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N.° 20 SESSÃO DE 27 DE NOVEMBRO DE 1894

Presidencia do ex.mo sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios — os dignos pares

Conde d’Avila

Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. — Correspondencia. — O digno par bispo-conde toma a palavra para se referir a varios assumptos de ordem religiosa e á aposentação de parochos. Responde o sr. ministro da justiça. — O sr. presidente nomeia a deputação que terá de entregar a Sua Magestade o projecto de resposta ao discurso da corôa. — O digno par Mattozo Santos justifica as suas faltas ás anteriores sessões, e annuncia que deseja conversar com os srs. presidente do conselho e ministro da marinha. O sr. ministro da justiça promette communicar aos seus collegas os desejos do digno par. — O digno par conde do Bomfim insta por uns documentos, e, depois de fazer varias considerações sobre materia religiosa, manda para a mesa um requerimento, que é lido e expedido. — O digno par conde de Castro pergunta por uns documentos, e annuncia nota de interpellação ao sr. ministro dos negocios estrangeiros ácerca do convenio de pescarias com a Hespanha. A nota de interpellação é lida e admittida. — O digno par conde do Casal Ribeiro emitte a sua opinião sobre a questão religiosa versada na camara, declarando-se ao lado dos prelados. — O digno par Rocha Peixoto manda para a mesa um projecto de lei sobre artigos do codigo civil, justificando-o. Fica para segunda leitura. — Os dignos pares Barros e Sá e arcebispo de Evora fazem largas considerações sobre assumptos religiosos.

Ordem do dia: são completadas as commissões de guerra e de fazenda, e eleitas as de instrucção e de commercio e industria. — Encerramento da sessão.

Ás duas horas e um quarto da tarde, achando-se presentes 24 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão precedente, que foi approvada sem reclamação.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Um officio do sr. ministro da marinha, acompanhando relações dos contratos celebrados pelo seu ministerio, de janeiro a dezembro de 1893 e janeiro a novembro do corrente anno, de valor superior a 500$000 réis.

Esteve presente o sr. ministro da justiça.

O sr. Bispo Conde de Coimbra: — Sr. presidente, eu bem conheço que não tenho intelligencia, nem dom de palavra e pratica de fallar em assembléas politicas, para poder ter a honra do levantar a minha voz n’esta camara, e, alem de outras, tem sido esta tambem uma das causas, confesso-o ingenuamente, por que não tenho frequentado com assiduidade as sessões, do que peço muitas desculpas a v. ex.as e á camara.

Agora mesmo, vindo a Lisboa por motivos ecclesiasticos, vim a esta sessão unicamente para acompanhar os meus collegas no episcopado, e para que a minha ausencia não denotasse descortezia e menos respeito e apreço por esta grandissima honra que a nossa constituição politica concede a todos os prelados do continente.

Mas, sr. presidente, sendo eu já, e infelizmente, o mais antigo de todos em Portugal no serviço do governo diocesano, como vigario geral, como vigario capitular, e depois como bispo, e tendo pugnado sempre desde o principio da minha carreira publica com a palavra, com a penna e com

o exemplo pela harmonia entre a Igreja e o Estado, e pelo auxilio reciproco que entre si devem prestar-se estes dois poderes, sem prejuizo dos direitos privativos de cada um, para mais facilmente conseguirem os fins a que ambos se propõem, fim religioso e fim social que não podem separar-se um do outro, eu não pude deixar, sr. presidente, de pedir a palavra a v. ex.a para testemunhar a satisfação e o contentamento que tenho por ver que vamos entrando no caminho das minhas aspirações: o auxilio dos governos ao ministerio e acção religiosa justa e legitima dos bispos, e o auxilio e cooperação d’estes ao desempenho da acção temporal e civil dos governos, quaesquer que sejam os partidos a que pertençam.

Alem d’isso, eu não podia deixar de declarar que estou de accordo, e que me associo aos meus collegas nas doutrinas que tão bem e tão sabiamente aqui têem exposto sobre assumptos de regimen parochial. E agora, já que tenho a palavra que v. ex.a se dignou conceder-me, o que muito agradeço, permitta-me que use d’ella para fazer algumas breves considerações sobre a nossa politica religiosa.

Sr. presidente, o grandissimo erro que commetteu o clero de 1834 entrando em demasia nas luctas e guerras de então em favor do partido vencido, trouxe, como era natural as represalias do partido vencedor, e o receio e a desconfiança em que este tem estado sempre de que para o futuro lhe póde ainda vir mal da classe ecclesiastica.

E com relação aos bispos, os partidos liberaes o a sua imprensa estão sempre a julgar de que tudo quanto vem d’elles é absolutismo, reacção e perigo para a liberdade, não cessando de lhes attribuir vistas absorventes do governo temporal, e ambições de predomínios politicos dos tempos que lá vão.

Sr. presidente, nada d’isto, e nada ha tambem tão injusto e destituido de fundamento, como são ainda hoje estas desconfianças e temores.

Sr. presidente, hão decorridos e passados já mais de sessenta annos, desde que foi vencido o antigo regimen; têem desapparecido, e baixado já á campa os seus caudilhos e homens mais importantes; e apagou-se tambem já, ha muito tempo, o grande fogo das paixões politicas, que o sangue derramado nos campos da batalha, os soffrimentos, as represalias e os desejos de vingança ateavam com mais ardor e maior violencia. E se eu não digo, como disse, não ha muitos annos, um illustre prelado francez, que os antigos regimens não se resuscitam, pela mesma rasão de que não se resuscitam os mortos; leve-se isso em conta do desejo que eu tenho de não offender, e de nem ao menos ser desagradavel áquelles que ainda hoje pensam e sentem o contrario. E muito estimava eu, e nós todos, os bispos portuguezes que elles, embora seguindo a sua politica, não se separassem de nós nos assumptos religiosos, visto que elles dizem que são catholicos, e visto que nós não queremos senão aquillo que quer o Papa.

Sr. presidente, o grande perigo da sociedade de hoje parece-me que não está em ella andar para traz, mas sim em que ande demasiadamente para diante, e que se precipite na ruina e na guerra do pobre contra o rico, do trabalho contra o capital, do operario contra o patrão, do pro-

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