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SESSÃO N.° 22 DE 13 DE NOVEMBRO DE 1906 301

E que, depois de ella estar na posse do Sr. Presidente do Conselho, appareceram ainda commerciantes pretendendo assigná-la.

Na declaração que faço, creio ter correspondido á amabilidade com que se me dirigiram os signatarios do officio, a quem compete a responsabilidade das asseverações de que fui apenas o porta-voz.

Posto isto, recordarei o que Urbano Rattazzi dizia acêrca da batalha de Custozza, em que os italianos foram derrotados em 1866:

O plano de Lamarmora era excellente. Simplesmente os austriacos não o quiseram seguir.

Com o chefe do Gabinete succede outro tanto, Os seus planos são primorosos. Apenas a Nação não está disposta a segui-los, por serem1 na pratica o reverso do que foram celebrados em theoria.

Os factos numerosos por mim adduzidos comprovam o meu asserto, cuja confirmação ainda hontem se patenteou na Camara Electiva, perante as affirmações do Sr. Presidente do Conselho, concernentemente aos adeantamentos ou dividas da Casa Real ao Estado.

Chamo a attenção da Camara para a gravidade de tão audaciosa declaração, e permitto-me lembrar ao Governo que medite nas melindrosas consequencias, que, sem duvida, resultarão dos seus propositos, se procurar torná-los effectivos. ..

O Sr. Pimentel Pinto: - Apoiado, apoiado.

O Orador: - A questão da liquidação d'esses adeantamentos, por contado Thesouro, é gravissima. Não pode ser.

Regularize-se a situação. É indispensavel fazê-lo quanto antes. Mas esclareça-se simultaneamente o assumpto, em todos os seus ramos, pedindo-se a quem quer que seja as responsabilidades pelas infracções commettidas; e reembolse integralmente o Estado quem aproveitou com os desmandos referidos.

Na serie de atropelos - para lhe não dar nome mais adequado - que me proponho pôr em relevo, seguem-se, ao que acabo de registar, os que, pelo Ministerio da Guerra, visam ao engrandecimento do poder real - ao nefasto, funesto e inconstitucional poder real. São d'essa indole gafada:

O projecto de lei de 9 de outubro, auctorizando o Governo a organizar o Supremo Conselho de Defesa Nacional, e a remodelar as organizações das Secretarias da Guerra e da Marinha;

A circular respeitante a cumprimentos;

E a circular referente ao hymno da Carta.

O Supremo Conselho de Defesa Nacional, que aspira a estabelecer sequencia na administração dos negocios da guerra, não pode, perante o seu organismo e funccionamento, attingir esse fim. Em sessão nocturna de 24 de abril de 1901, o Sr. Presidente do Conselho, versando esta materia, apparentou preferencias pelo figurino allemão. A par d'isto, a proposta submettida á apreciação parlamentar, e que é assignada tambem por S. Exa. % apresenta-se-nos com resaibos de afrance-zada.

Mas como o proverbio italiano nos ensina: tradutore tradittore, quando esse projecto for discutido, reconhecer-se-ha que, sem ser allemão, neni genuinamente francez, o producto indigena representa um aborto espectaculoso, que mal, muito mal mesmo, substituirá a modesta commissão superior de guerra, cuja instabilidade, na sua organica, devida a antagonismos ministeriaes indesculpaveis, nunca a inhibiu de trabalhar com idoneidade e proficiencia, na resolução dos mais complexos problemas da defesa da Patria.

A sequencia que eu preconizo de longa data derivaria do bom criterio dos dirigentes, os quaes deveriam sobrepor os interesses supremos da nação aos despeites de sectarios e de rivaes. Nunca me passou pela mente concorrer para a criação de um instrumento feudal, com pretensões a impor-se ao Parlamento, calcando abertamente os artigos 45.° e 46.° da Carta, os quaes dispõem:

Art. 45.° A proposição, opposição e approvação dos projectos de lei compete a cada uma das Camaras.

Art. 46.° O Poder Executivo exerce por qualquer dos Ministros de Estado a preposição que lhe compete na formação das leis; e só depois de examinada por uma commissão da Camara dos Senhores Deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em projecto de lei.

Sob o seu aspecto anti-constitucional, ao projecto em questão nada falta desgraçadamente. Investe o reinante em funcções descabidas, que lhe estão vedadas pela letra expressa da Carta, trazendo-o para a discussão a que não pode furtar-se, visto fazer parte de um orgão deliberativo, a que preside.

É certo que elle não tem voto nos assumptos submettidos a debate. Mas este facto, que imprime seguramente caracter, não resgata a presidencia de responsabilidades. Apenas a diminue no seu exercicio. É o que acontece sempre que se despreza o caminho direito, para enveredar por bêcos e vielas.

Segundo a previdente formula consagrada, o Rei reina e não governa, nem tão pouco commanda.

As attribuições do Chefe do Estado estão definidas pela Carta Constitucional e respectivos Actos Addicionaes. Pelo artigo 6.° da lei de 3 de abril de 1896, o Rei exerce o Poder Moderador com a responsabilidade dos Ministros. Pelo artigo 75.° da Carta, é elle o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos Ministros de Estado. Entre as suas attribuições, ha a mencionar, para o caso sujeito, a que dimana do § 5.° d'esse mesmo artigo, concebido n'estes termos:

Nomear os commandantes da força de terra e mar, e removê-los, quando assim o pedir o bem do Estado.

O Rei nomeia, não se nomeia, para desempenhar funcções de commando ou similares, por que não está, em casos taes, coberto pela responsabilidade dos Ministros.

Nem é o chefe superior do exercito, nem tão pouco lhe pertence o posto de marechal general. Estes predicados são-lhe indevida e inconstitucionalmente attribuidos pela organização militar de 30 de outubro de 1884, e subsequentes. Elle é unicamente, consoante o artigo 71.° da Carta, o chefe supremo da nação.

Demais, a legislação em vigor não destoa das tradições, nitidamente affirmadas pela Constituição de 23 de setembro de 1822, e pela de 20 de março de 1838.

Em taes circunstancias, a constituição de 1822 estabelecia:

Art. 123.° Especialmente competem ao Rei as attribuições seguintes:

VI. - Nomear os commandantes da força armada de terra e mar, e empregá-la como entender que melhor convem ao serviço publico;

Porem quando perigar a liberdade da nação e o systema constitucional, poderão as Côrtes fazer estas nomeações.

Em tempo de paz não haverá commandante em chefe do exercito nem da armada.

Quão afastados estamos do liberalismo castiço de ha cerca de um seculo!...

Então era preceito constitucional que a auctoridade do Rei provinha da nação. Na actualidade, ainda as leis são encimadas por estes dizeres, deprimentes para a soberania nacional:

Dom fulano, por graça de Deus, Rei de Portugal e dos Algarves, etc.

Por graça de Deus!...

Mas voltemos á Constituição de 23 de setembro de 1823, que mais determinava :