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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO N.° 41

EM 11 DE DEZEMBRO DE 1906

Presidencia do Exmo. Sr. Conselheiro Augusto José da Cunha

Secretarios — os Dignos Pares

Luiz de Mello Bandeira Coelho
José Vaz Correia Seabra de Lacerda

SUMMARIO.— Leitura e approvação da acta.— Expediente.— O Sr. Presidente do Conselho responde a algumas considerações apresentadas na sessão anterior, pelo Digno Par Sr. Alpoim. Chegando a hora de se passar á ordem do dia, promette concluir essa resposta na sessão seguinte.

Ordem do dia.— Discussão do parecer n.° 11 que approva, para ser ratificada, a convenção destinada a isentar dos direitos de porto os navios ambulancias em tempo de guerra.— Approvado, depois de considerações apresentadas pelo Digno Par Sr. Sebastião Baracho, a que responde o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.—É lido e posto em discussão o parecer n.° 12, que approva o contrato provisorio relativo á concessão do cabo telegraphico submarino da Gran-Bretanha ao Fayal e do Fayal a Cabo Verde.— Usam da palavra os (Dignos Pares Srs. Sebastião Baracho, Ministro das Obras Publicas, João de Alarcão e João Arroyo, depois do que é approvado.— É lido e tambem approvado, depois das considerações apresentadas pelos Dignos Pares Srs. Sebastião Baracho, Arroyo e Ministro dos Negocios Estrangeiros, o parecer n.° 3, que approva, para ser ratificada, a declaração commercial entre Portugal e a Suecia. — Encerra-se a sessão e designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

Pelas duas horas e trinta e cinco minutos da tarde verificando-se a presença de 40 Dignos Pares, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Foi lida e approvada a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se o seguinte expediente:

Officio do Ministerio do Reino, satisfazendo um requerimento do Digno Par Sebastião Baracho.

Para a secretaria.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (João Franco Castello Branco): — Sr. Presidente: o Digno Par Sr. José Maria de Alpoim dividiu as considerações feitas na sessão antecedente em duas partes: na primeira referiu-se aos trabalhos d´esta Camara, procurando mostrar que elles teem corrido com toda a ordem e regularidade, sem nenhuma demora ou lentidão dignas de reparo; na segunda referiu-se principalmente aos acontecimentos do Porto na noite de 1 do corrente mês, a fim de apurar a responsabilidade que d'elles pode advir para os delegados do Governo, quer civis, quer militares, na execução das instrucções que lhes foram transmittidas.

Antes d'essas considerações, alludiu o Digno Par á minha ausencia n'esta Camara.

Infelizmente para mim porem, o Diario das Sessões, de uma e outra casa do Parlamento demonstram que não tenho faltado a uma unica sessão, e ainda não houve uma só sessão em que não tenha tido de usar da palavra, n'uma ou n'outra Camara, porque as discussões teem sempre tomado um caracter politico que me obriga a entrar n'ellas no seu momento de maior intensidade.

Se não vim immediatamente á chamada do Digno Par, para responder ás considerações que desejava fazer sobre os acontecimentos do Porto, foi porque antes d'isso se abriu na Camara dos Senhores Deputados uma discussão com um illustre membro d'aquella Camara, exactamente sobre o mesmo assumpto. Já vê o Digno Par que seria um desprimor da minha parte abandonar o debate n'aquella altura.

As considerações apresentadas porem pelo Digno Par na sessão antecedente mostram nada só ter perdido com a demora, porque S. Exa. não fez mais do que repetir o que já estava dito. Apesar de tantos dias decorridos, o Digno Par não veio trazer á questão um unico facto, uma unica informação ou pormenor que pudesse demonstrar quaesquer excessos por parte das auctoridades ou agentes encarregados da manutenção da ordem n'aquella cidade.

Disse o Digno Par que eu tinha accusado esta Camara de fazer obstruccionismo.

Não empreguei tal palavra nem n'esta nem na outra casa do Parlamento, quando tive ensejo de me referir á iniciativa do Governo, á maneira como os trabalhos parlamentares teem corrido e á sua productividade, bastante limitada para dois meses e meio de sessão legislativa. Não me referi a este assumpto primeiro na outra Camara do que n'esta, o que mal parecia. Por occasião dos reparos levantados pelo Digno Par Sr. João Arroyo a um voto do Sr. Ministro da Marinha, voto divergente do da maioria d'esta Camara, é que eu expuz as ideias do Governo, e lamentei que a iniciativa do Governo não fosse aproveitada pela Camara, de forma a realizar-se com brevidade a publicação de leis que o Governo julga indispensaveis ao bem do paiz.

É esse o pensamento do Governo, que não occultei quando me referi ao funccionamento que estava tendo o systema representativo. Julguei util fazer estas considerações ao Parlamento, não só para que as responsabilidades ficassem bem definidas, mas ainda porque estava convencido de que o paiz olha com attenção para a maneira como correm os debates parlamentares, cujo prestigio eu só desejo ver bem erguido.

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Não falei pois em obstruccionismo, nem disse cousa alguma que pudesse considerar-se uma ameaça, ou uma consideração attentatoria da independencia e dignidade do Parlamento, que a ninguem mais do que ao Governo cumpre acatar. (Apoiados).

Referiu se o Digno Par ao modo como foram aproveitadas as sessões que se teem realizado n'esta camara e se as minhas palavras precisavam de uma demonstração por factos, não a podiam ter mais eloquente do que a que o Digno Par se encarregou de fazer.

Houve 4 sessões até o dia 15, é certo; mas não disse o Digno Par que depois do dia 15 de novembro houve 5 sessões em que se tratou exclusivamente de assuntos politicos, que se podem designar por questões das «abelhas palacianas», das cartas de El-Rei, dos acontecimentos de 4 de maio. E na realidade do que se discreteou foi acêrca da maneira como tinha caido o Ministerio regenerador e o actual Governo tinha sido elevado aos Conselhos da Corôa.

O Sr. João Arroyo: — E tambem se tratou da maneira de o fazer cair agora.

O Orador: — Isso é para d'aqui a tanto tempo, que o obstruccionismo ha de cansar-se antes.

Se não, o Digno Par verá.

O Sr. Sebastião Baracho: — Presumpção e agua benta...

O Orador: — Isto durou até a discussão do contracto dos tabacos, e ainda depois em mais sessões antes da ordem do dia.

O Sr. José de Alpoim: — O que eu disse foi que até o dia 15 houve apenas 4 sessões, e na 4.ª já o Digno Par Hintze Ribeiro instava por que começasse a discussão da resposta ao Discurso da Coroa, o que, por effeito da ausencia do Sr. relator, foi demorado até 6 de novembro.

O Orador: — A verdade é que, desde o dia 15 de outubro até que entrou em discussão o contracto dos tabacos, houve 5 sessões, gastas e consumidas em assumptos meramente politicos.

Pareceria que, depois d'isto, a discussão de resposta ao Discurso da Corôa ficava aligeirada. Não succedeu porem assim.

Esse debate protelou-se por tanto tempo, preencheu tantas sessões que o Digno Par Sr. Conde de Lagoaça, que ainda estava no Rio de Janeiro quando se começou a discutir aqui a resposta ao Discurso da Corôa, se lastimava de não tomar parte n'elle. Pois aquelle Digno Par partiu para Portugal e ainda chegou a tempo de usar da palavra na mesma discussão.

O Sr. José de Alpoim: — Uma viagem de oito dias !

O Orador: — Mas não vale a pena nenhum de nós inquietar-se por este motivo. Eu uso sempre para com os membros do Parlamento de uma serenidade absoluta, não porque seja esse o meu temperamento ou possua essa grande qualidade do Digno Par, mas porque desconfio da minha propria impulsividade, e durante os 15 annos que estive votado ao ostracismo, habituei-me a collocar-me em pontos de vista mais exactos, que me permittiram comprehender que o que importa não é o que cada um diz, mas o que cada um faz, e que é um erro grosseiro imaginar que um povo se dirige e governa com phrases.

Nas minhas palavras não ha a brilhante eloquencia do Digno Par, mas convenço-me de que, se os factos estiverem como estão do meu lado, permitta-me S. Exa. que lhe diga que por mais que se esforce em valer-se dos seus elevados dotes oratorios, proferindo accusações vehementes contra o Governo, elle continuará ficando intangivel deante d'essa catadupa de palavras, sem influencia alguma sobre elle, porque se sente com a razão do seu lado.

No fim do mês já havia sobre a mesa projectos importantes, como eram as convenções internacionaes feitas pelo Governo transacto e outros que eram já obra d'este Governo. Os membros dos partidos que fizeram aquellas convenções, que realizaram aquelles tratados, naturalmente o não fizeram por julgar que eram de um valor insignificante e não merecia a sua attenção este facto de ligar o destino do país a outra nação.

Mas o que nós estamos a ver é quê effectivamente se perdeu muito tempo com a discussão da resposta ao Discurso da Corôa.

Estes são os factos e eu pergunto a favor de quem elles militam, se a favor do Governo ou do Digno Par.

Se a resposta ao Discurso da Corôa tivesse uma discussão menos larga, e menos demorada, se em logar de se estarem a discutir os assuntos que nesta Camara absorveram tão largas sessões, já a partir do meado do mês transacto, outros projectos teriam occupado a attenção da Camara, uns estariam a discutir-se e outros teriam já obtido a approvação da Camara, e entre esses os que representam o pensamento do Governo.

No campo dos factos nenhuma contestação pode ser apresentada ás minhas palavras, que valem menos é certo, que as do Digno Par que, pelo brilho e eloquencia com que as pronunciou, nos permittiu apreciarmos o que é digno de se chamar bella peça oratoria.

Mas isso em nada me preoccupa.

Diz o Digno Par que me fazia uma proposta, e era que as suas palavras fossem impressas e affixadas ao lado do discurso por mim pronunciado na Camara dos Senhores Deputados e ao qual a Camara resolveu conceder essa honra, não porque elle valha em si, mas pelas affirmações que contem, pelo restabelecimento da verdade que encerra e pelo convencimento que a Camara teve de que se lhe devia dar no país a mais larga circulação.

Pela minha parte dou o meu voto favoravel, porque o discurso do Digno Par alem de ser uma bella peça oratoria, apoia e confirma o que eu tenho feito com respeito á lentidão dos trabalhos d'esta Camara.

Mas V. Exa. comprehende, não sou eu que o posso requerer n'esta Camara; aqui «penas sou chefe do Governo.

Se fosse Par do Reino, mandaria para a mesa um requerimento n'esse sentido.

Mas se alguem o quiser fazer, o Governo terá muito prazer em se associar a qualquer proposta n'esse sentido.

Demais isso não dará muito trabalho ao Digno Par, pois que o discurso de S. Exa. vem exactissimamente reproduzido no Dia. De onde se vê mais uma vez que o Estado é sempre o peor servido; as notas tachygraphicas estavam muito imperfeitas, tendo me causado a sua revisão em immenso trabalho; ao passo que uma empresa particular conseguiu reproduzir com a inexcedivel exactidão o discurso do Digno Par.

O Sr. José de Alpoim: — Isso tem uma simples explicação; fui eu que o mandei para lá.

V. Exa. comprehende bem que um trabalho, em que ha citações e numeros, um trabalho para o qual foi necessario folhear cuidadosamente o summario das sessões, é uma cousa estudada e reflectida.

O Orador: — Entende o Digno Par que as minhas palavras representavam uma ameaça á Camara dos Dignos Pares.

No discurso que pronunciei na outra Casa do Parlamento, nunca disse nem proferi palavras que pudessem merecer esta classificação.

Diga o Digno Par quaes foram essas palavras ou quaes os actos que possam traduzir-se em ameaças á Camara dos Dignos Pares do Reino.

O Sr. José de Alpoim: — Eu disse o contrario. Pela muita consideração

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para com S. Exa., declarei que não interpretava semelhantes palavras como uma ameaça á Camara dos Dignos Pares, ameaça que S. Exa. era incapaz de dirigir.

O Orador: — Eu não posso dar a minha prosa, que vale muito menos, mas dizia S. Exa.:

O Sr. José de Alpoim : — Eu não estou a argumentar com habilidade, estou dizendo a verdade. Não posso nem devo dizer quem foram as pessoas que me disseram que as palavras, proferidas por S. Exa., eram uma ameaça á Camara dos Dignos Pares; mas os jornaes da concentração liberal ahi o disseram, que S. Exa. accusou a Camara dos Dignos Pares e alguns homens publicos, fazendo ameaças nitidas, formuladas por palavras crueis, mas que eu não acreditava que assim fosse, e era impossivel que fosse essa a intenção de S. Exa.

O Orador: — Agradeço a explicação do Digno Par. S. Exa. dizia ainda o
seguinte:

(Leu).

O Sr. José de Alpoim: — Isto é uma questão de facto, o que eu disse é exactamente o que está ahi.

O Orador: — V. Exa. referiu-se a um facto; se o não acredita, para que se referiu a elle ?

Não podia ser para outra cousa senão, em primeiro logar, para mostrar as circumstancias, em que assim, procedia e para insistir n'ellas; em segundo logar, para dizer que S. Exa. e os seus amigos não precisavam de recorrer a meios extraordinarios para governarem.

Era uma maneira indirecta de fazer a critica de affirmações; mais que isso, de fazer até um programma de Governo.

Se ámanhã S. Exa. occupar estas cadeiras, não terei senão muita satisfação em que governe bem sem solicitações extraordinarias.

Pela minha parte tem os meus applausos. Se tal succeder faço votos para que a sua administração seja util ao paiz.

Mas permitta-me que lhe diga que por ora não era necessario fazer estas afirmações de caracter governativo, o Governo está governando e continuará a governar em harmonia com as suas ideias, com o programma que sustentei na opposição, e que, asseguro á Camara, hei de continuar a cumprir.

O Governo não faz ameaças á Camara dos Dignos Pares; eu expuz o meu modo de pensar sobre o modo como correm os trabalhos parlamentares, mas fi-lo por uma forma cordata e respeitosa para a Camara e para todos os seus membros, e tendo ella, como tem, homens de muito brio e energia, ninguem se levantou contra as minhas palavras, para dizer que eu sairá fora da orbita das minhas attribuições e do dever que me incorreria de respeitar e considerar esta Camara.

Pelo contrario, procedi no legitimo direito de chefe do Governo, por isso mesmo que os trabalhos parlamentares não resultam somente da acção parlamentar, mas da sua cooperação com o Governo; fiz considerações que julguei de proveito para a causa publica e para o prestigio do Parlamento, sem comtudo calar o que era do meu direito dizer.

Nada fiz pois que não fosse legitimo e correcto.

Se acaso a Camara dos Dignos Pares entender que os trabalhos parlamentares devem ou podem correr mais acceleradamente ou pelo menos mais productivamente, ella tem na sua mão os meios necessarios para o conseguir, sem necessidade dos conselhos do Governo e muito menos sem instigações que, de longe sequer, possam ser tomadas á conta de ameaças.

V. Exa., Sr. Presidente, comprehende que, dentro de cada uma das Camaras, quem governa são as maiorias, as quaes, todas as vezes que entendem que os trabalhos parlamentares precisam ser conduzidos por caminho differente d'aquelle que vão seguindo, teem mais de uma maneira de fazer com que prevaleça o que é o seu criterio, o que é a sua opinião, e, desde que são maiorias, estão no uso do seu direito e no legitimo exercicio da sua vontade.

Nem eu precisava referir-me a ameaças, nem ellas tinham cabimento e razão de ser; mas assistia-me o direito de dizer o que disse, de apresentar as considerações que fiz, para que a Camara as tomasse no sentido que parecesse mais adequado á causa publica e ao bom andamento dos trabalhos parlamentares.

O Sr. Presidente: — Cumpre-me lembrar ao Sr. Presidente do Conselho que passou já a meia hora antes de se entrar na ordem do dia.

O Orador: — Eu quero continuar a dar demonstração á Camara, como tenho vindo sempre dando, assim como os meus collegas n'este legar, de que desejo que as sessões corram absolutamente dentro das prescripcões regimentaes e com a maior utilidade para o paiz.

Termino, pois, aqui as minhas considerações referentes á primeira parte do discurso do Sr. Alpoim e a esta Camara virei amanhã responder á segunda parte do seu discurso, não só pela muita consideração que S. Exa. me merece, mas ainda para lhe mostrar com factos que o Digno Par disse muitas cousas, mas não lhe ouvimos nada de valor, nem a confirmação de um tacto, nem uma prova das suas affirmações.

(S. Exa. não reviu).

ORDEM DO DIA.

Leu-se na mesa e entrou em discussão o parecer n.° 11 sobre o projecto de lei n.° 9, que, é do teor seguinte:

PARECEU N.° 11

Senhores. — Á vossa commissão de negocios externos foi presente o projecto de lei n.° 9, que se refere á convenção assinada na Haya, a 21 de dezembro de 1904, e na qual se estatuem as garantias e direitos que os Governos, representados nessa conferencia, concedem com as devidas reservas e cautelas aos navios-ambulancias em Atempo de guerra.

É a applicação dos principios da convenção de Genebra de 22 de agosto de 1864 ás guerras navaes, com acrescentamento de vantagens e isenção de direitos nos portos de mar das potencias signatarias aos navios ambulancias. Em homenagem a tão humanitaria iniciativa, não podia a vossa commissão de acordo com o Governo deixar de approvar o projecto de lei que nos foi enviado da Camara dos Srs. Deputados e que é do teor seguinte:

Projecto de lei

Artigo 1.º É approvada, para ser ratificada pelo poder executivo, a convenção destinada a isentar dos direitos de porto os navios-ambulancias em tempo de guerra, assinada na Haya, em 21 de dezembro de 1904, em nome dos seus respectivos Governos pelos plenipotenciarios da Allemanha, Austria-Hungria, Belgica, China, Coreia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da America, Estados Unidos Mexicanos França, Grecia, Italia, Japão, Luxemburgo, Paises Baixos, Persia, Portugal, Romania, Russia, Servia e Sião.

Artigo 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão dos negocios externos e internacionaes, em 12 de novembro de 1906. = Conde de Sabugosa. = Grama Barros. = Conde do Cartaxo. — Luciano Monteiro. = João Arroyo. = Alexandre Cabral. = Teixeira de Vasconcellos.

PROPOSIÇÃO DE LEI N.° 7

Artigo 1.° É approvada, para ser ratificada pelo poder executivo, a convenção destinada a isentar dos direitos

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de porto os navios-ambulancias em tempo de guerra, assinada na Haya, em 21 de dezembro de 1904, em nome dos seus respectivos Governos, pelos plenipotenciarios da Allemanha, Austria-Hungria, Belgica, China, Coreia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da America, Estados Unidos Mexicanos, França, Grecia, Italia, Japão, Luxemburgo, Paises Baixos, Persia, Portugal, Romania, Russia, Servia e Sião.

Artigo 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 6 de novembro de l906. = Dr. Antonio José Teixeira de Abreu. = Conde de Agueda. = Julio Cesar Cau da Costa.

O Sr. Sebastião Baracho: — Não me proponho responder ás considerações feitas pelo Sr. Presidente do Conselho. Mantenho ideias accentuadas, acêrca do assumpto que se versou, e que tenho expendido por varias vezes. Ocioso seria agora recorrer a uma nova edição, tendo-se entrado em ordem do dia, com materia precisa a discutir.

Antes, porem, de explanar as considerações respeitantes aos navios-ambulancias, careço de dirigir-me ao Sr. Presidente do Conselho, concernentemente a assumptos da pasta do Reino.

Procedo assim, porque, estando inscripto ha dias para usar da palavra, antes da ordem do dia, ainda o não pude conseguir.

O Sr. Presidente do Conselho occupou hoje toda a hora, e pediu para que a palavra lhe ficasse reservada.

Respeito este modo de proceder, pelo qual, devo dizer, nunca me amoldei.

O Sr. João Arroyo: — Nem é legal.

O Orador: — Tem razão o Digno Par; e, todavia, o systema está sendo seguido, com prejuizo de quem tem de tratar, como me succede, de negocios varios de administração.

Entre elles, destaco o que diz respeito ao Lyceu da Lapa, onde os alumnos do 3.° anno não deram ainda, por falta de professores, uma unica lição de portuguez e francez.

Peço urgicas providencias, como o caso justifica, e que ellas se ampliem á reclamação que, em telegramma, me foi feita, n'um dos ultimos dias, e que passo a ler:

Os professores do concelho de Paredes, reunidos, pedem a intervenção de V. Exa. para que lhes seja pago o expediente do 2.º e 3.° trimestre do anno corrente; os restos da renda das casas de 1904; e os fornecimentos de 1905 e 1906.-— Lourenço Pinheiro = Nunes = Nogueira Junior.

Pelo acenado do Sr. Presidente do Conselho, reconheço que S. Exa. se propõe, como no caso anterior do Lyceu da Lapa, a adoptar providencias. Muito folgarei com que ellas se tornem effectivas sem demora, e aproveito ainda a occasião para mandar para a mesa o requerimento que passa a ler:

Requeiro que, pelo Ministerio do Reino e Archivo da Torre do Tombo, me seja fornecida, com urgencia, copia do inventario dos bens da Corça, ao qual se referem o artigo 8.° da lei de 16 de julho de 1855, o artigo 5.° da lei de 23 de maio de 1359 e o § unico do artigo 1.° da lei de 25 de junho de 1889. = Sebastião Baracho.

Peço ao Sr. Presidente do Conselho se digne recommendar que os esclarecimentos, que solicito, me sejam fornecidos com brevidade.

Antes, porem, de pôr termo a esta minha digressão, estranha ao projecto que se discute, dirijo-me ao Sr. Ministro das Obras Publicas, repetindo o que particularmente lhe disse n'esta Casa, por não ter tido ensejo de usar da palavra antes da ordem do dia.

Fui procurado por uma commissão de vendedores de vinhos a retalho, pedindo a minha intervenção, a fim de elles poderem vender, ainda este anno, agua-pé de que estão de posse.

Não annuiu o Sr. Ministro á pretensão.

Está no seu direito. É todavia de equidade intuitiva mandar levantar os sellos das vasilhas que conteem aquella bebida, e que por essa forma continuam inutilizadas.

Eu sei que a agua-pé é uma adulteração de vinho. Por isso apenas pedia a tolerancia da sua venda por este anno, attentos os prejuizos resultantes da prohibição official.

Para Villa Franca, houve condescendencia em circunstancias identicas, e, em toda, a parte, a fraude clandestina se pratica, sem que a repressão lhe seja correspondente.

Emfim, o Sr. Ministro procedeu como lhe aprouve; e eu ponho termo aqui ás considerações que o caso me dispertou, e passo a occupar-me dos navios-ambulancias.

As grandes nações, a quem é permittido ter potentes esquadras, mais aproveitam do que as pequenas com os navios-ambulancias. A estas é vedado possuirem couraçados, cujo elevado preço as arruinaria.

Na parte que nos é respeitante, as nossas posses apenas nos permittem aspirar a uma esquadra colonial, dois ou tres navios de representação, dois ou tres navios-escolas, e torpedeiros e submarinos, apoiados por poderosa artilharia, na defesa do porto de Lisboa e das nossas costas maritimas.

Por este modo, respondo a, anteriores observações, explanadas pelo Digno Par Sr. Teixeira de Vasconcellos, cujos projectos de acquisição de couraçados não passam de uma utopia, permitta-me S. Exa. que lh'o diga.

Os navios-ambulancias derivam da propaganda humanitaria que teve origem na Convenção de Genebra de 1864, de onde nasceu a Cruz Vermelha, que tantos serviços tem produzido em toda a parte, incluindo no nosso Paiz.

As guerras de Africa o attestam eloquentemente; e ainda este anno ella mandou delegado seu á Africa do Sul, quando se organisou a expedição, cujo mallogro é bem conhecido.

Esse delegado, o Dr. Antonio Rodrigues Braga, dera provas de excepcional aptidão na campanha de l906, em Moçambique. Em 1906 deveria dirigir os trabalhos a cargo da Cruz Vermelha, e que incidiriam sobre todos os hospitaes e ambulancias necessarios ao serviço de saude da columna expedicionaria, desde Mossamedes até o ponto mais a Este, que fosse indicado pelo commandante da expedição.

O Sr. Rodrigues Braga elaborou um relatorio, que a todos os respeitos merece ser lido e divulgado.

Á testa da Cruz Vermelha Portugueza encontra-se o Sr. General Francisco Maria da Cunha, cuja dedicação pelo serviço que lhe está incumbido é inexcedivel. Succedeu S. Exa. a outro não menos zeloso administrador, o Sr. Duque de Palmella.

A Cruz Vermelha não perde ensejo de affirmar o seu patriotismo, e merece o mais largo patrocinio de todos os que se interessam pelo bem publico.

A União das Mulheres Francezas consegue, em circumstancias similares, verdadeiros milagres.

Não é o orador, marido nem pae.

N'estas condições, falta-lhe, porventura, auctoridade para se dirigir ás mulheres portuguezas, principalmente áquellas cujos esposos e filhos servem no exercito.

Mas a causa é tão justa, e as mulheres portuguezas são tão superiormente dotadas de sentimentos nobres, que esta referencia á sua generosa cooperação junto da Cruz Vermelha, pode n'ellas encontrar proveito e echo.

N'essa persuasão, vou concluir, notando apenas um devaneio da nossa chancellaria. Attribuiu ella a 25 de abril do anno passado o convite feito ao Governo Portuguez em 25 de abril de 1904, para se enfileirar entre as nações adherentes á Convenção de 21 de dezembro d'este ultimo anno, concernente aos navios-ambulancias.

A nossa burocracia incorre uma ou outra vez em desfallecimentos d'estes, que deveria evitar para seu credo.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luis de Magalhães): — Sr. Pre-

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sidente, só para não faltar á praxe parlamentar, uso da palavra, pois, quanto á materia do projecto, o Digno Par só elogiosamente se lhe referiu, e por isso não tenho senão que me congratular com o voto de S. Exa.

Ouvi attentamente as considerações do Digno Par relativas ao papel desempenhado pela Sociedade da Cruz Vermelha; e, a tal respeito, só me cumpre declarar que é grato ao Governo reconhecer os relevantes serviços prestados por aquella aggremiação, uma das mais benemeritas instituições com que podem contar os que defendem a patria nos campos da batalha.

Esgotada a inscripção, é approvado o parecer n.° 11, e é lido e posto em, discussão o parecer n.° 12, que é do teor seguinte:

PARECER N.° 12

Senhores. — O projecto de lei n.° 11, vindo da Camara dos Senhores Deputados e sujeito á vossa esclarecida apreciação, tem por fim consagrar, por meio da approvação parlamentar, o contrato provisorio celebrado em 18 de julho ultimo com as tres Companhias Eastern Telegraph, Western Telegraph e Europa & Azores Telegraph, autorizando-as a amarrar no Faial, como ponto intermedio, os cabos concedidos ás duas primeiras companhias entre S. Vicente de Cabo Verde e a Gran-Bretanha, em Porthcurnow, pelo decreto do Ministerio da Marinha e Ultramar de 25 de janeiro do corrente anno, no uso da autorização concedida pelo artigo 15.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional.

São obvias as vantagens que para o Thesouro resultam do trafego d'estas novas linhas, fazendo-as convergir num ponto de territorio nacional, que é já um importante centro de communicações telegraphicas. Como não podem ser esquecidas as vantagens de toda a ordem que resultam da criação de linhas que nos dão um nova e facil communicação entre a America do Norte e a America do Sul, visto aquella ilha se achar em correspondencia com os Estados Unidos da America por dois cabos submarinos com o Canadá por outro, permittindo assim esta nova via encaminhar por territorio português parte do trafego que actualmente se faz pela via Galveston.

Assim é a vossa commissão, de acordo com o Governo, de parecer que seja approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É approvado o contrato provisorio, celebrado em 18 de julho de 1906, com as Companhias Western Telegraph, Eastern Telegraph e Europa & Azores Telegraph, relativo á concessão do cabo telegraphico submarino da Gran-Bretanha ao Faial e do Faial a S. Vicente (Cabo Verde).

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, em 12 de novembro de 1906.= Eduardo José Coelho = M. de Espregueira — J. de Alarcão = Marquez de Avila = José Lobo — Luciano Monteiro = Luiz de Mello Bandeira Coelho = Teixeira de Vasconcellos (relator).

PROPOSIÇÃO DE LEI N.º 9

Artigo 1.° É approvado o contrato provisorio, celebrado em 18 de julho de 1906, com as Companhias Western Telegraph, Eastern Telegraph e Europa & Azores Telegraph, relativo á concessão do cabo telegraphico submarino da Gran-Bretanha ao Faial e do Faial a S. Vicente (Cabo Verde).

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 6 de novembro de 1906.= Dr. Antonio José Teixeira de Abreu = Conde de Agueda = Julio Cesar Cau da Costa.

O Sr. Sebastião Baracho: — No contrato que se discute, duas concessões ha a notar: uma com a data de 25 de janeiro do anno corrente, levada a effeito pelo artigo 15.° do Primeiro Acto Addicional; a outra datada de 18 de julho, da responsabilidade do actual Sr. Ministro das Obras Publicas.

A primeira mostra á evidencia o desprezo pelas formulas parlamentares, usando-se do Acto Addicional nas vesperas da abertura das Côrtes.

É pecha dos Ministros da Marinha dos ultimos tempos, sem excepção do actual. . .

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Malheiro Reymão): — A concessão, permitta-me o Digno Par que lhe lembre, é de janeiro de 1906.

O Orador: — Não ha a menor duvida, e eu proprio o mencionei. A responsabilidade d'ella compete ao ex-Ministro do partido com quem o Governo actual está concentrado. Alcança por isso, de reflexo, a V. Exa., esta responsabilidade.

Directamente, o Sr. Conselheiro Ornellas, africanista abalisado e official muito distincto, peca por outros actos da mesma indole, em que o respeito ás boas praxes constitucionaes fica completamente compromettido.

A concessão, pois, á sombra do Acto Addicional, é, por assim dizer, morganatica. A outra, consoante se reconhecerá, tambem não é genuina. Passou pelo templo, sem inscripção no registo civil.

Da concessão de 25 de janeiro, nasceu o contrato de 21 de fevereiro, que concede, numa das suas clausulas, 4:000 libras esterlinas ao Governo Portuguez,
para melhoramentos no porto de S. Vicente.

Seria preferivel que outras vantagens, e não dinheiro, nos fossem attribuidas.

Adoptada, porem, aquella preferencia, de utilidade seria que o pagamento fosse estatuido, em data precisa. A forma vaga que reveste este compromisso, deixa prever que, para elle se tornar effectivo, bastante tinta e papel burocratico terão, quiçá, de ser consumidos.

O contrato de 18 de julho tambem não é impecavel. Affirma o relatorio que o precede, que elle foi elaborado nos precisos termos do decreto de 24 de dezembro de 1901, o qual estabelece:

Artigo 24.° As concessões para o estabelecimento e exploração de cabos submarinos serão feitas por lei, podendo, porem, o Governo celebrar, mediante concurso ou sem esta formalidade, os contratos provisorios que hajam de ser submettidos a approvação das Côrtes.

A que processo recorreu o Governo?

Ao concurso?

Não. Prescindiu d'elle, pelo contrario, o que mal se desculpa em quem tanto alardeia de moralidade e de respeito á lei.

É certo que pode allegar que a outra concessão, a morganatica, o forçou a praticar assim, o que prova apenas a ruindade do primitivo procedimento.

Não contente, porém, com este primeiro rasgão, realizado nas boas praxes administrativas, o Sr. Ministro das Obras Publicas consentiu, pelo artigo 27.° do contrato, que o concessionario fizesse amarrar os cabos no Faial, sem previa audiencia do Parlamento.

É verdade que esta clausula deixaria de vigorar, se não fosse dada approvação parlamentar ao contrato provisorio.

Attenta, porém, a fórma como o regimen representativo funcciona entre nós, a restricção apontada apenas servira para arredondar periodos, tornando o contrato, literariamente, mais elegante.

Mas não param aqui as vantagens concedidas.

Assim, o mesmo contrato prescreve:

Art. 22.° O Governo Portuguez obriga-se:

3.° A conceder ás empresas isenções de direitos das alfandegas para os cabos submarinos, fios terrestres, instrumentos e materiaes destinados aos estabelecimentos das linhas contratadas e ao das estações telegraphicas das empresas, como tambem para os navios que tomarem parte nas operações de immersão dos cabos.

4.° A não estabelecer nem cobrar contribuição especial em Portugal com relação aos cabos das empresas ou á exploração d'elles.

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Na verdade, são demasiados beneficios, quando o Thesouro Publico está exaurido, e quando da concessão derivara os mais vantajosos lucros para o concessionario.

É positivamente um acto de má administração o que se praticou.

O Sr. Teixeira de Vasconcellos: — Não me parece.

O Orador: — Não lhe parece? E todavia V. Exa. é contribuinte, que, pela interrupção que me faz, está pedindo uma sobretaxa.

Em conclusão, Sr. Presidente, nas duas concessões que succintamente analysei, sobresaem tres actos verdadeiramente anormaes. Na primeira, o que resulta da propria concessão, feita á sombra do Primeiro Acto Addicional. e da responsabilidade do actual leader progressista na Camara Electiva.

Os outros dois, constantes da concessão ter sido realizada sem concurso, e da permissão do amarramento do cabo no Faial, sem previa resolução parlamentar, são da paternidade do actual Sr. Ministro das Obras Publicas.

Afigura-se-me que, para quem tanto apregoa e evangeliza moralidade politica, a que transparece do projecto que se discute, imprime indubitavelmente caracter.

(O Digno Par não reviu).

O Sr. Ministro das Obras Publicas

(Malheiro Reymão): — Pedi a palavra para responder ás considerações do Digno Par Sr. Sebastião Baracho, e começarei por dizer que essas considerações ou observações me parecem completamente infundadas.

Em harmonia com o artigo 15.° do Primeiro Acto Addicional, fez-se um contrato provisorio para o lançamento de cabos submarinos entre Cabo Verde e a Gran-Bretanha, do qual resultou o contrato definitivo que está sujeito á apreciação d'esta Camara.

No primeiro contrato estabelecia se que o cabo podia ter um ponto intermedio de amarração em territorio português.

Tendo as companhias começado a preparar o seu material, a fim de poderem lançar o cabo submarino, communicaram ao Governo que os trabalhos para o referido lançamento já estavam muito adeantados, achando-se o cabo pronto para serimmergido, e ao mesmo tempo solicitava-lhe a necessaria autorização para que o cabo pudesse ser immediatamente lançado, porque a demora o damnificava e juntamente para que a amarração intermedia fosse feita na Ilha do Faial.

Entendeu o Governo dever deferir, embora ficasse dependente da sancção parlamentar a concessão definitiva d'esta auctorização e comprometrendo-se a companhia a retirar aquella amarração, se as Côrtes não approvassem o contrato provisorio.

Fez-se, pois, o contrato provisorio nos precisos termos do artigo 24.° da organização dos serviços de telegraphos e correios, approvada por decreto de 24 de dezembro de 1901, ficando estabelecida aquella restricção, e resalvado ao Parlamento o perfeito e livre exercicio das suas prerogativas.

O Digno Par fez tambem algumas considerações a respeito do contrato firmado em virtude do decreto de 25 de janeiro do corrente anno. mas em razão do caracter definitivo d esse contrato, eu limitar-me-hei a assegurar que, a despeito dos reparos de S. Exa., ha nas leis communs, se a ellas fosse necessario recorrer, os meios precisos para garantir o exacto cumprimento das disposições e clausulas estabelecidas no referido documento.

Tambem o Digno Par disse que deveria ser dado por concurso o direito de amarração do cabo no Faial; mas, a verdade é que o artigo 24.° do citado decreto de 24 de dezembro de 1901 auctoriza as concessões provisorias em concurso ou sem elle e n'este caso esta formalidade era completamente dispensavel. Alem d'isto, todas as conveniencias publicas aconselhavam a que se tratasse com aquellas companhias, que já tinham amarrações em territorio portuguez e ás quaes tambem convinha a amarração no Faial, de onde resultava consideravel encurtamento do cabo transmissor.

Comprehende-se bem, Sr. Presidente, que n'estas condições, não poderia fazer-se semelhante concurso.

Voltando propriamente á questão das vantagens que offerece a amarração do cabo rio Faial, devo dizer ao Digno Par que tambem poderia servir para aquelle effeito um ponto da bahia de Vigo; mas que o Faial apresentava mais favoraveis condições para nos, por ser um ponto do territorio portuguez, e para a Companhia, em vista de ficar a linha mais directa e aquelle ponto intermedio permittir assira maior celeridade nos despachos e perfeição na transmissão.

Alem d'isso, tudo indica vá que o ponto intermedio da amarração devia ser em territorio portuguez. O Governo, pois, celebrando o contrato provisorio, não só zelou cuidadosamente os interesses do paiz, como não attentou, repete, por forma alguma, entra a soberania do Parlamento.

Foi sempre minha intenção deixar a questão integra para a resolução do Parlamento e por isso fiz inserir o artigo 27.°, em que se resalva a rescisão do contrato pelas Camaras. Tenho porem a segurança de que o Parlamento Portuguez não denegará a sua approvação a um contrato a que assistem razões poderosas de interesse publico.

Quanto ao prazo para o pagamento das 4:000 libras mencionadas no contrato, cumpre-me dizer ao Digno Par que as leis em vigor podem compellir, como já disse, a companhia a esse pagamento; mas decerto não haverá necessidade de a essas leis recorrer, attenta a seriedade da referida companhia que, não porá o minimo obstaculo ao pagamento da quantia estipulada, logo que o assumpto esteja liquidado pelo Parlamento.

Por ultimo direi que a isenção estabelecida no artigo 22.° nada tem de desusado. Figura em quasi todas as concessões que se teem feito; bastará notar que o material assim isento é todo estrangeiro, não havendo pois prejuizo para a industria nacional.

Pelo que acabo de dizer parece-me que tenho respondido, embora muito succinta e rapidamente, ás considerações do Digno Par Sr. Sebastião Baracho e esperando que S. Exa. não duvidará dar o seu voto ao projecto que se discute.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. João Arroyo: — Sr. Presidente: não sei quanto tempo, pela tabella das discussões parlamentares inventada pelo Sr. Presidente do Conselho, estará destinado para a discussão d'este projecto.

Não sei mesmo se já o facto de eu usar da palavra n'esta occasião representa para S. Exa. uma especie de abuso no exercicio do meu direito parlamentar.

Se assim é, na opinião do Sr. Presidente do Conselho, espero que S. Exa. me perdoe.

Prometto, porem, desde já que, para não abusar da paciencia da Camara, serei breve.

Direi o que penso do presente diploma, em phrase reduzida e concisa.

Sr. Presidente: este projecto que estamos discutindo, representa uma medida progressiva ou civilizadora, que é aliás o que succede a todo e qualquer projecto tendente a auxiliar e promover o desenvolvimento de cabos submarinos destinados a ligar nada mais nada menos do que tres continentes: a Europa, a Africa e a America.

Pertence o projecto em discussão ao numero d'aquelles que são sempre recebidos com sympathia e á boa paz.

Na minha já longa vida parlamentar, tenho visto que estes projectos são invariavelmente considerados pela Camara como mero expediente de secretaria.

O Parlamento vota-os com uma certa insouciance, e o Governo, por um resto

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de respeito para com o poder legislativo, é que os submette ao exame.

Comtudo, o direito de amarração é um proprio nacional de que o Governo não pode desapossar o Estado, seu exigir o correspondente valor; ha uma servidão, cujo preço não só deve estar representado nas taxas da transmissão mas no valor inicial da concessão, co mo consequencia do abandono de uma parcela de territorio nacional e da faculdade de amarração dos cabos.

Entretanto, o projecto em discussão é, segundo a minha opinião, prova frisante de duas cousas: do amor com que o Governo actual procede sempre que se trata de respeitar a legalidade administrativa; do desamor com que são tratados os interesses do Estado.

Começarei pelo primeiro ponto.

O relatorio da proposta de lei, com que o Governo acompanhou este diploma quando o apresentou á Camara dos Senhores Deputados, diz, Sr. Presidente, os tramites de illegalidade por que este projecto passou.

A concessão pedida tinha duas partes: a primeira referia-se á ligação entre os Açores e Cabo Verde a segunda referia-se á concessão do direito de amarração nos Açores.

Geria os negocios publicos na epoca em que o primeiro favor se fez, o Governo progressista, e o que elle fez foi muito simples: apesar de se tratar de um direito de amarração que contendia com uma das nossas ilhas adjacentes, suppoz que o assumpto estava dentro do Acto Addiconal e realizou a concessão.

O Governo actual, certamente para não ficar atrás do entranhado amor do seu socio em concentração liberal, á legalidade administrativa, pensou pela seguinte forma, como vamos ver:

«Faltava porém a concessão do direito de amarração nos Açores. Entendeu, quanto a este, o Governo que a não podia fazer, senão provisoriamente, e nos termos precisos do artigo 24.° da organização dos serviços de telegraphos, correios e fiscalização das industrias electricas, approvado por decreto de 24 de dezembro de 1901. D'ahi o contrato provisorio, celebrado em 18 de julho do corrente anno, contrato que o Governo vem agora submetter á approvação parlamentar».

E accrescenta:

«Succedera, comtudo, que antes da abertura do actual parlamento, mas muito depois de começarem as negociações sobre o assumpto, tinha recebido o Governo communicação de que o cabo destinado á linha projectada estava prompto a ser lançado, visto ter sido começado o seu fabrico, logo que as companhias, pela publicação do mencionado decreto de 25 de janeiro de corrente anno, obtiveram parte da con cessão que o Governo com ellas já accordara effectuar, em numerosas con ferencias celebradas para esse fim»

O Governo soube n'esta altura que o cabo estava prompto a ser lançado:

«Nestes termos e não convindo protelar o lançamento do cabo, o que se traduziria em prejuizo da Fazenda Publica e da das companhias, entendeu o Governo dever autorizar a amarração respectiva nos termos do artigo 17.° (transitorio) do contrato, sob a condição de que essas empresas se obrigariam levantar o mesmo cabo, quando assim fosse exigido pelo Governo Portuguez caso o Parlamento não concedesse approvação ao contrato provisorio».

Do trecho que acabo de ler á Camara, conclue-se que o Governo de então, quanto ao cabo entre o Faial e S. Vicente, achou-se sufficientemente auctorizado para a concessão por força do Acto Adicional; quanto ao segundo cabo entre o Faial e a Gran-Bretanha, tambem não quiz protelar a concessão e por isso effectuou-a, estabelecendo a clausula de que, se o Parlamento não approvasse o contrato provisorio, a Companhia seria obrigada a levantar o cabo.

Sr. Presidente: não sei que mais admirar n'este procedimento, se o amor à legalidade, se a ligeireza com que o artigo transitorio foi redigido.

Só quero fazer passar pelos olhos do Sr. Ministro das Obras Publicas, que é muito intelligente, a seguinte perspectiva :

Supponha S. Exa. que o Parlamento Portuguez, por influencia de qualquer trasgo, desapparecia.

Supponha S. Exa. que a concentração liberal se desfazia.

Já aqui ha dias ella esteve em grave perigo, como muitos dos meus dignos collegas sabem, por causa de um logar de procurador regio.

Supponha o illustre Ministro que a athmosphera parlamentar se confundia e se baralhava.

Supponha que a concentração se desmoronava, e que, em consequencia d´esse facto, o Parlamento Portuguez lhe não approvava este contrato.

Supponha que o Ministro das Obras Publicas, já desconcentrado n'essa epoca, o que estivesse n'esse logar, se dirigia á Companhia e invocava o artigo 27.°

V. Exa. sabe o que surgia fatalmente?

Um pedido de indemnização. Percorra V. Exa. os antecedentes do seu Ministerio, compulse o que acêrca de contratos provisorios feitos n'outros tempos lá se encontra, e diga depois se uma companhia apoiada por um Governo forte e poderoso deixaria de criar graves difficuldades ao Governo Portuguez.

Que uru Governo vulgar, um distes Governos de normal auctoridade, praticasse um acto d'esta ordem, não era bom, mas ainda se comprehendia; mas o que não se pode comprehender é como um Governo do Sr. João Franco, que messianizou todo esse paiz por ahi fora, annunciando, para o Eldorado da sua governação, que o amor da legalidade havia de andar emparelhado com o amor estreme da austeridade politica, seguiu desassombradamente por um caminho que nos poderia levar a grandes dissabores.

De maneira que, sobre legalidades n'esta concessão, o que temos apurado é que ella constitue um acervo de cousas unicas e extraordinarias.

Serviu-se primeiro o concentrado progressista do facto da amarração em Cabo Verde para effectuar a primeira concessão, invocando o Acto Adicional; valeu-se o concentrado regenerador-liberal do motivo de estar prompto o Cabo para realizar uma segunda concessão, e introduzir-se no contrato provisorio uma clausula que, se porventura o Parlamento não approvasse o contrato, não lhe serviria de cousa nenhuma para salvaguardar a responsabilidade do Governo. Isto quanto á legalidade. Agora vamos ao facto em si; ao regimen d'esta concessão de cabos submarinos; ao que é esta concessão, emfim, pelo seu valor especial. E aproveito a occasião para pedir ao Sr. Ministro das Obras Publicas, que acabe com esta tradição do Ministerio das Obras Publicas, de suppor que a concessão de estabelecimento de cabos submarinos e o consequente direito de amarração, que importam a existencia de uma verdadeira servidão para o Estado, podem effectuar-se a troco de uma simples collaboração nas taxas telegraphicas, e que nem ha que cuidar do valor inicial de concessão, nem mesmo do que representam todas as isenções a que se refere o artigo 22.° do contrato provisorio, como já o Digno Par o Sr. Baracho accentuou.

Sr. Presidente: este cabo tem uma importancia muito especial.

A Camara deve estar lembrada de que, quando foi da guerra russo-japoneza, a Inglaterra teve sempre a primazia das noticias telegraphicas.

Pode dizer-se que a nação ingleza bateu o record das redes telegraphicas por occasião da guerra entre a Russia e o Japão.

As companhias que n'essa occasião prestaram á Inglaterra serviços admi-

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raveis de informação telegraphica, antecipando-se a todas as outras, foram estas a que o projecto se refere.

Qual é para esta companhia o interesse particular que ella tem na ligação pelo cabo submarino da Gran-Bretanha ao Faial e d'este porto a S. Vicente de Cabo Verde?

O seu interesse é o seguinte:

É que este cabo submarino é, desde o seu ponto de amarração na Europa, o unico cabo autónomo e independente de qualquer fiscalização internacional.

Este cabo submarino é o unico que, largando de Inglaterra, vem amarrar em porto portuguez, sem que exista a menor possibilidade de fiscalização de qualquer outro paiz europeu.

Esta companhia, obtendo a communicação entre o Faial e Cabo Verde, estabelece a ligação com toda a Africa occidental è oriental.

Esta linha que, percorrendo e rodeando a Africa, vae á Gran-Bretanha, passa á America e depois prolonga-se pelo Pacifico fora até aos territorios japonezes, é a unica linha independente e autónoma que, desde que larga da Inglaterra até ter amarração em porto portuguez, está absolutamente isenta e liberta de qualquer fiscalização de outro paiz europeu.

V. Exa. comprehende o grande valor que este facto representa.

Significa elle para nós uma vantagem no augmento de taxas telegraphicas? Por certo que sim.

Significa elle o desejo de vermos augmentadas as communicações telegraphicas com um paiz com o qual mantemos as mais intimas relações de amizade politica, como são aquellas que felizmente nos ligam á Gran-Bretanha? Tambem de certo que sim.

Mas isto, são porventura motivos para a administração portugueza dar de graça ou deixar de valorizar a concessão que fez, concedendo ainda em cima, sem nenhuma especie de compensação, todas as protecções e isenções a que se refere o artigo 22.° do contrato e que comprehende nada mais nada menos do que :

«Proteger as empresas na immersão e exploração dos cabos submarinos, conforme as leis e regulamentos vigentes em Portugal;

proteger, nos termos das leis, como se fossem propriedade do Estado, os cabos de costa e os fios terrestres das empresas; e conceder ás empresas isenção de direitos das alfandegas para os cabos submarinos, fios terrestres, instrumentos e materiaes destinados ao estabelecimento das linhas contratadas e ao das estações telegraphicas das empresas, como tambem para os navios que tomarem parte nas operações do immersão dos cabos».

Sr. Presidente: eu entendo que um paiz que atravessa uma difficil situação financeira, como é Portugal, precisamente no opportuno aproveitamento de todas estas receitas especiaes e proprias dos bens nacionaes é que elle pode ir buscar um dos seus mais preciosos elementos de vida.

O Sr. Sebastião Baracho: — Apoiado.

O Orador: — No momento actual em que qualquer augmento tributario representaria um desequilibrio enorme na economia do nosso paiz, e tão importante que julgo poder-me antecipar em dizer que só com a maior relutancia elle seria recebido, n'este momento em que tudo quanto nós podiamos alcançar dentro do regimen da monopolização dos tabacos está já obtido, n'esta occasião em que a tendencia publica é para reduzir as nossas tarifas aduaneiras a um regimen que não seja o do proteccionismo, é absolutamente indispensabel que se não desperdice aquillo que é nosso, que tem valor e que significa muito, não para utilização immediata, mas por se tratar de uma empresa tão poderosa em cujas mãos a concessão vae attingir um alto valor.

Aqui tem V. Exa., dito em meia duzia de palavras o meu sentimento sobre o projecto que se discute.

Como legalidade é uma demonstração provada de que vivemos n'uma epoca em que ella floresce, e, como conveniencia de administração, é evidente a prova de que elle contem dentro de si, não direi uma malversação dos dinheiros publicos, porque não suppônho o Sr. Ministro das Obras Publicas capaz de semelhante delicio, mas um desperdicio imperdoavel, n'este momento em que nem uma só migalha se podia perder.

Isto dito nada mais acrescentarei, terminando com a consciencia tranquilla de que, pela estreiteza das mi nhãs considerações, não devo ter desagradado muito ao Sr. Presidente do Conselho.

Se porventura, apesar dos meus desejos, ainda pude incorrer nas suas censuras, eu peço a V. Exa. que na sessão de amanhã, em que, implantando um novo regimen de discussão parlamentar, S. Exa. continua o seu discurso, com que hoje tomou todo o espaço antes da ordem do dia, impedindo a replica a qualquer Digno Par — eu peço a V. Exa., repito, que me diga precisamente, com minutos e segundos, quanto tempo pode um membro d'esta Camara usar da palavra, sem incorrer no seu messianico desagrado.

E nada mais, Sr. Presidente.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: — Não havendo mais ninguem inscripto, vae votar-se.

Leu-se na mesa e foi approvado o parecer n.° 12.

O Sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer n.° 13.

Leu-se na mesa e foi posto em discussão o parecer n.° 13, que é do teor seguinte:

PARECER N.° 13

Senhores. — Á vossa commissão dos negocios externos foi presente o projecto de lei n.° 10, tendo por objecto a ratificação da declaração commercial entre Portugal e a Suecia, assignada em 16 de abril de 1904.

Na sua intima substancia traduz-se a declaração no regimen de reciproca garantia de nação mais favorecida, resalvando, todavia, o caso de favores especiaes já concedidos ou que venham a sê-lo a certas nações que se acham vinculadas ás partes contratantes por tradicional e excepcional communidade de interesses.

Tudo conspira para fazer presumir que do projectado accordo ha de resultar um alto beneficio para o nosso commercio de exportação de vinhos, sendo para notar, com o devido louvor, que as negociações foram encaminhadas de molde a ficar garantido para Portugal o direito de se desligar do accordo quando e se porventura vier a baixar na Suecia o limite actual da força alcoolica dos vinhos ali importados.

Entende, pois, a vossa commissão, de accordo com o governo, que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º É approvada, a fim de ser ratificada, a declaração commercial assinada entre Portugal e a Suecia, aos 18 de abril e 1904.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Wenceslau de Lima = Alexandre Cabral = Teixeira de Vasconcellos = Conde de Sabugosa = Conde do Cartaxo = Francisco Antonio da Veiga Beirão = Luciano Monteiro.

PROPOSIÇÃO DE LEI N.° 10

Artigo l.º É approvada, a fim de ser ratificada, a declaração commercial assignada entre Portugal e a Suecia, aos 16 de abril de 1904.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 9 de novembro de 1906.= Thomaz Pizarro de Mello e Sanpaio, Presidente = Conde de Aqueda, 1.° Secretario = Julio Cesar Cau da Costa, 2.° Secretario.

O Sr. Sebastião Baracho : — O Digno Par e meu velho amigo Sr. Teixeira de, Vasconcellos formulou ante-hontem um reparo, alvejando os preceitos economicos por mim advogados.

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No intuito de affirmar principios, consignarei que toda a vantagem ha em organizar tarifas maleaveis, como inicio recommendavel para a negociação de tratados de commercio.

Estes devem de preferencia ser ultimados, como ponto de partida, com as nações com quem mais presos, estamos por laços mercantis e politicos.

Se por estes salutares preceitos tivessemos amoldado o nosso procedimento, não teriamos realizado a ultima convenção com a Suissa, nem tão pouco, em 1899, teriamos celebrado o convenio com os Estados Unidos, batido em brecha, n'essa epoca, pelo Digno Par Sr. Mello e Sousa, cuja especial competencia na materia é indiscutivel, e pelo Sr. João Franco.

Dito isto, notarei que a convenção que se discute enferma por não estai instruida com documentos elucidativos.

Os Livros Brancos continuam a ser um mytho, não obstante as minhas instancias para a sua publicação.

Quanto propriamente á natureza d'este diploma, direi que elle se avantaja aos que teem sido discutidos, pelos seguintes motivos:

1.° Porque os productos das colonia portuguezas, reexportados da metropole para a Suecia, gozarão, sem restricção de especie alguma — ao invés do que se preceitua na convenção com a Suissa — do tratamento da nação mais favorecida.

2.° Porque a convenção será executada immediatamente, depois da troca de ratificações, e ficará em vigor até a expiração de um anno, depois de ser denunciada.

Registadas estas vantagens relativas, que são obvias, ponho termo nas minhas ponderações.

( O orador não reviu).

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luis de Magalhães): — Sr. Presidente: é difficil responder ao Digno Par Sr. Sebastião Baracho, pela simples razão de que S. Exa. declarou que o projecto em discussão lhe merece sympathias.

O Sr. Sebastião Baracho: — Relativas.

O Orador: — Perfeitamente de accordo.

É um tratado em que se assegura para os dois paizes o reciproco tratamento de nação mais favorecida, e em que se estabelece a escala alcoolica até 25°, o que nos dá grandes vantagens, pois n'essa escala está comprehendido o nosso vinho do Porto.

O contrato pode ser denunciado, desde que não se possa manter o regimen convencionado; o que é uma circumstancia de muito valor, porque é um elemento de defesa contra a possibilidade de identica concessão a outros paizes.

Este tratado estreita as nossas rela coes commerciaes com a Suecia, que nos exporta madeiras das suas flores tas e importa os nossos vinhos.

Como nada tenho a oppor ás considerações do Digno Par Sr. Baracho termino por aqui.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. João Arroyo: — Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer rapida observações sobre o projecto que se discute.

É mais uma questão de redacção que de outra cousa.

No projecto estabelece-se a clausule de nação mais favorecida.

Sr. Presidente: não vou n'este mo mento reproduzir o que já tenho dito acêrca de tratados internacionaes, mas confesso que é sempre com desprazei que vejo exarados n'estes diplomas tratamento de nação mais favorecida sem que se tenham assentado as base; em que devem orientar-se as nossas relações commerciaes.

Continuo a dizer que é preciso negociar primeiro com a Allemanha e de pois com a França.

Emfim, eu não quero estar a reproduzir as minhas ideias a este respeito, e que repetidas vezes tenho apresentado á Camara.

Quanto ao projecto, diz elle que no caso de ser abaixado o limite alcoolico dos vinhos importados na Suecia, Portugal reserva-se o direito de se desligar d'esse regimen convencionado.

Sr. Presidente: eu não posso deixar de mostrar a grande incoherencia do Governo a este respeito.

Nós votámos ha dias a convenção com a Suissa, em que o maximo da escala alcoolica era de 23 graus para todos os nossos vinhos licorosos.

Como é que por este projecto vamos fixar esse limite de 25 graus?

É isto evidentemente uma contradição, ou pelo menos uma falta de coherencia.

Chamo para este ponto a attenção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Tambem se diz que o accordo deixará de produzir os seus effeitos, quando se der o abaixamento d'essa escala alcoolica.

Comtudo Portugal reserva se a faculdade de se considerar desligado d'este accordo, se o limite actual da força alcoolica dos vinhos importados na Suecia vier a ser baixado em detrimento dos vinhos portuguezes. N'esse caso o accordo cessará immediatamente se produzir os seus effeitos.

Tambem chamo para este ponto a attenção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, porque a disposição da alinea pode ser utilizada pela propria Suecia contra nós.

É uma forma vaga de dizer, a que falta uma referencia exclusiva a Portugal, e que pode ser aproveitada pela propria Suecia.

Acho tambem infeliz esta disposição.

O que peco ao Sr. Ministro, antes de me sentar, é que veja se é possivel que por meio de qualquer diploma, por meio de qualquer nota trocada entre as chancellarias, se aclare este ponto de maneira a evitar que elle possa ser utilizado um dia pela propria Suecia.

Tenho dito.

(O Digno Par não reviu).

Esgotada a inscrição, é em seguida votado o projecto.

O Sr. Presidente: — A seguinte sessão será amanhã, e a ordem do dia a continuação da que estava da ia para hoje, e mais o parecer n.° 16, com o annexo n.° 19.

Está levantada a sessão.

Eram 5 horas e 20 minutos da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 11 de dezembro de 1906

Exmos. Srs.: Augusto José da Cunha; Sebastião Custodio de Sousa Telles; Marquez Barão de Alvito; Marquezes: de Avila e de Bolama, de Penafiel, de Pombal, de Sousa Holstein; Condes: de Arnoso, de Bertiandos, do Bomfim, do Cartaxo, de Figueiró, de Paraty, de Sabugosa, de Tarouca, de Villar Seco; Visconde de Monte-São; Alexandre Cabral, Pereira de Miranda, Antonio de Azevedo, Eduardo Villaça, Costa e Silva, Santos Viegas, Costa Lobo, Teixeira de Sousa, Telles de Vasconcellos, Arthur Hintze Ribeiro, Ayres de Ornellas, Palmeirim, Vellez Caldeira, Eduardo José Coelho, Serpa Pimentel, Ernesto Hintze Ribeiro, Fernando Larcher, Mattoso Santos, Veiga Beirão, Coelho de Campos, Campos Henriques, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Francisco Maria da Cunha, Ressano Garcia, Baptista de Andrade, Jacinto Candido, D. João de Alarcão, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Gusmão, Mello e Sousa, Avellar Machado, José Dias Ferreira, Moraes Sarmento, José Lobo do Amaral, José Luis Freire, José de Alpoim, José Maria dos Santos, José Vaz de Lacerda, Julio de Vilhena, Luciano Monteiro, Pimentel Pinto, Pessoa de Amorim, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Affonso de Espregueira, Pedro de Araujo e Sebastião Dantas Baracho.

O Redactor,

F. ALVES PEREIRA.

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