O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 121

Ha de tudo isso muita vez nas mais unidas familias e nas mais sinceras amisades. O amor perennemente inalteravel é para a Arcádia dos poetas.

Mas quero, sr. presidente, que desprezemos a historia, as suas recordações, o seu ensino, os exemplos que nos legaram D. João I, D. João IV, D. Pedro II e o marquez de Pombal.

Pergunto eu: com que outra nação temos nós maior numero de affinidades de todo o genero?

A Inglaterra é, para assim dizer, um paiz nosso limitrophe - nas colonias e pelo mar, porque a Inglaterra é a maior potencia naval e o nosso paiz é uma orla do littoral. Na India, onde ella tem o dominio governativo, temos nós o dominio espiritual do padroado.

Affinidades politicas, porque a nossa constituição e a ingleza são da mesma familia.

Affinidades de vocação, porque Portugal foi sempre um paiz de navegantes, e não tem outro futuro. A Inglaterra tem sido a continuadora da nossa historia nas explorações, nos descobrimentos, no commercio maritimo. E é coincidencia notavel que o principe que revelou a Portugal a sua vocação, e lhe deu um impulso tão obstinado e tão feliz, era filho de uma princeza de Inglaterra - a mulher do Rei de boa memoria, a mãe de Duarte, o eloquente; de Henrique, o navegador; de Pedro, o cavalleiro; de Fernando, o martyr da patria.

E hoje em dia, sr. presidente, quem propala ao mundo os nossos merrtos de descobridores em uma lingua mais conhecida que a nossa?

São ainda os inglezes, escrevendo os feitos de nossos navegantes, como fez o sr. Major, e traduzindo os nossos historiadores e viajantes do seculo XVI, como está fazendo a sociedade Hakluyt.

Afinidades economicas. O valor total da nossa exportação é de 23:000 contos. D'estes, 12:000 vão para a Inglaterra: de maneira que a Inglaterra compra mais dos nossos productos que o resto do mundo inteiro.

Assim, sr. presidente, digam o que disserem quantos Thomés ha em Diu e em,toda a India, o mais simples criterio nos ensina que devemos continuar a estreitar cada vez mais os laços que ha tantos seculos nos prendem áquelle paiz. E tudo quanto seja em contrario, é renegar da nossa historia, apagar as recordações de uma confraternidade gloriosa, contradizer as sentimentos do nosso povo, que tributa aos filhos d'aquella nação maior consideração que a nenhum outro estrangeiro, e, finalmente, prejudicar gravemente os nossos interesses politicos e materiaes.

Assim o entendia o philosopho, o historiador, o homem de bem, cuja morte ainda ha pouco o paiz chorava como uma calamidade nacional.

A camara me agradecerá o rocordar-lhe eu as eloquentes palavras do sr. Alexandre Herculano.

"A alliança sincera de Portugal com a patria de Nelson e de Wellington é indestructivel. porque procede não só das tradições historicas e da analogia de instituições politicas, inas tambem da força das circumstancias actuaes.

"A origem d'essa intima alliança tem a sua data escripta no mais grandioso monumento do paiz. A Batalha recorda-nos que ha um pacto perpetuo assellado com sangue entre Portugal e a Inglaterra. Quando o povo portuguez deixar de ser o irmão e o amigo do povo inglez, tem que derribar primeiro o templo de Santa Maria da Victoria, e de lá, decima das ruinas, sobre os ossos de D. João I, o arauto da discordia tem a annunciar ao mundo que esse velho pacto expirou. Ha perto de quatro seculos, nos campos de Aljubarrota e em frente dos esquadrões francezes e castelhanos, a invencivel infanteria ingleza jurava com os cavalleiros portuguezes que esta terra seria livre, e uns e outros cumpriam heroicamente o seu voto."

Este é o pensar do sabio a respeito da nossa alliança com a Inglaterra a quem elle, em outra parte do mesmo escripto, chama "a civilisadora do mundo, esse paiz modelo, essa terra da nobre raça anglo-saxonia, defensora natural dos povos livres menos poderosos."

E o nome d'este pensador traz-me á memoria um outro que andará indissoluvelmente associado ao seu, o de um poeta a quem, nos dominios da imaginação, as lettras patrias devem igual quinhão de reconhecimento.

No seu poema Camões Almeida Garret dirige á Inglaterra uma saudação affeetuosa, que será applaudida por quantos conhecem aquella grande e nobre nação.

Patria da lei, senhora da justiça,
Couto da foragida liberdade,
Salve, Britannia, salve flor dos mares,
Minha terra hospedeira, eu te saudo!

O. sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: - Sr. presidente, v. exa. e a camara não estranharão de certo o ter eu pedido a palavra na questão especial, a que acaba de referir-se o digno par, tanto mais que s. exa. se dignou honrar-me appellando para o meu testemunho sobre essa mesma questão.

O assumpto em que fallou o digno par, tem toda a importancia que não póde deixar de dar-se a uma questão internacional, e o governo não póde em assumptos d'esta natureza ter senão uma opinião, não póde haver divergencias entre os ministros, e a opinião d'estes deve ser e é perfeitamente conforme; por consequencia as opiniões, quaesquer que ellas fossem, que em qualquer eseripto um dos actuaes membros do gabinete houvesse manifestado, quando não tinha a attender senão á sua responsabilidade pessoal, nada tem com as opiniões e os procedimentos, do governo.

N'uma discussão da imprensa os assumptos podem considerar-se sob um ponto de vista exclusivo e restricto; mas o governo é que tem de ter em conta os assumptos graves sob todos os seus aspectos, em todas as suas relações: não póde preuccupar-se unicamente de um interesse restricto e exclusivo, mas deve preoccupar-se com o interesse geral do estado, que é complexo, e até modifica essencialmente o aspecto das questões.

Citar as opiniões ou antes as impressões de um escriptor para d'ellas deduzir quaes as opiniões do ministro, é desconhecer inteiramente como varia uma posição e a responsabilidade de um homem publico, segundo a sua situação, situação que lhe impõe deveres e que o obriga a apreciar as questões nas suas mais largas relações.

Sr. presidente, o digno par fallou com o enthusiasmo que lhe é proprio, com o calor que lhe é habitual, sobre patriotismo, e disse que não sabia bem o que era... patriotismo.

Eu vou a tal respeito, sr. presidente, dizer a minha opinião.

Ter patriotismo é não prejudicar nunca os interesses da patria: é não tentar pertubar-lhe as boas relações com as nações estrangeiras para satisfazer um sentimento politico de momento, e de muito secundaria importancia.

Ainda ha pouco um dos primeiros homens politicos da Europa, o principe de Bismark, tratando-se de uma questão relativa aos ordenados dos agentes diplomaticos da Allemanha, disse - "Aqui regateia-se esta questão, aprendam com a França o que é ter patriotismo."

Quando se trata de uma questão internacional, não se levantam ali discussões no parlamento, que podem ter consequencias funestas para a dignidade da nação, nem se suscitam difficuldades ao governo.

São estes proximamente os termos justos e verdadeiramente patrioticos em que se exprimiu o grande chanceller do imperio allemão.

Ora, sr. presidente, como se trata de uma questão internacional, como é esta grave questão das nossas allianças, permitta-me o digno par que lhe lembre o conselho de um dos, primeiros politicos do mundo.

Citar a historia para mostrar as nossas velhas relações

22 *