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camara DOS DIGNOS pares.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 7 DE ABRIL.

Presidencia do Em.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios - os Srs.

Conde da Louzã (D. João)

Conde de Mello.

(Assistiam os Srs. Ministros, do Reino, e da Marinha.)

Depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 36 Dignos Pares, declarou o Em.ª. Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

Não se leu correspondencia.

O Sr. Conde de Thomar, referindo-se a uma discussão que houve entre elle Digno Par e o Sr. Ministro das Obras Publicas, na qual o Sr. Ministro prometteu mandar e dar os esclarecimentos necessarios; e ás propostas para uma commissão d'inquerito sobre este mesmo objecto, na outra Camara; para assim justificar a proposta que ia fazer, leu e mandou para a Mesa a seguinte proposta, para a qual pediu a urgencia:

«Proponho que se nomeie uma commissão de inquerito a respeito do caminho de ferro de Leste — devendo a dita commissão especialmente indagar a parte, que está feita, e a que resta a fazer — as sommas despendidas, e as que ha a despender — o estado do material fixo e circulante — o seu valor actual comparado com o custo — que numero de acções se passaram, e em que data — as causas que deram logar á suspensão dos trabalhos — e finalmente tudo o que a commissão julgar necessario para habilitar a Camara a tomar uma resolução conscienciosa sobre tão importante objecto. Camara dos Pares, 7 de Abril de 1856. = Conde de Thomar.»

Foi approvada a urgencia, e entrou em discussão.

O Sr. Ministro do Reino — Eu não me opponho a que haja a Commissão de inquerito para esclarecer a verdade sobre todo e qualquer objecto; parece-me comtudo que o negocio não é de tamanha urgencia, que se deva passar por elle sem estar presente o Sr. Ministro das Obras Publicas, que alguma cousa poderia dizer sobre o objecto, porque eu não tendo previsto, nem prevenido, a mesma proposta, nada posso dizer. Parece-me pois como digo, conveniente que o Sr. Ministro das Obras Publicas fosse avisado para estar aqui presente ámanhã á discussão da proposta; porque se acaso tivesse alguma cousa a dizer, poderia fazê-lo, ou pelo menos assistir á sua votação. Isto, pela minha parte, é um dever que não posso deixar de cumprir para com o meu collega, tractando-se de um objecto, que lhe diz respeito, e a que estou certo elle não se ha-de oppôr.

O Sr. Conde de Thomar não duvida condescender com os desejos do Sr. Ministro, não obstante parecer-lhe que não é indispensavel a presença do seu collega das Obras Publicas nesta discussão; mas quando annue a este adiamento por 24 horas, é porque não suppõe que S Ex se opporá á nomeação da Commissão de inquerito, por isso que é ella um meio de que ninguem mais que o Ministerio tem necessidade para pôr a cuberto a sua honra, e manifestarem-se os extravios, e ardis que se imputam á empreza, e que podem causar ao paiz grandes prejuizos.

O Sr. Ministro do Reino — Eu agradeço ao Digno Par a docilidade com que ouviu as observações que lhe dirigi, posto que me parece que não me expliquei bem sobre o motivo por que fiz as minhas observações, e por isso não me intendeu S. Ex.ª bem. Estou longe, declaro e torno a declarar, estou longe de me oppôr a que haja essa commissão de inquerito; e pelo contrario, muito estimarei que esta materia, e todas as outras que digam respeito ao procedimento de qualquer dos membros do gabinete no exercicio dos seus deveres, sejam assim esclarecidas, e tão minuciosamente examinadas; mas os motivos que me aconselharam a dizer o que disse, foi parecer-me que o meu dever me impunha a obrigação de observar que era necessario prevenir o meu collega da repartição competente para aqui estar, até mesmo porque qualquer explicação que elle de póde fazer com que a Camara presista com mais conhecimento no proposito de nomear a commissão de inquerito, lembrando algum ponto que o Digno Par não mencionasse: evitando-se assim que fique de parte alguma circumstancia importante. Intendo por tanto que nada se perde com as explicações que o Sr. Ministro da Fazenda possa dar; intendo mesmo que elle poderá nesta occasião ministrar esclarecimentos e informações, que não tenha podido ministrar na outra Camara, como o Digno Par menciona. Em todo o caso, eu não posso deixar de esperar da Camara o que ella não negou a Ministro nenhum, nem a nenhum gabinete; nem me parece que a demora de hoje para ámanhã possa influir na idéa de urgencia, que o Digno Par apresenta para a decisão da sua proposta. E aqui repito o que disse quando me levantei pela primeira vez; que nunca tive em vistas contrariar a proposta do Digno Par, e só dar occasião a que se esclarecesse mais por interesse geral. Tambem não posso deixar de dizer, como o Digno Par, que ella é util ao Governo, porque tenho a profunda convicção de que o Governo tem andado legal e dignamente nesta transacção; não tenho receio que se descubra cousa alguma, que lhe possa ser desairosa nem de longe, e por isso não posso tambem deixar de desejar o inquerito, uma vez que á sua votação esteja presente o Sr. Ministro das Obras Publicas, se quizer.

O Sr. Presidente — O Digno Par concorda em que fique a sua proposta para a sessão seguinte?

O Sr. Conde de Thomar — Convenho.

O Sr. Presidente — A Camara annue a que a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Thomar fique para a sessão seguinte?

Assim se resolveu.

O Sr. Visconde da Granja - Pedia a V. Em.ª que me informasse se já vieram os esclarecimentos e informações, que eu pedi pelo Ministerio das Obras Publicas. Em todo o caso, para não ter de me levantar outra vez, pedia que, no caso de não terem vindo, se repetisse o requerimento, porque foi apresentado por mim em 5 do mez passado, e já decorreu um mez.

Mandou-se repetir o pedido.

O Sr. Visconde de Sá — É para mandar para a Mesa um parecer da commissão de marinha e ultramar.

A imprimir.

O Sr. Visconde de Ourem — Sr. Presidente, eu pedi a palavra, porque tendo annunciado ha dias que tinha a fazer duas interpellações ao Sr. Ministro da Marinha, e S. Ex.ª se acha presente, desejava saber se está habilitado para responder ás ditas interpellações, das quaes uma versa sobre o procedimento de um empregado do Conselho Ultramarino no logar de Escrivão da fazenda de Gôa, e a outra sobre um conflicto que teve logar, tambem em Gôa, entre dois funccionar a respeito de precedencia de logares no Concelho do Governo. (O Sr. Ministro da Marinha Estou prompto para responder ao Digno Par.)

Sr. Presidente, eu desejo que o nobre Ministro dos Negocios da Marinha e Ultramar, a quem tenho a honra de me dirigir, se convença, e lenha para si, que é com a maior repugnancia, máo grado meu, que vou questionar a legalidade do provimento de um empregado do Conselho Ultramarino no logar de Escrivão da fazenda de Gôa. Mais; eu desejo que S. Ex.ª me possa convencer, que neste procedimento não faltou aos preceitos da justiça, que não dasattendeu as conveniencias do serviço, e que nem mesmo ferio os principios da moralidade. Eu faço justiça as boas intenções de S. Ex.ª, e pessoalmente desejo que conserve bom nome e reputação no desempenho das funcções do alto cargo que exerce; mas o provimento do emprego a que me refiro causou em mim impressões muito desagradaveis, parecendo-me um abuso de poder, e por isso não posso ficar silencioso sobre a materia.

Eu vejo, Sr. Presidente, que com o alludido despacho foi preterido um empregado probo, honesto, intelligente, e capaz de bem desempenhar o logar que pedíra, e a que tinha direito de legitimo accesso, preferindo-lhe o nobre Ministro um empregado subalterno do Conselho Ultramarino, que não tem as habilitações, nem os serviços, nem os conhecimentos especiaes dos negocios de fazenda da India, que concorrem no preterido. Desejava por tanto que o Sr. Ministro tivesse a bondade de me explicar quaes foram os motivos que teve para proceder, como procedeu, e depois de S. Ex.ª responder eu não duvidarei declarar, que estava em erro, ou direi o que mais se me offerecer sobre o objecto.

O Sr. Ministro da Marinha — O Digno Par reserva-se para o seu segundo discurso, porque ahi tenciona desenvolver as proposições que enunciara. Mas em quanto S. Ex.ª não tractar de desenvolver a sua primeira proposição, de que o empregado a que alludira, fôra preterido, porque havia lei que lhe dava accesso ao logar de Escrivão de fazenda da Junta de Gôa, e por conseguinte que se praticara contra elle uma injustiça, eu não posso responder ao Digno Par.

O Sr. Visconde de Ourem — Como disse, reservava-me para depois da resposta do Sr. Ministro, cantar a palinodia ou dizer as razões desenvolvidamente em que me fundava para acreditar que tinha havido uma grande injustiça em despachar para o logar de Escrivão de fazenda de Gôa um empregado que não só tem tantas habilitações e pratica de negocios de fazenda, como outro empregado que requerera o dito logar, mas que até mesmo este ultimo fôra preterido em seu direito; porém, como S. Ex.ª deseja que eu primeiramente me explique, tractarei de o fazer.

A Junta de fazenda de Gôa, foi estabelecida por Carta de Regia de 10 de Abril de 1769, e por outra Carta Regia da mesma data foram creados os logares de Thesoureiro geral, de Contador geral, e de Escrivão de fazenda, marcando-se a cada um destes empregados as suas attribuições e deveres. Desde então, sempre que vagou o logar de Escrivão da Junta da fazenda naquelle Estado, foi dado este logar por accesso ao Contador geral.

Isto succedeu em 1780, em 1791, 1796, 1800, etc... Ora em 1789 achando-se o Escrivão da Junta de fazenda avançado em annos, requereu o Contador geral da mesma fazenda que se lhe desse a nomeação daquelle logar para nelle entrar quando viesse a vagar pela falta do que o exercia; e por Provisão do extincto Erario de 17 de Novembro de 1800 se determinou, que quando vagasse o logar de Escrivão da Junta de fazenda nelle fosse provido o Contador geral por ser aquelle logar de seu legitimo accesso. E certo que o Contador de que se tracta não chegou a ser provido no logar, porque morreu antes do Escrivão de fazenda; mas o que se não póde duvidar é que ficou estabelecido que o logar de Escrivão é de legitimo accesso para o Contador, e assim sempre se intendeu até hoje

Sei que em 1829 se fez uma excepção a este respeito, porque vagando os logares de Escrivão e de Contador geral, se derão estes empregos a dois individuos do reino; mas isto é um facto praticado no tempo do Governo uzurpador, que não póde estabelecer regra nem servir de aresto.

Em 1842 deu-se uma outra excepção: foi despachado em commissão para exercer as funcções de Escrivão da Junta de fazenda de Gôa um chefe de uma das repartições do Thesouro; mas note-se que este empregado foi encarregado de uma commissão especial — qual a de pôr a escripturação e contabilidade da fazenda de Gôa em harmonia com a do Thesouro Publico da Metropole, de reformar a repartição do papel sellado e direitos de sello e a do correio, e este empregado, cumprida que foi a sua commissão, retirou-se para a Europa em 1854.

Ficando pois vago o logar de Escrivão da Juntado fazenda, o Contador geral que estava em Lisboa, e ainda está, requereu o dito logar, mostrando ter boas informações de todos os Governadores geraes com quem havia servido, e além disso ter prestado muitos e especiaes serviços a bem dos interesses da fazenda publica. Não obstante, porém, tudo isto, o Governo intendeu que o devia preterir, despachando Escrivão da Junta um empregado subalterno do Conselho ultramarino, inferior em todas as circumstancias ao preterido. Por conseguinte praticou sem a menor duvida uma flagrante injustiça, desattendendo a pretenção justa de um empregado probo, honesto e intelligente, que fundado n'um direito consuetudinario, nunca interrompido, e na disposição de uma Lei, qual a Provisão do extincto Erario que citei, esperava ser provido n'um logar que sempre foi de accesso daquelle que exerce.