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202 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Como Lisboa não só póde mudar por mais voltas que dêem, por mais soluções que procurem, linha internacional não póde ser senão a do Valle do Tejo.

Esta é a opinião do actual ministro das obras publicas, engenheiro com tão longa pratica d'estes estudos.

A opinião do um engenheiro tão distincto pelos seus conhecimentos especiaes, como é o sr. Lourenço de Carvalho, é uma opinião sempre valiosissima, e que deveria fazer impressão no animo do sr. presidente de ministros.

Mas apesar de tudo isto, que me parece obvio, o que eu reconheço é que a versatilidade de opiniões do sr. presidente de ministros se pegou já ao seu collega das obras publicas, e que os ares nas regiões do poder são pouco sadios e algum tanto epidemicos.

Tenho pezar de que o conceito elevado em que eu tinha o sr. Lourenço de Carvalho pelas suas convicções vá diminuindo ao vel-o sustentar como deputado uma opinião, o como ministro outra diametralmente opposta. Como deputado, s. exa. fallando vehemente, imparcial e desapaixonadamente, sustentava na camara dos senhores deputados que se fizesse primeiramente o caminho de ferro que pozesse Lisboa em communicação com o centro da Europa.

Note v. exa. que o sr. Lourenço de Carvalho julgava esta linha tão boa, considerava-a de tal fórma linha internacional, que nem sequer se preoccupava com as distancias, julgava que o caminho de ferro da Beira Baixa era tão excellente, que a sua construcção tinha sobre o caminho de ferro da Beira Alta a vantagem ainda de poder pela velocidade ser preferivel, embora para outro fosse mais curto o percurso de Lisboa a Medina del Campo.

S. exa. entendia que os 660 kllometros de Lisboa a Medina pelo caminho de ferro da Beira Alta e Salamanca, eram percorridos em mais tempo e com maior difficuldade de que os 805 kilometros de Lisboa pelo caminho de ferro: da Beira Baixa a Madrid e de Avila a Medina.

Eu podia talvez eximir-me de fazer mais considerações, e limitar-me a ler os trechos dos discursos do sr. Lourenço de Carvalho, porque elles são expressivos, e mostram claramente as minhas idéas; não obstante é preciso tornar salientes as contradicções, e por isso lerei ainda o que se segue:

"Portanto, a linha do Valle do Tejo, desde Lisboa até Madrid, é uma linha construida em excellentes condições, de uma facil exploração, e de uma velocidade compativel com a importancia que costumam ter os caminhos de ferro d'aquella ordem.

"A linha de Madrid a Medina del Campo tem porventura 207 kilometros, e esses 207 kilometros talvez v. exa. saiba muito bem, porque é de suppor que os tenha já percorrido, estão em excellentes condições de traçado e de exploração.

"A parte de linha de Madrid a Avila, ainda mesmo no ponto mais difficil, só tem excepcionalmente uma passagem das serras do Guadarrama, pequenas rampas de Om, 015 e curvas de 500 metros.

"De Avila a Medina del Campo, que são 80 e tantos kilometros, é de uma exploração facilima, é de um alinhamento recto ligeiramente quebrado a grandes intervallos de distancia.

"Vejamos agora se a totalidade de prumos da linha de Valle do Tejo não póde ser percorrida pelas locomotivas em tanto tempo, ou ainda em menos tempo que a linha da Beira Alta. A distancia por esta até Medina del Campo é de 660 kilometros, pela do Valle do Tejo ao mesmo é de 805.

"Pois, sr. presidente, eu reputo muito mais exequivel percorrer 800 kilometros com a velocidade de 40 kilometros a hora, do que os 660 com a velocidade de 30 kilometros. Isto daria o trajecto de vinte horas pela linha de Valle do Tejo, e de vinte e duas horas pela Beira Alta.

"Note v. exa. e note a camara, ainda que a parte a construir em Hespanha é consideravelmente menor na linha do Valle do Tejo, do que na linha da Beira Alta."

Já vê v. exa. as considerações que fazia o sr. ministro das obras publicas. S. exa. era de opinião, que apesar dos 100 kilometros que tinha a linha do valle do Tejo a mais, passando por Madrid, e por Avila a Medina del Campo, assim mesmo esse trajecto podia ser percorrido em menos tempo pelas condições de velocidade que teria essa linha. E note mais v. exa., que esta directriz era a mais extensa, porque, como a camara sabe, o caminho de ferro do valle do Tejo chegando a Madrid deve seguir por Baides a Cartajoa e Pamplona e pelo ramal das Alduides a Bayona, e se não for a Madrid póde seguir de Malpartida pela transversal para Salamanca, e ambas estas directrizes são mais curtas do que a da Beira Alta, como está demonstrado polo relatorio apresentado pela commissão de engenheiros hespanhoes, nomeada para estudarem a rede dos caminhos de ferro de Hespanha.

Se o caminho de ferro por Madrid aos Alduides a Bayona é mais curto debaixo do ponto de vista que acabo de apresentar, ainda menos extenso ficaria se não fosse a Madrid e de Malpartida seguisse a transversal para Salamanca.

De todas estas considerações, e das differentes discussões no parlamento sobre este assumpto, resulta totalmente a grande superioridade e vantagem da linha da Beira Baixa sobre o caminho de ferro da Beira Alta.

Ainda hei de ler mais outro trecho da discussão do sr. ministro das obras publicas, o qual completa a sua obra, e mostrar á assembléa que s. exa. considerava o caminho do ferro da Beira Alta apenas para o serviço interior do paiz. O illustre ministro considerava esta linha como um caminho de ferro caseiro, é a expressão que s. exa. usou, quer dizer que é um caminho de ferro que só póde servir para o serviço interior do paiz, e nunca ser uma linha internacional:

"Tenho entrado talvez demasiado na questão technica, mas em todo o caso não quero por fórma alguma que se supponha que morro de sympathia pela Beira Baixa, ou que sou contra a Beira Alta. O caminho de ferro da Beira Alta tem para mim uma rasão de ser, e quero-o, mas como um caminho de ferro caseiro, como o caminho de ferro do Douro.?

S. exa. não acreditava que o caminho de ferro da Beira Alta podesse vir a satisfazer as necessidades do paiz como linha internacional, e comtudo não teve pejo de pedir a auctorisação para construir por administração aquella linha, sacrificando de todo a da Beira Baixa. Isto torna-se tanto mais censuravel, quanto menos o sr. Lourenço de Carvalho se preoccupava com a construcção simultanea de todos os caminhos de ferro propostos então polo governo, apesar de conhecer que a linha da Beira Baixa era muito superior pela facilidade de construcção e exploração, e por ser menos extenso e mais barato.

Apesar de então reconhecer a excellencia d'esta linha, julgava tambem que era necessario para o paiz, para o desenvolvimento da riqueza publica, a construcção simultanea das outras, isto é, até da do Algarve, que s. exa. entendia dever ser feita de via reduzida!

E agora, sr. presidente, á linha internacional, á linha predilecta do sr. ministro, nem sequer se lhe dá a honra de ser construida simultaneamente com as outras, ainda mesmo como caminho de ferro caseiro!!!

A questão do caminho de ferro do Algarve é uma questão muito seria, grave e importante, e havemos de tratar aqui d'ella quando apparecer mais esse escandalo.

Sr. presidente, foi apresentado um projecto de lei na outra casa do parlamento para ser alienado o caminho de ferro do sul, para se poder fazer o caminho de ferro do Algarve, para se fazer um caminho de ferro secundario, caminho do ferro que o sr. ministro das cbras publicas entendia dever ser feito de via reduzida!

É admiravel, é surprehendente, e sobretudo mysterioso,