DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 187
quando as demissões tenham sido dadas ou pedidas por motivos politicos.
Não foi attendido porque aquelle illustre general; não quiz calcar a lei, nem prejudicar mais os officiaes que durante onze annos tinham estado sujeitos aos trabalhos e responsabilidades do serviço, por quem durante esse espaço de tempo se tinha exclusivamente occupado dos seus negocios particulares.
E mais um argumento para provar que era esse o seu pensamento, é que sempre que teve que referendar documentos em que se concediam indemnisações por motivos politicos, teve sempre cuidado de consignar que não gosavam d'essas vantagens os officiaes que, achando-se demittidos, sem ser por motivos politicos, tivessem sido reintegrados nos seus postos, como se vê na carta de lei de 17 de julho de 1855 n.° 2.° do artigo 3.°
(Leu.)
Finalmente o decreto, que discuto, de 18 de julho de 1866, invoca o parecer do supremo conselho de justiça militar, com o qual diz conformar-se. Ora este parecer conclue por dizer: "Que se o decreto de dictadura de 22 de dezembro de 1846, que fez voltar ao exercito o requerente, teve por fim reparar uma injusta preterição, não póde ella completamente obter-se, sem que a pretensão seja deferida a seu favor".
(Leu.)
A condicional indica que aquelle corpo collectivo não tinha opinião assente, ou que da documentos que lhe foram apresentados a não podia tirar: e nós já vimos como não havia outra preterição reparar. Parecer como aquelle poderia dar-se previamente para todos os negocios sobre que se fosse consultado; - se uma pretensão é justa deve ser resolvida a favor -; e todos se podem conformar com ella, sem receio de errar.
Tenho exposto, sr. presidente, as rasões por que considero illegal o decreto de 18 de julho de 1866. E tenho pelo meu lado todos os fiscaes da corôa e corpos consultivos travidos sobre o assumpto; com excepção do sr. Barros e Sá, relator do parecer que se discute; o qual tem opinião singular a este respeito manifestada em 1861; opinião que, se contesta pelos mesmos fundamentos por que se contesta a d'aquelle decreto, que parece inspirado pela consulta d'este jurisconsulto.
O parecer do sr. procurador geral da corôa e do sr. conselheiro Avelino, referindo-se á reintegração do sr. Damasio diz que em vista das leis; só se lhe poderia contar a antiguidade da patente desde o decreto do seu novo ingresso, porque o tempo, que esteve fora do serviço seria deduzido da antiguidade, como se deprehende do que se lê a, pagina 548 da ordem do exercito n.° 30 do anno passado.
(Leu.)
O dos srs. Sequeira: Pinto, Julio de Vilhena e Annibal Martins affirmam de uma maneira positiva que o decreto de 18 de julho de 1866 é illegal, em vista dos factos, das opiniões e consultas dos jurisconsultos e tribunaes, e das leis que regulam o accesso, e que produziu offensa de direitos de terceiro, como se vê do exposta a paginas 553, 554 e 559 da mesma ordem do exercito.
(Leu.)
São todos estes jurisconsultos; porém; de opinião de que não, póde ser mudada a posição ou a antiguidade do sr. general Damasio, porque, as patentes são propriedade do official, jurisprudencia que o governo respeitou.
A secção administrativa do conselho d'estado. em 1868, de que eram membros os srs. José Augusto Braamcamp, duque de Loulé, conde de Cabral e conde da Carreira, consultou ainda pela illegalidade do decreto de 1866, por isso que considera, igualmente illegal o de 22 de dezembro de 1846, firmando a opinião de que a reclamação de Affonso de Campos e de outros officiaes era procedente e que ao governo incumbia, reparar os prejuizos que os interessados estavam soffrendo, em vista da flagrante injustiça que lhes foi feita. É, sr. presidente, o que se lê mais desenvolvidamente a paginas 540 e 554 d'aquella citada ordem do exercito.
(Leu.)
Já vê v. exa., sr. presidente, que a minha opinião é apoiada na de boas auctoridades.
Mas, reconhecida a procedencia das reclamações, era da competencia do governo resolver ácerca d'ellas? Tenho tambem a convicção de que era.
É certo que o decreto de 10 de dezembro de 1868, sobre promoções, estabeleceu, no artigo 75.°, que os officiaes que se julgassem preteridos poderiam interpor recurso para o conselho d'estado, e fixou os prasos para a interposição d'esse recurso. Esse decreto foi depois suspenso, na parte não regulamentada; e por muito tempo se considerou todo sem effeito, pela difficuldade de destinguir-se o que precisava ou não de regulamentos, emquanto se não deliberasse sobre o assumpto; sendo assim, que muitas disposições d'aquelle decreto, que manifestamente não precisam de regulamentos, ainda até hoje não foram postas em execução. Em 1871 foi julgado que a doutrina do artigo 75.º estava era vigor, e na ordem do exercito n.° 7 d'este anno assim foi affirmado.
Mas, sr. presidente, a reclamação do coronel Affonso de Campos foi feita muito antes d'este decreto, quando era jurisprudencia seguida que o militar que se julgasse preterido recorria ao ministro; e estava em tempo de ser considerada, porque a demora na resolução das reclamações, dependente da vontade do governo, não podia prejudicar o direito do reclamante, embora publicadas depois as disposições que estabeleceram nova fórma de processo a seguir. É o que se deduz das opiniões emittidas a paginas 547 e 556 da consulta dos fiscaes, publicada na ordem n.º 30 do anno proximo passado.
Por consequencia, sr. presidente, era o governo competente para attender a esta reclamação; e, sendo ella justificada pelo aggravo feito por um acto illegal do governo; não só áquelle official como a outros, entendeu o governo, como tem sido pratica e como é justo, applicar a resolução tomada a todos os officiaes preferidos pelo mesmo motivo. A resolução do governo não dependia do official reclamante, mas da natureza da reclamação; foi provocada pelo requerimento de Affonso de Campos, como podia ter sido por o de qualquer outro dos officiaes prejudicados; as opiniões dos tribunaes e dos jurisconsultos não mudariam por esse motivo; e; n'este caso, mais frisante se tornaria a necessidade de adoptar medida geral para os officiaes nas mesmas circumstancias, sendo, como poderia ser, o reclamante algum dos mais modernos.
Resta-me, sr. presidente, mostrar como entendo que o governo podia adoptar a solução que adoptou.
Resolvido a attender as reclamações de que se trata, tinha elle a consulta da secção administrativa do conselho d'estado de 19 de abril de 1868, que já li á camara, tribunal competentissimo para julgar sobre o assumpto, o qual affirmou que as reclamações eram procedentes, sendo de parecer que, á falta de outros meios, devia o governo desde logo graduar os reclamantes no posto de coroneis, fixando-lhes igualmente a sua collocação na escala de antiguidade.
Vejamos qual era o effeito da applicação d'este parecer, que não repugna ao illustre relator da commissão. Era inquestionavelmente alterar a posição do então coronel Damasio na escala de accesso, e dar aos indemnisados, por esta fórma, o direito é reforma no posto de general de brigada, isto é, conceder-lhe para esta situação dois postos; porque as graduações em quaesquer postos, por effeito de preterição para a effectividade, são consideradas, na occasião da reforma, como se fossem postos effectivos, como se vê de differentes disposições da lei, e entre ellas da carta de lei de 17 de julho de 1855, artigo 1.º
(Leu.)