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SESSÃO DE 1 DE ABRIL DE 1875

Presidencia do exmo. sr. Marquez d'Avila e de Bolama

Secretarios-os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Antonio de Azevedo Coutinho Mello e Carvalho

(Assistiam os srs. presidente do conselho e ministro da fazenda.)

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 26 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente, julgou-se approvada, em conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

Deu-se conta da seguinte

Correspondencia

Um officio do ministerio do reino, participando que Sua Magestade El-Rei houve por bem decretar que a sessão real de encerramento das côrtes geraes ordinarias se effectue ámanhã, 2 de abril, pelas 5 horas da tarde, na sala da camara electiva, reunidos ambos os corpos collegisladores sob a direcção do presidente da camara dos dignos pares do reino, assistindo a esta solemnidade, por commissão do mesmo augusto senhor, os ministros e secretarios d'estado de todas as repartições.

Para a secretaria.

Dois officios da presidencia da camara dos senhores deputados remettendo duas proposições:

l.ª Auctorisando o governo a regular, em harmonia com a legislação e estipulações de differentes tratados, a jurisdicção civil e criminal dos consules em paizes não christãos.

A commissão de negocios externos e de legislação.

2.ª Approvando a nova convenção de extradicção entre Portugal e a Belgica.

A commissão de negocios externos.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae-se entrar na ordem do dia, que é a continuação da discussão do parecer n.° 66.

Continua com a palavra o sr. marquez de Sabugosa.

O sr. Marquez de Sabugosa: - Sr. presidente, se eu cedesse á minha vontade, desistiria da palavra, mas não o faço, porque julgo, como já disse, cumprir um dever deixando consignadas nas actas da camara as rasões do meu voto. Vou pois concluir, como posso, as considerações que sobre o projecto em discussão comecei na sessão passada.

Serei muito breve em attenção á camara, e talvez porque só nisso poderei fazer concessão á minha vontade.

Procurei hontem mostrar quaes eram as rasões porque eu não podia acceitar a legitimidade da pena de morte em geral, e que quando não a rejeitasse em absoluto, todavia não a poderia adoptar neste codigo militar, estando já abolida no codigo da criminalidade d'este paiz.

Procurei tambem mostrar que o codigo que se discute se inspirava n'um espirito exagerado, senão injusto, do que deve ser o da disciplina. E não julgue a camara que a opinião de entender desnecessaria a pena para manter a disciplina seja uma tal heresia militar, que não tivesse havido nunca homens d'essa profissão que a adoptassem.

Quando, em 1863, me parece, foi apresentado na outra camara um projecto de lei, pelo sr. Ayres de Gouveia, abolindo em geral a pena de morte, teve esse projecto o voto favoravel de quatro membros da commissão de guerra, votando tres contra.

Os quatro votos a favor, que constituiam maioria, foram dos srs. Camara Leme, Agostinho de Macedo, Villas Boas e Francisco Maria da Cunha. Estes quatro cavalheiros e militares distinctos concordaram n'essa occasião que não era indispensavel a pena de morte para o exercito. E já depois d'isso, sr. presidente, foi apresentado ao parlamento outro projecto de codigo, em que essa pena só era applicavel em occasião de guerra com o estrangeiro.

Não se tem, pois, julgado sempre indispensavel a pena de morte para manter a disciplina. Quaes as rasões por que se apresenta agora n'este projecto? Que rasões dá o governo e a commissão da nossa camara?

Sr. presidente, o parecer da commissão especial que examinou o projecto em discussão começa dizendo que vem gostosamente dar conta do resultado da sua meditação. Confesso que me impressionou este principio do parecer, apesar de saber que esse adverbio se não referia á necessidade que a commissão julga haver da pena de morte; mas a que este projecto convertido em lei satisfará a necessidade de regularisar a legislação militar, e concorrerá para a disciplina; comtudo a verdade é que este adverbio me fez impressão desagradavel ali collocado.

Mais desagradavel foi, comtudo, a impressão que experimentei ao ver as poucas palavras com que a commissão pretende justificar a pena de morte.

A esse respeito diz o parecer o seguinte:

"Dois são os fins principaes que as penas devem preencher; a correcção moral e o exemplo. Nos crimes communs a feição predominante da pena deve ser a correcção moral do culpado, porque a pratica do crime demonstra sempre alguma perversidade moral; mas nos crimes militares, tendo uma criminalidade só relativa, esta necessidade quasi se não faz sentir; é sobre os outros que é preciso actuar, impedindo a imitação do crime pelo exemplo do castigo."

Sr. presidente, parece-me pouco espiritualista esta doutrina. Quasi se não faz sentir a necessidade de moralisar! Pois o ensino pela palavra, e o ensino pelo exemplo, pela pratica dos deveres moralisando o homem, não concorrem para a disciplina do militar? Só o terror, o medo é que podem disciplinar o soldado? É esta a base em que se firma a disciplina dos exercitos n'este seculo n'um paiz livre?

É racional mandar matar um homem pelos seus camaradas para ensinar a estes que não devem matar?

Sr. presidente, eu desejo a disciplina, e não creio que possa haver exercito sem ella; mas não a quero exercida pelo terror, nem pela barbaridade, nem me parece que os meios para a conseguir sejam estes; e como exemplo vou apresentar á camara um que me foi dado pelo sr. ministro da guerra.

Ha pouco houve uma insubordinação no corpo de lanceiroe, estacionado em Extremoz, e um official distincto, o sr. Mello Brederode, pôde manter a ordem na sua companhia, apesar da indisciplina que imperava em todas as outras; os seus soldados seguiram-no conservando-se subordinados. O sr. ministro da guerra e presidente do conselho elogiou na ordem do exercito este official e os, soldados, e deu áquelle uma distincção.

Sr. presidente, não foi de certo pelo medo, pelo terror que esse official conseguiu disciplinar a sua companhia, de modo que se conservasse subordinada quando o resto do corpo o não estava.

Foi pelo exemplo do cumprimento continuado dos seus deveres, pela justiça dos seus actos, que conseguiu a estima e respeito dos seus subordinados, e a moralisação d'elles, a moralisação, sr. presidente, dos seus, porque a disciplina não póde deixar de ser resultado da moralisação. Factos d'estes, porque de certo se hão de ter dado mais no nosso exercito, não deviam ser esquecidos n'esta occasião pelo sr. ministro da guerra e pela illustre commissão.