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SESSÃO DE 2 DE JUNHO DE 1871

Presidencia do exmo. sr. Conde de Castro, vice-presidente

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

(Assistiam nos srs. presidente do conselho de ministros e ministros da justiça e das abras publicas.)

Ás duas horas e vinte minutos da tarde, achando-se presente numero legal de dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

Deu se conta da seguinte

Correspondencia

Um officio do ministerio do reino participando, para conhecimento da camara, que Sua Magestade El-Rei houve por bem decretar que a sessão real de encerramento das côrtes geraes ordinarias se effectue ámanhã, pelas cinco horas da tarde, na sala das sessões da camara electiva, reunidos ambos os corpos co-legisladores, assistindo a este acto, por commissão do mesmo augusto senhor, os ministros e secretarios d'estado de todas as repartições.

Inteirada.

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição sobre ser o governo auctorisado a proceder á cobrança dos impostos e demais rendimentos publicos, relativos ao exercicio de 1871-1872, e a applicar o seu prolucto ás despezas do estado correspondentes ao mesmo exercicio.

Á commissão de fazenda.

O sr. Margiochi: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda n.º 50, ácerca do projecto de lei n.° 49, vindo da camara dns senhores deputados.

Leu-se o projecto na mesa

O sr. Marquez de Vallada: - Sr. presidente, eu pedi a palavra para propor a dispensa do regimento, com relação ao projecto que acaba de ler-se na mesa, visto ser um negocio tão importante e que beneficia as industrias. Por consequencia pedia a v. exa. que propozesse á camara que este projecto seja discutido já.

A camara annniu.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Visconde de Chancelleiros): - Eu pediu a v. exa., sr. presidente, que tivesse a bondade de me declarar se os pareceres n.os 49, 50 e 52, que dizem respeito a obras publicas, estão dados para ordem do dia de hoje; se o não estão, peço a v. exa. que proponha á camara a dispensa do regimento, para nos podermos occupar da approvação d'estes pareceres, que naturalmente não soffrerão discussão.

O sr. Presidente: - Já hontem a camara resolveu que esses pareceres façam parte da ordem do dia de hoje.

O sr. Conde de Samodães: - Sr. presidente, eu pedia a v. exa. que tivesse a bondade de pedir á illustre commissão de fazenda que se occupasse incessantemente do projecto vindo da camada dos senhores deputados, ácerca de um accordo com a companhia viação portuense; porque, como a sessão se encerra ámanhã, era muito conveniente que o projecto, a que me refiro, fosse discutido antes do encerramento.

O sr. Presidente: - Mas ámanhã ainda hade haver sessão.

O Orador: - Sei muito bem que ámanhã ha sessão; por isso mesmo a illustre commissao terá tempo de dar o seu parecer.

ORDEM DO DIA

Leram-se na mesa os seguintes parecer e projecto:

Parecer n.° 49 Senhores. - A vossa commissão de obras publicas examinou, como lhe cumpria, o projecto de lei n.° 57, vindo da camara dos senhores deputados, com o fim de auctorisar a camara municipal de Benavente a empregar réis 18:000$000 do fundo de viação municipal na construcção de obras que muito importam áquelle concelho; e

Considerando que effectivamente esta construcção é reclamada pela camara e pelo conselho municipal de Benavente, e apresentada pelo governo como conveniente;

Considerando que a camara de Benavente possue os meios necessarios para levar estas obras á execução;

Considerando que estes meios não se podem applicar ás estradas municipaes, porque taes estradas se tornam desnecessarias e foram completamente suppridas pela rede de vias districtaes de que o concelho se acha dotado;

Considerando finalmente a innegavel importancia de todas estas obras e nomeadamente da canalisação do rio Sorraia entre Benavente e S. Braz da Barrosa, como estabelecimento de communicação facil e barata, e tambem como contribuindo para melhorar as condições sanitarias daquelles logares:

É de parecer que o projecto n.° 57 deve ser approvado por esta camara para subir á sancção regia.

Sala da coromissao, 1 de junho de 1871. = João de Andrade Corvo = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Francisco Simões Margiochi = Jayme Larcher.

Projecto de lei n.° 57

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal de Benavente a empregar até 18:000$000 réis do fundo de viação municipal nas seguintes obras:

A. Canalisação do rio Sorraia entre Benavente e S. Braz da Barrosa, 8:000$000 réis;

B. Auxilio á junta geral do districto de Santarem para conclusão da ponte de Benavente na estrada districtal n.° 76 e reparações da de Samora Correia nas estradas districtaes n.os 77 e 79, 6:000$000 réis;

C. Calçadas e canalisações nas das das villas de Benavente e Samora Correia, 4:000$000 réis.

§ unico. A obra de canalização do rio Sorraia entre os limites designados não póde ser executada sem que os projectos e orçamentos estejam approvados pela junta consultiva de obras publicas.

Art. 2.° Igualmente é auctorisada a camara municipal de Benavente a lançar a contribuição do trabalho para a obra da canalisação do rio Sorraia.

Art. 3.° O governo considerará para os effeitos do subsidio a canalisação do rio Sorraia entre Benavente e S. Braz da Barrosa como estrada districtal.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 31 de maio de lS7l. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

O sr. Margiochi (sobre a ordem}: - Mando para a mesa o parecer da commissão de administração publica n.° 56, relativo ao projecto de lei n.° 51.

O sr. Marquez de Niza: - Pedia a v. exa. que propozesse á camara a dispensa do regimento a respeito do parecer que o digno par o sr. Margiochi acaba de mandar para a mesa, a fim de entrar em discussão.

Foi approvado o requerimento.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. presidente, foi em uma sessão similhante a esta, em que o nosso lamentado presidente, o sr. conde de Lavradio, queixando-me eu

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então, como agora me queixo, de que á ultima hora affluissem de toda a parte os projectos para serem votados, sem que os dignos pares podessem ter conhecimento d'elles, dissera que tivesse eu paciencia com as novas pragas do Egypto. Eu tambem sou da opinião do nosso antigo presidente; projectos importantes apresentados á ultima hora, como estamos presenceando, são uma verdadeira praga.

São tantos os projectos de lei que é impossivel, nem ao menos le-los, para ter d'elles conhecimento; apenas alguns dignos pares, membros das commissões a que são remettidos, estão ao corrente dos assumptos.

O que sei é que as camaras municipaes não fazem senão sobrecarregar os povos com tributos indirectos, e por isso voto contra emprestimos municipaes, até ver se chamo a attenção dos poderes publicos sobre este importantissimo ramo de administração.

Eu não discuto, nem posso discutir este projecto, mas digo só a minha opinião a respeito do modo porque os impostos municipaes devem ser lançados, que o devem ser por um conselho municipal electivo.

A grande cidade de Coimbra paga de contribuições indirectas 32:000$000 réis, ao mesmo tempo que não paga nada de contribuições directas. Quem dirá que esta importante cidade de Coimbra, não póde pagar alguma contribuição directa para o municipio? Se o conselho municipal fosse electivo, estou certo que havia de pagar alguma.

Foi approvado o referido projecto n° 57, na generalidade e especialidade.

O sr. Marquez de Sabugosa: - Eu pedia a v. exa. que propozesse á camara que se occupasse primeiro que tudo dos projectos de interesse geral, como são o que trata da contribuição pessoal, e tambem o que se refere á contribuição districtal.

O sr. Presidente ao Conselho de Ministros (Marquez d'Avila e de Bolama): - Eu desejava que este proje jecto fosse discutido na presença do sr. ministro da fazenda.

Agora o que eu pedia a v. exa., á camara e á illustre commissão de fazenda, era que dessem preferencia á discussão da lei de meios que já está n'esta casa; porque, como os dignos pares sabem, já se acha sobre a mesa o officio participando a esta camara que será ámanhã o encerramento da sessão: e v. exa. comprehende de certo que o governo deseja estar legalmente auctorisado para proceder á cobrança dos impostos.

O sr. Margiochi: - Por parte da commissão de fazenda posso declarar que o parecer sobre a lei a que se referiu o sr. presidente do conselho está quasi prompto: creio mesmo que até só falta copiar-se; e por consequencia em breve será mandado para a mesa.

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o pare cer n.° 50 sobre o projecto de lei n.° 56.

O sr. secretario leu-os e são ao teor seguinte:

Parecer n.° 50

Senhores. - A vossa commissão de obras publicas, a cujo exame foi submettido o projecto de lei n.° 56, vindo da camara dos senhores deputados:

Considerando que a ponte sobre a na de Villa Nova de Portimão é parte componente de uma estrada real de primeira classe, cuja construcção compete exclusivamente ao estado e não deve sobrecarregar o orçamento de obras ás quaes se applica um imposto especial;

Considerando que precedentemente se deu caso identico relativamente a Vianna do Castello, e que pela carta de lei de 2 de setembro de 1860 foi tomada resolução igual áquella do artigo 1.° do actual projecto de lei;

Considerando tambem que pelas disposições do artigo 2.° reverterão em proveito de estado verbas applicadas a obras que deviam ser feitas á custa do rendimento de impostos especiaes:

É de parecer que o projecto de lei n.° 56 deve ser approvado por esta camara para subir á sancção regia.

Sala da commissão, 1 de junho de 1871.= João de Andrade Corvo = Francisco Simões Margiochi = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Jayme Larcher.

Projecto de lei n.° 56

Artigo 1.° A ponte na na de Villa Nova de Portimão, a que se refere o artigo 1.° da carta de lei de 7 de julho de 1862, será construida por conta do estado.

Art. 2.° Concluidas as obras para as quaes foram especialmente creados os impostos estabelecidos pela carta de lei de 7 de julho de 1862, a cobrança d'estes impostos continuará até final pagamento de quaesquer quantias applicadas pelo estado ás mesmas obras.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 31 de maio de 1871.= Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão.

O sr. secretario leu o parecer n.° 52 e respectivo projecto de lei, que são do teor seguinte:

Parecer n.° 52

Senhores. - Á vossa commissão de agricultura, commercio e artes foi presente o projecto de lei, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual é creado um logar de agronomo em cada um dos districtos administrativos do reino e ilhas adjacentes.

Reconhecendo a commissão a importancia que deve ter a proposta creação de agronomos districtaes, é comtudo de opinião que deve depender da iniciativa das juntas geraes a creação d'esses logares, visto que d'ellas depende a votação da verba para os remunerar, como no mesmo projecto, artigo 4.°, se determina.

É outrosim de parecer a commissão que ao concurso para estes logares de agronomos sejam admittidos os individuos que apresentarem diplomas de curso superior de agronomia do instituto agricola de Lisboa ou de analogos estabelecimentos estrangeiros.

A commissao, em vista d'estas considerações, tem a honra de vos submetter o projecto com as as seguintes alterações:

Projecto de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado, sobre proposta das juntas geraes, a crear em cada um dos districtos administrativos do reino e ilhas adjacentes um logar de agronomo.

Art. 2.° Os logares a que se refere o artigo antecedente serão providos, precedendo concurso documental, em individuos habilitados com diploma de curso completo pelo instituto geral de agricultura ou de curso em escolas agricolas estrangeiras de igual categoria, e que hajam merecido qualificações distinctas.

Art. 3.° O provimento a que allude o artigo 2.° sómente se effectuará sobre proposta dos governadores civis com approvação das juutas geraes de districto.

Art. 4.° Ficam auctorisadas as juntas geraes a incluir no orçamento annual das suas despezas obrigativas e a derramar pelas camaras municipaes a verba que julgarem necessaria para os ordenados dos agronomos, e mais despezas de melhoramentos agricolas nos respectivos districtos.

§ unico. O ordenado annual dos agronomos não será inferior a 400$000 réis.

Art. 5 ° As funcções dos agronomos serão determinadas em regulamento especial, tendo em consideração as conveniencias locais dos respectivos districtos.

Art. 6.° O governo publicará os regulamentos necessarios para a execução d'esta lei.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 1 de junho de 1871. = Marquez de Niza = Jayme Larcher = João de Andrade Corvo = Manuel Vaz Preto Geraldes = Visconde de Fonte Arcada (vencido).

O sr. Margiochi (sobre a ordem): - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre o projecto de lei que auctorisa o governo a proceder á cobrança dos impostos.

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Como este negocio é muito simples, creio que a camara não terá duvida em que seja dispensado o regimento, para entrar desde já em discussão.

Peço pois a v. exa. que consulte a camara a este respeito.

Consultada a camara, resolveu que se dispensasse o regimento.

O sr. Marquez de Niza: - Sr. presidente, o parecer n.° 52 que ha pouco foi lido na mesa creio que vae ser impugnado, e por isso talvez fosse conveniente que, em vez de se encetar a discussão sobre elle, começassemos antes a votar o parecer que o digno par o sr. Margiochi ha pouco apresentou por parte da commissão de fazenda, sobre ser o governo auctorisado a proceder á cobrança dos impostos. Se a camara quizer convir n'isto satisfará ao pedido do digno presidente do conselho, e satisfará igualmente a este preceito constitucional.

O sr. Presidente: - Vou consultar a camara ácerca da proposta do digno par o sr. marquez de Niza.

Consultada a camara, resolveu que primeiro fosse votada a lei de meios.

O sr. secretario leu o parecer n.° 64, sobre o projecto de lei n.° 36, que são do teor seguinte:

Padecer n.° 54

Senhores. - A vossa commissão de fazenda foi presente o projecto de lei n.° 64 vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim auctorisar o governo a proceder á cobrança dos impostos e demais rendimentos publicos relativos ao exercicio de 1871-1872 e a applicar o seu producto ás despezas do estado, correspondentes ao seu exercicio, segundo o disposto nas cartas de lei de 26 de junho de 1867 e mais disposições legislativas em vigor.

A commissão examinou-o detidamente, como lhe cumpria, bem como o parecer da commissão de fazenda da sobredita camara, e attendendo finalmente ás declarações feitas pelo governo é de parecer que o mencionado projecto seja approvado por esta camara, e submettido á real sancção.

Sala da commissão, 2 de junho de 1871. = José Augusto Braamcamp = Francisco Simões Margiochi = Felix Pereira de Magalhães = José Lourenco da Luz.

Projecto de lei n.° 64

Artigo 1.° É o governo auctorisado a proceder á cobrança dos impostos e demais rendimentos publicos relativos ao exercicio de 1871-1872; e a applicar o seu prortucto ás despezas do estado, correspondentes ao mesmo exercicio, segundo o disposto nas cartas de lei de 26 de junho de 1867 e mais disposições legislativas em vigor.

Art. 2.° A contribuição predial do anno civil de 1871 é fixada e distribuida pelos districtos administrativos do continente do reino e ilhas adjacentes, nos termos das leis de 14 e 24 de agosto de 1859.

Art. 3.° A contribuição pessoal do dito anno civil de 1871 é do mesmo modo fixada e distribuida pelos districtos administrativos do continente do reino e ilhas adjacentes, nos termos das leis de 17 e 23 de julho de 1869.

Art. 4.° Continuarão a vigorar no anno civil de 1871 as disposições da lei de 24 de agosto de 1869, relativa á contribuição industrial.

Art. 5.° São prorogadas no exercicio de 1871-1872 as Disposições da lei de 16 de abril de 1867, que alterou o artigo 3.° da lei de 30 de julho de 1860.

Art. 6.° Emquanto não for reformada a actual tabella das quotas de cobrança, os empregados de fazenda não receberão quotas sobre as contribuições addicionaes de 1871, a que se referem as leis de 17 de julho e 24 de agosto de 1869, cujas disposições são mantidas no futuro exercicio.

Art. 7.° Continuam provisoriamente em vigor no exercicio de 1871-1872 as deducções nos subsidios e vencimentos dos empregados do estado, dos de corporações e estabelecimentos pios, e das classes inactivas de consideração, fixadas pelo decreto de 26 de janeiro de 1869, até que se tome nova providencia sobre este assumpto.

Art. 8.° As auctorisações concedidas por esta lei terminam no continente do reino no dia 31 de julho, e nas ilhas adjacentes no dia 31 de agosto do corrente anno.

Art. 9.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 2 de junho de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Em seguida foi approvado sem discussão, na generalidade e especialidade.

O sr. Presidente: - Entraremos portanto agora na discussão do parecer n.° 52, creando um logar de agronomo em cada um dos districtos administrativos, projecto acima referido.

O sr. Visconde de Ponte Arcada: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: -Tem a palavra.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. presidente, assignei vencido o parecer que se acha em discussão, e por isso entendo que não posso deixar de tomar a palavra para explicar á camara as rasôes que me levaram a assigna-lo com esta delaração.

Todos entendem que, no estado actual da nossa fazenda publica, é absolutamente impossivel que a despeza seja augmentada. Esta opinião é a geral, e como a camara sabe é tambem a minha. E, sendo isto assim, para ser coherente com estes principios, que estão na mente de todos, não podia de modo algum approvar este parecer, que vae augmentar a despeza publica; tanto mais quando essa despeza não póde ter um resultado util immediato.

Sr. presidente, os povos não estão em circumstancias de poder dar ordenados de 400$000 réis a individuos que por agora de nada lhes servem.

Uma voz: - Isso é facultativo.

O Orador: - Então é escusado.

Pois muito bem, quando chegarmos ao tempo em que os agronomos forem necessarios, então trataremos de os estabelecer; isto é quando houver que lhes dar a fazer, e então serão nomeados, e ser-lhes-ha dado o ordenado que merecerem.

Nós estamos aqui para examinarmos as leis que são submettidas ao nosso exame, e por consequencia temos obrigação de as discutir, e impugnar quando ellas forem prejudiciaes ao paiz.

Todos nós queremos economias; mas apesar d'isso, quer-se que approvemos um projecto que tem por fim estabelecer uma nova despeza, sem resultado algum immediato! Se se tratasse da creação de facultativos para os municipios, sendo necessarios, então se poderia nomear algum; mas crear empregos novos de 400$000 réis a individuos que não hão de ter por muito tempo em que se occupem... É incrivel!...

Sr. presidente, parece que temos os olhos fechados, se os tivessemos abertos, haviamos de ver bem as circumstancias do paiz.

Nós, sr. presidente, não devemos fazer na actualidade despezas que se podem espaçar. Devemos poupar todos os recursos do paiz para organisarmos a fazenda publica e o nosso exercito, para não sermos avassallados por alguma força que nos venha atacar.

Para isto é que nós todos devemos concorrer, prescindindo de quaesquer despezas que não sejam de tanta necessidade como estas a que acabo de me referir.

Tenho a declarar que tambem não concordo com a disposição do artigo 3.° (leu), que permitte que os estrangeiros venham concorrer com os nossos agronomos e veterinarios para serem empregados.

Ainda ha pouco tempo vi uma representação dirigida á camara dos senhores deputados, assignada por 38 alumnos do instituto agricola e veterinario contra a admissão dos individuos formados nas escolas de Hespanha, representação que eu não posso deixar de apoiar; alem d'estas ha

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outras representações dos alumnos de medicina das diversas escolas do reino, no mesmo sentido é notavel que estando as nossas escolas superiores cheias de uma mocidade talentosa e dedicada a estudos importantes, vamos buscar fóra o que temos de casa, e expo-los a uma cuncorrencia que lhes póde ser nociva.

O que tenho dito é bastante para combater o projecto na sua generalidade e espscialidade.

Não o posso, pois, approvar, em primeiro logar porque não o julgo necessario por emquanto; e era segundo, porque não me posso conformar com as suas disposições.

Eu entendo que só depois de serem estes agronomos pedidos por um grupo da municipalidades, é que se devem nomear, quando d'elles careçam, mas esta necessidade ainda está muito remta.

São, portanto, estas rasões que acabo de expor, que me levaram a assignar vencido o parecer que está em discussão.

O sr. Presidente: - Como mais nenhum digno par pede a palavra, vou pôr á votação o projecto de lei.

Posto á votação, foi approvado na generalidade e especialidade.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Peço a v. exa. que verifique a votação, porque me parece que muitos dignos pares ficaram sentados.

O sr. Presidente: - Se v. exa. tem duvidas, renova-se a votação.

Eu peço aos dignos pares que façam sensivel a votação. Os que approvam o projecto na sua generalidade e especialidade tenham a bondada de se levantar.

Verificou-se a approvação.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Queira v. exa. mandar contar.

O sr. secretario visconde de Soares Franco, contando os dignos pares que estavam de pé, verificou serem dezeseis, ficando portanto o projecto opprovado na generalidade.

Passando se á especialidade, foram approvados sem discussão todos os artigos.

O sr. Andrade Corvo: - Peço a palavra sobre a ordem.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.

O sr. Andrade Corvo: - Mando para a mesa um parecer das commissões de fazenda e obras, publicas.

E peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, para que este parecer entre hoje mesmo em discussão.

Consultada a camara resolveu affirmativamente.

Entrou em discussão o parecer n.° 53 sobre o projecto de lei n.° 63, que são do teor seguinte:

Padecer n.° 53

Senhores. - A vossa commissão de legislação, examinando a proposta de lei n.° 63, vinda da camara dos senhores deputados, para a creação de uma casa de detenção e correcção para menores de dezoito aanos do sexo masculino, ou condemnados ou em processo crime na comarca de Lisboa, e considerando que e de toda a conveniencia publica e de alta moralidade um similhante ensaio, é de parecer que o projecto de que se trata deve ser approvado por esta camara para ser convertido em decreto das côrtes geraes e ser submetido á real sancção.

Camara dos pares, 1 de junho de 187l. = Conde de Fornos de Algodres = José Maria Eugenio de Almeida = Rodrigo de Castro Menezes Pita = Manuel Vaz Preto Geraldes.

Projecto de lei n.° 63

Casa de detenção e correcção

Artigo 1.° É creada para a comarca de Lisboa uma cadeia civil denominada casa de detenção e correcção, a qual é destinada a recolher os individuos do sexo masculino:

1.° Menores de dezoito annos, que se acharem em processo e não afiançados;

2.° Menores de Dezoito anãos que estiverem condemnados a prisão correccional;

3 ° Menores de quatorze annos, que estiverem condemnados a qualquer pena;

4.° Menores que forem presos á ordem da auctoridade administrativa;

5.° Menores que deverem ser detidos nos termos dos artigos 143.° e 224.°, n.° 12.°, do codigo civil.

§ unico. Os menores, que completarem dezoito annos antes de cumprida a pena, continuarão até seu inteiro cumprimento na casa de detenção e correcção.

Art. 2.° A casa de detenção e correcção fica dependente do ministerio dos negocios eclesiásticos e de justiça, o qual nomeará os respectivos empregados.

§ unico. A administração d'esta cadeia será immediatamente sujeita ao procurador regio juuto da relação de Lisboa, sendo-lhe applicavel o que se acha determinado com relação ás outras cadeias civis da comarca, nos pontos em que esta lei não providenciar especialmente.

Art. 3.° O pessoal empregado na casa de detenção e correcção compõe-se:

1.° De um director;

2.° De um sub director;

3.° De um capellão;

4.° De cinco guardas.

§ 1.° Os empregados, de que trata este artigo, receberão os vencimentos declarados na tabella que faz parte da presente lei.

§ 2.° O serviço de eaude da casa de detenção e correcção será feito pelos facultativos da cadeia central.

Art. 4.° São obrigados a trabalho:

1.° Os individuos indicados nos n.os 2.°, 3.° e § unico do artigo 1.°;

2.° Os individuos indicados nos n.os 1.°, 4.° e 5.° do mesmo artigo, que não tenham meios de subsistencia e forem alimentados pela casa de detenção e correcção.

Art. 5.° O trabalho na casa de detenção e correcção será regulado conforme a idade, forças e capacidade dos individuos.

Art. 6.° A todos os recolhidos n'esta cadeia será ministrada diariamente pelo capellão a instrucção liiteraria, moral e religiosa, do modo por que se determinar no regulamento.

Art. 7.° Uma terça parte do producto do trabalho dos presos será applicada ás despezas da casa; outra á retribuição dos presos, que, pelo seu bom procedimento e zêlo pelo trabalho, merecerem esse premio; e a ultima terça parte constituirá o fundo de reserva dos presos, o qual lhes será entregue ao sairem da cadeia.

Art. 8.° Serão empregados, como meios para estimular o bom procedimento dos presos e o seu zêlo pelo trabalho:

1.° Louvor em reunião publica dos presos;

2.° Retribuição pecuniaria nos termos do artigo anterior;

3.° Liberdade provisoria sob vigilancia da policia.

Art. 9.° Serão empregados como meios para corrigir o mau procedimento da presos ou coagir ao trabalho:

1.° Advertencia particular;

2.° Reprehensão publica;

3.° Prisão com isolamento, que não poderá exceder cinco dias.

Art. 10.° O procurador regio junto da relação de Lisboa fará, quando julgar conveniente, promover perante o juizo respectivo a liberdade provisoria dos individuos indicados nos n.os 2.° e 3.° e § unico do artigo 1.°, nos termos do artigo seguinte.

Art. 11.° Ao condemnado, que tiver cumprido duas terças partes da pena, poderá ser concedida liberdade provisoria, quando no livro do registo tenha nota de irreprehensivel comportamento.

Art. 12.° Quando o condenmado, a quem se tiver concedido a liberdade provisoria, abusar d'ella, procedendo de um modo reprehensivel, será reintegrado na casa de

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detenção e correcção, e não se lhe levará em conta, para o cumprimento da pena, o tempo que tiver gosado da liberdade provisoria.

§ unico. A reintegração será determinada pelo juizo competente, a requerimento do ministerio publico, em vista da informação da auctondada administrativa.

Art. 13.° Os presos serão distribuidos por classes ou categorias inteiramente distinctas e separadas, tomando-se por base para essa divisão a idade, e a gravidade das causas por que se acham na casa de detenção e correcção.

Art. 14.° A casa de detenção e correcção é considerada como qualquer asylo de mendicidade, e estabelecimento pio e de beneficencia ou educação gratuita, a fim de ter parte no beneficio das doações, legados ou heranças que forem deixados aos estabelecimentos d'essa ordem.

Art. 15.° É auctorisadia a despeza de 6:000$000 réis para accommodar aos fins da casa de detenção e correcção o edificio do extincto convento das religiosas de Santo Agostinho descalças, denominado das Monicas.

Art. 16.° Para satisfazer ás despezas ordinarias da casa de detenção e correcção, é auctorisada a verba annual de 2:000$000 réis, que será inserida no orçamento do ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, e com elle annualmente votada.

Art. 17.° Fica o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para a cabal execução da presente lei.

Art. 18.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Tabella a que se refere a lei d'esta data

Artigo unico. Terão vencimentos annuaes:

1 Director............................... 200$000

1 Sub-director............................ 150$000

1 Capellão............................... 200$000

5 Guardas, a 300 réis diarios............... 547$500

Palacio das côrtes, em 1 de junho de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario = Antonio Augusto de Sousa Azevedo Villaça, deputado vice-secretario.

Foi approvado na generalidade e especialidade sem discussão.

O sr. Margiochi(sobre a ordem): - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre o projecto n.° 46.

Leu-se na mesa o parecer n.° 65, sobre o projecto de lei n.° 49, que são do teor seguinte:

Parecer n.° 55

Senhores. - A commissão de fazenda d'esta camara, á qual foi presente o projecto de lei n.° 49, vindo da camara dos senhores deputados, çue tem por fim reduzir a 10 por cento ad valorem o direito de importação do junco preparado, e bem assim a fixar o direito das batatas e das favas em 5 réis por kilogramma; examinou com a devida attenção o mencionado projecto de lei, bem como os fundamentos apresentados no parecer da commissão de fazenda da sobredita camara, em virtude do que é de parecer que o mesmo projecto seja approvado por esta camara, para ser submettido á real sancção.

Sala da commissão, em 1 de junho de 1871. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = José Lourenço da Luz = Francisco Simões Margiochi = Felix Pereira de Magalhães.

Foi approvado o projecto de lei n.° 49 sem discussão, na generalidade e na especialidade.

Surguiu se o parecer n.° 66, e respectivo projecto de lei, que são do teor seguinte:

Parecer n.° 56

Senhores. - A commissão de administração publica examinou com a devida attenção o projecto de lei n.° 51, que tem por fim auctorisar a camara municipal da Motta a continuar a cobrar os impostos municipaes denominados a renda do caes e porto, e renda dos paços de vendas, com applicação especial aos juros e amortisação de um emprestimo para a construcção dos paços do concelho, cadeia do julgado e cemiterio da villa; e attendendo aos considerandos apresentados pela commissão de administração publica da camara dos senhores deputados, com os quaes se conforma; é de parecer que o mencionado projecto de lei seja approvado por esta camara e que, convertido em decreto das côrtes geraes, seja submettido á real sancção.

Sala da commissão, em 1 de junho de 1871.= Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Conde da Ponte = Francisco Simões Margiochi = Joaquim José dos Reis e Vasconcellos.

Projecto de lei n.° 51

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal da Motta a continuar a cobrar os impostos municipaes denominados "renda do caes e porto, e renda dos paços de venda", com applicação especial aos juros e amortisação de um emprestimo para a construcção dos paços do concelho, cadeia do julgado e cemiterio da villa.

Art. 2.° A auctorisação a que se refere o artigo antecedente só terá effeito se o emprestimo for, como é de lei, approvado pela estação competente.

Art. 3.° Logo que termine a satisfação dos encargos do referido emprestimo findará ipso facto a auctorisação concedida pela presente lei.

Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, 31 de maio de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Approvado sem discussão na generalidade e especialidade.

Seguiu se o parecer n.° 67, das commissões de fazenda e obras publicas, sobre o projecto n.° 52, que são do teor seguinte:

Parecer n.° 57

Senhores. - Ás commissões de fazenda e de obras publicas foi presente o projecto de lei n.° 52, vindo da camara dos senhores deputados, approvando a rescisão dos contratos celebrados com a companhia viação portuense, segundo o termo feito pelo governo com os representantes da mesma companhia em 1 de julho de 1870. Por esta rescisão ficarão as estradas que a dita companhia construiu, com todas as outras estradas do reino, na posse do governo; podendo assim ser exploradas sem estarem sujeitas a nenhuma condição excepcional. A rescisão, segundo se vê das informações e contas ministradas pelo governo, não traz para o estado augmento de encargos.

Em vista d'estas considerações são as commissões de parecer que seja approvado o dito projecto de lei.

Sala da commissão, 2 de junho de 1871. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Felix Pereira de Magalhães = Francisco Simões Margiochi = Tem votado do digno par, José Augusto Braamcamp = João de Andrade Corvo.

Projecto de lei n.° 52

Artigo 1.° É approvado o termo lavrado em 1 de julho de 1870 para a rescisão dos contratos celebrados com a companhia viação portuense em 9 de setembro de 1851, approvado por decreto de 13 do mesmo mez e anno, e confirmado pela carta de lei de 1 de julho de 1853, e era 26 de setembro de 1856, era virtude da lei de 13 de agosto de 1856.

§ 1.° Se o governo preferir pagar á companhia em inscripções de divida publica, a importancia será calculada pelo seu valor no mercado na data d'esta lei.

§ 2.° Fica d'este modo alterada a condição 3.ª do termo de rescisão dos mencionados contratos.

Art. 2.° Fica o governo auctorisado a emittir as inscripções necessarias para occorrer aos encargos provenientes do termo a que se refere o artigo antecedente.

Art. 3.° Continuarão a ser cobrados pelo governo, nos termos da carta de lei de 22 de julho de 1850, os direitos de portagem nas pontes do Arnoso, Ave e Lessa na estrada do Porto a Braga, na ponte de Brito, na estrada de Villa

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Nova de Famalicão a Guimarães, e na ponte de Travagem, na estrada do Porto por Santo Thyrso a Guimarães.

Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 1 de junho de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso, Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Approvado sem discussão na generalidade e especialidade.

Seguiu-se o parecer n.° 68 sobre o projecto n.° 46, que são do teor seguinte:

Parecer a.° 58

Senhores.- A vossa commissão de fazenda, a quem fôra remettido o projecto da lei vindo da camara dos senhores deputados, sob n.° 46, pelo qual é approvado o contrato junto, celebrado em 22 de março do corrente anno pelo governo com o barão de Fonte Bella, para o serviço de navegação a vapor entre Lisboa e os portos do archipelago dos Açores, que lhe foi adjudicado em concurso publico, aberto pelo ministerio da marinha e ultramar, examinou como lhe cumpria detidamente o referido projecto, e considerando sua subida importancia e grande conveniencia de não só manter as actuaes relações entre as diversas partes da monarchia, mas de amplia-las quanto seja compativel com os recursos do paiz, é de parecer que o sobredito projecto seja approvado por esta camara para ser submettido á real sancção.

Sala da commissão, 2 de junho de 1871. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = José Augusto Braamcamp = José Lourenço da Luz = Felix Pereira de Magalhães = Francisco Simões Margiochi.

Projecto de lei n.° 46

Artigo 1.° É approvado o contrato junto, celebrado em 22 de março do corrente anno pelo governo com o barão de Fonte Bella, para e serviço de navegação a vapor entre Lisboa e os portos do archipelago dos Açores, que lhe foi adjudicado em concurso publico, aberto pelo ministerio dos negocios da marinha e ultramar.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 1 de junho de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Approvado sem discussão na generalidade e especialidade.

O sr. Secretario (Visconde de Soares Franco): - Não ha mais nenhum parecer sobre a mesa.

O sr. Marquez de Vallada: - Visto que está para chegar a esta capital Sua Magestade o Imperador do Brazil, que pertence á casa de Bragança, parecia-me conveniente que esta camara nomeasse uma commissão para ir cumprimentar Sua Magestade Imperial quando aportasse a esta cidade.

O sr. Marquez de Niza: - Sr. presidente, diversos parlamentos têem dirigido as suas felicitações ao governo francez, ao poder executivo d'aquella nação, por ter debellado a communa e restabelecido a paz.

Parece-me que nós não podemos deixar de praticar o mesmo acto (apoiados); e com particularidade acho que o deve fazer este paiz, onde felizmente, apesar das divergencias dos partidos, temos sempre sabido conservar a liberdade unida com a paz publica (apoiados).

Creio pois que ninguem póde deixar de se congratular por este facto, porque comquanto desgraçadamente ainda existam latentes por muita parte as perniciosas doutrinas, causa do flagello que tanto tem atormentado aquelle paiz, ameaçando a Europa, é certo ao menos que aquelle fóco se acha completamente destruido. Tanto mais abomino aquelles excessos que receio muito que os espiritos timoratos se sintam inclinados para uma reacção em sentido diverso, e sejam exploradas estas terdencias por inimigos e falsos amigos das liberdades.

Espero porém que entre nós se não hão de dar esses tristes effeitos, e que a Divina Providencia ha de permittir que o nosso governo com mão firme saiba guiar o baixel do estado, para que este se não incline para um ou outro extremo, mas nos possa conservar seguras as verdadeiras liberdades no pleno goso do systema representativo. (Vozes: - Muito bem.)

Conseguintemenie mando para a mesa a seguinte proposta, que considero urgente para se votar desde já.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

"Proponho que a camara dos pares vote uma felicitação ao governo de França por ter vencido a anarchia e restabelecido a paz, que este voto se lance na acta, e d'ella seja enviada copia ao sr. Thiers, illustre chefe do poder executivo.

"Sala das sessões da camara dos pares, em 2 de junho de 1871. = O par do reino, Marquez de Niza.

Foi admittida.

O sr. Marquez de Vallada: - Eu pedia para retirar a minha proposta, visto que a camara vae deixar de estar reunida. Peço apenas que fique lançada na acta.

Agora, occupando-me da proposta do digno par o sr. marquez de Niza, não posso negar-lhe a minha approvação. Acompanho s. exa. nesses votos, que são os meus. A essas idéas julgo deverem reunir-se todos os amigos sinceros da liberdade, que a querem ver como arvore frondosa que possa abrigar todas as opiniões, que possa unir todos os homens á mesma sombra, como se fôra a grande columna da justiça, que outra cousa não é senão a mesma liberdade, porque d'essa grande columna, cuja base se firma na terra, o capitel toca no céu.

A liberdade não são os excessos, não é a anarchia, não é o despotismo.

A justiça não é nem póde ser o predominio do arbitrio, do capricho de qualquer poder, que não esteja sujeito a essa grande lei da justiça, lei que, como bem disse Strauss, está fóra de nós e acima de nós, porque a justiça é um attributo da Divindade. Por consequencia não é nos réis nem nos povos, nas multidões ou nas monarchias, que reside o poder soberano para decidirem tudo a seu bello prazer, mas para se conformarem com os grandes e eternos principios da justiça.

Infelizmente, sr. presidente, ha muito tempo que se propagam em differentes paizes da Europa as doutrinas não liberaes, essas doutrinas contra as quaes muitas vezes me tenho pronunciado n'esta casa, porque me prezo de ser liberal sincero.

Tenho aqui defendido a liberdade de associação, e a liberdade de petição, conformo-me com essas mesmas idéas que foram defendidas na tribuna por Montalembert, por Deschamps, e na Inglaterra liberal, na Inglaterra illustrada, na Inglaterra justa, por homens taes como lord John Russell e James Gray, esses grandes liberaes que as defenderam e sustentaram quer nos bancos da opposição, quer nos do ministerio, por medidas que mostravam amor entranhado aos principios liberaes.

Portanto, sr. presidente, os amigos sinceros da liberdade não querem nem podem querer esses excessos que lançam uma nodoa na historia da humanidade, e fazem com que aquelles que detestam a liberdade a julguem pelos seus excessos, ao mesmo tempo que muitas vezes aquelles que se mostram sinceros cultores dos principios liberaes se mostram adversarios implacaveis dos que desejam ver praticados esses santos principios, e lançam sobre os governos justos o labéo que deviam lançar sobre os governos despoticos, porque confundem o cesarismo exagerado das passadas eras, que fez a desventura dos povos, com os governos beneficos e justos, que são a dadiva de Deus, que são um beneficio para os estados.

Possam estas lições, sr. presidente, amestrar os povos e servir-lhes de exemplo proficuo para não quererem os excessos e defenderem os grandes principios da liberdade sem licença, da ordem sem tyrannia.

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Sr. presidente, nunca defendi outras idéas, e ninguem póde apontar-me um acto na minha vida publica, uma palavra por mim proferida que significasse outra cousa, senão que desde que entrei n'esta casa constantemente as defendi e sustentei.

Sr. presidente, n'estas questões politicas costumo sempre tomar a palavra, assim como em quaesquer questões de interesse geral, estou portanto de accordo com as minhas idéas tendo-a tomado n'esta occasião. Mas, sr. presidente, assim como lamento os excessos da anarchia e da revolução, lamento igualmente os fuzilamentos e as represalias, e estimaria que as scenas de 1871 nos não fizessem lembrar as de 1796 e os massacres de outras eras! Desejaria ver, depois de mantida a ordsm com vigor, ser exaltada a justiça.

Firme, pois, nos meus principios, julgo dever manifestar a minha adhesão e e meu affecto á proposta do digno par, o sr. marquez de Niza.

(O orador não reviu as notas d'este discurso.}

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Julgo do meu dever declarar á camara, que em nome de todo o ministerio me associo de muito bom grado á proposta que o digno par, o sr. marquez de Niza, acaba de apresentar. (Uma voz:-Muito bem.)

Acrescento, porém, que o governo já havia pela sua parte cumprido o dever que eu entendo tinha a cumprir na presença da actual situação da França, ordenando ao representante de Sua Magestade, em Paris, que por parte do governo portuguez felicitasse o sr. Thiers, pelo relevante serviço que acabava de urestar á liberdade e á civilisação, debellando a revolução que se lesvantara n'aquella cidade (apoiados}.

E o governo, tendo assim procedido, não podia deixar de ver agora com muita satisfação que a camara dos dignos pares exprimia os mesmos sentimentos. Se a proposta do digno par, o sr. marquez de Niza, for approvada, como creio que o será, eu me encarrego de a fazer chegar quanto antes ao seu destino, dirgindo-me novamente ao representante de Portugal em França, a fim de que elle faça sciente ao governo francez, a quem sei que foi muito agradavel a felicitação do governo postuguez, d'esta nova prova de sympathia pela França e dos desejos que todos nós temos que essa nação possa quanto antes cicatrizar as feridas que ainda gotejam sangue, e retomar aquelle logar que lhe pertence entre as nações, como é indispensavel a todos os respeitos.

Vozes: - Muito bera, muito bem.

O sr. Andrade Corvo: - Sr. presidente, é dever de todos os homens publicos, é dever de todos os homens de bem, é dever de todos os verdadeiros liberaes congratular-mo-nos por ter o governo da França debellado essa pavorosa e barbara revolução, que ameaçava destruir pelos fundamentos a sociedade, qus atacava com sanguinario furor a justiça, a moral, a civilisação e a liberdade. Felicitemos pela sua victoria o governo que salvou a França de um immenso perigo, que o era tambem para toda a Europa (apoiados}.

Esta manifestação do parlamento portuguez, felicitando um governo que soube cumprir a sua dolorosa missão, que soube combater e vencer a anarchia, e que ha de restabelecer, esperâmos nós, o dominio da lei e a acção benefica da liberdade, onde as más paixões, os ferozes instinctos, as falsas doutrinas imperaram com uma violencia, de que não ha exemplo ainda nas mais tenebrosas paginas da historia; esta manifestação é o cumprimento de um dever. Ao parlamento de uma nação, que se preza de civilisada e liberal, cumpre demonstrar n'esta occasião por um voto solemne que são solidarios todos os povos livres, e que é de todos elles a grande e nobre causa do progresso pela moral e pela justiça (apoiados}.

Sr. presidente, não é agora occasião para largas considerações. Está na nossa memoria gravada, com impressão dolorosissima, a historia dos terriveis successos de París.

Não ha palavras que possam traduzir o horror com que o mundo civilisado tem assistido a essa immensa catastrophe da França. Permitta Deus que nunca se apague do espirito das nações a memoria dos erros, dos crimes, do louco fanatismo, das invejas rancorosas, dos egoismos ignobeis que foram causa d'aquelle pavoroso cataclysmo; e que seja uma lição para todas ellas as desgraças da França, para que todas se convençam de que só na liberdade e na ordem, mantidas em nome da lei, está a felicidade dos povos (muitos apoiados}.

Sr. presidente, agitam-se hoje no mundo muitas falsas idéas, que podem de um momento para o outro pôr em grave risco a civilisação e o progresso.

Essas idéas, que tão fataes podem ser á liberdade e á grandeza das nações, tenho eu esperança que não penetrarão nunca no espirito do povo portuguez; d'este nobre povo que tem amor verdadeiro á liberdade, e elevadissimos sentimentos de probidade e de moral que nelle são já tradiccionaes. Essas falsas e corruptoras idéas espero eu não invadirão nunca o coração nobre de quem tem aspirações elevadas, sentimento verdadeiro da liberdade e puro amor da patria. Creio que taes erros não acharão echo entre nós; mas nem por isso deixo de sentir profunda magua ao ver as tristes consequencias a que elles podem levar as sociedades (apoiados}.

Sr. presidente, sejamos prudentes! Não deixemos, por imprevidencia ou por demasiada confiança, morrer a liberdade ás mãos da anarchia.

A Providencia salvará esta nobre nação portugueza d'esses erros e d'esses crimes, que arrastam os povos á deshonra e á ruina.

Compenetremo-nos, todos os que temos amor sincero á patria e á civilisação, dos nossos graves deveres.

Radiquemos cada vez mais a liberdade nas nossas instituições; conservemo la sempre illesa e pura; para que Portugal mantenha um logar eminente entre as nações da Europa, e não possa correr perigo a sua independencia.

Defendamos a ordem em nome das leis.

Sustentemos a paz e a independencia pela liberdade, pela justiça e pela moralidade (apoiados}.

O sr. Visconde Fonte Arcada: - Sr. presidente:

Oh di citta divise oribil sorte! stragi astragi succedano!.. il buon cade...
o inferocisce edemula I tironi!

Estes versos de uma tragedia de Silvio Pellico, era que refere as revoluções de uma republica italiana da idade media, descrevem exactamente o que se está passando em Paris, e talvez em mais algumas cidades de França.

Eu lamento e lamento profundamente, com o coração atribulado, os acontecimentos de Paris e de França; estou certo que só quem tiver o coração prevertido, é que não partilhará o que eu sinto, á vista de tantas desgraças e infamias praticadas pela communa e pelos seus satelites; bem como o que se está praticando em Paris, para castigar e reprimir aquelles excessos. Nunca o celebre Silvio podia pensar que viria uma epocha em que os seus versos se poderiam applicar no seculo XIX a uma cidade a Paris!...

Tudo o que se está passando seria thema para um longo discurso que eu nem poderia fazer agora nem teria tempo para o concluir.

Entretanto, sem querer alongar a discussão direi o que penso a respeito d'estes acontecimentos, que todos nós lamentâmos; oxalá que elles não tenham echo em outra parte, porque acontecimentos daquelles são para deixar rasto por algum tempo em França, ou em outros paizes.

É para isso que eu chamo a attenção do governo e de nós todos, porque eu não sou d'aquelles, como diz Nicolau Tolentino:

Que tendo a filha em perigo ri do turco descuidado.

A nossa filha é a nossa patria, cumpre que o governo e todos nós formemos um nucleo, para que nem por sombras

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se possam vir a dar similhantes acontecimentos em a nossa terra.

Sr. presidente, seria mui longo se quizesse apontar as causas que produziram em França tão desgraçados acontecimentos, isto não é para agora.

Não posso porém deixar de dizer que o governo francez tudo desmoralisou, e que nem o exercito tinha organisado de modo que podesse resistir a uma invasão; aprenderemos nós a evitar o que levou a França áquelle estado? Algumas d'estas causas não estarão á muito actuando sobre o nosso paiz? Como tem elle sido administrado até agora? Deixo á comprehensão dos meus iliustres collegas e de todos os que teem a mais pequena influencia sobre os negocios publicos, estas considerações para que taes causas se evitem, causas que eu não quero agora referir, mas que são bem conhecidas.

Approvo a proposta, mas cumpre que evitemos o que póde dar os funestos resultados que presenciámos.

Tenho concluido.

O sr. Presidente: - Vae votar-se a urgencia da proposta apresentada pelo digno par o sr. marquez de Niza.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se para ser votada.

Foi unanimemente approvada.

O sr. Marquez de Niza: - Eu pedia, no caso que a camara n'isso convenha, que a copia da acta seja remettida ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, para se expedir pela respectiva secretaria com a urgencia possivel.

O sr. Fontes Peneira de Mello: - Mando para a mesa um parecer das commissões reunidas de fazenda e administração publica, e peço que seja dispensado o regimento para entrar em discussão.

Admittida a urgencia e dispensado o regimento, foi lido na mesa, e é do teor seguinte, assim como o respectivo projecto.

Parecer n.º 59

Senhores. - As commissões de administração publica e de fazenda d'esta camara, a quem fora presente o projecto de lei n.° 55, vindo da camara dos senhores deputados, o qual tem por fim auctorisar a camara municipal de Lisboa a applicar do subsidio que recebe dos cofres do estado a quantia de 56:000$000 réis para garantia e amortisação de um emprestimo que pretende contrahir na importancia de 800:000$000 réis;

Considerando a commissão que da applicação que a camara municipal tenciona fazer do sobredito emprestimo devem provir grandes beneficios á cidade de Lisboa:

São de parecer que o mesmo projecto seja approvado por esta camara para ser submettido á real sancção.

Sala da commissão, em 2 de junho de 1871. = Antonio Maria de Fontes Peneira de Mello = Felix Pereira de Magalhães = Francisco Simões Margiochi = Conde da Ponte = Tem voto do sr. Reis e Vasconcellos = José Lourenço da Luz.

Projecto de lei n.° 55

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal de Lisboa a applicar, do subsidio que recebe dos cofres do estado, a quantia de 56:000$000 réis para garantia e amortisação de um emprestimo que pretende contrahir, na importancia de 800:000$000 réis.

Art. 2.° A faculdade concedida por esta lei fica dependente da auctorisacão que o governo der para a realisação do emprestimo, no uso das attribuições que lhe confere o decreto com força de lei de 18 de agosto de 1870.

§ unico. O emprestimo será dividido pelo menos em cinco series, nenhuma das quaes será emittida, sem que a precedente esteja esgotada e a camara haja prestado contas ao governo da sua applicação.

Art. 3.° Nenhuma das obras a que o emprestimo seja destinado póde ser emprehendida sem que os respectivos projectos e orçamentos hajam sido approvados pela junta consultiva de obras publicas.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, 31 de maio de 1871. = Antonio Cabral de Sá Nogueira, presidente = Adriano de Abreu Cardoso Machado, deputado secretario = Domingos Pinheiro Borges, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Ámanhã continua a mesma ordem do dia com os pareceres que se apresentarem.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e um quarto da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 2 de junho de 1871

Os exmos. srs. Conde de Castro; Marquezes, d'Avila e de Bolama, de Niza, de Sabugosa, de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Fornos, da Ponte, de Rio Maior, de Samodães; Viscondes, de Benagazil, de Chancelleiros, de Fonte Arcada, de Ovar, de Soares Franco; Moraes Carvalho, Mello e Carvalho, Fontes Pereira de Mello, Costa Lobo, Xavier da Silva, Rebello de Carvalho, Barreiros, Pereira de Magalhães, Margiochi, Larcher, Corvo, Braamcamp, Pinto Bastos, Pestana, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Preto Geraldes.

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