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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 195

na actual sessão legislativa estas duas importantes propostas.

Ainda que não tenhamos nada a inventar, porque n'outros paizes ha exemplos que podemos seguir, estando ahi postas em pratica as doutrinas na actualidade mais acceitas sobre um e outro ponto, a que venho referindo-me, com tudo creio que não devemos chegar a uma lei de recrutamento franceza ou prussiana, traduzil-a para portuguez, e, sem mais trabalho, convertel-a em proposta do governo. É necessario accommodal-a aos nossos costumes, ao nosso territorio, á nossa população, emfim a tudo quanto constitue elemento de vida de um paiz.

Não podendo, portanto, copiar ou traduzir qualquer organisação do exercito, nem qualquer reforma da lei do recrutamento, era indispensavel preparar estes trabalhos com antecipação, com tranquillidade, o que não se póde conseguir durante a sessão parlamentar.

V. exa., sr. presidente, que tem sido ministro muitas vezes, e a camara toda, sabem que não é possivel, com o parlamento aberto, proceder-se a certos trabalhos de importancia e que precisam grande estudo e desenvolvimento.

Declarei e torno a declarar, sr. presidente, que tenciono trazer ás côrtes uma proposta sobre o recrutamento, reforma das leis de 1855 e 1859, e outra, em harmonia com esta, para a reforma do exercito.

Ouvi com muita satisfação todos os dignos pares que tomaram parte n'este debate. Ao digno par o sr. marquez de Sabugosa não tenho muito que dizer, porque s. exa. não me dirigiu pergunta alguma; limitou-se a fundamentar o seu voto, repetindo o modo por que interpreta o decreto de 1863.

Eu tenho declarado mais de uma vez que não entendo assim aquella lei, e tambem não a entendeu assim v. exa. quando dignamente occupou o posto que occupo agora. Ha, por consequencia, a meu favor, em primeiro logar, a disposição da lei, que me parece clara; em segundo logar, a interpretação que lhe deu o governo esclarecido que esteve á frente dos negocios publicos depois que os deixei em 1877.

Portanto, n'esta parte registando e tomando na consideração que me merecem sempre as observações de s. exa., eu insisto na minha interpretação, e parece-me que o governo não interpreta mal d'esta maneira.

Sr. presidente, ouvi tambem com muito gosto as reflexões do meu antigo amigo o sr. Carlos Bento. S. exa. não fez interpellação nem censura, mas expoz as suas reflexões a proposito da lei que se discute, reflexões que são muito bem cabidas no assumpto, e que têem intima connexão com elle.

Lembrou s. exa. que um homem d'estado, o sr. marquez de Sá da Bandeira, cuja perda todos nós deploramos, tinha reduzido o tempo de serviço militar a tres annos; mas disse o digno par que essa medida não tinha sido bem acceita por todos os militares. Eu honro-me de ser militar, e acceitei-a perfeitamente.

Julgo que é indispensavel que o tempo de serviço não passe alem de tres annos nas fileiras, embora se augmente o tempo na reserva; mas isso é outra questão. Esse tempo da reserva na maior parte dos paizes ainda é maior que entre nós. Essa reducção faz com que o maior numero de pessoas possam passar pelas fileiras do exercito sem prejuizo para os individuos nem para os interesses do thesouro.

D'esta fórma habilitam-se muitos homens para occuparem os seus logares no exercito, e ao mesmo tempo prepara-se uma reserva numerosa com contingentes avultados. O resultado d'esta reducção, de cinco a tres annos, é que sendo a fixação do exercito em tempo de paz de 30:000 homens, como está determinado por uma lei organica, os contingentes são maiores, porque menor é o numero de annos por que se tem de fazer a divisão. Assim pois, em logar de 6:000 homens, os contingentes têem de ser de 10:000.

Este augmento parece á primeira vista um grande encargo; mas desde o momento que seja limitado esse encargo a um pequeno numero de annos, e que todos os mancebos validos sejam obrigados ao serviço militar no principio da sua vida, não produz inconvenientes graves.

Nós estamos vendo que nos paizes onde este systema está adoptado, nem as artes, nem a agricultura, nem as sciencias, nem nenhuns trabalhos, sejam de que genero forem, têem perecido por causa do serviço militar, pelo contrario têem florecido muito mais que entre nós. Embora este serviço se estenda a um grande numero de cidadãos, como elles não occupam muitos annos as fileiras, d'ahi não resulta inconvenientes consideraveis, pelo contrario passam pelas fileiras um grande numero de individuos, que adquirem habitos de disciplina e de subordinação porque a fileira é tambem uma escola onde os cidadãos aprendem a ser respeitadores da ordem, da auctoridade e ao mesmo tempo a terem o pundonor e honra que devem possuir todas as pessoas para serem dignas.

Por consequencia, n'esta parte estou perfeitamente de accordo com s. exa. Disse o digno par que pelo systema das substituições em logar das remissões a dinheiro não se deu um passo para o serviço obrigatorio. É exacto. Modificou-se a lei na parte que foi impugnada e combatida fortemente por dois illustres membros do parlamento. Queixavam-se todos que por este systema o governo tinha dinheiro, mas não tinha soldados, e muitas vezes aconteceu, como se via dos documentos officiaes, que as sommas entradas pela remissão dos recrutas não eram sufficientes para obter o resultado que se desejava. O governo é verdade que via entrar-nos cofres publicos em determinados periodos dinheiro com uma certa abundancia, mas não via preenchidas as fileiras do exercito.

A lei do recrutamento foi feita para ter soldados e não para ter dinheiro. Alem de que este systema não podia ser justificado perante a consciencia publica, era um imposto o mais repugnante que podia haver, pois fazia depender da sorte o pagarem familias ou individuos sommas avultadas muito superiores ás que pagavam durante muitos annos, por outras contribuições ou encargos, e algumas d'essas sommas ainda se exigem e pagam para garantia e deposito ou fiança que a lei de 1876 ainda deixou ficar com respeito áquelles que porventura possam ser chamados ao serviço.

Portanto, o governo sem dar um passo para o serviço obrigatorio, afigura-se-me que pelo menos satisfez ás aspirações de um grande numero dos membros do parlamento, e ao que parecia ser então a opinião publica.

É certo que quando se promulgou a lei de 1855, ainda não havia serviço obrigatorio; apenas existia na Prussia uma organisação hoje melhorada, desenvolvida, acrescentada, que não é d'esse tempo, e que depois se generalisou, adoptando-a a França, a Italia e a Russia.

Ainda ha nações que não têem o serviço obrigatorio; uma d'ellas é a Belgica, outra a Hespanha, outra a Inglaterra. A Hespanha tem-no, mas no papel; não o cumpre.

Entendo, pois, que no interesse da igualdade e no interesse do exercito, o serviço obrigatorio está sendo fatalmente uma necessidade.

Receio, comtudo, que, quando se apresente a proposta para o estabelecermos, muitos dos dignos pares e dos outros membros do parlamento que têem agora sustentado e advogado este principio, votem contra elle. Espero que sejamos todos vivos para o anno, e se lá chegarmos, e eu tiver a honra de apresentar essa proposta, ver-se-ha então que muitos dos dignos pares que pedem actualmente o serviço obrigatorio, hão de ser os primeiros a levantar objecções contra elle.

O serviço obrigatorio como na Russia e na Italia está organisado tem dois caracteres distinctos: um essencialmente