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N.º 44

SESSÃO DE 6 DE MAIO DE 1896

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os dignos pares

Jeronymo da Cunha Pimentel
Visconde de Athouguia

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O digno par o sr. Margiochi manda para a mesa um parecer sobre um projecto de lei relativo á fiscalisação da venda do leite. - O digno par o sr. visconde da Silva Carvalho requer a reunião das commissões de marinha e de fazenda durante a sessão. - O digno par o sr. Thomás Ribeiro pergunta por uns documentos que pediu pelo ministerio da fazenda, respondendo-lhe o sr. presidente, e pede o recambio de um requerimento que em tempo dirigiu ao ministerio da marinha. O sr. ministro do reino dá as informações solicitadas por aquelle digno par. - O digno par o sr. conde da Azarujinha requer que se entre na ordem do dia, e que as futuras sessões terminem ás seis horas. É approvado. - O digno par o sr. visconde da Silva Carvalho manda para a mesa um parecer, que vae a imprimir.

Ordem do dia: trocam-se explicações, ácerca da reforma eleitoral, entre os dignos pares os srs. conde de Thomar, conde do Bomfim, conde de Bertiandos e Jeronymo Pimentel (relator). - O digno par o sr. Baptista de Andrade manda para a mesa um parecer, que foi a imprimir. - É approvado o projecto na generalidade, e sobre a especialidade fallam os dignos pares conde de Lagoaça e Jeronymo Pimentel, que manda para a mesa dois pareceres. É approvado o projecto na especialidade. - Mandam para a mesa pareceres os dignos pares os srs. Vellez Caldeira e Arthur Hintze. - O digno par o sr. Jeronymo Pimentel requer que varios pareceres entrem em ordem do dia. - É posto em discussão, e approvado, o projecto de lei sobre circumscripções administrativas, depois de explicações trocadas entre os dignos pares conde de Bertiandos, Jeronymo Pimentel e ministro do reino. - É lido um officio da camara dos senhores deputados, remettendo o projecto do codigo de justiça militar, que vae á commissão de guerra. - São approvados, sem discussão, os pareceres: n.° 85 (alterações da divisão judiciaria); n.° 69 (empregados do hospital de S. José); n.° 70 (quadros das prisões e cadeias de Lisboa); n.° 71 (camaras municipaes ultramarinas); n.° 72 (camara de Lourenço Marques); n.° 73 (fundo de soccorros a naufragos). - É levantada esta sessão e aprasada a subsequente, consignando-se-lhe ordem do dia.

Abertura da sessão ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 20 dignos pares.

Foi lida e approvada sem reclamação a acta da sessão anterior.

(Estiveram presentes os srs. ministros do reino, da justiça, dos negocios estrangeiros e das obras publicas, entrando durante a sessão o sr. ministro da guerra.)

Mencionou-se a seguinte

Correspondencia

Officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que tem por fim auctorisar o governo a applicar á acquisição de navios de guerra até 2:800 contos de réis do producto da emissão complementar dos tabacos.

Para a commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

Officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que tem por fim organisar os serviços da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

Para a commissão de fazenda.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o digno par o sr. Margiochi.

O sr. Margiochi: - Como relator das commissões reunidas de agricultura e fazenda mando para a mesa o parecer sobre o projecto de lei que tem por fim evitar a venda de leite que não seja puro ou não esteja em perfeito estado de conservação.

Leu-se na mesa e foi a imprimir.

O sr. Visconde da Silva Caralho: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que as commissões de fazenda e marinha se reunam durante a sessão, para darem parecer sobre uma das proposições de lei vinda da outra casa do parlamento.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam o requerimento, que acaba de ser feito pelo sr. visconde da Silva Carvalho, tenham a bondade de se levantar. Foi approvado.

Tem a palavra o sr. Thomás Ribeiro.

O sr. Thomás Ribeiro: - Pouco tempo tomarei á camara. Pedi a palavra em primeiro logar para perguntar a v. exa. pelos documentos que requeri pelo ministerio da fazenda e pela repartição geral das alfandegas. Tenho que liquidar a este respeito quasi uma questão de honra; tenho de pedir que me illucide sobre uma duvida que póde existir no espirito de alguem; talvez até no. espirito da camara dos pares. V. exa. deve saber o que ha a este respeito, eu já os pedi por mais de uma vez, e ha mezes!

Isso parecia-me tão simples!...

O sr. Presidente: - Foram já requisitados por duas vezes, mas ainda não vieram.

O sr. Thomás Ribeiro: - Emfim, terei que me resignar. Nunca esperei isso do nobre ministro da fazenda. Aqui fica, porém, o protesto contra os maus procedimentos d'aquella repartição, sempre muito prompta em vexar quão remissa em se justificar.

Agora deixe-me v. exa. contar ao governo outra cousa. É minha opinião que as questões do ultramar precisam ser muito estudadas, muito ponderadas, para serem bem decididas.

É tambem minha opinião que ás vezes ha muitas decisões que nada decidem. Eu sei que existe uma proposta de lei para se crearem no ultramar colonias militares ou agricolas.

Sobre isso nada tenho a dizer, porque tudo quanto se fizer em beneficio do ultramar é bem feito. Mesmo que se encontrem algumas difficuldades, logo que haja boa vontade tudo se consegue. Mas como gosto de esclarecer todos os meus actos, desejava tambem saber se sobre esta questão ha ainda discussão na presente sessão legislativa. E precisava principalmente saber se os pedidos e promessas que ha largo tempo têem sido feitas de concessões no ultramar, vem ou não vem ao parlamento como parece ter-se decidido.

Desejava tambem saber, e especialmente, o que ha sobre um pedido que fiz ha muito tempo. A minha saude vae-se alterando, e eu pouco posso, mas na idéa de ser util quanto podesse a este paiz requeri pelo ministerio da marinha e ultramar, que me dessem uns terrenos na In-

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dia para eu ir com alguns colonos da minha provincia empregar com elles o resto da minha actividade.

Parece-me mais conveniente, e assim o disse, ir trabalhar para lá, do que estar aqui a fazer rhetorica. Fiz o meu pedido, alleguei as minhas considerações, e disse que era preciso que a gente portugueza fosse levar o seu sangue ás nossas colonias. Pouco tempo depois as circumstancias davam-me rasão.

No fim de contas todas as diligencias que se fizeram no ministerio da marinha foram a meu favor, mas acabaram por não me fazerem a concessão. Algumas vezes tenho sido accusado de pouco affecto aos senhores inglezes; pois, a proposito de um pedido, e nunca houve nenhum mais patriotico! fui suspeitado de querer vender a concessão que requeria justamente aos inglezes.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.º 76 sobre o projecto de lei n.° 87 (reforma eleitoral)

O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia.

Continúa em discussão na generalidade o projecto sobre a reforma da lei eleitoral.

O sr. Conde de Thomar: - Antes de entrar na discussão do projecto permitta-ma v. exa. que diga algumas palavras sobre a proposta que ha pouco apresentou o sr. conde de Azarujinha e que teve por fim alterar a ordem dos nossos trabalhos.

Não pedi a palavra sobre essa proposta para não contrariar o pedido de s. exa. nem demorar o andamento dos nossos trabalhos, mãe parece-me que melhor fôra propor que se entrasse logo no principio da sessão na ordem do dia acabando esta ás cinco horas, havendo depois meia hora para tratar qualquer assumpto.

Assim, tinhamos as horas regulamentares de trabalho sem incommodo para ninguem.

Bem sei que isto é uma questão secundaria, mas parece-me sempre inconveniente alterar o regimento, sobretudo quando o atrazo nos trabalhos não provem da camara.

Sr. presidente, pouco direi sobre o projecto em discussão, que já hontem foi largamente discutido n'esta casa, e se tomei a palavra é uniicamente para justificar o me voto.

Voto contra elle, porque me não satisfaz.

Desejo ser coherente com o que disse em tempo n'esta camara.

Quando aqui se discutiu o bill de indemnidade, eu declarei logo que votaria contra todos os decretos da dictadura.

Discutindo-se hoje n'esta camara o projecto sobre a lei eleitoral, modificação da lei da dictadura, eu não posso deixar de votar contra esse projecto.

O que é curioso é que a maioria d'esta e da outra casa do parlamento votaram o bill de indemnidade, parecendo assim que acharam excellentes todas as medidas decretadas em dictadura e optima a lei eleitoral hoje condemnada; comtudo, passados apenas quatro mezes de experiencia, apresenta o governo n'esta camara um projecto que tem por fim substituir essa lei approvada e votada, e com a mesma alegria a maioria condemna hoje o que votou hontem.

Esta lei eleitoral é exactamente o opposto do que foi decretado em dictadura.

Como todos sabem, o escrutinio de lista não deu os resultados que o governo esperava.

Depois de quatro mezes de experiencia, o governo reconheceu que tinha errado e propoz á sua maioria que pozesse de parte o escrutinio de lista e que votasse o projecto de que estamos tratando.

O que é facto é que pelo escrutinio de lista a eleição era viciada completamente, e que a independencia do eleitor ficava inteiramente annullada pela influencia da auctoridade, mas as rasões apresentadas para defender o escrutinio de lista servem hoje para o condemnar e defender a eleição pelos circulos uninominaes. Exactamente o contrario.

Os circulos abrangiam uma tão grande area que eram por completo annulladas as influencias locaes, o eleitor independente ficava sem preponderancia alguma no resultado da eleição.

Este é um facto que de todos nós é sabido.

Sr. presidente, eu desejo fazer uma pergunta ao nobre relator da commissão.

Sei que o sr. ministro do reino está algum, tanto incommodado de saude, e por isso não peço que s. exa. responda á pergunta que vou fazer.

O sr. relator da commissão de certo interpreta o sentimento do governo, e s. exa. me responderá o que intender conveniente.

Na pergunta que vou fazer eu não quero de fórma nenhuma melindrar absolutamente ninguem.

Como tenho ouvido opiniões differentes com respeito a algumas das disposições sobre incompatibilidades, é por isso que faço a pergunta.

Desejava que o nobre relator da commissão me dissesse se o cargo de governador e o de vice-governador do banco hypothecario podem, em vista do que dispõe o projecto em discussão, tomar parte nos trabalhos parlamentares.

Todos sabem que o banco hypothecario tem uma concessão especial do estado, e, portanto, parece-me que é fóra de duvida que o governador e o vice-governador d'esse banco não poderão tomar parte n'esses trabalhos.

É isto o que acontece relativamente aos directores do banco de Portugal, banco que tem tambem uma concessão especial.

Eu desejava evitar qualquer semsaboria que se podesse dar n'esta ou na outra casa do parlamento, e por isso pedia que o governo, ou o sr. relator da commissão, apresentasse sobre este ponto a sua opinião clara e positiva.

Vejo tambem pelo que se estabelece no § 2.° do artigo 7.° do projecto em discussão que o decreto dictatorial relativo á lei eleitoral soffreu uma grande modificação.

E desejava que o sr. relator da commissão me dissesse quaes são os officiaes superiores a que se refere esse § 2.° do artigo 7.°

Começa o cargo de official superior nos majores, ou entende-se, que essa classificação se entende, por exemplo, com officiaes menos graduados mas com longa carreira, ou com a graduação de majores?

Se a modificação introduzida na lei, relativamente ás incompatibilidades, se refere aos majores, eu desejava saber qual a rasão por que se ha de admittir ao logar de deputado um major e se não ha de admittir um capitão, quando esse capitão tenha dez annos de posto, o que mesmo no exercito é tomado em consideração, pois por esse facto lhe é concedido um acrescimo ao soldo, para, por assim dizer, o equiparar aos majores. Desejava saber qual o motivo por que se excluem os capitães n'essas circumstancias, quando, de mais a mais, toda a gente comprehende que não é o posto que dá a intelligencia, o saber e a capacidade. Basta recordar as capacidades que ha entre os capitães, officiaes menos graduados que fazem parte do corpo docente da escola do exercito, para vermos quanto é injusto impedir a essas capacidades o ingresso no parlamento.

Outra duvida tenho.

(O orador lê o § unico do artigo 8.°)

Como se deve entender para os aposentados a disposição relativa á perda de vencimento e ao numero de funccionarios publicos que podem fazer parte da camara dos deputados?

Peço ao illustre relator que me esclareça tambem sobre este ponto.

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Sobre o projecto nada mais direi.

Voto contra elle, assim como votei contra o bill; isto é, contra todos os actos da dictadura; e como tenho tambem votado contra todas as questões de confiança ao actual governo.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Sr. presidente, eu serei muito breve na minha resposta ao digno par; restringir-me-hei aos pontos precisos a que s. exa. se referiu. Mesmo porque s. exa. não discutiu o projecto na sua generalidade; disse simplesmente que votava contra elle porque o governo lhe não merece confiança.

Dirigiu-me o digno par algumas perguntas sobre incompatibilidades.

Uma das perguntas é sobre se o governador e vice-governador da companhia de credito predial (banco hypothecario) estão comprehendidos nas incompatibilidades.

Digo a v. exa. que não sei n'este momento quaes são as condições em que se encontra a companhia do credito predial para com o governo.

Se porventura a companhia do credito predial está nas condições do artigo 4.° sem duvida que sim; mas não sei qual a organisação do banco hypothecario, e, portanto, não posso dizer se está incluido nas incompatibilidades; nem isso me cumpre a mim n'este momento, mas á camara, quando tiver de julgar sobre a incompatibilidade de algum dos seus membros.

Ponderou s. exa. que na designação de officiaes superiores se comprehendiam os postos de major para cima.

Sem duvida.

Segundo a lei os officiaes superiores são esses e não outros.

Disse s. exa. que não havia rasão para que os capitães que têem dez annos de serviço, tendo direito á melhoria de soldo, não podessem tambem ser eleitos deputados.

Responderei a s. exa. que os capitães com esses annos de serviços têem apenas direito a esse augmento de soldo e mais nada.

Em diuturnidade de serviço não dá accesso ao posto de major, nem outras vantagens, nem outros direitos mais que aquelle.

Ha na hierarchia militar uma distincção entre officiaes e officiaes superiores; a ella attendeu a lei, permittindo que estes podessem ter ingresso na camara electiva para representar o exercito.

Perguntava s. exa. se os reformados, a que se refere o § unico do artigo 8.°, estavam isentos da incompatibilidade.

Evidentemente. Podia isso entrar em duvida pelo decreto de 28 de março de 1895; para que ella desapparecesse se introduziu o § unico d'este artigo.

Nem esses são contados no numero dos quarenta deputados, que sendo funccionarios publicos podem tomar assento na camara; podem ser eleitos, funccionar, sem que percam nada dos seus vencimentos, porque a lei expressamente os exceptua do principio consignado no artigo 8.° Limito aqui as minhas considerações.

O sr. Conde do Bomfim: - Sr. presidente, eu fallei n'esta camara a respeito das incompatibilidades militares, pronunciando-me contra o preceito do decreto dictatorial, que impedia que no parlamento tivessem ingresso officiaes muito distinctos, que desempenharam conscienciosamente e com dignidade o seu mandato, e muito folgo que a lei se modificasse, de fórma a dar entrada na camara dos senhores deputados aos officiaes superiores que antes a não tinham. Mas eu pretendo mais, e acho justo que ao menos, em harmonia com o que se acha consignado para a entrada dos militares n'esta camara, por direito hereditario, na lei de 3 de maio de 1878, se permitta tambem a entrada na outra camara aos militares no posto de capitão ou aos primeiros tenentes da armada com cinco annos de exercido.

E esta ampliação é tanto mais justificada, porquanto tendo a nova lei, que alterou a constituição d'esta camara, extinguido as categorias, admitte a possibilidade de que para esta camara possam entrar militares de todas as graduações, quando para a outra os não admitte e exige tantas restricções.

E não posso deixar de justificar a rasão do meu alvitre, por isso que pertencendo á classe militar, e tendo entrado n'um posto subalterno para a camara dos senhores deputados, mal pareceria se o não fizesse.

Não me parece mesmo que o pensamento que deve presidir ás incompatibilidades, se fundamente bem na categoria dos postos.

Pelo contrario, em todas as leis, nas constituições de 1820 e 1838, e em quasi todas as constituições, se tem em vista principalmente a funcção.

Ha funcções que pela sua importancia, pela confiança que representam, e pela influencia directa que podem ter sobre o exercito, e, portanto, sobre a disciplina, podem tornar-se incompativeis com as de representante da nação, como na magistratura civil, como foi o pensamento que presidiu á lei em muitos pontos.

Portanto, é por essa rasão d'estado que as incompatibilidades militares se deveriam determinar.

A proposito das alterações fundamentaes introduzidas na reforma eleitoral, vou expor a minha opinião a este respeito.

Vejo que a proposta do governo tinha estabelecido o principio de escrutinio de lista, e que esse principio foi ali defendido com bons argumentos, dizendo o governo «que as grandes correntes da opinião só podem traduzir-se no escrutinio de lista, e por isso em França os chefes da opposição o têem proposto. É que pelo escrutinio de lista se obtem a expressão mais generica, mais consentanea com o caracter que deve revestir uma assembléa parlamentar».

Que a commissão por sua parte se envaidece com o systema, reforçando-se com boas auctoridades, como a de Gambetta, e até com os protestos dos operarios republicanos progressistas em França, que pediram o restabelecimento do escrutinio de lista, como um verdadeiro acto de libertação politica. E acrescentando por outro lado que noa paizes onde rege o systema de circulos uninominaes, se estuda, este facto como uma doença a que é preciso dar remedio.

E, finalmente, diz-nos ainda a commissão no seu bem elaborado relatorio, feito pelo distincto parlamentar o sr. Jeronymo Pimentel, que quanto maiores forem as circumscripções eleitoraes melhor se traduzirá o principio de que os deputados são representantes da nação e não dos circulos por onde são eleitos. E o governo com a nova lei conclue affirmando ter ella fixado preceitos rascaveis para dar á camara electiva o caracter adequado a uma representação exacta do paiz, a uma imagem fiel, um transunto verdadeiro dos elementos essenciaes da vida nacional cumprindo assim um dos pontos fundamentaes do seu programma, e attendendo a uma das necessidades mais instantes.

Como, pois, se póde explicar a revogação do systema do escrutinio de lista? Como póde o governo perder assim um dos pontos fundamentaes do seu programma?

Fica-se perplexo e desconfiado, quando nem o governo nem a commissão dão ao menos rasão do seu procedimento Porque se passa para os circulos uninominaes, quando se tem dito em phrase eloquente, que a sombra do campanario empallidece a luz nacional?

É verdade que no relatorio da commissão se encontra «que o governo vendo que um partido importante se afastou da uma e da vida parlamentar, tomando como pretexto o alargamento dos circulos, que julgou mais conveniente voltar aos circulos unipessoaes.

E isto que poderia parecer que o governo se arrepende, não se explica, mesmo porque reconhecendo que é um pretexto; não é uma, rasão.

E por outro lado nada nos prova em primeiro logar que

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uma nova reforma esse partido volte á vida parlamentar, pois que não se diz haver accordo com elle n'esse sentido; em segundo logar que seja por causa do escrutinio de lista, que elle se afastasse e não simplesmente por se escolher o districto para circulo. Com effeito, d'esta divisão proposta em tempo pelo sr. bispo de Vizeu, se dizia que era a mais arbitraria que existia na legislação administrativa, e estupenda phantasia legislativa.

Portanto, porque rasões se altera, repito, uma reforma tão preconisada?

É um mysterio.

Se effectivamente fosse alterada a lei, por qualquer circumstancia politica, com o fim de dar entrada, tanto n'esta como na outra casa do parlamento, a muitos homens distinctos e altas capacidades reconhecidamente necessarias para intervir nos negocios do estado; realmente seria muito bom que se alterasse a lei, debaixo d'este ponto de vista. Mas o que não se explica é como sem base, sem accordo com os partidos, a que o governo agora parece referir-se como a um successor, que estamos ameaçados se proceda de fórma que se fique ameaçado de termos tres leis eleitoraes e tambem tres eleições.

Já temos a que o governo apresentou no seu decreto dictatorial; temos agora uma segunda lei, e se vier um outro governo ainda poderemos ter outra, porque, repito, não ha nada que demonstre estar accordado que esse grande partido, que o governo parece que aspira que volte á vida parlamentar, acceite a reforma da lei que agora se discute.

Portanto, eu peço e desejo que o illustre relator da commissão nos de explicações a este respeito, e exponha ao paiz e ao parlamento as rasões convincentes sobre tão importante assumpto.

O sr. Jeronymo Pimentel (relator): - O digno par, a quem vou responder, parece ter mostrado as suas sympathias e desejos para que as incompatibilidades se alargassem de modo tal que não abrangessem os capitães com cinco annos de serviço no posto; dando tambem como rasão o poderem entrar n'esta camara, por direito hereditario, os capitães com aquelle tempo de serviço.

As rasões, porem, são diversas, assim como tambem eram diversas quando havia as categorias, com relação á entrada n'esta camara, para pares electivos ou de nomeação regia, ou por hereditariedade, não só quanto á categoria, mas tambem com relação aos rendimentos e outras circumstancias.

Era, portanto, mister estabelecer um criterio, uma linha, quando se tratasse da questão dos officiaes, para attender áquelles que estavam nas condições de poderem ser eleitos.

Entendeu assim a commissão da outra camara, de accordo com o governo, que para a incompatibilidade não devia abranger a classe dos officiaes superiores.

O digno par, sr. conde do Bomfim, declarou-se perplexo entre o escrutinio de lista e os circulos uninominaes. Viu as rasões que pesavam de um lado e do outro, e essas rasões influiram para que o seu espirito ficasse perplexo. Pareceu, entretanto, inclinar-se para o escrutinio de lista, não vendo rasões fortes, quer no relatorio do governo, quer nos pareceres das commissões das duas casas do parlamento, que justificassem a mudança de opinião a este respeito.

Devo dizer a s. exa. que o meu espirito tambem está um pouco perplexo a este respeito.

Acho vantajosa a eleição por circulos uninominaes, consoante as condições de paiz e a organisação dos partidos. Tanto assim, que posso apontar um exemplo, que já no meu relatorio apontei; a França, n'um pequeno periodo, mudou de um systema para outro.

Quando se trata de uma questão d'esta ordem ha a attender ás condições do paiz no momento em que se decreta a lei; ha a attender á organisação dos partidos e a outras circumstancias, porque se n'um momento dado o escrutinio de lista póde ser bom, n'outro dado momento póde ter inconvenientes.

Disse o digno par que lhe parece que o motivo principal de mudança de opinião do governo n'esta parte foi o desejo de transigir com a vontade do outro partido constitucional, que tomára a eleição por escrutinio de lista como um pretexto para se abster das eleições e manter-se n'um certo afastamento da vida politica constitucional.

Não foi essa a rasão preponderante. É certo, porém, que o governo e a maioria da camara não desejavam que o partido progressista, que deve seguir-se na rotação do poder, se conservasse afastado da vida politica, tomando por pretexto que a eleição se fizesse por escrutinio de lista. Não foi, todavia, essa a unica rasão determinante. Os varios motivos justificativos d'essa mudança constam dos relatorios das commissões das duas camaras, embora, na opinião do digno par, não pesem tão poderosos e tão convincentes que tirem o seu espirito do estado de perplexidade em que se encontra.

Como não desejo demorar o debate, nem a minha palavra tem a força de levar a convicção ao espirito de s. exa., limito-me a estas ligeiras considerações.

O sr. Baptista de Andrade: - Mando para a mesa os pareceres das commissões de marinha e de fazenda, sobre o projecto de lei que tem por fim auctorisar o governo a applicar á acquisição de navios de guerra até á quantia de 2:800 contos de réis do producto da emissão complementar das obrigações dos tabacos.

Leu-se na mesa, e foi a imprimir.

O sr. Conde de Thomar: - Pedi a palavra para agradecer ao nobre relator da commissão algumas explicações que me deu, com relação ás perguntas que dirigi a s. exa.

Todavia, a uma d'essas perguntas, bem clara e bem precisa, respondeu s. exa. com uma evasiva, dizendo que não conhecia n'este momento qual a organisação do banco hypothecario, a que eu tinha feito referencia. Permitta-me o digno par que eu diga que parece impossivel que a commissão não tratasse de todas estas cousas, occupando-se de um assumpto tão importante como o que estamos discutindo. E se eu apresentei este exemplo do banco hypothecario foi para achar uma solução ao requerimento, que deve estar affecto a uma commissão d'esta camara, com relação a alguns dignos pares que não têem vindo assistir ás sessões da presente legislatura, exactamente por se julgarem comprehendidos n'um dos artigos da lei das incompatibilidades.

V. exa. deve lembrar-se de que os srs. Julio de Vilhena e conde de Ficalho requereram a esta camara que declarasse se effectivamente, pelo facto de serem membros do um conselho de administração de uma companhia de caminhos de ferro, que recebe do governo uma garantia de juro, estavam ou não comprehendidos n'aquella lei. A commissão, a quem pertencia dar parecer sobre esse requerimento, supponho que não o apresentou.

(Áparte do sr. Sequeira Pinto.)

Mas não ha resolução alguma tomada pela camara; de sorte que temos estado reunidos durante quatro mezes, mas privados do concurso d'aquelles collegas que poderiam de certo ter contribuido para realçar as nossas discussões, e tambem não ha nada que justifique o ficarem elles privados de um direito.

Era justamente por isto que eu tinha dirigido ao nobre relator uma pergunta com relação ao banco hypothecario, que se encontra nas mesmas condições das outras companhias; acha-se comprehendido no artigo 4.°:

(Leu.)

N'este caso, não me parece que por parte do governo podesse haver duvidas.

Francamente, esta questão não é nova, tem sido debatida na imprensa, e parece-me que o governo já deve achar-se preparado para dar uma resposta definitiva sobre

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este ponto: os governadores do banco hypothecario podem ou não tomar parte nos trabalhos legislativos? Se podem, muito bem; se não podem, não venham ás camaras.

Responda-se a isto sem evasivas, que me parecem inconvenientes.

Esquecia-me de fazer outra pergunta ao sr. relator, pois não comprehendo a redacção d'este artigo 9.°, que diz:

(Leu.)

Pergunto se isto que aqui se diz: empregados do corpo diplomatico ou consular em serviço no estrangeiro, significa que estes empregados dó corpo diplomatico ou consular, uma vez em Lisboa, fazendo serviço na secretaria, podem ser eleitos deputados?

Pelo facto d'estes funccionarios estarem servindo temporariamente na secretaria ou estarem na disponibilidade, parece-me não perderem a sua qualidade de membros do corpo diplomatico; logo, não podem ser eleitos deputados.

Não sei se a redacção d'este artigo differe da lei eleitoral da dictadura; o sr. ministro do reino m'o dirá.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): - Foi alterada.

O Orador: - Parece-me que por esse decreto os empregados do corpo diplomatico podiam ser eleitos, e a prova é que na camara estava um deputado, membro do corpo diplomatico; agora, vê-se que esse privilegio é só para os que residem em Lisboa.

O nobre relator da commissão me dirá o que ha a este respeito, e, antes de concluir, permitta-me s. exa. que eu, o felicite pelo relatorio que apresentou sobre esta lei eleitoral.

É um trabalho importantissimo, que revela muito estudo e alta intelligencia da parte do illustre relator.

É um trabalho que não póde deixar de ficar archivado como um dos mais importantes da actual sessão legislativa.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Começo por agradecer as palavras amaveis que me dirigiu o digno par que me precedeu.

Agradeço os seus elogios, que são favores de que me não julgo credor.

Sinto que o digno par não ficasse satisfeito com as rasões que dei em resposta á pergunta de s. exa. porque não posso dar outras.

O digno par perguntou se o governador ou vice-governador do banco hypothecario estavam comprehendidos nas disposições do artigo 4.°; disse-lhe que ignorando a organisação d'aquella companhia, e hão tendo mesmo obrigação de a conhecer, não sabia se os seus governadores, ou os membros do seu conselho de administração, eram attingidos pela incompatibilidade prescripta no n.° 4.°do artigo 4.° d'este projecto de lei.

Já disse e repito, não é a minha, opinião nem a d'esta: commissão especial que ha de resolver este assumpto, mas a camara quando tenha dê-se pronunciar sobre essa hypothese, como ha de fazer quando discutir o parecer, da commissão de legislação sobre a incompatibilidade que affecte os directores da companhia do caminho da, ferro da Beira.

Este assumpto da companhia da Beira a que e digno par se referiu, foi á commissão de legislação a fim de ella dar o seu parecer; ella assim o fez; o parecer está impressão, deve já estar distribuido, e a camara o julgará.

O sr. Conde de Bertiandos: - Sr. presidente por pouco tempo cansarei a attenção da camara.

Não tencionava mesmo fallar sobre este assumpto; mas, hão quero fazer excepção aos meus collegas da opposição parlamentar. Por isso algumas palavras direi, para explicar o meu voto.

Não me Contraria o pensamento da actual lei; comparando-a com o decreto dictatorial, julgo-a até muito superior a elle e entendo que tem vantagens sobre algumas leis anteriores.

Emquanto ao relatorio da commissão faço meu o elogio ha pouco dirigido pelo sr. conde de Thomar ao sr. Jeronymo Pimentel. S. exa., como relator do projecto em discussão, mais uma vez revelou a sua proficiencia, o seu muito saber, produzindo um documento digno d'esta camara.

Consinta v. exa., sr. presidente, que eu me dirija ao sr. ministro do reino, com relação ás circumstancias excepcionaes que deram logar á gestação da presente lei.

Elias mostram apenas que o governo procura continuadamente ludibriar todo o espirito liberal do paiz.

N'um certo momento, entendeu o governo que era indispensavel calcar aos pés a constituição e trouxe ao parlamento uma camara eleita por escrutinio de lista, por fórma que a nenhum eleitor fosse necessario incommodar-se em ir á urna.

Todos nós assistimos á lucta eleitoral e sabemos que isto assim foi.

Depois, não sei porque, não conveiu o escrutinio de lista, que no relatorio do governo era considerado como notavel progresso, e, sem que tivesse havido a experiencia de alguns annos, a mesma camara eleita - digâmos eleita porque é esta a palavra consagrada - a mesma camara eleita por aquelle decreto veiu dizer:

- Nós, os que viemos ao parlamento absolver todas as vossas culpas, srs. dictadores, nós declarâmos que não, representâmos o paiz.

Ora, sr. presidente, comprehendia-se que, n'uma occasião em que o governo não tivesse estado sob a enorme responsabilidade em que o actual incorreu durante um largo interregno parlamentar, e depois de uma experiencia de algum tempo, comprehendia-se que uma camara modificasse a lei eleitoral, aperfeiçoando-a, mas n'uma occasião d'estas, não se percebe. Pois quando era indispensavel que a camara significasse à genuina representação do paiz, para que o governo ficasse completamente absolvido, é essa mesma camara, é esse mesmo juiz que vem dizer: nós não representamos o paiz.

É o governo acceita é fica!

Esta circumstancia é grave, gravissima, é mostra bem a falta de decoro politico.

Eu pasmo diante de tanta audacia!

Diz-se geralmente: mas o paiz é indifferente; ao paiz pouco lhe importa.

Sr. presidente, o paiz está assombrado com o que se passa, e quem está assombrado, parece que está indifferente.

Sr. presidente, eu nem quebro lanças por esta lei, nem por outra qualquer lei eleitoral.

Pelo modo como vão as cousas pouco importa que haja o escrutinio de lista, ou circulos uninominaes, ou o que quizerem.

Em primeiro logar o governo que se seguir ao actual se lhe não convier uma certa lei, já tem o precedente. Promulga uma lei pela qual nomeie os deputados que lhe aprouver trazer á camara.

Por conseguinte, n'esta falta de certeza, é inutil estar a discutir uma lei eleitoral, porque só valerá aquella que o governo quizer na occasião.

Ao governo convem lhe uma lei de um modo, fabrica-a, pretende-a de outro modo, decreta-a d'esse modo.

E nós votâmos, os srs. deputados votam e o paiz vota tambem.

Vota ou não vota, isso é indifferente pois já expliquei n'uma sessão anterior como as urnas fazem as eleições trabalhando só por si.

Sr. presidente, o que era necessario e quanto antes, era uma lei de responsabilidade ministerial que podesse garantir ao paiz a esperança de se entrar n'um caminho Anormal.

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De outro modo é tempo malbaratado todo o que se emprega na discussão das leis eleitoraes.

Alem d'isso, sr. presidente, mesmo quando se cumpra esta lei ou outra qualquer, por muito boa que ella possa ser, ha tantos coefficientes de incorrecção que o paiz nunca será representado livremente.

Nós atirámos a terra com tudo quanto eram nucleos de torça.

Por theorias individualistas, pulverisámos

Por conseguinte, o cidadão encontra-se só, desarmado diante do poder central a que elle está completamente sujeito e de quem é o mais possivel dependente.

A molecula social desappareceu e ficou apenas o atomo; e esse átomo por mais que lhe chamem soberano, esse atomo é escravo e não póde deixar de ser escravo.

Sr. presidente, muito conveniente seria que se reformasse o nosso quadro administrativo com a possivel independencia.

Nós precisavamos que a administração não estivesse como está inteiramente sujeita á politica.

Tudo quanto sensatamente poder limitar o arbitrio dos governos se torna urgente se quizermos que a nação se possa fazer representar no parlamento.

Está tudo por fazer para se organisar o corpo eleitoral.

Mas n'esta desorganisação completa em que vivemos, a que se chama liberdade talvez por irrisão.

O sr. Conde de Lagoaça: - Apoiado, apoiado.

O Orador: - É escusado pensar em boas leis eleitoraes, porque, na pratica, desapparecem todas as vantagens d'ellas:

Sr. presidente, na mudança de eleições para escrutinio de lista tão apregoado no relatorio do governo, para os circulos pequenos, de um deputado só exceptuou Lisboa e Porto.

Julgo isto inconvenientissimo, porque nós estamos a ver perfeitamente a rasão d'essa differença, que é a exclusão dos partidos extremos.

Pois o governo devia preferir bater-se com elles leal e francamente na camara, a que elles estivessem nas sociedades secretas guerreando sem discussão, sem peias, todas as leis e todos es bons principios.

A camara seria uma valvula de salvação.

Não sei se isto desagrada, mas agrade ou desagrade, digo-o porque fallo a verdade sempre e sou leal, nem quero, com armas desleaes, guerrear os meus adversarios.

Julgo inconvenientissimo esta excepção repito, para as duas principaes cidades do reino, inconvenientissimo e sem explicação, porquanto, aquella que o sr. ministro do reino nos deu, francamente, não a comprehendo. Isto não quer dizer que outra se não comprehenda.

V. exa. sabe perfeitamente, sr. presidente, que por mais que se combinem, reunem e congreguem os eleitores de Lisboa e Porto, desde que houver uma grande maioria que abata a sua voz e o seu voto, é indifferente que elles se reunam e combinem, e nem pensarão sequer em ir á urna.

Sr. presidente, eu não quero cansar a camara, termino por aqui as minhas considerações.

O sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler-se o projecto para ser votado na generalidade.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam o projecto na generalidade tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Agora vae passar-se á especialidade.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Requeiro a v. exa. para consultar a camara sobre se permitte que a votação, do projecto, na especialidade, seja por capitulos, em vez de ser por artigos.

O sr. Visconde de Chancelleiros: - É melhor votarem por uma só vez.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Parece-me que não é a primeira vez que isto se faz. Com outros projectos tem-se feito o mesmo.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam o requerimento do sr. Jeronymo Pimentel tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente - Vae ler-se o capitulo I.

O sr. Conde de Lagoaça: - Duas palavras apenas, simplesmente para explicar a minha attitude em frente da especialidade d'este projecto.

Quando aqui se tratou da generalidade, discuti com certa largueza a parte politica d'este projecto. A especialidade prestava-se a largas considerações, que não faço, porque v. exa. e a camara são demasiadamente illustrados para que eu, que sou o mais humilde membro d'esta camara, dissesse qualquer cousa sobre o modo de votar, sobre o escrutinio de lista ou sobre circulos uninominaes, de onde resultasse proveito e utilidade para a camara e para o governo a quem tenho a certeza de não levar o convencimento.

Por outro lado, sou amigo pessoal, á parte todas as divergencias politicas, do sr. ministro do reino, e como sei que s. exa. está doente, o que eu faria era incommodal-o ainda mais, por isso, nada direi na especialidade, e apenas isto para que se não suppozesse que não entrava na discussão por não ter que dizer.

O sr. Presidente: - Como não está mais ninguem inscripto, vae votar-se.

Os dignos pares que approvam este capitulo, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Pedi a palavra, por parte das commissões de instrucção publica e de fazenda, para mandar para a mesa dois pareceres.

Lidos na mesa, e a imprimir.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o capitulo II.

Leu-se na mesa, e posto á votação, foi approvado sem discussão, bem como os capitulos 3.°, 4.°, 5.°, 6°, 7.°, 8.° e 9.°

O sr. Presidente: - Vae ler-se o capitulo X.

Leu-se na mesa.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Só gora tenho occasião de responder ao digno par sr. conde de Bertiandos.

Devo começar por agradecer as suas palavras de elogio ao meu relatorio, em que só vejo mais uma prova da sua amisade, porque a outra cousa não posso attribuir os elogios immerecidos que me teceu.

S. exa. nas diversas considerações que fez, de caracter inteiramente politico, ha uma que eu não posso deixar passar sem resposta, para que o meu silencio ou o do governo, não pareça assentimento a essa accusação, de que o digno par se fez echo hoje n'esta camara.

Disse s. exa. que estabelecendo-se o escrutinio de lista nos circulos de Lisboa e Porto, parecia que o pensamento do governo era desejar afastar da representação nacional os partidos avançados.

Não foi nem podia ser esse o pensamento do governo, porque no parlamento devem ter logar todas as manifestações de opinião quando ellas tem rasão para se representarem.

São até uma especie de valvula de segurança para deixar expandir, dentro de certos limites, a manifestação de idéas, que reprimidas podiam explodir por outra fórma.

O governo procedeu como em outros paizes. O escrutinio de lista para produzir os seus resultados, exige que seja adoptado onde houver mais illustração e mais independencia no eleitor.

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Deve suppor-se que nos grandes centros, mais providos de illustração e menos sujeitos a qualquer acção de pressão, é onde mais cabimento tem este systema eleitoral.

Eu não quiz que s. exa. supposesse que a minha falta de resposta importava menos consideração por s. exa., quando é certo que eu tenho pela sua pessoa e pelo seu superior caracter o maior respeito, sentimento que lhe consagram todos os que o conhecem e apreciam as suas elevadas qualidades de espirito e de coração.

O sr. Vellez Caldeira: - Por parte da commissão de legislação mando para a mesa o parecer sobre o projecto de lei que tem por fim confirmar com pequenas modificações e decreto que poz em vigor o codigo de processo commercial.

O sr. Presidente: - Vae ler-se.

Leu-se na mesa e foi a imprimir.

O sr. Arthur Hintze Ribeiro: - Mando para a mesa o parecer sobre o projecto de lei n.° 57.

Peço a v. exa. que lhe mande dar o destino conveniente.

O sr. Presidente: - Vae ler-se.

Leu-se na mesa e foi a imprimir.

Vae votar-se o capitulo 10.° da reforma eleitoral.

Leu-se na mesa.

Os dignos pares que approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que, attenta a importancia do assumpto e a ligação que tem com a reforma eleitoral, entrem desde já em discussão os pareceres n.ºs 84 e 85, que se referem á circumscripção administrativa.

Tambem requeiro a v. exa. para que sejam dados para ordem do dia da sessão de ámanhã os pareceres n.ºs 83, 78, 86, 87, 77, 79, 80, 82 e 81.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam o requerimento do sr. Jeronymo Pimentel para que entrem desde já em discussão os pareceres n.ºs 84 e 85 tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Tambem requereu o digno par para que entrassem em ordem do dia na sessão de ámanhã os pareceres n.ºs 83, 78, 86, 87, 77, 79, 80, 82 e 81.

Os dignos pares que approvam este requerimento tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Segundo a deliberação da camara vae ler-se para entrar em discussão o parecer n.° 84, sobre o projecto de lei n.° 79.

Leu-se na mesa e poz-se em discussão na generalidade e na especialidade o

PARECER N.° 84

Senhores: - No uso da auctorisação que ao governo concedia o artigo 467.° do decreto de 2 de março de 1895, foram publicados diversos decretos, alterando as circumscripções administrativas do continente e ilhas adjacentes, e classificando os differentes concelhos, nos termos do mesmo decreto.

A reforma administrativa trazia como consequencia necessaria a suppressão dos concelhos que não tivessem as precisas condições e recursos de autonomia municipal.

Não estava sujeita a restricções, na amplitude dos seus termos, a auctorisação que para aquelle fim assumira o poder executivo.

Era mesmo difficil traçar-lhe limites, porque a divisão concelhia não podia obedecer a um criterio unico, na diversidade de condições em que se encontravam ainda os differentes municipios do paiz.

Alem d'essa difficuldade pratica, que deriva da extensão, população e circumstancias topographicas, tão differentes nas diversas circumscripções administrativas, acrescem sempre, quando se trata de supprimir, mutilar ou arredondar os districtos, os concelhos ou as parochias outras difficuldades que muitas vezes tem prejudicado reformas de administração, para as quaes é indispensavel alterar a divisão territorial.

Vós o conheceis; é por isso desnecessario dar-vos as rasões d'essas difficuldades.

Era convicção de todos a necessidade de supprimir alguns concelhos, a que escasseavam todos os elementos de vida desafogada, já na pequenez da sua população, já na deficiencia dos recursos de toda a ordem para occorrer ás variadas exigencias da administração.

Mas faltava a coragem bastante para arcar com as difficuldades, que essa operação melindrosa da governação encontra sempre quando se tenta realisal-a.

Teve-a o actual governo, e bem merece por isso.

Mas por tal modo procedeu, que, sem embargo da reacção natural, que levanta sempre uma alteração na circumscripção administrativa, pequenos foram os attritos que encontraram os differentes decretos que determinaram essas alterações.

Quando em 1820 se operou a mudança no novo regimen politico, existiam 785 concelhos. Pouco a pouco, novas autonomias municipaes encontraram ensejo para a sua creação, e a divisão territorial, decretada em 28 de julho de 1833, já estabeleceu 796 concelhos.

O desejo de independencia, affirmando uma vida propria, embora atrophiada pela carencia de recursos, tão natural ao homem, tambem não é alheio ao espirito dos povos.

D'ahi os esforços para obterem a sua autonomia e affirmarem a sua individualidade administrativa ou politica.

É por isso que o numero de municipios fixados em 796, pelo decreto de 1833, tinha-se já elevado a 817 quando Passos Manuel com o seu genio reformador procedeu a uma nova divisão administrativa pelo decreto de 6 de novembro de 1836.

Como se fôra o imperador romano a decepar papoulas, Passos Manuel lançou por terra a autonomia de 466 municipios.

A esta hecatombe administrativa escaparam apenas 351 concelhos.

Mas a autonomia municipal era como a phenix que renasce das proprias cinzas.

Em menos de seis annos, 30 concelhos só no continente lograram rasgar a mortalha em que os envolvêra o reformador de 1836. O codigo administrativo de 1842, no mappa da divisão territorial, que lhe vinha annexo, reconheceu a existencia de 381 concelhos no continente e 34 nas ilhas adjacentes.

Por diversa sorte passou a divisão concelhia alterada segundo as auctorisações concedidas ao governo pelas leis de 29 de maio de 1843, 3 de agosto de 1853, 26 de julho de 1855, 4 de junho de 1859 e 26 de julho de 1867, alem de alterações parciaes decretadas para determinados concelhos.

Quando o actual governo principiou a usar da auctorisação conferida pelo decreto de 2 de março do anno passado, encontrou 292 concelhos no continente e ilhas adjacentes. D'estes apenas supprimiu 46, ficando, portanto, existindo ainda 246.

D'aqui se vê que não foi tão impiedoso para a vida municipal dos pequenos concelhos, como Passos Manuel, e que não andou imprudentemente no uso da auctorisação que tornou, porque os queixumes das victimas não encontraram echo na opinião imparcial do paiz.

Os concelhos que o decreto de 2 de março de 1895 classificára como de 3.ª classe, ficam sujeitos, pela approvação da reforma administrativa, que acabou com aquella classe, a nova apreciação das suas condições, para o que o governo está auctorisado pelo artigo 451.° d'aquella reforma.

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Depois da promulgação dos differentes decretos que alteraram a divisão administrativa, reconheceu-se que havia necessidade de algumas modificações, que, sem affectar a existencia dos concelhos, importavam vantagem para os povos, e harmonia com a divisão judicial.

Essas alterações mudam algumas freguezias de uns concelhos para outros, e alguns logares de umas para outras freguezias. N'isso se attendeu ás reclamações dos interessados, e ás informações officiaes, que foram presentes á commissão da camara dos senhores deputados.

Julga esta vossa commissão que não carece de apresentar outros motivos justificativos do seu parecer favoravel a este projecto de lei.

É por isso que ella julga dever merecer a vossa approvação, para ser offerecido á real assignatura.

Sala das sessões da commissão de administração, 4 de maio de 1896. = Conde do Restello = Augusto Ferreira Novaes = Conde de Carnide = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator = Tem o voto do digno par: F. Arouca.

Projecto de lei n.° 89

Artigo 1.° São confirmados, sem prejuizo da auctorisação conferida ao governo pelo artigo 451.° do codigo administrativo, os decretos de 12 de julho, 14 de agosto, 7 e 26 de setembro, 18 e 21 de novembro de 1890, pelos quaes foram alteradas as circumscripções administrativas do continente do reino e ilhas adjacentes, salvas as seguintes modificações:

§ 1.° No districto de Aveiro ficam pertencendo para todos os effeitos civis e ecclesiasticos á freguezia de Anta, concelho da Feira, os logares da Estrada, Mocho e Tabuaço.

§ 2.° No districto de Castello Branco é restabelecida para todos os effeitos politicos e administrativos a freguezia de Cambas, que ficará pertencendo ao concelho de Oleiros, com todos os logares que a constituiam em data anterior ao decreto de 7 de setembro de 1895; o logar de Freixial, da freguezia de Santo André do Telhado e concelho do Fundão, é annexado para todos os effeitos civis e ecclesiasticos á freguezia de S. Pedro do Souto da Casa, do mesmo concelho; e a povoação do Ninho do Açor, da freguezia de S. Vicente da Beira e concelho de Castello Branco, é annexada para iguaes effeitos á freguezia de Tinalhas, do mesmo concelho.

§ 3.° No districto de Faro, a freguezia de Odeleite, do concelho de Alcoutim, é annexada ao concelho de Villa Real de Santo, Antonio, e a freguezia de Odeceixe, do concelho de Lagos, é annexada ao concelho de Odemira.

§ 4.° No districto da Guarda a freguezia da Bezelga, do concelho da Meda: é annexada ao concelho de Sernancelhe, e a freguezia de Moimentinha, do concelho de Pinhel, é annexada ao concelho de Trancoso.

§ 5.° No districto de Leiria as freguezias de Famalicão e Santa Catharina, do concelho das Caldas da Rainha, são annexadas ao concelho de Alcobaça; o logar dos Tamasinhos, da freguezia do Alvorge, concelho de Ancião, é annexado para todos os effeitos civis e ecclesiasticos á freguezia de Santa Eufemia, concelho de Penella, e o logar da Gallega, da mesma freguezia do Alvorge, é annexado para iguaes effeitos á freguezia de S. Miguel de Penella.

§ 6.° No districto de Lisboa a freguezia de Lamas, do concelho de Azambuja, é annexada ao de Alemquer, e o territorio da freguezia de Palmella, do concelho de Setubal, situado ao norte da linha ferrea do sul e sueste, é annexado, para todos os effeitos civis e ecclesiasticos, á freguezia de S. João Baptista de Alcochete, do concelho de Aldeia Gallega do Ribatejo.

§ 7.° No districto de Portalegre, a freguezia da Margem, do concelho de Niza, é annexada ao concelho de Ponte de Sor, e a freguezia de Santo Aleixo, do concelho de Fronteira, é annexada ao de Extremoz.

§ 8.° No districto de Vizeu as freguezias de Caria e Rua, do concelho de Sernancelhe, são annexadas ao concelho de Moimenta da Beira.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 2 de maio de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

Deu-se conta de um telegramma que diz respeito ao projecto em discussão.

É da commissão encarregada de representar contra a mudança da freguezia de Freiria para Mafra, pedindo a esta camara se digne prestar a sua attenção para as suas justas representações dirigidas ao governo, pedindo a permanencia da dita freguezia no concelho de Torres Vedras.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. conde de Bertiandos.

O sr. Conde de Bertiandos: - Imagino que se trata de um projecto que diz respeito á freguezia de Famalicão. Sobre elle mandei para a mesa uma contra-representação da qual não sei se a commissão tomou conhecimento.

O sr. Presidente: - As representações que vieram para a mesa foram enviadas ás respectivas commissões.

O Orador: - Eu desejo dar umas explicações.

Esta freguezia de Famalicão pertencia a um certo concelho e foi passada para outro; depois appareceu uma representação na camara dos senhores deputados, de alguns habitantes da referida freguezia a pedir que esta fosse annexada ao concelho a que anteriormente pertencia, é ultimamente foi apresentada aqui uma contra-representação declarando que a freguezia se julga muito bem annexada ao concelho em que está.

Ora, eu desejava saber se a commissão tomou conhecimento d'esta contra-representação.

Chamo para este ponto a attenção do sr. relator da commissão.

O sr. Jeronymo Pimentel: - Sr. presidente, pedia palavra para dizer ao digno par sr. conde de Bertiandos que á commissão foi presente a representação que o digno par aqui apresentou.

A commissão, porém, considerando essa representação, entendeu que não havia fundamento para que fosse alterado o projecto em discussão.

É o que tenho a dizer em resposta ao digno par.

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): - Sr. presidente, pedi a palavra simplesmente para dar mais algumas informações ao digno par sr. conde de Bertiandos.

Na camara dos senhores deputados foi apresentada uma representação pedindo a annexação da freguezia a que o digno par se refere ao concelho de Alcobaça.

Depois o sr. conde de Bertiandos apresentou aqui uma representação de outros moradores da mesma freguezia em sentido opposto.

Ora, como essa freguezia fica á 18 kilometros das Caldas e a 10 kilometros de Alcobaça, a commissão de accordo com ò governo entendeu que devia preferir o conselho que fica a menor distancia.

São estas as informações que posso dar ao digno par.

O sr. Conde de Bertiandos: - Eu não conheço a freguezia a que me estou referindo, mas consta-me que o caminho d'essa freguezia para a séde do concelho a que vae ser annexada é mau, emquanto que a ligação com o outro concelho é commoda e por boa estrada.

O sr. Presidente: - Como não ha mais nenhum digno par inscripto vae votar-se.

Em seguida foi posto á votação e approvado o parecer n.° 84.

É lido um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que tem por fim approvar, para reger n'estas reinos e seus domi-

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nios, o codigo de justiça militar, cujas disposições serão applicaveis á armada emquanto não for publicado um codigo respectivo á mesma.

Para a commissão de guerra.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o parecer n.° 85.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 85

Senhores: - A commissão de legislação vem n'este parecer dar-vos conta do seu exame sobre o projecto, já approvado na camara dos senhores deputados, que confirmou as alterações decretadas na divisão judicial.

A necessidade de harmonisar a divisão judicial com a administrativa, auctorisada pelo decreto de 2 de março de 1895, levou o governo a promulgar o decreto de 12 de julho do mesmo anno, pelo qual foi igualmente auctorisado a fazer as modificações que necessarias fossem n'aquella divisão.

Para satisfazer a esse fim, não só foi alterada a area de algumas comarcas, mas foram supprimidas outras, cuja existencia era incompativel com as condições da sua população e do seu movimento judicial, e com a nova divisão administrativa que pouco a pouco se ía publicando.

D'essas alterações outra necessidade provinha, a de alterar a sua classificação.

Depois das modificações feitas na divisão das comarcas, veiu o reconhecimento de que era não só conveniente, mas preciso, fazer ainda algumas pequenas alterações, passando algumas freguezias d'umas para outras comarcas, no que ia a satisfação a justas reclamações dos povos, o melhor agrupamento d'essas freguezias, segundo as condições topographicas, e a necessidade de harmonisar a divisão judicial com a administrativa.

No projecto se indicam essas modificações.

Sendo conveniente proceder a nova divisão das varas civeis e dos districtos criminaes de Lisboa, o governo pede auctorisação para o fazer. Essa conveniencia é reconhecida por todos que sabem como se tem alterado a distribuição da população da capital, nos ultimos annos.

Providenceia tambem o projecto, como já o tinha feito o decreto de 12 de julho de 1895, sobre o destino dos magistrados e mais empregados das comarcas e julgados municipaes extinctos.

A vossa commissão de legislação, conformando-se inteiramente com este projecto, é de parecer que o deveis approvar, para poder ser convertido em lei.

Sala das sessões da commissão de legislação, 4 de maio de 1896. = Antonio Emilio Correia de Sá Brandão = Conde de Bertiandos (com declarações) = Diogo A. Sequeira Pinto = Augusto Ferreira Novaes = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator = Tem o voto do digno par: F. Arouca.

Projecto de lei n.° 90

Artigo 1.° São confirmadas pela presente lei as alterações decretadas pelo governo na divisão judiciaria do continente do reino e ilhas adjacentes no exercicio da auctorisação conferida pelo decreto com força legislativa de 12 de julho de 1895, salvas as seguintes modificações:

§ 1.° No districto de Castello Branco a freguezia de Cambas, com todos os logares que a constituiam em data anterior ao decreto de 7 de setembro de 1895, fica pertencendo á comarca da Certã.

§ 2.° No districto de Faro a freguezia de Odeceixe, da comarca de Lagos, é annexada á comarca de Odemira.

§ 3.° No districto da Guarda a freguezia da Bezelga, da comarca de Meda, é annexada á comarca de Moimenta da Beira; e a freguezia de Moimentinha, da comarca de Pinhel, é annexada á comarca de Trancoso.

§ 4.° No districto de Leiria as freguezias de Famalicão e Santa Catharina, da comarca das Caldas da Rainha, são annexadas á comarca de Alcobaça.

§ 5.° No districto de Lisboa a freguezia de Lamas, da comarca do Cartaxo, é annexada á comarca de Alemquer.

§ 6.° No districto de Portalegre a freguezia da Margem, da comarca de Niza, é annexada á comarca de Abrantes; e a freguezia de Santo Aleixo, da comarca de Fronteira, é annexada á comarca de Extremoz.

§ 7.° As freguezias dos concelhos de 3.ª ordem que forem supprimidos ficarão pertencendo á mesma comarca a que pertencer o concelho a que forem annexadas.

§ 8.° É o governo auctorisado a proceder a nova divisão das varas civeis e dos districtos criminaes da comarca de Lisboa.

Art. 2.° Os magistrados judiciaes das comarcas supprimidas continuam addidos aos quadros respectivos, nas condições em que actualmente se encontram.

§ unico. Os juizes dos extinctos julgados municipaes que tiverem mais de um anno de serviço, e boas informações relativas ao exercicio d'este logar, e se acharem habilitados com approvação em concurso para o cargo de delegado do procurador regio, serão preferidos no provimento das vagas que se derem no quadro d'esta magistratura, depois de collocados os addidos a que se refere o presente artigo.

Art. 3.° Os conservadores e os officiaes de justiça com mais de um anno de bom e effectivo serviço serão preferidos, segundo a sua classe e categoria, para o preenchimento das vacaturas que occorrerem.

Art. 4.° Os tabelliães de notas com carta de serventia vitalicia, existentes nas comarcas ou concelhos supprimidos, são conservados, não podendo, porém, crear-se, depois da promulgação da presente lei, novos tabellionatos senão por especial auctorisação legislativa.

Art. 5.° É confirmado o decreto de 26 de dezembro de 1895, que classificou as comarcas do continente do reino e ilhas adjacentes, e fixou o quadro dos respectivos officiaes de justiça, e continua o governo auctorisado a proceder ás alterações que forem precisas nos districtos de juizes de paz, em consequencia das alterações determinadas na circumscripção administrativa e comarcã.

§ unico. É supprimido o 4.° officio da comarca da Gollegã.

Art. 6.° Sendo alterada a classificação de qualquer comarca, o juiz, que a esse tempo n'ella se achar, não será deslocado emquanto não for promovido, collocado no quadro ou transferido, excepto se a comarca tiver sido classificada em ordem superior á categoria do juiz.

Art. 7.° A divisão judicial, fixada na conformidade da presente lei, sómente póde ser alterada pelo poder legislativo.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 2 de maio de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

Foi approvado, sem discussão, na generalidade e na especialidade.

O sr. Presidente: - Agora vae ler-se o primeiro parecer dado para ordem do dia de hoje.

Leu-se na mesa o parecer n.° 69.

É do teor seguinte:

PARECER N.° 69

Senhores: - O decreto de 21 de abril de 1892 permittiu que pela caixa geral de depositos se fizessem adiantamentos aos empregados do estado. Os artigos 1.° e 4.° n.° 1.°, fallando dos vencimentos, refere-se sómente aos descriptos nas tabellas de distribuição das despezas e no orçamento ao estado.

Esta disposição não permitte que aquelle beneficio se

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torne extensivo aos empregados de nomeação regia do hospital de S. José.

Não parece justo que elles sejam d'elle excluidos.

O projecto de lei sobre que a vossa commissão é chamada a dar parecer, vem propor que aquelles empregados gosem das vantagens estabelecidas n'aquelle decreto.

Parece-nos justo, por isso vos aconselhâmos que lhe deis a vossa approvação, para ser levado á sancção regia.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 1 de maio de 1896. = A. A. de Moraes Carvalho = Gomes Lages = Arthur Hintze Ribeiro = Frederico Arouca = Jeronymo da Cunha, Pimentel, relator.

Projecto de lei n.° 82

Artigo 1.° As disposições do decreto de 21 de abril de 1892 são extensivas aos empregados de nomeação regia do hospital de S. José e annexos, os quaes poderão receber da caixa geral de depositos adiantamentos dos seus ordenados, nos termos do mesmo decreto.

§ unico. A direcção da caixa geral de depositos, de accordo com a direcção geral de contabilidade publica e administração do hospital de S. José, adoptará as necessarias providencias para a execução d'este artigo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 30 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Moita Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e especialidade.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Segue-se o parecer n.° 70.

Vae ler-se.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

PARECER N.° 70

Senhores: - Logo depois que principiou a funccionar a penitenciaria central de Lisboa se reconheceu que o seu pessoal, quer o da secretaria, quer o da segurança, não satisfazia ás necessidades do serviço.

Aquelle, por mal organisado e mal distribuido, este por diminuto.

Onze annos de pratica mais têem confirmado o que desde logo se tinha previsto.

Reorganisar o pessoal d'aquella secretaria sem augmento de despendio; regularisar a situação dos guardas provisorios em serviço de 1887, é um dos fins d'este projecto de lei.

A reforma da casa do detenção e correcção em Lisboa impunha-se tambem como uma necessidade inadiavel, assim como a dos regulamentos, e a fixação dos quadros do pessoal das cadeias civis de Lisboa e Porto.

Não duvida a vossa commissão conceder a auctorisação que se pede dentro dos limites que no projecto são traçados.

Por isso é de parecer que lhe deis a vossa approvação.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 1 de maio de 1896. = Frederico Arouca = A. A. de Moraes Carvalho = Gomes Lages = Arthur Hintze Ribeiro = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.

Projecto de lei n.° 85

Artigo 1.º É o governo auctorisado a reformar, dentro das respectivas verbas orçamentaes, o quadro do pessoal da cadeia geral penitenciaria, fixado por lei de 29 de maio de 1884 a reorganisar a casa de detenção e correcção da comarca de Lisboa, e a reformar os regulamentos e fixar os quadros do pessoal das cadeias civis da mesma cidade e da cadeia da relação do Porto.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes, na sua proxima sessão legislativa, do uso que houver feito d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 30 de abril de 1896.= Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

Foi approvado, sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o parecer n.° 71. Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.º 71

Senhores: - Deve ser empenho de todos os que se interessam pelos negocios publicos do ultramar, contribuir pelos meios de que possa dispor-se, para offerecer a maior somma de garantias aos que vão prestar serviços nas terras da Africa e da Asia, e affirmar-lhes que o seu sacrificio de sangue e de vida terá compensação em favor das pessoas da sua familia que lhes sobrevivam. Este asserto, de ha muito reconhecido, tornou-se agora ainda mais justificado depois das provas de valor e abnegação dadas ultimamente pelos nossos compatriotas n'aquellas terras portuguezas, onde, de facto, em epochas anteriores, tambem se provou muita coragem e muita dedicação.

Foi com aquelle especial e plausivel pensamento estabelecido o instituto ultramarino, cuja direcção é presidida por Sua Magestade a Rainha a Senhora D. Amelia, que se ha dignado dedicar os seus maiores desvelos, a sua mais efficaz protecção áquella sympathica instituição, que tem já dispensado prestimosos auxilios a viuvas e orphãos de funccionarios do ultramar.

Tudo que concorrer para augmentar os recursos do dito instituto será por certo applaudido pelos servidores do estado nas provincias ultramarinas e por quantos se interessam vivamente pelo engrandecimento colonial.

Com esse fim foi apresentada pelo governo ao parlamento, e convertida pela camara dos senhores deputados no projecto de lei n.° 74, uma proposta determinando que seja considerada despeza obrigatoria das camaras municipaes do ultramar o subsidio annual de 1 por cento das suas receitas ordinarias destinado ao mencionado instituto ultramarino.

Se não póde esperar-se que o producto do subsidio proposto se traduza em uma cifra elevada, será, em todo o caso, um auxilio valioso para a instituição a que nos temos referido, e que merece a maior protecção dos poderes publicos.

Parece, portanto, á vossa commissão que deveis approvar o seguinte projecto de lei:

Sala das sessões, em 2 de maio de 1896. = Jeronymo da Cunha Pimentel = José Baptista de Andrade = Francisco Costa.

Projecto de lei n.° 74

Artigo 1.° É considerada despeza obrigatoria das camaras municipaes das provincias ultramarinas, nos termos e para os effeitos do codigo administrativo em vigor, o subsidio annual de 1 por cento das receitas ordinarias das mesmas camarás, destinado ao instituto official creado pelo decreto de 11 de janeiro de 1891.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Mota Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Este parecer tem apenas tres assignaturas, mas eu devo dizer á camara que o parecer original que está sobre a mesa contém mais duas assignaturas do que aquellas que vêem no parecer que foi impresso.

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SESSÃO N.° 44 DE 6 DE MAIO DE 1896 615

Está em discussão na generalidade e especialidade o parecer n.° 71.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi o parecer posto á votação e approvado.

Em seguida foram lidos na mesa e approvados, sem discussão, os pareceres n.ºs 72 e 73, que são do teor seguinte:

PARECER N.° 72

Senhores: - Foi submettido ao exame da vossa commissão do ultramar o projecto de lei n.° 73, vindo da outra casa do parlamento, que tem por fim auctorisar a camara municipal de Lourenço Marques a estabelecer, nas suas posturas, multas até á quantia de 100$000 réis, por cada transgressão, por ser inefficaz o maximo marcado no artigo 486.° do codigo penal.

Carece a alludida camara municipal de se premunir com as providencias necessarias para dirigir a sua administração, de modo que fique habilitada a occorrer á policia e hygiene d'aquella cidade, a qual cada vez está tendo maior desenvolvimento e frequencia de nacionaes e estrangeiros.

A providencia é reclamada pelo primeiro magistrado da provincia de Moçambique, e proposta pelo governo como indispensavel ao bom regimen municipal de Lourenço Marques.

É, pois, parecer da vossa commissão que approveis, para ser convertido em lei, o seguinte projecto de lei.

Sala das sessões, em 25 de maio de 1896. = Visconde da Silva Carvalho = José Baptista de Andrade = Arthur Hintze Ribeiro = Jeronymo da Cunha Pimentel = Francisco Costa.

Projecto de lei n.° 73

Art. 1.° É auctorisada a camara municipal de Lourenço Marques a estabelecer, nas suas posturas, a pena de multa até 100$000 réis por cada transgressão.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

PARECER N.° 73

Senhores: - Foi presente á vossa commissão de marinha o projecto de lei n.° 77, vindo da camara dos senhores deputados, que auctorisa o governo a abonar das sobras do artigo 5.° da tabella da despeza de marinha do exercicio de 1894-1890, a quantia de 6 contos de réis para o fundo de soccorros a naufragos, instituido pela carta de lei de 21 de abril de 1892. A vossa commissão, em vista do legal e humanitario fim d'esta despeza, é de parecer que o projecto de lei merece ser approvado para subir á sancção regia.

Sala das sessões, 30 de abril de 1896. = Visconde da Silva Carvalho = Francisco Costa = Conde do Bomfim = Jeronymo da Cunha Pimentel = José Baptista de Andrade.

Projecto de lei n.° 77

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abonar das sobras do artigo 5.° da tabella da despeza de marinha do exercicio de 1894-1895, a quantia de 6 contos de réis para o fundo de soccorros a naufragos instituido pela carta de lei de 21 de abril de 1892.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 28 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Entre os projectos que estavam dados para ordem do dia achava-se o das execuções fiscaes, que não ponho em discussão por não estar presente o sr. ministro da fazenda e os demais já todos estão approvados. Portanto está esgotada a ordem do dia.

Posso dar agora a palavra a qualquer digno par que antes da hora do encerramento da sessão se queira occupar dos assumptos que costumam ser tratados antes da ordem do dia.

(Pausa.)

O sr. Presidente: - Como não estava inscripto nenhum digno par e nenhum tambem pediu agora a palavra, a seguinte sessão será ámanhã, sendo a ordem do dia o parecer n.° 74 sobre o projecto das execuções fiscaes e os n.ºs 83, 78, 86, 87, 77, 79, 80, 82 e 81 que a camara auctorisou que fossem discutidos ámanhã.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e quarenta e cinco minutos da tarde.

Dignos pares presentes à sessão de 5 de maio de 1896

Exmos. srs. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Marquezes, das Minas, da Praia e de Monforte (Duarte); Arcebispo de Evora; Condes, da Azarujinha, de Bertiandos, do Bomfim, de Carnide, de Lagoaça, do Restello, de Thomar; Viscondes, de Athouguia, de Chancelleiros, da Silva Carvalho; Moraes Carvalho, Sá Brandão, Serpa Pimentel, Arthur Hintze Ribeiro, Ferreira Novaes, Vellez Caldeira, Cypriano Jardim, Sequeira Pinto, Fernando Larcher, Costa e Silva, Margiochi, Jeronymo Pimentel, Gomes Lages, Baptista de Andrade, José Maria dos Santos, Pessoa de Amorim, Thomás Ribeiro.

O redactor = Alves Pereira.

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