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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 107

o direito divino dos réis, e se os homens que rodeavam o bondoso rei de França, Luiz XVI, e a infeliz minha sua esposa, não tivessem cooperado para a revolução, não se teriam dado tão desgraçados acontecimentos n'aquelle paiz... (Interrupção que não se ouviu.) Sim, a corrupção não é de agora, a corrupção é muito antiga; ella data já desde a Grecia antiga: quem ler Thocidides, póde ver que a corrupção é muito velha, mas por ser velha não se segue que seja boa. Por isso digo eu, quem se não lembra de ver as primeiras classes oa sociedade, e infelizmente até padres, serem os primeiros a promover o desenvolvimento de idéas que não eram idéas de liberdade, a qual é filha do céo, mas idéas corruptoras e corrompidas?! É necessario, pois, que aquelles que presidem á governação publica dos povos sejam os primeiros a dar o exemplo, e não se desvairem. Se não fossem os desperdicios da regencia de França; se não fosse o procedimento menos regular da côrte d'aquelle tempo, e a protecção illimitada que se dava a homens que possuiam idéas muito reprehensiveis, de certo não passaria a França pelas vicissitudes que tem experimentado, e não lhe viria o cataclysmo, cujos resultados ainda hoje está soffrendo! Lembra-me que um ministro d'aquelle paiz, ministro muito conhecido, e que então se apontava como o regenerador ou salvador das finanças, mr. de Calonne, tendo-se-lhe dirigido a rainha, pedindo lhe certa somma de dinheiro, elle respondeu-lhe: "Se é possivel está feito, se não é possivel ha de fazer-se".

O que se ve de tudo isto, pois, é que o desvairamento póde partir de todas as classes da sociedade, e que muitas vezes elle tem partido das mais elevadas.

O que é certo é que se se faz uma pergunta a qualquer ministerio sobre os negocios de administração publica, ou só se condemna qualquer acto praticado, sempre a culpa vae para aquelles que maitas vezes são innocentes: apontam para os resultados, sem investigarem o que lhes dá causa: Felix qui potuit rerum cognoscere causas.

Sr. presidente, as lições têem sido tremendas, e se a experiencia, que é a mais sabia mestra dos povos e dos estados não serve para alguma cousa, peçamos a Deus Nosso Senhor que nos tenha debaixo das suas vistas e nos livre, de algum modo, d'este systema que não tem principios; d'este systema valetudinario; d'este systema que se não póde sustentar diante de nenhuma escola, nem a do antigo regimen, nem a chamada da civilisação moderna.

Peço desculpa da digressão; mas ella tende a provar o desejo que eu tenho de concorrer e cooperar com os homens que governam a minha terra, para que elles emprehendam com mão firme e resolução forte a grande obra da reforma do ensino. Quantas vezes; ha vinte annos a esta parte, tenho eu clamado n'esta camara, apresentando sempre (e glorio-me de as ter apresentado), as boas idéas a este respeito? Mas, como o unico officio n'este paiz é fazer eleições e crear inscripções, como em outra occasião mui bem disse o actual sr. ministro das obras publicas, olha-se pouco para estas idéas e para estes principios. Fazer eleições e crear inscripções, e dizer ao povo que póde e deve pagar mais é a maxima constante, é a doutrina fundamental, é o que significa a escola dos homens que nos tem governado, até que Deus illumine uma vez o povo, e faça com que elle lance fóra de seus hombros o jugo que lhe têem posto os homens de todos os partidos, que o têem illudido, quer lisongeando-o, quer opprimindo-o. A verdade deve ser dita com franqueza e lealdade ao povo e ao rei; e eu não sei curvar-me senão diante ds Deus e da justiça; não me curvo diante de nenhuns outros poderes, porque não pretendo captar a benevolencia de ninguem. Sou independente, e só pretendo obter a recompensa da minha consciencia. Com essa fico completamente satisfeito.

Portanto, sr. presidente, sobre este ponto nada mais direi. Reservo-me para occasião mais opportuna desenvolver em mais larga escala os principios que tenho constantemente mantido, e que não têem sido attendidos por muitos dos homens que hoje se queixam da propagação de idéas perigosas. Por essa occasião lhes lançarei a culpa, porque eu tenho um registo das opiniões de muitos cavalheiros que têem passado por aquellas cadeiras (apontando para as cadeiras dos ministros), e que fóra d'ellas têem sustentado certas opiniões, e quando são membros do poder então é que acham os espinhos e as difficuldades, e se declaram coactos. Sr. presidente, apenas achei um ministro que me dissesse uma vez que estava satisfeito de se ver n'aquelle logar, que estava de saude e cada vez melhor. Nào direi o nome d'este cavalheiro, apesar d'elle já ter morrido.

Em todos os paizes onde existe o governo representativo, os homens politicos devem ter um plano de governo. Assim o vimos ainda não ha muitos annos na Belgica. Ali, quando o conde Déchamp, chefe do partido conservador, ou catholico, foi chamado para formar um ministerio, apresentou o seu plano. Alguns seus correligionarios disseram-lhe que era melhor apresenta-lo depois de estar no poder; mas elle disse que era leal e não podia esconler os seus principios de governo. O conversar depois tem graves difficuldades, e quasi sempre os ministros acabára por se combaterem; pois é certo que d'estes ministerios de conciliação, não vem proveito algum para a causa publica. Ora, o conde Déchamp não quiz seguir este systema de conversar depois, quiz conversar antes: conversou. E o rei da Belgica achou conveniente não chamar ao poder um partido que representava as idéas expostas no progratnma d'aquelle estadista. Agora mesmo lá está esse partido, não representado na presidencia do conselho pelo conde Dechamp, mas pelo conde Anathan, que é um homem notavel do mesmo.

Lá fóra debatem-se as idéas; ha partidos definidos. Não acontece o que está acontecendo entre nós. E isto não é só opinião minha, é tambem a do sr. conde de Casal Ribeiro, que disse que entre nós ha capitulos, ha congregações; em summa, que ha tudo, menos partidos. Aqui o governo não tem plano seu. Ainda ha poucos dias vimos isto. Uns diziam que o seu programma era o do sr. Fontes, outros declaravam que era o programuaa do sr. bispo de Vizeu, de sorte que o tal programma do governo era commum de dois; e por isso não me atrevo a dizer se os actuaes ministros pertencem ao partido reformista, a que tambem chamam episcopal, ou se pertencem ao partido regenerador. O tempo é que ha de mostrar a que partido pertence o ministerio. Quanto ao que disse o sr. ministro da marinha, sobre o ministerio não estar em crise, acredito que s. exa. acredita não se dar similhante facto; mas recordarei que a historia parlamentar apresenta entre nós exemplos que mostram, que muitas vezes oa ministros cuidam estar muito seguros, e momentos depois recebem um bilhete do presidente da administração em que lhes diz: "Queira v. exa. ficar sabendo que eu pedi a demissão do gabinete em meu nome e no dos meus collegas". Varios presidentes do conselho têem escripto d'estes bilhetes, e até alguns meus amigos. Acredito, pois, que s. exa. está na melhor boa fé, como está sempre, pois é um cavalheiro a toda a prova, como sempre o conheci, e hei de continuar a conhecer; mas as circumstancias levam ás vezes os homens a adoptar propositos contra sua vontade, e até mesmo contra suas opiniões. Eu referi-me ao que geralmente se diz bem alto, e é, que o sr. Carlos Bento sáe do ministerio. Ora, esta saída do sr. ministro da fazenda é provavel, a meu ver, que traga algumas difficuldades ao governo.

(Interrupção que se não ouviu.)

Pois se lhe não trouxer difficuldades, estimarei muito; mas parece-me que as ha de trazer. O sr. Carlos Bento faz parte integrante do grupo de homens que partilham das idéas do sr. presidente do conselho, aliás não o proporia recentemente o sr. marquez d'Avila para conselheiro d'estado. O sr. Carlos Bento tem estado no governo com o sr. presidente do conselho por tres ou quatro vezes, o que prova que s. exa. faz o mais elevado conceito do seu collega da fazenda e dos seus conhecimentos, sciencia, lealdade po-