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negociou primeiro o accordo com a santa sé, e a desamortisação produziu grandiosas vantagens, segundo o próprio testemunho de um respeitável membro do actual gabinete.

Parece que a prudência aconselhava adoptar entre nós o mesmo methodo, para colhermos igualmente tão prósperos effeitos da desamortisação que se intenta. Todavia como andámos pela maneira inversa, é de receiar que entre nós a desamortisação não venha a ser tão bem succedida como o foi na Hespanha.

E sabido, sr. presidente, que uma parte considerável do nosso paiz (quem sabe se a sua maioria), é de opinião que o accordo píevio com a santa sé se faz necessário para tornar legal e licita a desamortisação projectada. E similhante opinião não carece de rasões ponderosas, como se manifesta dos muitos escriptos que de fresco têem sido publicados sobre este ponto, e do bem trabalhado discurso que na camará dos senhores deputados recitou um dos seus mais dis^ tinctos oradores, e não menos illustre jurisconsulto.

Não entro na questão sobre qual das opiniões tem por si melhores argumentos. Basta-me para o meu intento que seja verdadeiro, como é, o facto apontado.

Se uma grande parte do nosso paiz segue a opinião da necessidade do accordo com a santa sé, corre ao governo e a esta camará rigorosa obrigação de procurar este accordo, e conseguintemente de remover tudo que o possa dificultar ou impossibilitar, para que não sejam desviados de concorrer á desamortisação, os que escrupulisam d'isso faltando aquelle accordo, único meio efficaz de socegar as consciências dos escrupulosos.

N'um paiz onde o catholicismo é admittido, e somente seguido da parte menos numerosa, o governo, apesar de protestante, negoceia com a santa sé, e celebra com ella concordatas, em respeito ás consciências da minoria da nação. E n'um reino todo eminentemente catholico ha de o governo e a camará menospresar os escrúpulos das consciências de uma grande parte, se já não é da maioria do paiz? Ou cuida-se que convertido este projecto em lei, com isso se tranquillisam as consciências?

Não vejo, sr. presidente, no adiamento d'este projecto nenhum inconveniente, mas descubro alguns graves, gravíssimos, que concorrem na sua rejeição, como procurei mostrar nas considerações que fiz. E n'isso cumpri com o meu dever de par e bispo.

Voto pela desamortisação, sendo accordada com a santa sé, rejeito a no defeito d'este accordo. Agora o tempo desenganará quaes andaram mais bem aconselhados, e melhor advertidos, se os que approvaram o adiamento que propuz se aquelles que o rejeitaram.

O sr. Ministro ãa Fazenda (A. J. d!Avila):—Sr. presidente, ouvi com toda a attenção o eloquente discurso que acaba de pronunciar s. em," o sr. Cardeal Patriarcha, e apesar de estar de accordo com s. em.a nos principios que expoz, não posso comtudo tirar d'elles as consequências que O digno prelado tirou. Apressei-me sobretudo a pedir a palavra, quando ouvi a s. em." referir alguns factos da historia contemporânea com alguma inexactidão, querendo desviar d'esses factos argumentos para fundamentar a sua proposta de adiamento. Antes porém de entrar n'este campo devo declarar á camará, que se o governo estivesse convencido de que na proposta de lei que se vae discutir havia a menor demonstração de menos respeito, acatamento e veneração para com o augusto chefe da igreja, cujas virtudes todos nós respeitamos, o governo seria o primeiro a não pedir o andamento d'este projecto (apoiados). Portugal é um paiz catholico, e o governo actual presa-se de ter dado nas circumstancias difficeis e afflictivas porque está passando a santa sé todas as demonstrações que cabiam nos seus meios, do seu ardente desejo de diminuir e não de augmentar essas difficuldades e amarguras. Estou mesmo persuadido de que quando s. em.a tiver examinado todas as disposições do projecto e as comparar com a legislação actual a respeito de conventos (apoiaãos), s. em.a ha de reconhecer que todo o bom catholico deve promover a approvação d'este projecto para evitar a completa anniquilla-ção dos conventos de religiosas entre nós (muitos apoiados).

Disse s. em.% que o que se estava passando n'este paiz era opposto inteiramente ao que se tinha feito em Hespanha: n'este ponto não posso concordar com s. em.a, porque não ha paridade alguma entre o que se fez em Hespa-nha e as disposições d'este projecto, porque o que se fez n'aquelle paiz é exactamente o contrario do que nós pretendemos fazer. Em Hespanha, como a camará muito bem sabe, o governo assenhoreou-se dos bens das corporações religiosas, mandou proceder á sua avaliação, pagou-os em titulos de 3 por cento pelo seu valor nominal, e depois ven-deu-os por conta do thesouro. Pergunto se no projecto ha uma só disposição por virtude da qual o thesouro vá locu-pletar-se com os bens dos conventos?! Longe d'isso, os bens são vendidos por conta dos estabelecimentos a que pertencem. Se forem vendidos por quantias superiores ao seu valor, esse beneficio reverte todo em favor d'esses mesmos estabelecimentos; por consequência, sr. presidente, o que se fez no reino visinho não é o que se pretende fazer por meio do projecto, cujo adiamento s. em.a propoz.

Sr. presidente, a legislação actual é a seguinte: «Não é permittida a admissão de noviças e de profissões nas casas religiosas. Todos os conventos, á medida que forem tendo menos de doze religiosas professas devem ser extinctos, e os seus bens incorporados nos bens do estado». O resultado d'esta legislação tem sido, que apesar de se não ter executado com todo o rigor a disposição que prescreve a extinc-ção dos conventos que tiverem menos de doze religiosas professas, limitando-se esta extincção aos conventos em que deixarem de existir todas as religiosas, apesar d'isto desde 1833, em que esta legislação está em vigor, dezesete conventos deixaram de existir, e se o governo quizesse dar

rigorosa e severa execução á lei, supprimia hoje oitenta conventos de religiosas. (Apoiados.—Sensação.) Não são necessários muitos annos para que, proseguindo as cousas n'este caminhoj tenham desapparecido todos os conventos de religiosas.

Que faz o projecto?... Põe um termo a este estado de cousas, estabelecendo que os conventos não possam ser supprimidos senão em conformidade dos cânones. Cessa pois a legislação que determina: «Que todo o convento que tiver menos de doze religiosas seja, ipso facto, supprimido». Os que forem supprimidos desde que este projecto for convertido em lei, só o poderão ser na conformidade das leis da igreja. E os seus rendimentos vão porventura augmentar a receita publica? Vão ser encorporados nos bens do estado? Não, senhor, o projecto determina, que esses bens serão exclusivamente applicados á manutenção de outros estabelecimentos de piedade ou instrucção, e á sustentação do culto e clero. Mas quando? Quando uma lei especial tiver regulado esta applicação. Quer dizer, que emquanto essa lei especial se não fizer, lá estão intactos os bens dos conventos supprimidos, podendo por consequência servir para a dotação das casas religiosas, que forem conservadas, em vista das negociações, que estão abertas a este respeito com a santa sé.

Eis-aqui os resultados d'este projecto se for convertido em lei. É exactamente tudo o que s. em.a pôde desejar.

Vejamos agora quaes serão os resultados da approvação do adiamento proposto por s. em.1

Se o projecto só for convertido em lei depois de feito o accordo com a santa sé, que certeza tem s. em.a de que não passará, pelos menos, ainda um anno, antes da feitura d'essa lei, tendo em vista quanto adiantada vae já esta sessão? Que certeza tem de que o governo, não digo este ministério, mas outro que lhe pôde succeder, não ha de mandar supprimir os oitenta conventos que estão já nas circumstancias de o ser? Que certeza tem de que não ha de supprimir ainda outros, que venham a ter n'esse intervallo de tempo menos de doze religiosas? Quem se lhe pôde op-por? (0 sr. Conde ãe Thomar:—As camarás.) As camarás podem por uma lei, mas essa lei não está feita, e o que se trata agora n'este projecto é precisamente de fazer uma lei n'esse sentido. Eu peço ao meu antigo e particular amigo o sr. cardeal patriarcha, que pense bem nas consequências que podem resultar da approvação do seu adiamento.

Senhores, uns poucos de ministérios têem apresentado ás camarás projectos d'esta natureza, mas esses projectos não tiveram andamento: agora que ha uma administração, que quer decididamente que este projecto seja convertido em lei (as outras administrações também o quizeram, mas as circumstancias não as ajudaram), não contrariem um pensamento tão catholico e religioso, como é aquelle que está no projecto (apoiaãos).

Ha negociações effectivamente, e v. ex.a sabe que o governo tem sillo por isso muito censurado, e eu particularmente (não n'esta camará). Estimarei muito que chegue a occasião, em queeu dê conta do procedimento do governo a este respeito. E também certo, que o governo, quando foi discutido-este projecto na outra casa do parlamento, declarou que achava conveniente um accordo com a santa sé, em relação á questão da desamortisação; mas não declarou, que esse accordo era indispensável, e pelo fundamento de que o que está n'este projecto não é senão a execução das leis do reino (apoiaãos). O goveno faz comtudo votos sinceros para que a santa sé, convencida da conveniência de vir quanto antes a este accordo, não ponha obstáculos a que esta medida se adopte. Tenho ainda a esperança de que a santa sé, da parte de quem o governo tem recebido immen-sas provas de consideração e deferência, ha de vir a uma solução pacifica a esse respeito, e de que o accordo ha de estar feito antes de convertido o projecto em lei do estado. E uma esperança que o governo tem, e para a realisação da qual faz todos os exforços, que consistem principalmente na boa fé e lealdade com que tem procedido n'uma questão tão delicada como é esta.

Disse s. em.a que a approvação d'este projecto ia tornar impossivel a questão do accordo em relação á conservação dos conventos. Se s. em.a estabelecesse a proposição contraria parece-me que estaria mais na verdade. Pois que?... pôde a santa sé recusar o seu concurso para que se fixe o numero dos conventos que convirá que existam no reino, o numero das religiosas, que devem ter esses conventos, e a sua dotação, quando pela approvação d'esta medida nós vamos deixar a questão intacta, pondo termo á anniquilação successiva dos conventos, edos seus rendimentos? Não pôde ser.

Sr. presidente, eu vou acabar, porque affigura-se-me que tenho já sufficientemente respondido ás observações do digno par. Se eu visse que na approvação d'este projecto havia disposições que poderiam contrariar o accordo em relação á fixação dos conventos, havia disposições de menos consideração e menos respeito para com a santa sé, eu acharia rasão nos argumentos apresentados por s. em,', mas eu não vejo nada d'isso, vejo aqui estabelecido o principio da conservação dos conventos, vejo mais que estes não podem ser supprimidos senão na conformidaãe ãos cânones, e que os rendimentos dos conventos supprimidos não hão de ter applicação alguma a usos profanos, e sim aos fins, que já indiquei, dependendo essa applicação de uma lei especial, ficando intactos esses rendimentos em quanto essa lei se não fizer, e podendo por consequência ser destinados á dotação dos conventos, que hão de ser conservados, tudo isto no caso de ser votado o projecto. No caso opposto vejo, que se compromette cada vez mais a existência dos conventos, e que não será preciso que decorram muitos annos para que todos estejam extinctos, o que tornará muito dif-cil, senão impossivel o seu restabelecimento, porque este só

poderá ter logar á custa de grandes sacrifícios que não sei se se poderão fazer.

O sr. Conãe ãa Taipa: — Também quer o adiamento, e sustenta-o pela necessidade urgentissima que ha de fazer alguma cousa por esta sociedade caida tão baixo, que está á mercê dos patriotas do Borratem; o que passou a mostrar, quanto a isto, pelo que está vendo, e quanto aquella necessidade por diversas considerações da ordem moral mais elevada, e até pelas da ordem económica.

Quanto ás primeiras. As freiras como estão não servem de nada. Privadas do direito de se renovarem, estão em vésperas de acabar completamente, e isso não pôde nem deve ser. E mister que haja freiras; e que as haja n'um certo numero de conventos de vida contemplativa para as pessoas que se temem do bullicio do mundo, ou foram feridas por elle; e deve também have-las da vida activa que reúnem á caridade pratica a oração — quaes para enfermeiras; quaes para cuidarem e tratarem da puericia, desses filhinhos do povo, que a sociedade vê indifferente correrem por essas ruas, cheios de trapos, de immundicie e de ignorância, e dentro em pouco também de vicios, que serão mais tarde o tormento e o castigo d'essa mesma sociedade; e quaes finalmente para assistirem nas prisões para mora-lisar os presos do seu sexo, e attenderem igualmente aos seus outros melhoramentos mesmos physicos. E também quer frades, porque quer missionários, e estes só os conventos podem offerece-los. A civilisação das colónias não pôde ob-ter-se senão pelas missões, e só a civilisação pôde tornar as colónias úteis á metrópole. Manda-se semente de algodão para as colónias, para vir de lá o género... baldada esperança! é necessário quem o semeie e amanhe; isso exige um certo grau de civilisação, que só com os missionários se obtém. Não feriamos aprendido nada apesar de uma tão longa experiência? Vamos perdendo as colónias porque não temos os missionários, e d'aqui a pouco ficaremos sem nenhuma se não mudarmos de systema, se qui-zermos ser mais sábios que os francezes, inglezes, hollan-dezes, etc.

Depois do que disse é evidente que concorda na desamortisação, mas não para cair na voragem do thesouro: quer que ella seja o mais productiva possivel para ter as applicações que leva ditas; e isso não se consegue pelo modo proposto. Ninguém sabe o que compra, nem o que vende. Diz-se que estes bens andavam mal administrados, e facilmente o crê: logo não rendem o que podiam render, e assim o governo que os vende não sabe que valor tem; e não sabe também o comprador, salvo um ou outro que esconde o seu segredo, c compra cora 10 o que vale talvez 40 ou 50.

Desejaria portanto que estes bens fossem primeiro arrendados nas próprias localidades, por modo que o pequeno e pobre lavrador concorresse a esta experiência, que trabalhasse a terra, melhorasse a sua cultura, e mostrasse assim qual era o valor do campo, á compra do qual podesse concorrer ao fim de algum tempo com os ganhos resultantes do seu próprio trabalho. Isto fa-la-ía mais demorada, mas ao mesmo tempo mais vantajosa e mais popular do que esta que se propõe^ e fa-la-ía também mais moral porque não entregaria estes bens em parte á agiotagem, que está com ávidos olhos devorando esta presa, que somente será uma boa especulação para os agiotas. N'este sentido votou pelo adiamento.

O sr. J. A. ãe Aguiar: — Não estranha que o sr. cardeal patriarcha propozesse o adiamento com os fundamentos que expoz, porque, elle orador, apesar das doutrinas que professa, se estivesse exercendo as mesmas funcções e trajando as mesmas vestes, talvez fizesse o mesmo. O que o surprehendeu foi que se combatesse o parecer por excessivo, quando elle suppunha que o não fosse senão por aquelles que o achassem fraco, e não muito de accordo cora as doutrinas que, elle orador, aprendeu na universidade de Coimbra, e que se acham consignadas no relatório do decreto que supprimiu as ordens religiosas em Portugal, que muito se honra de ter referendado.

O orador não julga que seja necessário breve da santa sé para se fazer a desamortisação; e toma-o apenas como um acto de mera ãeferencia, e cortezia; porque na sua opinião o estado usa do seu direito dispondo d'estes bens, não só porque são verdadeiramente seus, visto que quem os deu á igreja, deu-os ao estado; como porque, a respeito d'aquel-les que as corporações tivessem havido por compra, o direito de propriedade d'essas corporações não é o mesmo do dos indivíduos; estes têem direito á sua vida e desenvolvimento, que o estado é obrigado a proteger-lhes, o que se não pôde entender das corporações.

Esta doutrina, a que chamou verdadeira, a que professa a universidade de Coimbra, que sempre teve a reputação de muito orthodoxa, não duvida crer que é também a que segue o sr. cardeal patriarcha, pois que s. em," disse que votaria pelo projecto se a santa sé auctorisasse a desamortisação; o que mostra que "o approva, e por tanto que a questão não é de propriedade, como por ahi se tem dito, mas sim de competência, o que simplificava muito a sua posição na tribuna, pois lhe bastava mostrar a competência do poder civil, independente de nenhum accordo com o chefe da igreja, a quem aliás respeita tanto n'essa qualida-da, como individualmente a respeito do papa actual pelas suas muitas virtudes e amor do bem.

O sr. Marquez ãe Ponte ãe Lima:—Sr. presidente, eu não tinha tenção nenhuma de fallar n'esta questão, porque sou o único, e não vejo ninguém que aprendesse na escola em que eu aprendi, que não foi a universidade de Coimbra; entre tanto não posso deixar de dizer, em primeiro logar, que a auctoridade espiritual é a primeira de todas, porque todos devem estar bem com a sua consciência; em segundo logar trata-se aqui de uma medida que não me parece re-