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creto de 9 de agosto de 1833, decreto que subsiste, é em presença do qual as irmãs da caridade não podem existir.

O sr. Marquez de Vallada:—Começa dizendo que abunda nas opiniões do seu nobre amigo o sr. conde de Thomar, em geral; mas pede licença para, em relação ao digno par, repetir áquellas celebres palavras do marquez de Valdega-mas, tratando das doutrinas de mr. Proudhon=que o sur-prehendia a surpreza com que este escriptor apresentava as suas doutrinas=. Surprehendia ao orador a surpreza do digno par, quando parece surprehendido pelas contradicções do sr. marquez de Loulé; porque, se lança um golpe de vista retrospectivo sobre a longa carreira politica do sr. presidente do conselho, vê que sempre está em contradicção: com quanto reconheça qué as contradicções de s. ex.* são ainda em mais extensa escala n'este celebre negocio das irmãs da «aridade.

E notável que o sr. marquez de Loulé, sendo presidente do conselho, sendo, por assim dizer, a cabeça politica do ministério, assim como é hoje a cabeça juridica o sr. Moraes Carvalho, é notável que fosse s. ex.* quem confirmasse os alvarás assignados pelo sr. Julio Gomes, ministro do reino n'essa epocha, quando o decreto de 9 de agosto de 1833 já existia n'aquelle tempo. Seria que então ainda o sr- marquez de Loulé não o conhecia? Seja como for, o que ó verdade é que ha quem duvide se aquelle decreto, hoje, pelas circumstancias em que estamos, comparadas com as circumstancias em que estávamos quando foi promulgado, tem a mesma força que tinha n'essa epocha. Pela sua parte está convencido de que o sr. marquez de Loulé tem toda a responsabilidade d'esses alvarás referendados pelo sr. Julio Gomes; e por isso tem estranhado, assim como muitas outras pessoas, que os jornaes que defendem a politica do nobre presidente do conselho sejam os mesmos que têem combatido mais fortemente o sr. Julio Gomes, chegando a enche-lo de injurias. Se este procedimento é leal, que o julgue a opinião publica, e a nossa consciência.

Tratando do decreto que vê publicado hoje no Diário de Lisboa, disse que não podia deixar de surprehende-lo. É uma lição de philosophia transcendente que o sr. marquez de Loulé quer dar aos doutores da igreja e a todos os publicistas e moralistas, e o que mais é, até ao papa e ao concilio de Trento; porque diz o decreto que a instituição dos prelados maiores é opposta ao espirito do evangelho; cousa que a igreja catholica somente agora ficou sabendo, depois que o sr. marquez de Loulé teve a bondade de ensinar-lh'o. Diz-se também ali que a obediência aos superiores nos assumptos da regra annulla a auctoridade episcopal, contra todos os bons principios de direito canónico. Nunca suppoz ninguém que a auctoridade episcopal fosse alem do que respeita aos assumptos religiosos, e que podesse ingerir-se no que é domestico: agora, graças ao sr. marquez de Loulé, fica-se sabendo que os bispos têem direito a impor os methodos e a forma de ensino, assim como as regras de enfermaria, as horas de levantar e deitar, as da comida, as praticas de devoção, etc. Aqui estão os bons principios de direito canónico! São bons por serem do sr. marquez de Loulé, porque, quanto ao seu direito canónico, ainda ninguém conseguiu vê-lo.

Isto são cousas que não se discutem; signalam-se para exemplo; e para que se compare esta febre de veneração ao poder episcopal com a insolência das ordens que se lhe dirigem, para fazer sobresair a contradicção. Acrescentou que também s. ex.a faz no antepenúltimo periodo do preambulo do decreto um cumprimento de cavalheiro ás irmãs de caridade francezas, que tinha injuriado no primeiro e segundo; outra contradicção de s. ex.*, que o não surpre-hende, porque é um seguimento das outras contradicções que temos notado com relação ás irmãs de caridade francezas: quanto ás portuguezas, d'essas nem se digna o nobre ministro de fazer caso.

Isto faz-lhe lembrar que o sr. marquez de Loulé também assignou duas portarias sobre este negocio; mas como encontrou opposição em muitas partes, e nos juizes que fo

ram consultados, tacto a que allude porque nos governos de publicidade não se pôde prescindir d'estes esclarecimen tos, ainda que tinha vontade de fazer executar as suas portarias, teve de recuar. Nem todos podem saber tudo, e o sr. marquez de Loulé, que não tinha os estudos necessários, e não quiz ser aconselhado por ninguém que podesse esclarece-lo, procedeu de uma maneira um pouco leve, e foi-lhe indispensável pôr de parte áquellas portarias. Houve então um meeting sobre o qual com bastante antecedência chamou o orador' a attenção do sr. marquez de Loulé, e conserva notadas na sua carteira as palavras que s. ex.a lhe dirigiu então, dizendo-lhe que chamava revolucionários a todos que não pensavam como elle, orador, o qual replicou que bem sabia que não podia chamar revolucionários, nem nunca o fizera, aos que não pensavam como elle: que conhecia algumas pessoas que dissentiam de suas crenças e opiniões, e nem por isso os considerava assim; mas que entendia, que um meeting como aquelle que se annunciava não devia ser tolerado pelos ministros; mas n'essa occasião era muito regular o meeting, porque se esperava achar n'elle força para o governo fazer certos commettimentos: como porém foi explorado por certos homens que não conhece nem quer conhecer, os quaes o levaram para o pa-teo do Geraldes em vez de ir para o pateo do Thorel, então já o meeting não era como os dos paizes illustrados, principalmente os de Inglaterra, onde o socego publico não é alterado. Felizmente também aqui o não foi n'essa occasião, porque houve só uma procissão, e acabou sem mais consequências, que as de não achar'o governo a força que esperava ter; e por isso veiu a contradicção que tem relação com isto, porque o meeting foi resolvido para se deci dir por uma vez a questão das irmãs da caridade no sentido da violência, da oppressão e da tyrannia. '

Observou o orador que notara então alguns actos que lhe pareciam attentatorios dos principios da constituição, e o sr. marquez de Loulé disse então; hão de haver mais: por isso o sr. conde de Thomar disse muito bem que esta devia ser tratada largamente; e n'isto concorda tanto com s. ex.a como com o sr. ministro da justiça; mas deve se-lo muito brevemente, como disse n'um aparte o sr. conde da Taipa.

Notou que os dois srs. ministros que fallaram quizeram auctorisar este decreto pelo dever de cumprir as leis; como ss. ex.as as cumprem vê-se no acto de invasão de uma ty-pographia, onde se arrombou, prendeu e apalpou com todo o desembaraço, do que não tratava agora, por estar já an-nunciada uma interpellação;. mas não pôde abster-se de chamar a attenção do sr. ministro da justiça contra as lojas maçónicas, expressamente prohibidas por as leis; e assim pede ao mesmo sr. ministro da justiça a mesma coadjuvação contra ellas que deu contra as irmãs da caridade, e pede-lhe o seu conselho efficaz a este respeito; como espera também que os outros srs. ministros darão o seu concurso para que as leis não sejam sophismadas em certos assumptos para a impunidade do crime, como o são noutros para a tyrannisação da consciência.

E concluiu dizendo que aguardava outra occasião para fallar sobre o assumpto, reservando-se comtudo para chamar a attenção dos srs. ministros, na discussão da resposta ao discurso da coroa, para a politica geral do ministério, a que preside o sr. marquez de Loulé, e para outros assumptos em que successivamente o irá interpellando.

O sr. Marquez d* Ficalho: — Sr. presidente, eu cedia da palavra se não tivesse ouvido citar o decreto de 9 de agosto de 1833, em relação ás irmãs da caridade.

- Sr. presidente, eu não sou orador, e sintp-o muito n'esta occasião. Tomei assento n'esta camará, não pelos meus serviços, porque os não tinha n'esse tempo, não pelas minhas habilitações, porque também não as tinha então, nem as tenho agora... não sei fallar senão como soldado.

Sr. presidente, o decreto de 1833 por quem foi feito? Pelos homens que hoje se reputam liberaes? Não. Por quem foi? Pelo meu general, o capitão mais liberal que temos conhecido (apoiados). Fe-lo elie. N'esses dias, como por encanto, as armas de que nos servíamos e as espadas que se empunhavam, abatiam-se, quando passavam as irmãs da caridade! Dizia-se: passe, que é uma irmã da caridade! E é esse decreto que os homens que hoje se dizem liberaes querem citar aqui para o fazer valer contra as irmãs da caridade.

Sr. presidente, em 1833 as irmãs da caridade tinham o seU geral em Paris, correu o anno de 1833, e assim continuou; em 1834, em 1835, também... Chegou o anno de '1836. Rasgou-se a carta, os arminhos desappareceram, áquellas portas feeharám-se, e a outra camará, com os homens mais liberaes que havia no paiz, impellidos pela revolução triumphante, foram destruindo tudo o que ainda estava de pé, e quando chegaram defronte da portaria de Santa Martha pararam, tiraram o bonet vermelho, e disseram: salve, irmãs da caridade. (O sr. Marquez ãe Vallada:

— Muito bem.) Isto disse-o a revolução que nos tinha'fechado áquellas portas, que não tinha respeitado nada, nem a maior obra de D. Pedro. E hoje, sr. presidente, depois de trinta annos de liberdade, é que nós havemos de pôr condições a cada um sobre o seu modo de viver!!!

Sr. presidente, sinto ter sido agora surprehendido n'esta questão, depois de haver perdido por tres vezes occasião de fallar; e por isso é que, mesmo tomado de improviso, aproveito-me hoje da palavra para fazer um protesto como catholico, como liberal, e como soldado: como catholico, porque eu quero que a base do ensino seja a religião (os outros podem fazer o que quizerem); como liberal, porque eu não reconheço que se possam regatear condições de liberdade no modo de cada um regular as suas acções; e como soldado, oh! como soldado, porque hoje que ellas fazem parte de todos os exércitos, não ha soldado que as não ame,', J,(como camaradas, que as não respeite como anjos de carij-J

dade... Podesse eu chamar agora á barra d'esta camará o ^oldado francez e o austríaco; podesse eu chamar o voluni jtario de Garibaldi, e os que tomaram parte na nobre em-j preza de Gaeta; podesse eu aqui chamar esse heroe dol; tempos modernos, Abdel-Kader! Podesse eu chama-los aquíj] a todos á barra da camará, e o meu triumpho seria certo. Não posso faze-lo!... Mas chamarei... a quem? Ao sr. presidente do conselho. Não tenha v. ex.a receio de que eu diga alguma cousa do muito que podia dizer... n'estas questões religiosas quero antes ser sempre victima, nunca, serei algoz, espero-o em Deus... V. ex.a não as quer? E capaz de se pôr em pé, voltar-se para mim, e dizer: não?...

Sr. ministro da guerra (sinto que me não ouça) a v. ex.a nunca lhe acudiram estas santas mulheres? Não estiveram á sua cabeceira, tendo o seu geral em Paris? As portuguezas!... Diziam-n'os que as desprezávamos, e todavia agora é que estão offendidas por um grande desprezo, hoje, desde as dez horas da manhã!... As francezas têem elogios rasgados, que echoarão em todo o mundo; mas as portuguezas esqueceram completamente!

Sr. presidente, peço desculpa á camará. Não sei se tenho desarrasoado; mas é esta uma questão que me tem feito envergonhar. Nós não temos as grandes complicações, mas estamos todos os dias a crear difficuldades que não existem n'este paiz! Parece que estamos a faze-lo de propósito para nos mettermos em confusão! Não temos que acudir ás cousas mais sérias?... Bem: saiam as irmãs da caridade, está tudo remediado? A'manhã o exercito estará em estado de combater os nossos inimigos, o deficit desapparecerá do orçamento... Saiam, saiam hoje; assim o disse eu nas minhas primeiras e poucas palavras, tratando d'este objecto, e dis se-o ao governo. E esta uma questão que não admitte trans

acções; trata-se de ser, ou não ser. Se as quereis, aceitae o seu instituto com todas as condições; "se não. as quereis, mandae-as embora!

Sr. presidente, eu termino aqui.

O sr. Soure:—Sr. presidente, eu ouvi com toda a attenção os dignos pares que fallaram n'esta questão, e senti que o meu amigo que acaba de sentar-se levasse uma questão, toda de legalidade, para o mero sentimentalismo. É para onde o levaram as suas convicções puras e sinceras. Mas a questão devia ser tratada n'outro campo; a questão apresentada foi de legalidade, se o governo tinha exorbitado com a medida que acabámos de ler, publicada no Diário ãe Lisboa.

Diz o meu nobre amigo: «Não querem as irmãs da caridade». Nós ambos já nos encontrámos n'uma commissão defendendo opiniões contrarias, e o meu nobre amigo pôde declarar se quem esteve do lado opposto ao seu queria ou não as irmãs da caridade. Pois se quem tem opinião contraria á do digno par as queria, porque não as ha de querer o governo, que não offereceu provas em contrario ? Ainda ninguém o disse. Eu tenho dado passos para mostrar que as quero, mas com outra organisação; aqui é que nós nos separamos, e separamos completamente.

Diz o digno par: «Pois ellas não estiveram sempre sujeitas ao seu superior em Paris?» Mas se o estavam para que pediram o ficar sujeitas a elle ?. ..

O sr. Marquez ãe Ficalho:—Isso foi em 1838. O Oraãor: — Se estavam sujeitas então como deixaram de estar?. . .

O sr. Marquez de Ficalho: — Estiveram até 1838. O sr. Presiãente: — Eu peço ordem. ' O Oraãor: — Não se incommode v. ex.* com as interrupções; ellas servem para me illustrar, porque eu não podia persuadir-me que estando sujeitas ao seu prelado em Paris fossem pedir a repetição da mesma sujeição; n'isso é que estava o meu equivoco, não podia ser.

Ora, o governo exorbitou! Pois, senhores, o governo não só não exorbitou, mas até o que fez agora deveria te-lo feito ha mais tempo. A portaria de 5 de março do presente anno expende a doutrina que vem no decreto que hoje se publicou que é a verdadeira, pois toda a corporação ou instituto a quem só por uma ficção é concedida pela lei o direito de propriedade, se sáe fora do fim para que foi in-stituida, e não cumpre as condições, mediante as quaes foi permittida, o governo tem rigorosa obrigação de a' dissolver. O governo portanto fez o que lhe cumpria fazer, o governo não legislou; se usa da palavra ãissolução não quer dizer outra cousa senão que essa corporação não tinha existência legal, e não a tinha porque o decreto de 9 de agosto de 1833, que prohibiu a sujeição ao prelado maior, necessariamente trazia comsigo a sancção de que os infractores d'essa disposição deixariam de existir legalmente.

O governo pois não fez senão declarar que essa congregação tinha deixado de existir, por isso mesmo que estava fora das condições legaes. Com que fundamento pois se vem fallar em usurpações de poder! Pois o digno par que encetou esta discussão, que fez aquella pergunta innocente, quer dar força ao decreto de 1819, e quer invalidar o de 1833!

Pois se o decreto de 1833 existe, se está em pé,e tem força de lei; se a congregação a que nos referimos saía fora do disposto n'esse decreto indo submetter-se a um prelado maior, e, o que é mais, estrangeiro, qual é a consequência lógica e juridica? A consequência é que deixou de existir, e o governo declarando-o assim não fez mais do que cumprir o seu dever.

Pois só se quer que sejam corporações religiosas áquellas que têem votos solemnes e perpétuos de profissão? Não é assim, nunca assim foi entendido, sempre se lhes deu mais ampla significação. Haja ou não haja os votos, estão sempre debaixo da inspecção do executivo, que tem rigorosa obrigação de inquirir se ellas se despojaram ' do seu caracter, assumindo por isso existência legal. E que fez o governo senão por esta declaração cumprir a lei? A portaria de 5 de março e este decreto não fizeram mais do que não reconhecer a existência legal aquella associação.

A questão da conveniência das irmãs da caridade não vem para aqui, portanto não a tratarei agora; nós teremos occasião mais opportuna para o fazer, se-lo-ha mais detidamente, e depois de haver um parecer de commissão.

Mas o governo é contradictorio, disse-se entre outras cousas, porque quer formar uma instituição similhante. Eu não sei como se possa tirar uma tal conclusão. Quanto á questão da palavra reorganisar é uma questão de diccio-nario, que me parece não ser digna de nos oceupar aqui a nossa attenção. Em conclusão digo, que não me parece que o governo, na publicação do decreto que hoje se combate, commettesse alguma usurpação de attribuições de um outro poder. Creio que os considerando dos mesmo decreto são claros ejuridicos; não se podendo produzir rasões mais concludentes do que áquellas que vem no relatório que precede o mesmo decreto. E' necessário não destacar períodos, e ler com attenção a maneira como estão redigidos os seus fundamentos, que elles respondem cabalmente a todas as objecções. Eu não tomei parte alguma n'este trabalho, mas honrar-me-ia muito se a tivesse tido.

O sr. Presidente: — Eu não posso deixar de observar á camará que este negocio começou como uma interpellação e por consequência não sei se podia tomar estas proporções, e mesmo como interpellação é sabido que não estava dado para ordem do dia, conseguintemente vou consultar a camará para saber se quer que isto continue, ou que passemos a outros objectos, que se entre na ordem do dia. (Pedem vários dignos pares a palavra sobre a orãem.)

O sr. Conãe ãe Thomar (sobre a orãem):—Pediu a palavra sobre a ordem e instou por ella quando viu que o