.

O serviço de fiscalização é exercido por duas repartições, uma do Ministerio do Reino e outra do Ministerio das Obras Publicas. Talvez que, por esta duplicação, os serviços se não tenham feito com a unidade e efficacia que se requer.

Já recommendei o assumpto ás autoridades de hygiene e saude publicas logo que me seja possivel, tratarei de reprimir as falsificações a que o Digno Par alludiu, o que não atacará senão interesses absolutamente illegitimos que convem que sejam atacados.

N'este momento vejo entrar n'esta casa o Sr. Ministro das Obras Publicas, que, se estivesse presente quando o Digno Par fez as suas considerações, poderia dar-lhe alguns esclarecimentos; todavia, em breve, S. Exa. terá occasião de, n'esta casa, tratar do assumpto.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Francisco José Machado: - Agradeço a resposta de V. Exa. e confio que a sua acção se ha de exercer utilmente.

O Sr. Luciano Monteiro: - Por parte da commissão de legislação, participo a V. Exa. e á Camara que essa commissão está constituida, tendo escolhido para Presidente o Sr. Sá Brandão e a mim, para Secretario.

Requeiro a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que seja aggregado á commissão de negocios externos o Sr. Eduardo Villaça.

Consultada a Camara, resolveu offirmativamente.

O Sr. José de Alpoim: - Agradeço a V. Exa. o ter-me reservado a palavra para a sessão de hoje.

O assumpto que vou tratar é de natureza local, e já o versei n'esta casa, se bem me recordo, com a presença do Sr. Ministro das ,Obras Publicas. Não sei se S. Exa. transmittiu ao Sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino e ao Sr. Ministro da Justiça as minhas reflexões.

Trata-se de um grave desacato praticado na freguezia de S. Pedro da

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Torre, concelho de Valença e districto de Vianna do Castello.

O parocho d'aquella localidade, que tem contra si o enorme defeito de acompanhar a orientação politica dos dissidentes progressistas, tem sido, por esse facto, alvo de uma violenta perseguição por parte do administrador do concelho d'aquella localidade.

Aquelle sacerdote fez enterrar, em 21 do mez passado, no respectivo cemiterio, conforme as prescripçoes usuaes e as recommendações do seu prelado, o cadaver de uma criança. No dia 21, o administrador do concelho foi ao cemiterio, fez desenterrar o cadaver sem a presença do sub-delegado de saude e sem attender as prescripções da hygiene, e ordenou que o enterramento se fizesse no adro da egreja.

Este administrador de concelho é juiz de direito, mas está dado como incapaz de exercer as respectivas funcções por impossibilidade physica; recebe, todavia, um ordenado de réis 800$000 e exerce as funcções de administrador de concelho, que demandam mais força physica e mais actividade do que as sedentarias funcções de magistrado.

Peço ao Sr. Presidente do Conselho que me diga se o Sr. Ministro das Obras Publicas lhe transmittiu as observações que a este respeito lhe fiz. Por informações particulares do concelho de Valença, sei que o delegado de saude de Vianna do Castello já examinara o cemiterio e o achara em condições marcadas pela lei, para que n'elle sejam sepultados os cadaveres. É um perigo para a saude publica os enterramentos fazerem-se nos adros das egrejas; e quantas luctas acerbas temos visto para evitar que isso se faça. Agora o que é verdadeiramente espantoso é que um administrador de concelho se ponha á frente da força armada para não cumprir a lei.

Está presente o Sr. Presidente do Conselho e eu espero que S. Exa. me diga se já tomou algumas providencias para que seja instaurado processo áquella auctoridade.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): - Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Obras Publicas communicou-me as palavras que o Digno Par Sr. Alpoim aqui proferiu n'uma das sessões passadas.

Em relação ao assumpto a que o Digno Par se referiu, tenho a dizer o seguinte: Já ha mezes se deu um facto analogo ao que o Digno Par se referiu; houve queixosos, instaurou-se processo que correu os seus tramites.

Com referencia a este caso que o Digno Par aponta, fique certo que a auctorização para se instaurar processo será dada, como serão dadas todas as que se referirem a processos contra auctoridades.

Desde o momento em que o Governo entendeu apresentar ao Parlamento um projecto de lei acabando com a chamada garantia administrativa, V. Exa. comprehende que seria uma leviandade politica minha, eu não conceder essa auctorização.

Em relação a este primeiro facto, a resposta não pode ser mais clara, nem mais positiva.

Com respeito á natureza do facto, devo dizer que o cemiterio ainda não foi devidamente approvado pelas auctoridades competentes, e d'ahi razão por que o administrador assim entendeu que devia proceder.

De resto, V. Exa. comprehende que um magistrado que é conhecedor da lei, e com responsabilidades determinadas, não se ia abalançar a praticar um acto que não tivesse a justifical-o qualquer disposição legal.

São estas as informações que tenho, e, como este assumpto está affecto ao poder judicial, elle procederá como entender.

Não foi o Governo que collocou aquelle juiz de direito na situação em que está; encontrou-o, assim como a outros, n'essa situação.

O que posso garantir ao Digno Par é que, logo que haja vacatura, elle reassumirá as suas funcções, independentemente de quaesquer conveniencias politicas ou partidarias.

É isto que posso dizer a V. Exa., e creio que não podia ser satisfeito mais completamente.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. José de Alpoim: - Agradeço as explicações de V. Exa., mas direi que não ha lei nenhuma que autorize um administrador do concelho a mandar desenterrar um cadaver, nas condições em que aquelle o fez.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): - O facto está affecto ao poder judicial e o Governo já deu auctorização para que o processo prosiga: portanto, aos tribunaes compete dizer quem tem razão, se é o Digno Par ou se é o administrador do concelho.

ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O Sr. Presidente: -Vae passar-se á primeira parte da ordem do dia, a eleição simultanea da commissão de negocios ecclesiasticos e da commissão do ultramar.

Feita a chamada, procedeu-se ás votações.

O Sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os Dignos Pares Srs. Antonio Costa e Teixeira de Vasconcellos.

(Pausa).

Como S. Exas. não estão presentes, convido para escrutinadores os Dignos Pares Srs. José Lobo e Luciano Monteiro.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem sido eleitos:

Para a commissão do ultramar:

Francisco Felisberto Dias Costa.
Antonio Eduardo Villaça.
Luciano Affonso da Silva Monteiro.
João Pereira Teixeira de Vasconcellos.
José Adolpho Mello e Sousa.
José Estevam de Moraes Sarmento.
Henrique da Gama Barros.
Francisco Maria da Cunha.
Julio Marques de Vilhena.
Antonio Teixeira de Sousa.
Jacinto Candido da Silva.
Marquez do Lavradio.

Para a commissão dos negocios ecclesiasticos:

Cardeal Patriarcha.
Arcebispo de Calcedonia.
Marquez de Pombal.
Antonio Candido Ribeiro da Costa.
Gonçalo Xavier de Almeida Garrett.
Carlos Augusto Vellez Caldeira Castello Branco.
Henrique da Gama Barros.
João Pereira Teixeira de Vasconcellos.
Luciano Affonso da Silva Monteiro.
Arthur Alberto de Campos Henriques.
Jacinto Candido da Silva.
José Maria de Alpoim de Cerqueira
Borges Cabral.

SEGUNDA PARTE

Continuação da discussão da resposta ao Discurso da Corôa

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á segunda parte da ordem do dia, continuação da discussão do projecto de resposta ao Discurso da Corôa.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco): - Sr. Presidente: se não fora a ultima parte do discurso do Sr. Hintze Ribeiro e a natural e velha deferencia e attenção que por todos os motivos S. Exa. me merece, eu poderia deixar, porventura, de usar da palavra, porque não teria que responder.

Das bancadas do Governo outra cousa não ha a fazer senão dar explicações dos actos ministeriaes que, por qualquer forma, sejam increpados ou trazidos á tela do debate por qualquer membro da Camara, ou expor os planos do Governo sobre qualquer questão, os quaes o Parlamento tem, não só

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direito de conhecer, mas dever de sobre elles se pronunciar.

O discurso do Digno Par, discurso eloquente, elevado, ponderado e reflectido, como é uso de S. Exa., na sua maior parte, é uma justificação e enaltecimento dos actos do Ministerio a que ultimamente presidiu, e só o final constitue uma critica humoristica dos actos, da orientação e das medidas que são da responsabilidade do Ministerio actual.

Referiu-se o Digno Par a actos da minha responsabilidade, quando fui collega de S. Exa. no Ministerio de 1893 a 1897. Sob o ponto de vista moral e da justiça que eu mereço, todos os actos da minha vida são susceptiveis de analyse e discussão; mas, sob o ponto de vista politico, a responsabilidade dos actos d'esse ministerio cabe principalmente ao seu Presidente do Conselho.

Mas não é este o momento em que mais importa defender ou justificar esses actos de que foi dada conta ao Parlamento de então.

Mas, Sr. Presidente, a ultima parte do discurso do Digno Par, pela sua elevação, pela sua intelligencia pela sua importancia, pelas qualidades de S. Exa. por todos estes motivos, e pela muita deferencia para com o Digno Par, demanda resposta do Governo.

Tendo pois de responder a S. Exa., procurarei acompanhar o Digno Par o mais rapidamente possivel, porque não desejo tomar muito tempo á Camara, nem desejo prolongar demasiado os debates politicos, que, ha mais de um mez, n'esta casa se teem successivamente produzido.

Em relação á primeira parte do discurso do Digno Par, é evidente que havia muita curiosidade e muito interesse até em ouvil-o. S. Exa. procurava defender e enaltecer os seus actos: estava n'esse momento falando, não só para a Camara, mas para o paiz, procurando dar a noção bem exacta do seu procedimento e dó que tinha dimanado da sua administração a bem dos interesses publicos, quando S. Exa., a breve trecho, diz- "que ao paiz e ás instituições, durante os 58 dias de Governo, dedicou toda a sua boa vontade e intelligencia, sacrificando até a sua saude".

Nós todos acompanhavamos as palavras do Digno Par, com uma profunda adhesão, sem a menor duvida sobre o que S. Exa. affirmava, dizendo que fôra até o ponto de arriscar o que mais caro lhe podia ser, no cumprimento dos seus deveres.

Portanto não podia ser eu quem fosse n'este logar fazer qualquer observação ás palavras do Digno Par na sua defesa; apenas me referirei de passagem a tres pontos por S. Exa. tocados, pela razão de me dizerem respeito, e porque tambem importam ao Governo.

É a questão dos tabacos, a dos Sanatorios da Madeira e a da expedição de Angola.

S. Exa. apresentou estas questões como liquidadas ou em via de liquidação: entendeu que nós não tivemos por assim dizer senão colher os fructos das agruras e dos lavores dos nossos antecessores. Parece que n'esta parte nós nada tivemos que cuidar, que não tivemos senão de nos louvarmos por encontrar estas questões, não só bem encaminhadas, mas por assim dizer terminadas.

Não porque eu não queira para mim todas as responsabilidades, deixando os louvores para o Ministerio passado, como já tive occasião de dizer n'esta Camara, em resposta ao Sr. Teixeira de Sousa, não porque deseje contrariar as affirmações do Digno Par; mas em todo o caso seja-me permittido dizer que estas questões teem dado ao Governo muito cuidado e attenção, e que na realidade lhe teem trazido muito trabalho.

Sobre uma, que está, como espero, proximo do seu final, eu direi que o Governo tem procedido por forma a assegurar a liquidação, mas que estavamos muito longe d'isso ainda, quando chegamos a estes logares.

Em relação á questão dos sanatorios da Madeira, ella ha de vir ao Parlamento, ou sob a forma de proposta, ou sob outra forma, e então será opportuno ver em que altura encontramos essa questão, quaes os esforços empregados pelo Digno Par para a melhor realização d'este assumpto, e os que nós temos empregado.

Quanto á questão de Angola, ainda agora está no principio; os acontecimentos virão demonstrar se foi efficaz ou contraproducente a resolução, adoptada. Oxalá que o futuro venha confirmar a sua inteira efficacia. Por emquanto é cedo para poder louvar, quer a resolução do Governo, a que o Digno Par pertenceu, quer as medidas que teem sido adoptadas pelo Governo a que tenho a honra de presidir.

Mais nada digo a este respeito, porque estas observações foram somente para mostrar que nós tambem temos tido muito que fazer.

Em relação ás minhas responsabilidades no Ministerio de 1893 a 1897, que se ligam com a maneira como o systema representativo se tem praticado em Portugal, tenho a dizer ao Digno Par que, se alguma vez a pratica do systema representativo se alterou, foi exactamente durante esse Ministerio, por virtude de despachos que mais directamente me pertenciam, mas que eram resultado de deliberações do Conselho de Ministros.

Adiaram-se as eleições e mais tarde a abertura do Parlamento, em consequencia dos acontecimentos que se deram, entre elles a affirmação por parte dos technicos de que em Lisboa existia o cholera-morbus.

Aberto o Parlamento, deram-se na Camara dos Senhores Deputados tumultos em dias seguidos e, só depois de estar em vigor um regimento que o Governo fez approvar, que poz nas mãos do Presidente d'aquella Camara os meios de obstar á desordem, é que se conseguiu que os trabalhos parlamentares d'aquella Camara corressem regularmente.

Ainda hoje me não arrependo dessas medidas que foram ditadas por circumstancias de caracter extraordinario.

Deus nos livre que o Governo do paiz e as suas funcções representativas possam ser normalmente postas em cheque ou impedidas por uma minoria mais ou menos numerosa, em qualquer das casas do Parlamento.

Perante factos d'aquella natureza não havia senão duas resoluções a tomar: adoptar medidas extraordinarias ou retirar-se o Governo.

O Governo não podia retirar-se deante de aggressões feitas em qualquer das casas do Parlamento pelas minorias.

As minorias tem os seus direitos, é certo, e os seus processos de combate; mas as maiorias dispõem de outras armas que tornam absolutamente impossiveis quaesquer manejos menos regulares ou contrarios ao regimento.

Nenhum Governo se pode retirar pela circumstancia unica de ser aggredido pela minoria, porque isso representaria a suspensão do funccionamento regular do systema representativo.

Isso importaria uma derrocada de qualquer systema de Governo.

Mas, repito, Sr. Presidente, que ainda até hoje me não arrependi do que então fiz, porque nem nós prejudicamos a lei, nem as boas praticas do systema representativo, nem ainda os principios de liberdade.

É certo que depois do encerramento das Côrtes o Governo de que eu então fazia parte praticou um erro.

Devia esperar o dia 2 de janeiro, dia marcado na lei para a abertura da nossa Camara, e ver se no interregno entre o encerramento da Camara e a sua nova abertura as paixões politicas se tinham acalmado, de maneira a consentirem o funccionamento da Camara e, portanto, a boa pratica do systema parlamentar.

O Governo de então, em vez d'isso, publicou um decreto em cujo relatorio se disse que era indispensavel seguir por um caminho de dictadura, e assim

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fez, não havendo Parlamento durante o anno de 1895.

Ora, Sr. Presidente, estou d'isso profundamente arrependido., porque mais tarde adquiri a certeza de que nenhumas vantagens, nenhuns resultados vieram para o paiz d'essa dictadura, quer sob o ponto de vista do bom funccionamento do systema representativo, quer sob o ponto de vista da sua administrarão financeira, da sua administração economica e da sua administração politica.

Tenho a franqueza de o dizer e a hombridade de confessar que o meu erro foi de ordem e natureza a dar-me a convicção de que nenhum homem publico, na posição em que eu hoje estou, deve recorrer a tal systema.

Sr. Presidente: eu devo declarar a V. Exa. que, desde o momento em que esse facto foi trazido aqui pelo Digno Par, desejo dizer o bastante para que todos possam apreciar a razão que dictou então o meu procedimento.

Em seguida ao encerramento houve então a chamada colligação liberal, e a qual entendeu que devia appellar para o paiz numa serie de comicios.

Por parte do Governo de que eu então fazia parte, posso affiançá-lo, não se recorreu a qualquer meio que- impedisse a realização d'esses comicios.

Fiz mais, Sr. Presidente.

Desejando que o Chefe do Estado pudesse directa e pessoalmente ter amplo conhecimento da maneira por que se realizariam esses comicios, e da forma por que elles podiam influir na opinião publica ou no modo por que provocavam as manifestações do sentimento popular, eu fiz que de todos os telegrammas em cifra que eram trocados entre os governadores civis e o Ministerio do Reino fosse dada copia ao Chefe do Estado, a fim de que elle pudesse inteirar se absolutamente do modo como as cousas se passavam.

Alguns dos cavalheiros que então desempenhavam as funcções de governadores civis pertencem ao partido regenerador e elles poderão dizer se foram então ou não as instrucções que lhes dei, attenta a intimidade e a convivencia com o Ministro do Reino de então.

Se assim procedi, é porque eu entendia e assim o expuz ao Chefe do Estado, que se porventura a opinião publica se manifestasse hostil ao Governo e favoravel ás minorias, a obrigação do Governo era retirar se, e visto que as Camaras não estavam dissolvidas, mas apenas encerradas, poderia formar-se um Ministerio de entre as maiorias parlamentares.

Então, como hoje, eu pensava que a primeira de todas as bases indispensaveis para a defesa de qualquer regimen é que elle proceda por forma a ter por si a opinião publica, a opinião da maioria do paiz para os actos d'aquelles que o representam no desempenho das principaes funcções governativas.

N'essa parte não tenho de que me arrepender, isto é, da forma como procedi, do desejo de que o Governo se tivesse assegurado da benevolencia da opinião publica, indispensavel condição para poder governar.

Á dictadura que fizemos e de que me arrependo pode ser bem applicado o dito de Catharina de Médicis a seu filho Henrique 111 no dia seguinte ao assassinio do Duque de Guise, em Blois.

Quando elle lhe annunciava o modo violento por que acabava de desfazer-se do seu rival e competidor, a astuta florentina respondia-lhe: "C'est bien coupé, mon fils, mais maintenant il taut coudre".

O paiz não impediu que se fizesse a dictadura. Simplesmente os resultados d'ella é que não corresponderam á importancia do golpe que nós demos. Um anno depois saímos do Governo, e as circumstancias financeiras, economicas e administrativas do paiz não correspondiam á grandeza do emprehendimento em que nos lançámos; mas o que é mais, é que se alguma cousa se fizera n'essa dictadura, a que eu ligava apreço, como era a lei eleitoral com representação de classes, com prescripção de incompatibilidades, com um numero fixo de empregados publicos, medicos e advogados, com suppressão de algumas comarcas, tudo isso que podia não ter valor algum, mas que a mim merecia conceito e interesse, e ainda hoje merece, tudo isso ruia a breve trecho sem que o paiz mostrasse o menor despeito.

Não podendo no meu conceito julgar que essas medidas dictatorialmente decretadas não tinham valor e não eram opportunas e adequadas ao paiz, mas vendo que tão facilmente eram revogadas e postas de parte perante a in differença publica, de ahi concluo que toda e qualquer medida governativa que seja simplesmente producto da vontade de um ou de meia duzia de homens, e não tenha na realidade sido preparada nas discussões do Parlamento e bem recebida pela opinião publica, ou é mediocre, nada remedeia, e conserva-se porque absolutamente nada vale, ou se de facto tiver algum valor cae com os seus proprios auctores, porque representa a vontade de um homem ou de um grupo de homens, não representa de forma nenhuma a obra de uma nação.

Aqui está, Sr. Presidente, a razão do meu arrependimento. É porque fizemos uma larga dictadura, que foi um crime constitucional sem precedentes na nossa historia, e os resultados que d'ella obteve o paiz foram nullos, porque ou nenhuns foram ou, se alguns existiram, se mallograram por completo.

Dentro das condições que acabo de referir, não foi sem desgosto que esse facto para mim se deu, pois me produziu profundo abalo, e foi certamente da observação d'esse facto e em resultado do que depois vi, do que era a vida das nações em que o systema representativo funccionava com toda a regularidade, em que a verdade dominava sobre tudo e allumiou todos os actos do Governo, que eu me convenci que caminho errado tinha eu trilhado, e que, se queria servir o meu paiz e prestar-lhe serviços que de futuro o modificassem, tinha de adequar as minhas ideias ar circumstancias que se mostravam ser mais proveitosas para o paiz.

Aqui tem V. Exa. quaes são as minhas responsabilidades e os motivos por que as tomei.

Mas quando o Digno Par o Sr. Hintze Ribeiro se referiu a que a restauração do systema parlamentar não datava de agora, visto que a ultima interrupção tinha sido n'este Ministerio de que eu fiz parte, S. Exa. laborou n'um equivoco, em que mais de uma vez caiu no seu discurso, de completa sinceridade, não só o quero crer, mas tenho a certeza d'isso.

O Digno Par disse que o Parlamento funccionou sem intervallo a partir de 1896.

É verdade.

E parece ao Digno Par que esse funccionamento se deu, estando o Parlamento em condições de poder-se dizer que tinhamos o systema representativo?

N'essa parte é que. eu digo que S. Exa. caiu n'um erro de apreciação, que é filho do seu modo de pensar, que não da sua vontade.

Nós tivemos systema representativo de 1897 a 1901, mas não o tivemos nos annos seguintes, em que o Parlamento funccionou sim, mas sem aquelle cunho com que se caracterizam todos os systemas representativos: a lucta parlamentar, a verdadeira opposição de coração e de ideias, que é na realidade verdadeira.

Grupos de homens representativos de ideias oppostas combatendo-se e entrechocando se, isso pode o Digno Par sustentar, porque todas as apparencias de razão estarão do seu lado, n'esses annos, de 1902-1904.

Mas isso é que a consciencia do paiz reconhece que não existiu, e o i que importa para a opinião publica é i as consequencias dos actos, não é o 1 criterio que tem quem governa;

O que importa é que o Governo te-

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nha a maioria do paiz, e não que o Digno Par sustente, sob o ponto de vista de argumentação, que na eleição de abril d'este anno houve quatrocentos homens que tiveram a crença politica, a iniciativa eleitoral de inscreveverem nas suas listas quatrocentos ou quinhentos nomes do Sr. Bernardino Machado.

Pode o Digno Par argumentar sempre pela forma a mais habil, de modo a tornar irrespondiveis os seus argumentos, mas creia que não leva a convicção a ninguem, de que o systema representativo não demanda, sobretudo, para ter uma existencia verdadeira, o encontro de ideias representadas por homens que se degladiam.

As eleições, para que sejam tambem genuinas, é necessario que cada um vote segundo o seu pensar, e não pondo ao lado de quatro nomes monarchicos um nome republicano.

Foram exactamente essas eleições que suscitaram os acontecimentos de 4 de maio, e foi depois d'esses acontecimentos que a opinião publica se manifestou, quando o Digno Par declarou e os seus collegas reconheceram que lhes era indispensavel o adiamento das Côrtes, para poderem governar e enveredar com firmeza por outro caminho, na defesa do regimen monarchico, e a este proposito o Digno Par, com a nobreza que lhe faz honra, sustentou firmemente, elevadamente, os seus principios de conservador.

Para o Digno Par, a manutenção da ordem, a defesa do regimen, sobreleva a quaesquer outras considerações.

S. Exa. pensa, pela exposição que aqui fez, que todos os meios são bons para manter a ordem, e parece tambem que na defesa do regimen o Digno Par imagina que todos os meios são adequados, tanto quando esse regimen constitucional é abalado pelos meios de propaganda legaes que, segundo a Carta Constitucional, são per-mittidos a todos os cidadãos portugueses, como quando esse regimen é combatido por meios illegaes.

Então o poder legitimamente constituido tem o direito de combater e subjugar.

O Digno Par, querendo abonar os seus actos e affirmações, o modo de pensar dos homens de auctoridade em assumptos politicos, citou o nome de um dos mais illustres republicanos entre os homens publicos que recentemente teem governado a nação franceza, Waldeck Rousseau, que sustentara que era necessario lançar mão de todos os meios para manter a ordem à tort et à travers.

Sr. Presidente: basta que o Digno Par faça esta affirmação, para que ninguem duvide da sua sinceridade.

Mas, para que se não citem só as palavras de Waldeck Rousseau, que estão na memoria de todos os que me ouvem, eu recordo que a breve trecho, na questão Dreyfus, em que havia o celebre incidente do Fort-Chabrol, durante mais de duas semanas em Paris se manteve n'uma situação absolutamente constituida em revolução armada contra o poder constituido; e Waldeck Rousseau, que entendia que para manter a ordem todos os meios eram bons, estava muito longe de recorrer á artilharia para atacar a casa onde estava Chabrol. Pelo contrario, procedeu de modo a dar-nos uma clara demonstração de que a manutenção da ordem era uma condição indispensavel de governar, mas de que é necessario graduar os meios para a manter, de forma que não aggravassem a desordem.

Eu, Sr. Presidente, contraponho ao dito que ouvi, d'esse homem publico aqui citado, as palavras de outro, tambem Ministro em França, que atravessou uma politica de excitação porventura mais grave e mais difficil ainda do que a que atravessou Waldeck Rousseau. Refiro-me a Mr. Constans, que era Ministro do Interior na epoca do boulangismo.

Foi elle quem, governando a França durante esse periodo, e falando n'uma grande reunião publica, disse que a maneira de governar modernamente, e a que os povos gostavam de sentir, era une main douce et ferme.

Era com a doçura e a firmeza que Constans entendia a verdadeira forma de governar.

Sr. Presidente: manter a ordem, é effectivamente a primeira obrigação de todos os Governos, e eu, no periodo do 1893-1897, encontrei me em mais de uma collisão e conflictos em que a ordem podia ter perigado, e se de alguma cousa me ufano d'esse Ministerio, é de ter procedido por maneira que nem uma gotta de sangue fosse derramado, e de ter tido aquella mão doce e firme de Mr. Constans, porque julgava ser a perfeita forma de governar povos modernos livres e representativos.

Mas, Sr. Presidente, quanto a manter a ordem, devo dizer que ha duas formas de a manter: uma é reprimir materialmente, quando materialmente é infringida; a outra é proceder por forma a que não haja nem motivos, nem sugestões, nem tendencias para essa ordem se alterar. E se entre liberdade e ordem, alguma correlação se deve estabelecer é a que eu estabeleci: é que não ha liberdade sem ordem, nem ordem sem liberdade, porque a ordem cria a liberdade e a liberdade cria a ordem.

A liberdade por si mesmo impõe-se áquelles que gozam d'essa liberdade.

Sr. Presidente: a defesa de um regimen é effectivamente tambem obrigação imprescriptivel de qualquer poder constituido, mas ha duas maneiras de combater o regimen, como já tive occasião de dizer.

Entre nós não é permittida a perseguição por motivos de opiniões politicas, nem está prohibido que cada um no Parlamento ou na imprensa, desde que respeite o Chefe do Estado, possa sustentar as suas ideias, propagandear as suas doutrinas e forcejar para que o Governo entre no caminho que julga mais consentaneo com as suas ideias.

Outra defesa de regimen não ha, nem outra maneira de assegurar a verdadeira manutenção da ordem.

Pode a força militar e policial assegurar por momentos o restabelecimento da ordem material; mas se a maioria da nação for contraria, essas manifestações hão de se repetir a meude, porque a breve trecho não ha força que lhe resista, porque todos os cidadãos estão ligados pelos mesmos principios, pelo mesmo sangue, pelas mesmas affinidades de pensamento, e pela ideia que em todo o cidadão a tudo sobreleva, e que é o bem da patria.

Sr. Presidente: em defesa do regimen, quando elle é combatido de peito aberto, de cara levantada, dentro da lei, com respeito e com ordem, não ha que se lhe oppor senão a propaganda igual e a pratica de actos por tal forma benéficos e respeitaveis, que a nação se sinta bem e que nenhuma attenção preste a quem faz propaganda em sentido contrario.

E mais uma vez accentuo que é convicção minha profunda, e a historia o demonstra, que as nações o que querem é ser bem governadas e que as instituições lhes asseguram os meios necessarios para a fortuna de cada um; e quando estas instituições, como as nossas, são oito vezes seculares, sem interrupção de qualquer outra forma de Governo, estas instituições não teem que recear dos seus adversarios; só teem que recear d'aquelles que as servem.

Sr. Presidente: se pelo contrario, se contra as instituições, se contra o regimen os processos não são os da lucta leal e legal, mas sim os da lucta insidiosa, traiçoeira, tumultuaria, violenta e illegal, então sim, então é que o poder constituido tem o direito e a obrigação de se defender, por forma a mallograr todas essas machinações e a assegurar ao paiz a continuação d'essas instituições, que a sua maioria tem por mais convenientes; então todos os elementos de acção devem ser empregados, mas é necessario empregal-os na razão directa do aggravo, para que não possa vir criar um seita de inimigos.

Qual era a situação em Portugal, em abril e maio d'este anno?

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O partido republicano em Portugal, é hoje um facto cuja existencia não está na mão de ninguem contestar nem aniquilar de momento.

Circunstancias anteriores, que não vem agora para o caso referir, deram a este partido, principalmente nas duas capitães do reino e em outras terras, elementos de consistencia, que seria verdadeira cegueira não querer ver, para procurar com remedios adequados evitar o seu progresso e até, sendo possivel, demorar a sua marcha.

Mas, Sr. Presidente, quaes eram os meios de que esse partido lançava mão? Os da ordem, os da entrada no Parla mento. Não usou esse partido da revolta violenta e illegal.

O Digno Par disse que eu, primeiro, e depois ligado com o Sr. José Luciano de Castro, com o partido progressista, nos tinhamos recusado a combater em Lisboa.

Combati em 1905; defendi para a fazer prevalecer, principalmente, a candidatura de um dos mais queridos e valiosos amigos o Sr. Mello e Sousa. Fui á uma com a convicção de que o partido republicano em Lisboa não possuia elementos maiores do que o meu partido, e que em uma lucta legitima não poderia ser vencido, e que com um nome tão estimado e querido como o do Sr. Mello e Sousa, pertencente á classe commercial, a mais preponderante na capital do reino, nós poderiamos vencer, se porventura processos illegaes ou incorrectos não viessem annullar os nossos esforços.

O resultado foi o seguinte: O partido republicano apresentou-se com uma força que a mim me surprehendeu e a todos os monarchicos.

O facto a que me refiro foi publico e de uma notoriedade incontestavel.

Depois não existia duvida nenhuma de que nós não poderiamos fazer prevalecer qualquer candidatura sem que entrássemos em combinações com o Governo a que presidia o Sr. Hintze Ribeiro, se estivesse disposto a acceital-as, e como entendêssemos que deveriamos apresentar-nos na Camara dos Deputados inteiramente livres de quaesquer combinações, eis a razão, tambem, por que não combatemos em Lisboa.

Disse o Digno Par que, desdobrando-se a lista eleitoral em outros circulos, contra adversarios monarchicos, com mais razão entendera poder desdobrar em Lisboa, contra os inimigos das instituições.

Isso é uma questão politica, com a qual não tenho nada.

Não me posso pronunciar contra um acto passado em que o Digno Par procedeu no pleno uso das faculdades que usava, e no pleno direito com que entendeu proceder.

Mas o que resultou d'ahi?

O que toda a gente conhece. Os acontecimentos de 29 de abril d'este anno, que trouxeram como consequencia os de 4 de maio, e que determinaram, como repetiu e confessou aqui hontem o Digno Par, um estado de cousas que fez pensar o Chefe do Governo e os seus collegas na necessidade de proceder com firmeza na defesa do regimen monarchico, e para isso pediu ao Chefe do Estado um adiamento.

É claro, Sr. Presidente, que desde esse momento se comprehendeu que o Digno Par, ao pedir o adiamento sem consulta do Conselho de Estado, naturalmente expoz perante El Rei as razões que o levavam a fazer este pedido. O Chefe de Estado entendeu, porem, que o não devia conceder, e que, tendo o Governo, em virtude d'esse facto, pedido a demissão, a devia ac ceitar.

Affirmo mais uma vez, como n'uma das ultimas sessões d'esta Camara, que nunca um Governo subira mais constitucionalmente ao poder.

Eu não sei a maneira como disse isso, mas quando o fiz, foi meu intuito tirar d'esse facto a propria significação e explicação, não tendo razão o Digno Par de ficar magoado por eu ter feito essa referencia ao Ministerio a que S. Exa. presidiu.

Se já é uma faculdade da Coroa admittir ou escolher livremente os seus Ministros, mais faculdade é ainda o negar o adiamento das Côrtes, feito contra os principios constitucionaes. E, portanto, já não se tratava de uma simples divergencia sobre essa faculdade constitucional.

Desde que o Governo julgava necessario proceder com mais firmeza na defesa do regimen, havia ainda uma orientação a tomar por parte do Chefe do Estado: era uma mudança, por assim dizer, de orientação politica, procurando experimentar e praticar outros processos de ordem e natureza a defender o nosso regimen.

Já vê V. Exa., Sr. Presidente, se ha assumpto verdadeiramente delicado e importante, são os d'esta natureza; são os que dizem respeito á concessão ou negação ao Governo de uma resolução de ordem ministerial, que tem por fim a approvação ou rejeição de certas e determinadas medidas.

Já é uma circumstancia importante e de valor; mas quando esse facto é determinado pela necessidade de uma orientação, motivada pelos acontecimentos de 29 de abril e 4 de maio, era mais legitimo que a Coroa tivesse pensado, hesitado e resolvido mudar de orientação politica.

Portanto, como V. Exa. vê, a divergencia era de natureza a justificar inteiramente a minha afirmação, de que nunca nenhum Governo tinha caido mais constitucionalmente.

Constituirá infracção de cortezia a affirmação de um facto verdadeiro? Onde existe aqui qualquer aggravo? Em que está a affronta ao Digno Par aos seus collegas? Em nada.

O eu dizer constitucionalmente, não quer dizer, não traduz que os Ministros de então se tenham tornado incapazes da administração dos negocios publicos.

A minha affirmação é perfeitamente legitima e constitucional.

Em nada offende aquelles a quem foi dirigida.

Disse o Digno Par que fui eu quem aqui affirmou que no dia 8 de maio, tendo a honra de ser recebido por El-Rei, saira d'essa audiencia com a convicção de que se não tratava de uma crise politica, e que em 15 de maio essa crise se dava sem que houvesse acontecimentos que pudessem justificar esse facto.

S. Exa. sabe muito bem que se dentro do Ministerio os Ministros não sabem todas as vezes que ha divergencia acêrca de qualquer medida apresentada á ponderação de qualquer dos seus collegas, - e este facto dá-se todos os dias, n'um ou n'outro ponto de importancia não fundamental, ou que as opiniões se dividem, e por isso é que ha Conselho de Ministros, - o mesmo acontece com os actos politicos em que, discordando os Reis Constitucionaes dos seus Governos, em qualquer acto que possa mais ou menos merecer a sua reprovação, podem não demittir immediatamente os seus Ministros e chamar ao Governo outros.

O Rei tem o direito de demittir os seus Ministros em conformidade com as indicações parlamentares, mas quem governa é o Governo.

Os Ministros só em casos excepcionaes consultam o Rei sobre os actos que querem praticar; por isso que são elles que teem o direito de governar, e a responsabilidade á face da lei, embora os Reis as tenham perante a historia e perante a moral.

Mas V. Exa. comprehende que a confiança da Coroa é uma cousa por tal forma fortuita e fragil que, de um momento para o outro, se afasta da orientação de um Governo.

S. Exa. pediu ao Chefe do Estado um adiamento, e ao Chefe do Estado punha-se pela primeira vez a questão de concordar ou não com a orientação do Governo, e com a marcha que elle tinha pedido.

E n'esse momento é que o Chefe de Estado ou mantem a sua confiança nos Ministros ou lh'a retira.

Ao Digno Par Sr. Hintze Ribeiro, afigurou-se-lhe existir contradicção no facto de eu dizer que sairá em 8 de maio com a plena convicção de que

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estava ainda longe o dia de eu ser chamado aos conselhos da Corôa.

Tal contradicção não existe. Demais é preciso ponderar que em oito dias El-Rei podia pensar, - é claro que não me deu a saber isso, nem tinha que dar, -que, estando a breve trecho para se abrirem as Côrtes, era ahi que o Governo devia dar conta dos actos praticados, e que seriam os representantes do paiz que tinham a obrigação e o direito de approvar ou de censurar os actos praticados pelo mesmo Governo.

Mas desde o momento em que elle ia pedir um adiamento nas circumstancias em que o pedia, já não era a Camara que tinha de fiscalizar e solidarizar-se com os actos do Governo; pelo contrario, era o Chefe de Estado que tinha de tomar essa attitude, e essa responsabilidade El-Rei entendeu que a não devia tomar, por isso não convir aos interesses do paiz.

Sr. Presidente: repito, assim como ha pouco sustentava que a substituição do Governo tinha sido constitucionalmente feita, da mesma forma é preciso dizer que nenhuma contradicção existe entre o que julguei ver em 8 de maio e o que succedeu em 15, quando o Governo, em legar de usar das faculdades ordinarias, entendeu dever pedir á Coroa aquillo que não lhe era licito pedir.

Isto em relação á crise.

Em relação á substituição, o Digno Par disse hontem aqui que eu devia a minha ascensão aos conselhos da Coroa simplesmente a circumstancias derivadas da minha intelligencia politica com o partido progressista, e a uma certa novidade que eu apresentava no meu programma de Governo.

Plena e inteiramente de accordo. Simplesmente o Digno Par disse hontem aquillo que eu já mais de uma vez tenho tido a honra de dizer n'esta casa de Parlamento.

Já vê, portanto, o Digno Par que n'este pontos estamos perfeitamente de accordo.

Não ha tambem duvida nenhuma de que tão constitucional foi a saida do Governo como constitucional a sua substituição.

Diverge o Digno Par da nossa orientação?

É natural, e eu folgo que assim seja, porque ha toda a vantagem em que dentro da politica monarchica e constitucional as fronteiras partidarias e o modo de pensar dos homens publicos estejam perfeitamente marcados e definidos, de modo que, quando uma substituição se faça, ella não represente unicamente uma mudança de nomes de homens, mas de doutrinas e de ideias.

Mas quando vejo a critica que o Digno Par faz á orientação do Governo e ás medidas por elle apresentadas, eu, se ainda tivesse alguma duvida ou hesitação sobre a perfeita opportunidade do caminho em que me lancei, sobre, a perfeita opportunidade da orientação de todo o Governo e das medidas apresentadas, a .maneira por que o Digno Par as critica, dar-me-hia a impressão de que ellas eram excellentes, desde o momento em que um dos mais illustres adversarios não tinha dito nada sobre ellas que as fizesse desmerecer da sua importancia.

Disse o Digno Par que não era precisa uma lei de responsabilidade ministerial; que nos basta a Carta Constitucional e o Codigo Penal.

É curioso que seja o chefe do partido regenerador quem diga isto, não se lembrando que foi no seio do seu partido, em 1892, que occorreu um determinado facto na Camara Electiva.

Um Deputado republicano accusara um Ministro da Coroa. Nomeara-se um commissão de inquerito parlamentar. Pois a breve trecho essa commissão declarou não poder proseguir nos seus trabalhos porque faltava uma lei de responsabilidade ministerial.

Será possivel que não seja precisa uma tal lei?

Mas em primeiro logar, quanto á observancia das leis pelos Ministros, não sei que haja alguma cousa escripta no Codigo Penal.

Em segundo logar, toda a nossa historia constitucional dos ultimos tempos demonstra que essa responsabilidade nunca se tem tornado real, pelas razões apresentadas em 1892, por uma commissão composta na sua quasi totalidade por membros do partido regenerador, "porque faltava uma lei de responsabilidade ministerial e não podia ter portanto seguimento a accusação".

Como V. Exa. vê, esta argumentação do Digno Par mais me convence de que é indispensavel hoje essa lei, para que duvidas como essas se não possam levantar.

Com relação a ter o Digno Par dito ser preciso depositar 2:000$000 réis para accusar um Ministro e para elle ser julgado, V. Exa. comprehende que tal caução é necessaria, porque ao contrario viriam todos os dias accusações aos Ministros, o que não convem ao funccionamento parlamentar.

Mas um Deputado, a commissão de contas publicas, ou a propria commissão de infracções pode fazer qualquer accusação a um Ministro; portanto, não é exacto dizer-se que pelo projecto que apresentei, e que tem parecer na outra casa do Parlamento, é condição indispensavel, para se accusar um Ministro, depositar 2:000$000 réis. Não. Basta pertencer á commissão de contas publicas ou á commissão de infracções ou ser Deputado. Em terceiro logar, tambem não é exacto que sejam as maiorias que devam proceder á accusação de um Deputado, nem a Camara dos Pares, sobre se é ou não criminoso o Ministro accusado.

A minoria da commissão parlamentar não se converte em maioria, porque a prescripção da penalidade de qualquer Ministro só se dá quatro annos depois d'elle ter saido do Ministerio.

Como V. Exa. vê, não me parece que se possa dizer que esta medida seja inefficaz, muito pelo contrario. Outros Ministerios a teem tambem julgado tão conveniente que a teem apresentado, e até um. Ministerio a que eu pertenci, e presidido pelo Digno Par a quem tenho a honra de responder, apresentou uma proposta n'esse sentido, mas que não teve seguimento.

Muitos Governos teem reconhecido a vantagem da existencia de uma lei d'esta natureza.

Reconheceu a o Governo progressista em 1879 e o Governo regenerador em 1894, e reconhecemol-a nós agora. Ha apenas uma differença: esta lei agora é apresentada para ser discutida e votada. Ou o Ministerio a que tenho a honra de presidir não se conserva muito tempo n'estas cadeiras, ou esta medida ha de ser uma das primeiras que terão a sancção regia e uma das primeiras que ha de ser lei do paiz.

Agora o Digno Par referiu-se á lei de contabilidade publica, dizendo que essa lei não tem novidade nenhuma, que já havia uma, e o que eu quiz foi fazer com que o director da contabilidade publica ponha o visto em todos os Ministerios, e que a commissão de contas publicas seja formada na sua maioria com elementos da opposição. Com relação ao primeiro ponto, disse o Digno Par que era um meio para eu poder nomear um inspector geral da contabilidade publica, com tres contos de réis.

O Governo actual não pensou de forma alguma em nomear director geral de contabilidade publica. Já encontrou esse logar preenchido por um funccionario dos mais distinctos, dos mais laboriosos, dos mais intelligentes e dos mais capazes que contam as repartições do Estado em Portugal, o Sr. Conselheiro André Navarro.

Este funccionario foi nomeado n'uma occasião em que ninguem pensava nas regalias que devia vir a ter. Foi nomeado e muito bem; oxalá que outras nomeações se fizessem assim. É um funccionario que subiu degrau a degrau a escala da burocracia.

É um funccionario de carreira, que merece toda a consideração, é digno de toda a confiança e possue todas as boas qualidades.

Isto não é indifferente, porque, por melhores que sejam as disposições de

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uma lei, por mais adequadas que sejam aos interesses do paiz as prescrições que ella contenha, de pouco ou nada valerá sem que haja quem lhe dê bom cumprimento e execução, porque tudo depende da forma por que ella for executada.

Não é só necessario, é indispensavel, haver um bom funccionario para lhe dar a devida execução, porque isso é ter a certeza da proficuidade d'essa lei, é a melhor garantia do seu regular cumprimento e bom acatamento. As disposições de uma lei valem tanto como o executor a quem ella deve ser confiada.

Com relação a ter aquelle funccionario, não só as responsabilidades do que pratica, mas ainda as dos actos do director geral da thesouraria, desculpe-me o Digno Par que lh'o diga, mas é um equivoco em que S. Exa. labora.

O director geral da thesouraria tem as responsabilidades que lhe competem pelas operações da thesouraria, porque essas demandam que seja elle o unico responsavel; mas se o director geral da thesouraria é o responsavel, não o é o director da contabilidade, porque este funccionario tem tambem as suas responsabilidades, que não são as que pertencem ao director geral da thesouraria.

Relativamente á commissão das contas publicas, commissão que existe em Inglaterra, onde o systema parlamentar funcciona á maravilha, onde todos os serviços de contabilidade, de fiscalização e de despesas publicas são tão regulares e invejados por todos os Governos bem administrados e constituidos; sobre essa commissão, Sr. Presidente, a critica do Digno Par o Sr. Hintze Ribeiro foi analoga aquella que fizera antes referindo-se á lei de responsabilidade ministerial.

Sr. Presidente: como V. Exa. sabe, é no principio de cada sessão que se nomeia a commissão de contas publicas, formada na sua maioria por elementos da opposição, e que tem por fim verificar as contas relativas á gerencia do anno transacto.

É esta commissão representativa da confiança de um Governo que sae. Dá-se a queda d'esse Governo e sobe outro ao poder que nomeia a commissão referida, com elementos do Governo transacto.

Dizia o Digno Par: ahi está como a maioria da commissão passa a ser composta, não por elementos da maioria, como devia, mas pela maioria affecta a este Governo.

Perdão. A commissão continua a ser composta por elementos da minoria em relação á gerencia que se destina fiscalizar, a qual é a do Governo que caiu; porque ella vae proceder á fiscalização, não do Governo que então occupa as cadeiras da poder, mas do Governo anterior.

Em vista d'isto, que maior garantia queremos nós de uma absoluta imparcialidade e isenção?

Tambem em relação a qualquer das leis que o Governo tenciona apresentar, o Digno Par fez referencias, e o que eu receio é que, dado o caracter um pouco desordenado que ultimamente, por falta de um moderno regimen parlamentar, não por outra cousa, a nossa politica tem tido, tenhamos necessidade d'essas leis draconianas exageradas.

Com respeito á lei da imprensa, disse o Digno Par Sr. Hintze Ribeiro: Que mais liberdade pode haver do que aquella que o Sr. Presidente do Conselho concede?

Eu não quero dar mais liberdade na questão da imprensa; o que eu quero é assegurar essa liberdade, para que não possa amanhã ser infringida por simples ordens dadas aos empregados policiaes, que procedam por maneira contraria aquella que o Governo quer. O que eu quero é que me não succeda o que só me consta que n'este paiz succede.

Porque de todos os crimes está incumbido o Ministerio Publico para d'elles cuidar, e não é preciso que o Ministro do Reino e o Ministro da Justiça ou qualquer funccionario ministerial se lembre de todas as manhãs ler os jornaes para saber quantas facadas se deram, quantos furtos houve, quantos abusos, quantos acontecimentos de ordem criminosa tiveram logar nas das de qualquer cidade, de qualquer villa ou aldeia.

Lá estão os agentes administrativos e os do Ministerio Publico para instaurarem os respectivos processos.

O Governo diz:

"Aqui está o crime, é preciso que seja instaurado um processo".

E é ao Ministerio Publico que isso compete.

Pois então é o Governo quem ha de segundo o seu arbitrio e a sua maneira de orientação, segundo os acontecimentos de hoje e de amanhã, fazer com que haja crimes de imprensa ou não?!

Está isto em Portugal organizado por forma que só ha os crimes que o Governo quer?

Isso é que eu entendo que não pode ser, nem quero para o meu Governo essa responsabilidade.

Não quero, repito, que impere o arbitrio do Governo, como até hoje tem acontecido.

Não quero que os delegados do Ministerio Publico deixem de cumprir o seu dever em relação aos delictos da imprensa, como cumprem em relação a quaesquer outros crimes.

Com este systema, todos terão a ganhar: a imprensa, porque vê deante de si um poder que em nada depende da vontade ou da influencia do Governo, e as pessoas a quem a mesma imprensa se referir por qualquer forma desagradavel, porque teem a certeza de que encontrarão a justiça de que precisam, quando os seus direitos sejam desacatados, quando a sua honra seja offendida.

Vamos agora á garantia administrativa.

Em primeiro logar, tenho a dizer que eu, como Ministro do Reino, nunca appliquei as disposições da lei, que não permittia que as auctoridades administrativas fossem demandadas ou processadas sem auctorização do Governo.

Foram os Governos que depois se succederam, no poder e muito especialmente a maneira por que procederam os Ministerios a que o Digno Par presidiu, que me convenceram a mim, que fui o auctor da ressurreição d'aquella lei, que era inconveniente e perigoso que ella continuasse a existir, e que melhor seria correr o risco de, uma ou outra vez, se deparar uma situação difficil, do que persistirem disposições de que tão largo uso e abuso se fez, sobretudo nos ultimos tempos.

Referiu-se S. Exa. a restricções, mas ellas não podem impedir que o processo caminhe e siga os seus termos contra qualquer auctoridade administrativa ou policial que tenha delinquido.

O que se dispõe é apenas uma justificação das circunstancias em que essa auctoridade se encontre, e que não contende com direitos de terceiros.

Mas a Camara está no seu direito de não deixar ficar essa mesma restricção, porque o Governo, já o tenho dito e repito, traz as suas propostas ao Parlamento para que elle, não só as aprecie, como as aperfeiçoe n'aquillo que julgar susceptivel de melhoria.

O Governo não terá a minima duvida em acceitar quaesquer modificações desde que as julgue uteis, e não fará d'isso questão ministerial.

Tambem S. Exa. alludiu á lei eleitoral.

Disse o Digno Par que a lei que actualmente vigora garante uma larga representação das minorias, e tanto que nas ultimas eleições trouxe á Camara 24 Deputados.

Em primeiro logar, tenho a dizer que quando em 1897 caiu o ministerio a que S. Exa. presidia, e entrou o Governo da Presidencia do Sr. José Luciano de Castro, o partido regenerador por uma lei de circulos uninominaes trouxe mais Deputados do que o Sr. Hintze Ribeiro conseguiu nas ultimas eleições. O partido regenerador

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SESSÃO N.° 18 DE 7 DE NOVEMBRO DE 1906 241

conseguiu trazer á Camara em 1896, com uma lei de circulos uninominaes, uma minoria de 29 Deputados.

Essa lei soffreu, porem, em 1899, modificações na circumscrição dos circulos, feitas pelos progressistas, e mezes depois o partido regenerador trazia á Camara 40 Deputados, mais 11 do que em 1896 havia trazido com a lei cujos circules traçara. Com os circulos uninominaes podem concorrer á uma todos os agrupamentos locaes e no Parlamento ter representação interesses variados e importantes, como sejam os industriaes, agricolas, etc.

Eu sou dos que pensam que o parlamento se não fez só para os grandes partidos, mas para nelle se representarem todos os interesses nacionaes e todos os differentes agrupamentos de interesses, sentimentos ou ideias que no paiz existem.

Alem d'isto, a lei dos circulos uninominaes não é só destinada a criar por esta forma uma proficuidade do direito do voto. N'essa lei, que tem por assim dizer os dois campos das nossas bases eleitoraes, os delinquentes são entregues ao poder judicial em condições que hão de impedir que futuros recenseamentos possam ser elaborados sem exactidão, como ha pouco eram accusados os que tinham interferido nos recenseamentos da cidade do Porto.

Ainda o Digno Par se referiu, para eu nada esquecer, á circumstancia de que o Governo nenhuma medida de economia tinha apresentado, e que, pelo contrario, o que apresentara eram medidas criando augmento de despesa, e um orçamento com um deficit de cerca de 3:000 contos, quando o que passou da gerencia transacta era inferior ao que é hoje apresentado ao Parlamento, que eleva esse deficit em mais 1:000 contos.

Effectivamente o Governo não pôde ainda fazer aquillo que deseja em materia orçamental. Um dos nossos primeiros cuidados foi reduzir as despesas e cortar tudo que não tinha lei em que se estribasse ou que o Parlamento não tivesse auctorizado, fazendo uma excepção áquelles que, por gratificações ou abonos juntamente com o seu ordenado, não vencessem somma superior a 600$000 réis annuaes.

Mas não fez só isto em relação ao orçamento.

O Governo, é certo, não propor quaesquer augmentos de receitas ou reducções de despesas. Fez melhor do que isso: reduziu de facto, e desde logo, as despesas que não tinham qualquer sancção legal. Apresenta o Governo ao Parlamento um orçamento com deficit, ,sim, mas com o qual se responsabiliza a poder governar, salvo, é claro, as despesas de caracter extraordinario, e isto sem prejuizo dos serviços e das necessidades publicas.

O Parlamento tem de apreciar um orçamento em que o deficit é a significação da differença entre a receita e a despesa, de que o Governo julga poder tomar a responsabilidade sem qualquer prejuizo.

Se se for comparar esse deficit, aliás avultado, com o deficit da ultima gerencia e com os dados que o proprio orçamento fornece, ver-se ha que alguma differença existe entre este e o anterior.

Ha de o Governo fazer, e já tem feito, uma administração economica, legal e severa, tanto quanto lh'o permittam as leis e as circumstancias actuaes. As verbas não auctorizadas serão lançadas em capitulos proprios, appensos aos differentes ramos orçamentaes, para que o Parlamento possa, querendo, legalizal-as, ou, se lhes não reconhecer base legal, eliminal-as. Ora essas despesas são de cerca de 800 contos de réis.

Nem todas essas despesas poderão deixar de ser mantidas, mas ainda assim, se o Parlamento estiver animado do mesmo espirito de economia de que está o Governo, poderá fazer-se uma reducção importantissima.

Como V. Exa. vê, ainda n'esta parte o Digno Par não teve razão para tão duramente increpar o procedimento do Governo.

Dizia S. Exa. que o unico aumento de receita que nós propunhamos era o que o seu Governo nos tinha deixado.

Não sei bem o que é que o Digno Par entende que nos deixou como receita.

Supponho que se refere á questão dos tabacos, que bastante cuidado nos tem dado.

O que S. Exa. nos deixou foi a beneficio de inventario.

O seu Alegado foi um deficit importante e uma numerosa burocracia, grande parte da qual poderia ter sido dispensada; e, se hoje o fosse, não se prejudicariam os serviços, sendo tambem certo que é attendivel a necessidade de retribuir melhor um exercito de empregados que se dirigem ao Governo e ao Parlamento a pedir melhoria de situação e de vencimentos.

Não quero fazer arguições de especie alguma.

Como V. Exa. comprehende, seria isso da minha parte uma triste maneira de me apresentar no Parlamento, quando peço a cooperação de todos os membros de cada uma das Camaras, se não para auxiliarem o Governo na tarefa de governar, ao menos para que os actos do Governo sejam por ellas apreciados com uma severidade porventura necessaria, mas em todo o caso desapaixonada e desembaraçada de qualquer sentimento hostil.

Mas desde o momento em que o Digno Par se referiu ao Governo pela forma por que o fez, engrandecendo as vantagens que nos tinha deixado e pondo em relevo que nós nada tinha-mos feito para as accrescer, eu não podia deixar de dizer o que disse, não para arguir ninguem, mas simplesmente para fazer conhecida a verdadeira situação do que encontramos.

O Sr. Ministro da Fazenda ha de opportunamente apresentar algumas medidas de caracter fiscal e financeiro, e isto concorrerá para poder equilibrar-se o orçamento do Estado, se não de uma vez e de subito, em todo o caso mantendo as despesas publicas exclusivamente dentro da lei, teremos a breve trecho uma situação desafogada, de uma forma definitiva e duradoura, que nos permitta melhorar os serviços publicos, entre os quaes ha alguns, como a instrucção, que precisam ser augmentados no seu dispêndio em muitas centenas de contos.

Sr. Presidente: não me resta senão responder a uma unica cousa, á pergunta que o Digno Par fez sobre o que é a concentração liberal e qual o seu destino quando este Governo se gastar.

V. Exa. comprehende que não me é muito difficil responder a esta pergunta. É evidente que o Governo se ha de gastar como todos os Governos.

Quem lhe succederá? Que respondam ao Digno Par as indicações constitucionaes que n'essa epoca interferirem na resolução do Monarcha.

Quem as pode prever? Ninguem, pois são circumstancias de momento.

O que é a concentração liberal? Mas isso já está dito. Explicou-o já o Sr. José Luciano e elle, orador, tambem. A concentração liberal é .o resultado da aproximação do partido progressista e do partido regenerador-liberal, feita em circumstancias de todos conhecidas.

Sobre ella se tem pronunciado nos ultimos tempos a opinião do paiz, que a acompanha e a tem avaliado justamente.

Condições imperiosas impunham que, se seguissem novos processos administrativos, orientando-se financeira, economica e moralmente os novos principios do Governo.

O que saiu da concentração liberal?

Saiu o actual Ministerio, que conta com o apoio d'essa concentração. Pois é caso novo ver dois partidos caminharem juntos, com as mesmas ideias e combatendo aquellas que lhes sejam contrarias?

Isso vem fazendo ha vinte annos os partidos unionista e conservador na Inglaterra, sem perda do seu caracter e feição especial.

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242 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Em França o mesmo se tem feito entre as direitas, o centro e as esquerdas, o chamado bloco, representado em Gabinetes successivos, que proseguem na execução dos mesmos principios.

Porque se não havia de fazer isso em Portugal?

Porventura alguma difficuldade, alguma impossibilidade havia de que assim acontecesse?

Porque nunca succedeu isto no nosso paiz?

Sr. Presidente: esta politica parecerá unica para o Digno Par o Sr. Hintze Ribeiro, que julga só poder existir em Portugal aquella de dois partidos autónomos e independentes, perfeitamente isolados de toda e qualquer agremiação politica, auxiliando-se e succedendo-se no poder um ao outro, por periodos de tempo anteriormente determinados. Esta tem sido a norma nos ultimos annos da politica portugueza, porem é minha fé que não tornará a ser.

É que acima dos rotativismos ha as ideias, que dominam, sejam quaes forem os homens, e que só mudam quando as correntes da opinião publica derivam o seu curso e revertem em contrario sentido.

Deus nos livre que assim não fosse. Porque então nós seriamos um paiz representativo verdadeiramente singular em que as mudanças politicas se dariam, não em harmonia com a corrente da opinião publica e nacional, mas em harmonia com condições de ordem particular e pessoal muito respeitaveis, sem duvida, mas absolutamente incapazes de servirem de base e fundamento a um verdadeiro systema representativo e parlamentar.

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu).

Vozes: - Muito bem.

O Sr. João Arroyo - Sr. Presidente: o Sr. Presidente do Conselho na ultima parte do seu discurso, aliás um dos mais bem conduzidos e mais maduramente reflectidos que S. Exa. tem proferido perante esta Camara, alargou-se bastante na ultima parte das suas considerações, referindo-se ao discurso do Digno Par o Sr. Hintze Ribeiro e defendendo os seus projectos de lei; e alargou-se tanto que eu tive tempo para, através d'essa longa exposição, ir cobrando alento, recobrando animo e voltar da impressão mais do que de estupefacção, de verdadeiro assombro, que as primeiras partes da oração de S. Exa. em mina tinham produzido.

Confesso que houve um momento em que eu cheguei a perder a noção nitida das cousas. Houve um momento em que me pareceu ver o Ministro. do Reino de 1893 a 1897 a justificar-se perante o Presidente do Conselho d'aquelle tempo.

Causou-me isto, como V. Exa. pode imaginar, o maior dos espantos. Eu suppunha que o Sr. João Franco não tinha que dar explicações e justificar-se perante as accusações d'aquelle que tinha sido seu Presidente do Conselho.

A atmosphera de exaltação não existe só na scena parlamentar; campeia já na praça publica.

Sem querer entrar nas minucias do discurso de S. Exa., não posso deixar de fazer uma pequena referencia a um romance de Verne, em que duas ou tres personagens, no fundo pacatissimas, se sentem dominadas pela atmosphera que as cerca, e sem que cousa alguma explique a mudança do seu temperamento, ellas se encontram a falar com uma psychologia, a raciocinar com uma logica e com um ardor absolutamente incompativeis com o seu temperamento normal.

Eu, Sr. Presidente, conheço varios factos extraordinarios da nossa vida politica, as actas do soberano congresso de 1821, os acontecimentos de 1837 e 1838, a luta dos patuleias em 1841 e 1847, mas o que nunca vi até hoje foi que a revolução partisse das bancadas do poder.

Eu seria incapaz - camarada de S. Exa. durante vinte e dois annos - de poder contestar que as suas palavras e o seu procedimento politico não sejam dictados por intenções rectas; mas o natural de S. Exa., o seu temperamento impulsivo atraiçoaram-n'o, e levaram-n'o a avançar proposições que, se não são de um perigo immediato para as Instituições, são com certeza um sopro que pode atear a chama revolucionaria.

Não se illuda ninguem sobre a natureza e importancia do movimento politico de que está sendo theatro a Nação Portugueza. O acontecimento que se produziu no domingo ultimo, na segunda cidade do reino, não pode deixar de impressionar vivamente todos os que são devotados á causa da Monarchia.

O que se está passando, Sr. Presidente, chama-se revolução.

Far-se-ha ella dentro das instituições vigentes?

Terá de saltar para fora dos moldes da Constituição Portugueza?

Não sei. Mas o que sei é que ella avança a passos, já não direi tão agigantados, mas tão apressados, que, quem metter a mão na sua consciencia, reconhecerá a verdade do que vou dizer.

É que o acontecimento de domingo, isto é, a victoria da lista da cidade, causou calafrios a todos aquelles que são devotados á causa da soberania portugueza.

Não sei, Sr. Presidente, se o regresso ás boas formas constitucionaes, se a reintegração de todos os poderes do Estado no seu verdadeiro logar, não sei, repito, se isso será concedido ainda dentro das instituições que nos regem, porque ellas estão actualmente tão arriscadas na sua existencia - e logo o provarei- que sentar se alguem n'aquellas cadeiras, na hora de hoje, representa o* mais grave sacrificio pessoal que os homens publicos podem realizar em Portugal, porque a lucta que porventura elles teem de desempenhar é das maiores como vou provar a V. Exa.

Sr. Presidente: eu conheço a antiga atmosphera do Parlamento Portuguez, e tudo o que se refere a instituições vigentes.

Ouvi centos de vezes, quer d'aquellas cadeiras, quer d'estas, a conhecida phrase: "A Coroa deve estar acima dos debates parlamentares".

Sr. Presidente: a Corôa deve estar acima das luctas dos partidos, a Coroa deve estar acima das luctas incruentas que se travam no Parlamento portuguez. Mas a Coroa, como o primeiro poder do paiz, tem de ser discutida severa e inexoravelmente, sobretudo por aquelles que a defendem, quando, devido a uma propaganda illegitima, irregular e illegal, esse poder saiu fora da orbita traçada na constituição portugueza.

Para quem servirá o segredo? Para quem reverterá, em utilidade, essa reserva parlamentar? Para ella?

Não, Sr. Presidente, porque o poder indiscutivel é um poder insustentavel. Para os partidos monarchicos? Esses não verão senão denegrida até a sua propria forma de batalhadores corajosos, pois que parece temerem o momento de arcar com as forças republicanas.

Para a nação?

Mas então a verdade acima de tudo, a justiça em primeiro logar, porque ella quer ser bem servida, quer ser perfeitamente servida, a começar por aquelle que é o seu primeiro magistrado: El-Rei.

Esta é a attitude de quem respeita homens e de quem tem a liberdade de discutir principios; não é a attitude, para mim insustentavel, de quem aqui n'esta casa curveteou e curveteia (não me refiro a ninguem pessoalmente) mesuras reverenciosas deante do Augusto Chefe do Estado, mas que lá fora não receia atraiçoar o credo monarchico, fazendo votar em Deputados republicanos.

Isso pode ser a moral jesuitica que Molière incumbiu de representar a um dos seus mais celebres typos de comedia; mas a esse procedimento lógico opponho eu outro.

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SESSÃO N.° 18 DE 7 DE NOVEMBRO DE 1906 243

Respeitando os homens, venho aqui, no uso do meu direito, n'esta tribuna, em face da letra da Carta e das restrictas disposições do regimento, mostrar que o mais alto poder do Estado exorbitou das suas funcções constitucionaes.

Sr. Presidente: quem pediu a carta de El-Rei fui eu.

E porque a pedi?

Pedi porque a isso me vi obrigado n'um momento de lucta parlamentar, em que porventura a affirmação contida n'um discurso meu podia ser lançada no campo dos ataques e aggravos pessoaes.

Pedi e sustento que a pedi no uso legitimo do meu direito.

Não pedi uma carta que trate de qualquer incidente entre o Chefe do Estado e o Presidente do Conselho, nem pedi a carta relativa a um acontecimento secundario, pedi a carta que se referia á questão de uma crise politica.

Referia-se a um assumpto de altissima importancia politica, aquelle em que El-Rei emittia uma opinião, não como homem particular, mas como homem publico, exercendo o mais alto logar.

Em seguida o incidente alargou-se sobre a existencia de mais cartas.

Conservando-me sempre na attitude primeira que referi, pedi que viessem todas as cartas respeitantes á crise.

Vieram tres.

A primeira é a que o Sr. Presidente do Conselho na outra Camara classificou de carta de alforria portugueza; a segunda é uma carta balsamo applicada ao Sr. Hintze Ribeiro; e a terceira é uma carta expediente, accusando a reorganização do actual Gabinete.

Foi o que me deram.

Através mesmo das indecisões que houve nas referencias do Sr. Presidente do Conselho ás cartas relativas á crise, as que pedi foram estas a que me refiro e vou analysar.

Antes de começar, tenho de me felicitar pelo facto do Sr. João Franco, o conductor da primeira carta de Sua Majestade que foi lida n'esta Camara, ter vindo a esta casa na sua carruagem habitual.

Foi uma fortuna, porque se S. Exa. tivesse vindo a pé,, se effectuasse esse passeio e encontrasse qualquer sargeta no caminho, certamente este facto ter-me-hia impedido de discutir a carta n'este momento.

Não quero ser muito longo, mas não posso deixar de me referir ao momento em que o Sr. Presidente do Conselho explicou a sua entrada no poder.

Attribui a subida de S. Exa. ao poder a influencias palacianas. Já exhibi perante a Camara a demonstração que entendia conveniente.

El-Rei affirma que recebeu informações.

Não as recebeu do Conselho de Estado, não as recebeu dos Presidentes das Camaras, não as recebeu de quaesquer homens publicos eminentes; por consequencia só as podia receber do pessoal de sua casa.

Mas o Sr. Presidente do Conselho disse-nos aqui que ainda restavam as autoridades publicas que o podiam fazer, o commandante das guardas municipaes ou então os chefes de policia.

Quanto ao commandante das guardas municipaes, presto-lhe a minha maior consideração e estima, e confio tanto no superior criterio d'aquelle funccio-nario, que prevejo qual seria a attitude de S. Exa. se por acaso fosse chamado a dar quaesquer informações.

Quanto aos chefes de policia, Sr. Presidente, seria chegarmos ao ultimo systema de degradação, suppor que os funccionarios de policia fossem chamados pelo Chefe, do Estado para depor contra ou a favor de um determinado assumpto.

Mas, quanto á atmosphera que nos cerca, eu não posso n'este momento, em que me quero referir nitida e solemnemente ás declarações que proferi no meu primeiro discurso, deixar de dar um brado profundo da minha indignação de portuguez, a um facto que demonstra a verdade, a verdade que se solta dos meus labios, se reconhece nas minhas palavras e se evidencia aos olhos da Camara.

Essa verdade é que os palacios dos nossos Reis foram destinados a sua habitação unica.

Os palacios dos nossos Reis, ou na capital ou em qualquer ponto do territorio portuguez, são propriedade do Estado, são propriedade nossa, dos cidadãos portuguezes, entregues apenas ao usufructo de El-Rei e Familia Real, com o seu pessoal de serviço, e onde se pode apenas dar hospedagem aos soberanos estrangeiros, aos Principes de sangue ou a qualquer Chefe de Estado estrangeiro que nos honrem com a sua visita.

E assim, que extensão de paciencia não é preciso que possua o espirito e o coração portuguez para poder admittir que em um d'esses palacios seja alojado como hospede de El-Rei um empregado do Estado?

Em que paiz se permittiria esta excepção verdadeiramente humilhante para um Ministro da Coroa, que é o Ministro dos Negocios Estrangeiros, de fazer-se hospede de El-Rei um delegado seu, una inferior seu, um subordinado seu?!

(Ouviu-se um sorriso).

Parece-me, Sr. Presidente, que ouvi uma manifestação qualquer?!

O Sr. Conde de Figueiró: - Fui eu que me sorri do que V. Exa. dizia.

O Orador: - Se o sorriso de V. Exa. significa a mais pequena intenção de desmerecer das palavras que eu proferi, das intenções que as dictaram ou da minha attitude n'esta casa, peço a V. Exa. que o signifique por qualquer forma, sabendo antecipadamente que eu não permitto a ninguem que commigo não mantenha a attitude de deferencia que mantenho para com todos os collegas.

O Sr. Conde de Figueiró: - Peço a palavra.

O Orador: - Tenho posto sempre na minha attitude de homem publico todos os cuidados para que a Camara saiba, para que o paiz inteiro saiba que, quando uma provocação vier, seja de onde for, achar-me-ha de pé aqui ou em qualquer outro campo. Exijo para mim o mesmo respeito pessoal que ponho nas minhas palavras quando a alguem me refiro.

Continuemos, Sr. Presidente. Sua Majestade El-Rei faz na sua carta a analyse dos factos.

A repressão violenta só pode e deve ser empregada quando seja absolutamente necessaria para a salvação publica: ora eu perguntei ha dias ao Sr. Presidente do Conselho demissionario se S. Exa. tinha feito qualquer pedido a Sua Majestade alem do pedido de adiamento, e o Sr. Hintze Ribeiro, nos termos mais positivos, declarou, quando usou da palavra, que não, e hontem, atravez de um longo discurso, S. Exa. mais uma vez declarou que só tinha pedido á Coroa o adiamento das Côrtes.

Pedira exclusivamente o adiamento dentro dos limites estabelecidos na legislação do paiz.

Sr. Presidente: eu não tenho por forma alguma, nas considerações que vou fazer, o intuito de ser desagradavel ao Sr. Hintze Ribeiro; mas tenho obrigação de me referir aos pontos da carta de El-Rei em que Sua Majestade se mostra em absoluta contradicção com as declarações do Sr. Hintze Ribeiro.

Não creio que um homem que empunha um sceptro, com as responsabilidades de Chefe de Estado, fale em regimen de violencias e de terror simplesmente como devaneio do seu espirito, para salvar uma responsabilidade de momento; não creio tão pouco que da carta de El-Rei se possa comprehender...

O Sr. Presidente: - O Digno Par dá-me licença?

Parece-me que tenho dado toda a

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244 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

liberdade á exposição que V. Exa. tem feito; mas, no cumprimento do nosso regimento e pelo que preceitua a Carta Constitucional, o Chefe do Estado é inviolavel. (Muitos apoiados).

V. Exa. pode se dirigir ao Governo, pode fazer o que entender, o que não pode é discutir a pessoa do Chefe do Estado. (Apoiados).

Eu peço a V. Exa., em nome das nossas antigas relações, em nome do prestigio parlamentar e das nossas instituições, que se abstenha de proseguir no caminho em que vae.

O Orador: - Eu ouvi as palavras de V. Exa., e peço a V. Exa. e á Camara que me digam se eu nas palavras que proferi, desde que comecei a usar da palavra, tive alguma expressão que signifique menos respeito para com o Chefe do Estado. Pode V. Exa. ter a certeza de que, desde que V. Exa. ou a Camara me indiquem qual foi essa expressão, eu estou prompto a explical-a.

Mas no caso de que V. Exa. queira lançar mão da força e da auctoridade para exercer sobre mim qualquer pressão, recorro ao espirito liberal de Augusto José da Cunha, para me collocar sob a triplice egide de antigo amigo, de velho parlamentar e de protector dos direitos que aqui me cabem.

Tenho a garantia plena de usar da palavra emquanto me não afastar do regimento.

Quem trouxe as cartas ao Parlamento foi o Governo.

Desde que essas cartas vieram, eu tenho todo o direito de as discutir.

Tenho todo o respeito pelo Chefe do Estado e o maximo acatamento á auctoridade real n'aquillo em que ella é inviolavel, que é a sua personalidade.

Tenho que me referir ao Rei, desde o momento em que é elle o signatario da carta. E desde que as primeiras luzes de direito vieram ao meu espirito, sei que a responsabilidade dos actos da Corôa pertence ao Governo.

Se me tirarem a palavra, se exercerem sobre mim essa violencia, estando eu dentro do regimento, só cederei á força.. .

O Sr. Presidente: - V. Exa. dá-me licença? Talvez eu esteja em erro, e por isso desejo consultar a Camara, mas V. Exa. não pode continuar no uso da palavra, se continuar a discutir a pessoa do Rei. (Muitos apoiados).

O Orador: - Eu appello para a consciencia de V. Exa.

O Sr. Presidente: - Não permitto que ninguem me exceda em limpidez de consciencia. (Apoiados).

A minha consciencia está limpa, e é ella que me diz que V. Exa. está praticando uma infracção constitucional. (Muitos apoiados).

O Orador: - Mas eu sujeito a minha opinião á decisão da Camara.

Desejo que V. Exa. consulte a Camara sobre se entende que eu tenho ou não o direito de discutir a carta de El-Rei. Quero que a Camara assuma a responsabilidade da continuação d'este debate.

(O Sr. Presidente agita a campainha).

O Sr. Presidente: - Vou consultara Camara.

Vozes: - Não é necessario.

O Orador (interrompendo}: - Eu peço que a Camara me diga se pronunciei qualquer expressão menos correcta, qualquer palavra de desrespeito para com o Chefe do Estado.

Isto é uma infracção, isto é uma violencia.

O Sr. Presidente: - Desejo saber se é infracção ou não; a Camara é que o ha de dizer.

É isto o 'que V. Exa. deseja?

V. Exa. deseja que eu consulte a Camara?

O Orador: - Eu não quero cousa nenhuma; o que eu quero é continuar a falar.

(Augmenta o sussurro).

Vozes: - Deu a hora, deu a hora, deu a hora.

O Orador: - Protesto, e não abdico do meu direito.

(Grande sussurro na sala).

O Sr. Presidente: - A primeira sessão é na sexta feira.

Está encerrada a sessão.

Eram 5 1/2 horas da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 7 de novembro de 1906

Exmos. Srs.: Augusto José da Cunha, Sebastião Custodio de Sousa Telles; Marquez Barão de Alvito; Marquezes: de Avila e de Bolama, de Penafiel, de Pombal, do Soveral; Arcebispo de Calcedonia: Condes: de Arnoso, do Bomfim, do Cartaxo, de Figueiró, de Sabugosa, de Tarouca, de Villar Seco; Viscondes: de Asseca, de Monte São, de Pindella; Moraes Carvalho, Alexandre Cabral, Pereira de Miranda, Antonio de Azevedo, Eduardo Villaça, D. Antonio de Lencastre, Costa e Silva, Santos Viegas, Costa Lobo, Teixeira de Sousa, Telles de Vasconcellos, Campos Henriques, Palmeirim, Vellez Caldeira, Carlos Maria Eugênio de Almeida, Eduardo José Coelho, Serpa Pimentel, Ernesto Hintze Ribeiro, Fernando Larcher, Mattozo Santos, Veiga Beirão, Dias Costa, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Francisco Maria da Cunha, Ressano Garcia, Gama Barros, Jacinto Candido, D. João de Alarcão, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Gusmão, Mello e Sousa, José de Azevedo, José Dias Ferreira, Moraes Sarmento, José Lobo do Amaral, José Luciano de Castro, José de Alpoim, Silveira Vianna, José Vaz de Lacerda, Julio de Vilhena, Luciano Monteiro, Rebello da Silva, Pimentel Pinto, Pessoa de A morim, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Affonso de Espregueira, Raphael Gorjão, Sebastião Dantas Baracho, Deslandes Correia Caldeira e Wenceslau de Lima.

O Redactor,

ALBERTO BRAMÃO.

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