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SESSÃO N.° 27 DE 20 DE NOVEMBRO DE 1906 357

clero, o Ministro que referendou este decreto pretendeu estabelecer uma compensação prescrevendo no artigo 7.° do mesmo diploma que os parochos haveriam, em logar d'esses dizimos, uma congrua igual ao seu rendimento anterior liquido, e isto vitaliciamente, acrescentando nos artigos 8.° e 9.° que um decreto especial fixaria - "as congruas sustentações que os fariam decentes e independentes, pagas pelo Thesouro Publico na forma geral".

E este decreto, que teve efficacia para a extincção dos dizimos, não a teve para a criação das côngruas.

Estas apparecem muito mais tarde, depois dos parochos serem largos annos provados duramente pela miseria e pela fome; e apparecem em condições muito diversas das que haviam sido promettidas, pois longe de tornarem decentes e independentes os contemplados, nunca foram abonados pelo Thesouro Publico, nem vitalicia a sua duração.

N'aquella expressão de que taes congruas durariam por "toda a vida", é licito entrever desde aquelle tempo a lei da aposentação do clero, em que se pensou tão tarde, ficando a este respeito, como em tudo o mais, a classe parochial em condição inferior aos empregados publicos, como se vê do confronto da lei de 14 de setembro de 1890, com o decreto de 17 de julho de 1886.

E só decorridos dois annos depois da publicação do referido decreto é que foi arbitrada uma prestação até á quantia de 50$000 réis por lei de 20 de dezembro de 1834, emquanto não fossem estabelecidas as côngruas.

A deficiencia d'esta lei, pois que não chegou a fixar o quantitativo da referida prestação, e o não cumprimento d'aquelle decreto fez com que um outro decreto de 19 de setembro de 1836, viesse declarar que nenhuma das medidas tomadas até ahi tinha sido efficaz, e que os parochos viviam pela maior parte na ultima indigencia e abandono.

Este decreto reconheceu e confessou a precaria situação do clero parochial, sem comtudo lhe dar remedio, pois que preceituou apenas medidas provisorias e de pouca duração, resultando da sua pratica desigualdades e injustiças taes que determinaram o decreto de 13 de janeiro de 1837, diploma que não dispensou novas leis e novos decretos sobre este mesmo assumpto.

Veem depois as leis organicas de 5 de março de 1838 e de 20 de setembro de 1839, que não dispensam ainda a lei de 8 de novembro de 1841.

Esta lei fixou os arbitramentos já feitos, e para que se não pensasse que os males que o clero estava soffrendo se prolongariam muito, apparecê pela primeira vez claramente promettida a dotação do clero no artigo 4.° d'esta lei - promessa que está por cumprir ha 65 annos!

Não foi sem verdade, pois, que affirmei que os Governos teem correspondido aos justos clamores da classe parochial com promessas sem cumprimento, decretos e leis sem effeito.

Á citação das leis seguia-se naturalmente a apreciação dos factos.

Não a permitte, porem, a brevidade do tempo, que não devo tomar á Camara.

Vou por isso concluir, pedindo instantemente ao Governo que tome a peito os interesses dos parochos, que bem posso classificar de interesses nacionaes.

E não será difficil ao Governo encontrar meio de melhorar, como é de toda a justiça, a condição do clero parochial se quizer soccorrer-se dos doutos trabalhos feitos e publicados pelos congressos ecclesiasticos de Braga e Coimbra.

O Sr. Ministro da Marinha (Ayres de Ornellas): - Pedi a palavra para declarar ao Digno Par que ouvi com a maior attenção, como certamente foi ouvida por toda a Camara, a eloquente exposição que S. Exa. fez, acompanhando- a representação do seu cabido acêrca da necessidade das obras da Sé Cathedral da Guarda, e bem assim as considerações que S. Exa. fez sobre a situação do clero parochial.

V. Exa. comprehende que, não sendo assumpto que corra pela minha pasta, eu não posso dar largas explicações ao Digno Par, e por isso me limito a chamar a attenção dos meus collegas para este assumpto, para que sejam satisfeitas as reclamações do Digno Par, e passo desde já a dizer a S. Exa. a que o Governo, muito longe de votar ao abandono esta questão, tem pela classe parochial toda a consideração devida aos relevantes serviços que tem prestado.

O Sr. Presidente: - Faltam dois minutos para se entrar na ordem do dia. Os Dignos Pares que teem alguns documentos a mandar para a mesa podem fazê-lo.

O Sr. Sebastião Baracho: - Mando para a mesa um requerimento, que é do teor seguinte:

Requeiro que, pelo Ministerio da Marinha e do Ultramar, me seja enviada, com urgencia, copia do relatorio da commissão nomeada pela portaria de 9 de janeiro de 1903, para estudar o projecto do submarino Fontes. - Sebastião Baracho.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de resposta ao Discurso da Corôa

O Sr. Ministro da Marinha (Ayres de Ornellas): - Sr. Presidente: a primeira vez que tive a honra de falar n'esta Camara foi discutindo uma das medidas apresentadas pelo Ministro da Marinha, que então era o Sr. Teixeira de Sousa.

Por uma coincidencia notarei, hoje, a primeira vez que me levanto d'esta cadeira para discutir n'esta Camara, é tambem com o Sr. Teixeira de Sousa, e para responder ao seu discurso.

S. Exa. não estranhará, nem levará á conta de menos consideração, que o não acompanhe n'aquelle desenvolvimento e n'aquella minucia de exposição que usou no seu largo discurso; e que, mais detalhada e pormenorizadamente, eu entre nos assumptos que dizem respeito á minha pasta. Aproveitarei, assim, a occasião para apresentar, não digo um programma de desenvolvimento da administração colonial, mas as ideias do Governo sobre os pontos essenciaes da nossa administração ultramarina, assumpto que com proficiencia e talento foi versado pelo Digno Par.

O discurso de S. Exa. comprehende tres partes essenciaes, uma propriamente politica, outra financeira e economica, e a terceira colonial.

Na parte politica S. Exa. fez considerações sobre dois pontos que largamente já teem sido discutidos n'esta e na outra casa do Parlamento: as contradições do Sr. Presidente do Conselho e a organização da concentração liberal.

Quando S. Exa., com aquella eloquencia inflammada que lhe é caracteristica, se referiu aos modelos e prototypos de contradições do Sr. Presidente do Conselho, veio-me á memoria aquella definição de espirito humano de um dos grandes humanistas da Renascença, Montaigne.

Dizia elle que o espirito humano é essencialmente ondeante e malleavel.

Esta malleabilidade, longe de ser um defeito, longe de representar uma inferioridade, é uma qualidade superior, porque representa á adaptação da in-telligencia humana á variada forma como se vão apresentando as questões.

As chamadas contradições do Sr. Presidente do Conselho não são mais que uma evolução do seu espirito, uma adaptação da sua intelligencia a novos moldes, porque novos são os requisitos e exigencias da administração publica. Essa evolução está em harmonia com a opinião publica, que já se vinha manifestando no mesmo sentido.