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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 12 DE ABRIL.

Presidencia do Em.mo. Sr. Cardeal Patriarcha

secretarios – Os Srs.

Conde de Fonte Nova.

Conde de Mello.

Depois das duas/horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 34 Dignos Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Vice-Secretario Conde de Fonte Nova deu conta do seguinte

Officio do Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, satisfazendo ao requerimento do Digno Par Visconde da Granja sobre esclarecimentos por elle exigidos ácerca de obras do districto de Aveiro. — Para a secretaria.

ORDEM DO DIA.

continúa A discussão na generalidade sobre os vinculos.

O Sr. Presidente — Tem a palavra o Digno Par o Sr. Serpa Machado para uma explicação.

O Sr. Serpa Machado — Agradeço a V. Em.ª o conceder-me a palavra para eu explicar certas proposições que estabeleci quando fallei sobre a materia em discussão, e que eu intendo foram mal avaliadas por algum Digno Par que fallou depois de mim.

Sr. Presidente, eu occupei-me em mostrar, que o direito de propriedade ia de encontro ás reformas que se queriam fazer no systema vincular, com alteração do modo porque elle hoje se acha constituido: fallei largamente sobre isto, e fiz a comparação das differentes doutrinas da propriedade, e da negação della, referindo as de Platão e outros, e accrescentei, que tinha chegado atai ponto a exageração sobre esses principios, que muitos desses taes tinham estabelecido não só a communhão dos homens, mas tambem das mulheres, e citei o nome de outro philosopho... que viveu no tempo de Henrique 8.°, o qual escreveu sobre esta materia na obra a que chamou Utopia; mas eu não disse ser opinião minha, que essas doutrinas se devessem adoptar. Mas como esta idéa da communhão das mulheres, era muito extravagante, houve algum Digno Par que disse, que a opinião daquelle homem não se podia citar, por não ser um homem honesto, e muito menos virtuoso.

Sr. Presidente, contra isto é que eu reclamo, e faço-o com toda a razão porque não era possivel que eu viesse adduzir aqui a opinião de um homem, que não fosse religioso: tenho-o, e sempre o tive nesse conceito. Este homem era de uma virtude tal, á qual os escriptores chamam — caprichos de espirito. Elle foi condemnado a pena de morte por negar a supremacia a Henrique 8.°, a qual elle só concedia ao Papa: então foi instado por sua mulher e filhos para que condescendesse em implorar clemencia ao Rei, e deixar-lhe a supremacia: mas respondeu, que podendo durar a sua existencia mais vinte annos, elle não queria comprar a existencia de mais vinte annos, pela perda da sua honra, e de uma eternidade de penas. E soffreu o cutello do algoz.

Ora, aqui temos um homem, ao qual os escriptores daquelle tempo, ainda outros depois, e eu mesmo, consideramos como um homem virtuoso, não obstante o estabelecer elle proposições que hoje não são compativeis com o estado de civilisação da Europa, e impraticaveis. Declaro comtudo, que ainda hoje não rejeito o juizo que faço do saber, intelligencia, e virtudes daquelle escriptor, e grande philosopho: mas era forçoso que eu desse esta explicação para retirar de sobre mim a mancha que se me quiz lançar, de sustentar eu um homem que foi apontado aqui como immoral.

Agora, Sr. Presidente, faltarei tambem sobre outro ponto a respeito do qual desejo que a minha opinião fique bem esclarecida. Quando durante o meu discurso eu tractei da propriedade, disse nessa occasião que o principio estabelecido, tanto no projecto que veio da Camara dos Srs. Deputados, como no parecer das commissões desta Casa, trazia em resultado o ir-se atacar os vinculos: e é assim, Sr. Presidente: por quanto, se a propriedade em que os vinculos estão instituidos é uma propriedade como qualquer outra; e se por essa propriedade estar vinculada não deixa por isso de ser propriedade; se finalmente a Carta Constitucional manda respeitar o direito de propriedade, é então evidente que se não póde, nem devem ser approvados o projecto vindo da outra Casa do Parlamento, e o novo que pelas commissões foi submettido ao nosso exame (apoiados). Por outro lado é innegavel, que a propriedade não se póde ter como isenta do principio de retroactividade: porque em uma lei nova se offendem os direitos adquiridos, intendo eu que não póde haver retroactividade em taes leis: por outra, se a lei nova sobre vinculos offender a propriedade dos vinculos, intendo que não póde haver retroactividade: o legislador não póde fazer leis que ataquem direitos adquiridos, nem offender esses direitos; e na verdade offende-los-ha qualquer alteração que se faça no caso em questão, sem que esses direitos sejam respeitados. São estes os meus principios sobre o assumpto, que actualmente se debate.

Sr. Presidente, são estas as principaes observações que eu julguei dever fazer para me justificar das differentes interpretações que os dignos oradores que faltaram depois de mim deram ao que eu tinha dito; mas se no decurso da discussão que me parece tomou uma nova fórma depois das luminosas idéas que apresentou o Digno Par o, Sr. Visconde de Algés, em virtude das quaes se procura melhorar a instituição vincular, idéas essas que eu approvo na maior parte, com quanto não approvo a parte relativa á retroactividade, porque intendo que isso não póde ser por nenhum principio, e muito menos em presença do que se acha estatuido na Carta constitucional da monarchia (apoiados): — se durante a discussão, repito, novos argumentos se adduzirem que me obriguem a usar da palavra, eu a pedirei a V. Em. limitando-me por agora a dizer, que como o trabalho offerecido pelo Digno Par o Sr. Visconde de Algés, é muito differente dos outros que até agora se tem apresentado, parecia-me por isso que devia ser tomado em consideração por uma commissão: e em occasião competente eu apresentarei tambem um trabalho sobre este assumpto, o qual nessa occasião desenvolverei.

O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, o Digno Par que hontem tão brilhantemente mereceu a attenção da Camara, defendeu plenamente as commissões reunidas, das accusações, que lhes haviam sido dirigidas de precipitação na apresentação do parecer que se discute.

Os Dignos Pares que o assignaram com declarações, intendi eu, que fazendo-o assim, concordavam no seu pensamento em geral, salvo no que dizia respeito á substituição proposta.

Eram desnecessarias essas resalvas, porque os mesmos que assignaram sem declarações, sómente o fizeram com as clausulas salutares que vem no parecer que precede o projecto, as quaes são concebidas nos seguintes termos (leu).

E, Sr. Presidente, sem declinar a defeza do parecer das commissões, como seu relator, voa apresentar uma substituição ao projecto, offerecido por ellas em logar do projecto da outra Camara, aproveitando agora para esse fim as idéas que tem vogado durante esta discussão.

Declaro muito expressa e solemnemente, que não renuncio ao pensamento predominante do projecto, que as commissões reunidas offereceram. Este pensamento predominante tem duas bases, ou duas razões em que se funda, quanto á abolição dos morgados e capellas; uma de facto e a outra de direito; quanto á de facto, resulta do estado hypothetico dos morgados e capellas em presença da opinião e da legislação; quanto á de direito tem sido para mim principalmente a repugnancia, e incompatibilidade que existe hoje, dos morgados e capellas com a Carta constitucional da monarchia, reduzidos a um privilegio exclusivo em favor de certos individuos.

Não desejo, nem pertendo cortar a palavra aos Dignos Pares, respondendo desde já a algumas proposições, que se avançaram contra o parece; das commissões, o que farei no logar competente da inscripção, mas permitta-me a Camara, que justificando a base essencial da substituição, que vou apresentar, remova com isso uma grave arguição que se me fez.

Os Dignos Pares não me convenceram de que a instituição vincular (que cessa a de ser entre nós uma instituição) não representava hoje entre nós senão uns poucos de factos, ou resultantes do antigo direito commum ou das graças especiaes dos nossos Soberanos.

Ora a subsistencia, ou tolerancia destes factos, é, repito, uma violação da Carta constitucional, que aboliu toda a sorte de privilegios puramente individuaes.

A este respeito fui arguido de contradictorio nos meus actos, já como fiscal da Corôa, já como juiz por isso que exercendo as funcções destes logares, tenho consultado, ou julgado, dando, contra o que dispõe a Carta constitucional, segundo as minhas convicções, como existente a instituição dos morgados.

Similhante arguição, porém, é muito mal cabida.

Sr. Presidente, nesses actos por mim praticados, fóra do Parlamento, não ha contradição alguma; ha simples e restrictamente o cumprimento dos meus deveres, porque eu, como fiscal, ou como juiz, que deve guardar e fazer guardar a observancia das Leis, não julgo das Leis, mas pelas Leis, embora as eu repute injustas, como acontece a respeito de muitas, que eu não considero conformes á Carta.

A Carta estabelece theses geraes, e aos legisladores depois é que pertence confeccionar Leis, cujos principios e disposições sejam verdadeiras consequencias derivadas das mesmas theses. Já disse nesta casa, em outra occasião, que eu considero, como repugnante ao Acto addicional, a interpretação que o Decreto eleitoral deu á expressão emprego inamovível comprehendendo nestes os empregos de mercê vitalicia, e alargando por este modo a influencia do funccionalismo na representação nacional; comtudo, se ao Tribunal, em que sirvo, subirem recursos, por offensa ou preterição de direitos politicos, e eu fôr juiz, não é pelo Acto addicional, segundo as minhas convicções, mas pelo Decreto eleitoral, confirmado pelas Côrtes, que devo dirigir-me.

Sr. Presidente, nesta casa e na outra passou uma Lei, dando ás letras chamadas da terra, a natureza commercial, com todos os privilegios inherentes aos actos commerciaes/sem que essas letras se refiram a acto algum commercial, nem nellas figurem commerciantes. de modo que o devedor de uma e mesma quantia, por exemplo, 2:000$000 réis, se de 1:000$000 réis se constitue devedor por uma escriptura, e do outro 1:000$000 réis o faz pondo o acceito n'um bocado de papel, no primeiro caso ha-de ser de