DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 193
foi recebida decididamente por todos os militares; mas a experiencia veiu demonstrar a sua utilidade, e tanto, que todas as nações entenderam dever seguir este systema que dá a educação militar ao maior numero possivel de individuos, sem grande inconveniente para o thesouro.
Ninguem sabe melhor do que o sr. presidente do conselho a pretensão que teve uma influencia estrangeira, de diminuir a força de uma nação, julgando assim desarmar essa nação, que era a Prussia.
Todos sabem que em 1808 o imperador Napolcão I determinou que a Prussia não tivesse em armas senão 42:000 homens; mas este paiz teve a habilidade de estabelecer um systema de serviço militar, que deu para este paiz resultados muito vantajosos, e contrarios áquelles que eram esperados, e tanto que dentro em poucos annos aquella nação dispunha de uma força enorme para concorrer, como effectivamentecon correu, para as grandes victorias que honraram as armas d'aquelle paiz.
Sr. presidente, nós estabelecemos o systema mais limitado de serviço, que foi um melhoramento incontestavel, más os melhoramentos de 1808 parece-me que podem dever ainda ao actual ministerio um grande aperfeiçoamento. Uma das reformas ultimamente apresentadas pelo sr. ministro da guerra foi a escola de cavallaria, que eu vi com grande satisfação. As escolas regimentaes de primeiras letras, entendo tambem que são um melhoramento.
Eu entendo que é absortamente indispensavel introduzir na nossa organisação militar a disposição de pôr em pratica as escolas regimentaes.
Já o sr. duque da Terceira, em 1845 ou 1846, reconheceu a necessidade d'esta medida, e tanto que fez consignar uma subvenção, no orçamento do ministerio da guerra, para o serviço das aulas regimentacs nos corpos de l.ª linha.
Eu entendo que o primeiro meio de realisar a instrucção primaria obrigatoria é dar ás praças de pret uma infinidade de empregos, que, nãi sendo desempenhados por ellas, hão de sel-o pelos afilhados dos influentes junto dos governos. O estabelecimento das escolas regimentaes de instrucção primaria deve concorrer para haver uma boa força auxiliar. Nós não podemos contar só com uma força effectiva em armas. Devemos contar com os 3:000 guardas das alfandegas, que não podem deixar de ser considerados como força militar. E tanto assim é, que na Italia e em Hespanha o corpo auxiliar das alfandegas considera-se como fazendo parte do exercito, e o mesmo deve acontecer com as nossas guardas municipaes. A França tem 20:000 ou 30:000 homens da gendarmeria, que são considerados tambem como força militar. Mas, o que se tem feito no nosso paiz?... Os guardas civis, que existem em varios districtos, são tambem um meio para se poder contar com mais força em qualquer occasião que fosse necessaria.
A lei do recrutamento é tanto mais necessaria quanto nós hoje estamos em uma posição indefinida com relação ao exercito. O actual sr. ministro da guerra conheceu esta necessidade, e tratou de nomear uma commissão encarregada de apresentar uma parecer sobre este assumpto. Esta commissão desempenhou este serviço de um modo muito louvavel, e indicou dois pontos muito importantes: um que tinha por fim tornar dependente da decisão do poder judicial certas reclamações, para se evitarem os arbitrios, e a outra foi a instituição de voluntariado por um anno, o que é um preparo indispensavel para se chegar ao serviço obrigatorio, que deve ser a base de toda a organisacão militar.
Entre nós existe actualmente um systema, que não existe em outro qualquer paiz. Não ha serviço obrigatorio, nem ha substituições por conta do estado; ha o systema das substituições por conta das familias.
O governo precisa que a opinião publica o auxilie para poder realisar o serviço obrigatorio, mas isso não se consegue senão fallando no parlamento e sustentando estas idéas. Só assim chegaremos a um resultado satisfactorio.
O sr. ministro da guerra, faço-lhe completa justiça, se podesse estabelecer o serviço obrigatorio, tinha-o estabelecido; mas como está debaixo da pressão da opinião dos que exigem o serviço obrigatorio e da dos que resistem a essa exigencia, não se tem considerado ainda nas circumstancias de apresentar uma reforma n'esse sentido.
O systema das remissões não dá só meios ao governo, dá tambem soldados, e a prova é que em Hespanha, ultimamente, havendo guerra civil, nem por isso deixou do ter soldados, apesar de lá haver o systema das remissões.
O que eu quero dizer é que é indispensavel que marchemos para o serviço obrigatorio, e que organisemos as cousas por fórma que saiamos d'esta situação, que nos não permitte dar um unico passo para esse resultado.
O systema que actualmente existe não é nem uma cousa nem outra. Emquanto havia remissões o systema era ao menos definido.
Eu não exijo do governo impossiveis, não quero nem desejo a reformade um jacto, mas o que é necessario é preparar a opinião e desfazer os attritos que porventura se possam encontrar n'ella, para que se chegue ao fim desejado, e quanto a mim o meio que o governo tem a apresentar para preparar convenientemente a opinião é o systema da voluntariedade.
E elle que nos póde sem difficuldade, e com segurança, encaminhar para o serviço obrigatorio, como tem succedido em outros paizes que o adoptaram.
E não se diga, sr. presidente, que o systema não póde ser adoptado entre nós. Está em vigor em muita parte, é seguido na Italia, porque não podo tambem dar resultado no nosso paiz?
O sr. presidente do conselho nomeou uma commissão para rever a lei do recrutamento. Eu concordo perfeitamente com a necessidade da revisão d'esta lei, e tanto mais que a considero uma base da lei eleitoral. A lei eleitoral, sr. presidente, está, quanto a mim, dependente da lei do recrutamento, e não nos illudamos, emquanto esta estiver viciada não póde aquella ser uma verdade.
Portanto, sr. presidente, não continuemos com este systema, protrahindo assim um estado de cousas, que não tem as vantagens de encaminhar a opinião para um systema definido, e que nem ao menos tem as vantagens que poderiam offerecer as remissões.
O sr. ministro declarou já que ha de tratar de melhorar o nosso serviço do recrutamento, eu applaudo-o por esse facto, e desejo ardentemente que a reforma se faça.
A lei de 1855, feita pelo ministerio de que fazia parte o sr. Fontes, póde considerar-se liberal, mas depois as circumstancias fizeram com que essa lei esteja dependente da lei eleitoral, e tanto assim é que o sr. ministro da guerra, quando tratou d'este assumpto, providenciou por fórma a procurar desviar da commissão de revisão os inconvenientes das influencias cleitoraes. E eu ouvi cousas, sr. presidente, a um dos membros da commissão, que me fizeram horrorisar!
Eu louvo, sr. presidente, os bons desejos do sr. ministro, e os serviços que tem prestado, occupando-se do assumpto, e manifestando as minhas opiniões, tenho apenas em vista dar força ao que se fizer n'este sentido, e o meio de dar essa força e preparar a opinião é de certo o manifestarem-se n'esta casa as opiniões clara e francamente.
(O orador não reviu os seus discursos na presente sessão.}
O sr. Marquez de Vallada: - Muito bem disse o illustre representante da nação que acaba de fallar, com o brilhantismo com que costuma occupar a tribuna, que a base de toda a organisacão militar é uma boa lei de recrutamento. S. exa., fazendo os elogios merecidos ao sr. Fontes Pereira de Mello pelos esforços que s. exa. tinha empregado para tornar uma realidade aquillo de que o paiz tanto carece, acrescentou que estas leis são, por assim dizer, experiencias. A experiencia, que é a melhor mestra dos individuos e dos povos, demonstra que as leis encontram na pratica quasi sempre difficuldades, que anteriormente se não