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APPENDICE A SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 1890 636-A

O sr. Bernardino Machado: - Sr. presidente, foi por motivo justificado que não compareci na sessão das commissões reunidas de instrucção e de commercio e industria era que se deliberou sobre o assumpto agora sujeito a discussão da camara; e apressei-me a dar aos meus collegas d'essas commissões a explicação da minha falta. Se eu tivesse podido comparecer, assignaria o projecto com a declaração de vencido em parte. Proponho-me expor á camara as rasões do meu accordo e das minhas divergencias.

Antes de mais nada, porém, desejo accentuar que não attribuo as imperfeições da proposta adoptada pelas commissões a menos capacidade governativa do sr. ministro da instrucção publica. Attribuo-as, sim, ás difficuldades do assumpto com que s. exa. se encontrou, difficuldades que se não deixam vencer de repente nem pelos maiores talentos; á sua deficiencia de pratica dos negocios do ensino, porque s. exa., que é um filho laureado da nossa Universidade, e professor d'ella, ha muito pouco que versa as cousas e até as pessoas que são hoje do seu ministerio; e finalmente ao feliz, invejavel e sympathico defeito da sua juventude.

Sr. presidente, em todos os momentos da nossa historia, a instrucção acompanha as vicissitudes da patria. Após os rudes inicios da nossa nacionalidade, logo que a constituimos definitivamente, funda-se a Universidade e com ella a nossa fortuna; á expansão das nossas forças, em portentosas descobertas e conquistas, responde um admiravel desenvolvimento do ensino, tão cheio de vida, que da sua seiva se elabora a brilhante efflorescencia quinhentista, acima da qual esplende, como a mais bella representação do genio portuguez, o sagrado poema dos Lusiadas; a nação decáe com a decadencia das aulas, ao ponto que nem quasi as letras vernaculas, filhas dos passados estudos, nos consolara e reconfortara nos transes amargos da servidão; restaura se a patria, recobrara-se as instituições docentes até attingirem a magnificencia com que as dotou no seculo passado a prodigiosa energia governativa do marquez de Pombal, e é dos novos estudos, é da Universidade reformada, que saem as legiões gloriosas que de 1820 a 1834 nos restituem a independencia e conquistam a liberdade. Desde então não ha mudança politica que se não assignale pelas suas reformas na instrucção. Era 1835 a reforma de Rodrigo da Fonseca Magalhães, era 1836 e 1837 as reformas de Passos Manuel e do marquez de Sá da Bandeira, era 1844 a reforma do sr. marquez de Thomar, em 1852 e 1859 as reformas do sr. Fontes Pereira de Mello.

Era pois natural, ao movimento de renovação que ultimamente se apoderou da alma nacional, que um abalo benefico se produzisse no ensino. O paiz viu, á luz relampejante da sua indignação, a necessidade de o melhorar. Por toda a parte se comprehendeu que uma nação como esta nossa, retalhada de territorio e escassa de população, só póde ser realmente grande, só póde ser forte e respeitavel, pela valia dos seus membros, e que para os valorisar não ha outro meio senão a educação. Estavamos em risco immediato de perder mais uma parcella do nosso patrimonio: procurássemos a compensação em nós mesmos, no nosso aperfeiçoamento, na cultura dos nossos filhos. D'este empenho nasceu o ministerio da instrucção publica. E justa e nobre a aspiração? sem duvida. É portanto credor dos maximos encomios o gabinete presidido pelo sr. Antonio de Serpa.

Devemos o ministerio da instrucção publica sobretudo á politica regeneradora. Foi o ministerio das obras publicas, creado pela regeneração logo no seu advento, o que suscitou entre nós a idéa, então advogada com a arte do visconde de Castilho, de que um ministerio da instrucção publica havia de prestar ao fomento moral do paiz serviços tão relevantes como os estava prestando ao fomento material o novo ministerio das obras publicas. E foi o sr. Fontes quem em 1859 preparou, a transição para a autonomia politica do governo do ensino, organisando a direcção geral da instrucção publica, e pondo ao lado do ministro do reino, na capital, o conselho geral de instrucção publica. D'ahi a pouco, em 1864, apresentava-se n'este conselho, pela primeira vez oficialmente, uma proposta para a creação do ministerio de instrucção publica, apresentava-a o sr. Latino Coelho; e, era 1870, presidindo ao gabinete e heroico fundador da regeneração, chegou mesmo a formar-se, ainda que para em breve se desfazer com o gabinete, um ministerio especial dos negocios do ensino, cuja gerencia foi commettida ao sr. D. Antonio da Costa, o homem eminente que entre nós acabava de fazer a mais amoravel propaganda em favor da educação, e a quem poucos dias bastaram para comprovar no governo de quanto eram capazes para o progresso dos estudos e do paiz as suas excepcionaes faculdades. Mais tarde, desde que as attenções convergiram para o estado do nosso ensino, homens de todos os partidos, mas principalmente do partido regenerador, propugnaram a creação de um ministerio da instrucção publica; e, quando na lucidez da sua amargura, a opinião veiu dar força a essas reclamações, satisfel as de prompto o actual governo.

Factos diversos tinham nos derradeiros annos tornado inadiavel a especialisação de uma pasta para o expediente da instrucção. Passaram-se uns d'esses factos no ministerio do reino, outros no ministerio das obras publicas. Indical-os-hei.

No ministerio do reino os actos de zelo pela causa do ensino, raios, ephemeros, alternavam com largos periodos de incuria. Faltava manifestamente ao parlamento um chefe de administração que correspondesse aos seus votos. Era parcimonioso e até exiguo o orçamento da instrucção publica. Pois apesar disso havia sempre sobras! Que mais seria preciso para demonstrar que a administração não estava á altura das necessidades da educação nacional? O ministro do reino, occupado e preoccupado com outras momentosas questões, acima de tudo com a questão eleitoral, não tinha tempo para despachar os negocios do ensino. E nem conta vinha dar de si ás côrtes. Relatorios, mappas, que a lei lhe mandava apresentar... não apresentava nada. Igualmente faltava ao magisterio um chefe de administração que obtemperasse ás reiteradas instancias expressas pelos conselhos academicos e sobretudo pelo conselho superior de instrucção publica. Quasi sempre as suas solicitações eram baldadas.

O ministro do reino apenas para a situação economica do professorado voltava, de quando em vez, os seus olhares complacentes, e isto, porque as representações que n'esse sentido lhe eram dirigidas, tomavam um caracter eleitoral que se impunha! Não deprimo a importancia de taes serviços, e na especie não se deve era boa justiça regatear louvores ao ultimo gabinete progressista, principalmente ao presidente do conselho, o sr. José Luciano de Castro. Elle e os seus collegas elevaram os vencimentos de quasi todo o magisterio. E meritorio e muito, sem contestação alguma. Mas para tudo mais o ministerio do reino, com um ou com outro titular, provava-se cada dia mais impotente. Bastar-me-ha lembrar as duas reformas recentes do ensino secundario, ambas deploraveis, pessima, inqualificavel a ultima. Converteu-se a instrucção secundaria n'uma machina de exames, destinada a lisonjear a sensibilidade das familias com o falso brilho de uns diplomas insensatos de approvação era historia, era mathematica, etc., - como se os lyceus habilitassem historiadores, mathematicos, etc., e não visassem a um fira educativo pelo conjuncto dos seus exercicios, - n'uma machina destinada a conferir diplomas e a receber era cambio o preço d'elles para acudir com essa maquia... a muitas cousas, menos ás necessidades do ensino. Era assim a politica da instrucção no ministerio do reino!

O desleixo administrativo chegou a contagiar o parlamento. Serviços indispensaveis deixaram de ser averbados no orçamento da direcção geral de instrucção publica. E

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