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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 437

vejam-se esses dados que nos ministra o relatorio do governo que precede este projecto.

Pois e possivel, por exemplo, podermos fazer desseccar um pântano em Africa com 5:000$000 réis? Se assim continuámos, os pantanos é que nos hão de desseccar a nós.

Eu vou citar um exemplo illustrativo e hodierno, procurado em uma nação estrangeira, e podia tambem recorrer á nossa historia a colher documentos approbativos d'este procedimento por que estou pugnando; o que arruinou Portugal foi a tendencia para abarcar aquillo com que não podia; mas já disse um philosopho que a experiencia aproveita aos individuos, mas nunca ás nações. E assim parece, porque nós continuamos no mesmo systema que nos arruinou.

Póde-se, é verdade, objectar que, se fossemos a applicar esta somma toda que se pede neste projecto, sómente a beneficiar a provincia de Angola, ficavam as outras colonias sem melhoramentos nenhuns. A esta observação respondo que, quem tem esperado até agora póde esperar mais algum tempo, e quando Angola desse resultados fecundos, então seria occasião de chegar a sua vez ás outras colonias. Ninguem é obrigado a fazer o que não pode. Nós não podemos fazer nada, é preciso convencermo-nos disto, se quizermos melhorar todas as nossas colonias ao mesmo tempo. Já será um esforço heróico para uma nação pequena como a nossa, conseguir o desenvolvimento de Angola na escala que possa essa colonia emparelhar com a do Cabo da Boa Esperança.

Só assim é que não será dinheiro perdido o que se vae gastar no ultramar; só assim é que poderemos ter uma colonia nas condições de attrahir os nossos emigrantes. E nesta occasião direi que é opinião minha, que por mais tropeços que queira pôr á emigração, nunca a poderão impedir. A emigração está no caracter portuguez. O portuguez foi sempre aventureiro, viajante, emigrante, é isto o que mostra a nossa historia. Apenas expulsámos os mouros fomos logo para Africa, e depois disso temos andado sempre vagueando.

Não podemos nunca contrariar esta tendencia natural dos nossos conterrâneos. O mais que é possivel fazer nesta parte é procurar dar direcção á emigração; e se nós com o dinheiro que se vae gastar com as colonias, applicando-se só a Angola, podessemos dar a esta provincia um desenvolvimento capaz de attrahir para ali os nossos emigrantes, teriamos feito já um não pequeno serviço.

Ainda que não considere prejudicial para o paiz a emigração para o Brazil, entendo todavia que seria mais conveniente que os nossos nacionaes emigrassem para territorio que fosse do dominio portuguez. Mas ia-me esquecendo do exemplo que me propuz adduzir em favor da minha opinião de nos limitarmos, por emquanto, a Angola.

A Hollanda é um paiz que deveriamos imitar no que diz respeito a negocios coloniaes. Geralmente não gosto de invocar os exemplos das nações estrangeiras, porque raras vezes se dá um parellilismo de circumstancias tal que permitta applicar os actos das nações estrangeiras ao que é preciso executar entre nós. Comtudo, em relação á Hollanda podemos apresentar o seu exemplo como argumento concludente de analogia. Aquelle paiz tem uma população quasi igual á nossa, é um pouco inferior; como se tem sabido administrar melhor que nós, o rendimento do seu orçamento eleva-se a 36:000:000$000 réis, quando a nossa receita não excede a 25.000:O0O$000 réis.

Ora, sr. presidente, que é o que tem feito a Hollanda? Mediu as suas forças:

Quid valcant humeri, quid ferre rceusent.

Assentou o seu dominio colonial no archipelago malaio, concentrando todos os seus esforços em Java, Sumatra, e algumas ilhas adjacentes. O resultado é que a Hollanda domina num a população de 18 milhões de orientaes, e percebe das suas colonias um rendimento liquido de 6.000:000$000 réis. Esta nação que está em circumstancias analogas á nossa, devia ensinar-nos a proceder sob o mesmo plano.

Eram estas as considerações que eu tinha a apresentar á camara. Quanto a mim, este dinheiro que o parlamento vota para obras publicas no ultramar é como agora se dispende, de todo perdido. Deita-lo aqui no mar ou ir deita-lo ao ultramar não tem differença alguma; a questão é de distancia. E a rasão deste nosso insensato procedimento está na natureza d'aquelle enthusiasmo de que no principio fallei.

Em relação a esse enthusiasmo pelas nossas colonias, divido eu o paiz em tres classes.

A primeira pertence a grande maioria dos cidadãos, os que não se importam com as nossas possessões e nada sabem a seu respeito.

A outra classe chamo eu a dos declamadores, para quem as colonias constituem um thema de declamação, uma figura de rhetorica, como poderiam ser as barbas de D. João, de Castro ou a espada do condestavel, porem elles importam-se, para utilidade pratica e de nossos dias, tanto com as colonias como com as ditas barbas e a dita espada; todavia, esta classe é a mais importante, e, por assim dizer, está dando o diapasão para se discutirem os assumptos coloniaes; é a que influe nas resoluções legislativas e nos actos governativos.

A terceira classe é diminutissima, compõe-se dos homens que entendem das colonias, e desejam fazer alguma cousa em seu favor, mas, ao mesmo tempo, não esquecem os recursos e as possibilidades da metropole. E o prudente juizo destes que deveria predominar. Mas num paiz como o nosso, onde palavras espumosas produzem a embriaguez do champagne, creio que esses homens, francos na puridade, não ousam levantar a sua voz contra o alarido feito pelos declamadores, pelos que excitam e lisonjeiam a opinião nestes assumptos.

E talvez não façam mal. Pregariam no vasio, e seriam esmagados pela atmosphera creada pelos que curam mais dos applausos que das colonias. Quanto a mim, sr. presidente, que sou por dever de officio obrigado a estudar e a emittir o meu voto sobre estas questões, não reclamo nem posso reclamar para mim outro merito senão o de expor o meu pensar lisa e abertamente.

Portanto, cumpre-me dizer que sei perfeitamente que estas minhas palavras hão de ter o mesmo resultado que os 800:000$000 réis que vamos votar com applicação ás colonias.

O sr. Conde de Cavalleiros:- Não pedi a palavra para discutir o projecto, porque me falta a indispensavel capacidade, mas para fazer pequenas reflexões ao nobre ministro da marinha.

O projecto reduz-se simplesmente a votarmos 800:000$000 réis para a continuação das obras de todas as nossas colonias.

Ora, sr. presidente, o anno passado auctorisou-se um emprestimo de 1.000:000$000 réis, empregou-se esse dinheiro, e supponho que hoje não existe nada.

Qual é o relatorio, a declaração e a explicação que tem vindo ao parlamento sobre similhante negocio? Não me consta cousa nenhuma; o que me consta, e eu já o disse aqui noutro dia, é que o sr. ministro de então contratou com varios officiaes portuguezes o irem elles dirigirem as obras das nossas colonias, e arbitrou-lhes ordenados excessivos, que tenho ouvido calcular em 500$000 réis mensaes a uns e 700$000 réis a outros!

Isto ainda não é nada, o mais é os adiantamentos que se fizeram a esses officiaes, que se diz que receberam réis. 10:000$000 e 12:000$000! Será isto verdadeiro? Será falso? O governo que responda, que é o meio de nos desenganar se estamos illudidos.

Pergunto: qual é a lei que auctorisou o governo a fazer este contrato, a dar estes excessivos ordenados e estes