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SESSÃO DE 15 DE ABRIL DE 1878

Presidencia do exmo. sr. duque d'Avila e de Bolama

Secretarios - os dignos pares, Visconde de Soares Franco, Montufar Barreiros

(Assiste o exmo. sr. ministro da marinha.)

Ás duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 19 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

A acta da antecedente, considerou-se approvada por não ter havido reclamação.

Mencionou-se a seguinte

Correspondencia

Cinco officios da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo os seguintes projectos de lei:

1.° Constituindo em praça de guerra de l.ª classe a fortaleza da serra do Monsanto, com suas dependencias.

ÁS commissões de guerra e fazenda.

2.° Auctorisando o governo a reformar no posto de coronel o major Jeronymo de Moraes Sarmento.

As commissões de guerra e fazenda.

3.° Melhorando a reforma ao coronel João Gomes da Silva Talaya.

As commissões de guerra e fazenda.

4.° Approvando o accordo celebrado em 4 de março ultimo, em Tanger, relativo á adhesão do imperio alemão ao convénio internacional do pharol do cabo Spartel.

A commissão de negocios externos.

5.° Approvando a convenção entre Portugal e os Paizes Baixos, para a reciproca extradição de criminosos.

A commissão de negocios externos.

Um officio do exmo. sr. Alberto Antonio de Moraes Carvalho Junior, participando o fallecimento de seu pae o digno par Alberto Antonio de Moraes Carvalho.

O sr. Presidente: - Acaba de ser lida na mesa a participação do fallecimento do nosso collega o sr. Moraes Carvalho.

Eu creio que a camara concordará em que se lance na acta um voto de profundo sentimento pela infausta noticia que acaba de ser recebida, e que desta resolução se de conhecimento á familia do illustre finado.

Os dignos pares que approvam esta minha proposta tenham a bondade de se levantar.

Foi approvada.

O funeral terá logar amanhã, saindo o préstito da casa do finado, ao meio dia, para o cemiterio occidental.

Vou nomear a deputação que o ha de acompanhar.

Nomeio os srs. Paiva Pereira, Carlos Bento da Silva, conde de Rio Maior, José Augusto Braamcamp, conde dos Arcos, D. Affonso de Serpa Leitão e marquez de Monfalim.

O sr. Costa Lobo: - É para perguntar a v. exa. se já veiu da outra casa do parlamento o orçamento rectificativo da receita e despeza do estado, e se sobre elle a commissão de fazenda já deu o seu parecer?

O sr. Visconde de Soares Franco: - Já veiu, e creio que se deve estar a distribuir.

O sr. Costa Lobo: - Sr. presidente, acaba de me ser distribuido neste momento.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. presidente, peço a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vamos entrar na ordem do dia.
É o parecer n.° 319.

O governo está representado pelo sr. ministro da marinha, e creio que a camara não terá duvida em começar esta discussão.

O sr. Conde de Rio Maior: - O que se vae discutir agora é o projecto da reforma eleitoral?

O sr. Presidente:- É esse que se vae discutir.

O sr. Conde de Rio Maior: - Sr. presidente, embora esteja presente um dos membros do governo, este projecto tem tal importancia, que eu proponho o seu adiamento até estar presente o sr. ministro do reino ou o sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente: - Parece-me que a camara não deve ter, duvida em entrar nesta discussão; entretanto ella resolverá conforme entender.

O sr. Ministro da Marinha (Thomás Ribeiro): - Sr. presidente, não tenho duvida nenhuma em assistir por parte do governo a este debate; entretanto reconheço que estando presentes, ou o sr. ministro do reino ou o sr. presidente do conselho mais póde ser esclarecido o debate.

A camara na sua alta sabedoria resolverá o que melhor entender.

O sr. Vaz Preto:- Eu acho que o sr. ministro da marinha tem bastante talento para entrar nesta discussão; mas ella é de tal importancia, e as opiniões do sr. presidente do conselho estão do tal forma compromettidas, que nós não podemos discutir sem a sua presença, aliás não entramos nella, porque é necessario saber quaes as opiniões de s. exa. hoje, sobre um negocio tão serio como é o que se quer discutir.

O sr. Presidente: - Peço a attenção da camara. O digno par propõe o adiamento do projecto até estar presente o sr. ministro do reino.

O sr. Conde de Rio. Maior: - Ou o sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente:- Os dignos pares, os srs. conde de Rio Maior e Vaz Preto, propõem o adiamento deste projecto até estarem presentes, ou o sr. ministro do reino ou o sr. presidente do conselho.

Os dignos pares que approvam esta proposta, tenham a bondade de se levantar.

Não está approvado.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, peço a contraprova.

O sr. Presidente: - Está empatada a votação. Eu desempato votando pelo adiamento. Passámos a discutir outro projecto.

Ò sr. Ministro da Marinha:- Visto que a camara resolveu não entrar na discussão do projecto da reforma eleitoral, sem estarem presentes ou o sr. ministro do reino ou o sr. presidente do conselho, o que eu acho justo, pedirei a v. exa. que, existindo, como existem, entre os projectos que estão dados para ordem do dia, alguns que dizem respeito ao ministerio da marinha, como por exemplo o que se refere ao emprestimo para a continuação das obras no

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ultramar, esses viessem de preferencia á discussão, não havendo inconveniente.

O sr. Presidente: - O parecer que se refere ao emprestimo para as obras do ultramar é o parecei1 n.º 329.
Vae ler-se.

É o seguinte:

Parecer n.° 329

Senhores.- As vossas commissões de marinha e fazenda examinaram o projecto de lei n.° 312, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual o governo é auctorisado a contrahir um emprestimo de 800:000$000 réis, destinado a continuar as obras publicas emprehendidas nas provincias ultramarinas da Africa oriental e Occidental.

Tendo-se começado obras importantes naquelas provincias da Africa com os 1.000:000$000 réis votados em 1876, é necessario continuar a subsidiar aquelles trabalhos para que se não perca o que está principiado. São portanto as vossas commissões de parecer que o projecto seja convertido em lei.

Sala das commissões, 12 de abril de 1878.- João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Martens = Visconde da Silva Carvalho = Marino João Franzini = Visconde de Bivar= Conde de Linhares = Visconde de Soares Franco = Barros e Sá = Visconde da Praia Grande = Augusto Xavier Palmeirim.

Projecto de lei n.° 312

Artigo 1.° Em conformidade do § unico do artigo 1.° da carta de lei de 12 de abril de 1876, e nos termos dos artigos 2.°, 3.° e 4.° da mesma lei, é o governo auctorisado a contrahir um emprestimo de 800:000.$000 réis, destinado á continuação e conservação de obras e melhoramentos publicos, emprehendidos nas provincias ultramarinas da Africa oriental e occidental.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 26 de março de 1878.= Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Antonio José d'Avila, deputado servindo de secretario.

O sr. Presidente: - Este parecer tem um só artigo, por isso está em discussão na sua generalidade e especialidade.

O sr. Costa Lobo: - Sr. presidente, este projecto de lei é acompanhado de alguns esclarecimentos que suo valiosos, porque nos dizem o destino que foi dado á somma de 1.000:000$000 réis, que foi votada anteriormente para os melhoramentos do ultramar.

Estes esclarecimentos convencem-me, depois de já o estar ha muito tempo, de que tudo quanto disse nessa occasião era exacto. Eu disse, que era dinheiro inteiramente perdido. Peço aos dignos pares que tenham a bondade de ler esses esclarecimentos, que se acham no relatorio do sr. ministro. Ahi se vê que esses 1.000:000$000 réis votados, e disseminados em apistos pelas vastidões do nosso dominio ultramarino, têem sido empregados em composturas e reparações de edificios.

O unico melhoramento reproductivo que se vê, são tres kilometros de estrada em Lourenço Marques.

Gastou-se uma parte deste dinheiro em pessoal, transportes e instrumentos, e o resto foi absorvido em concertos e rebocos. Parece, e era natural, suppor-se que as colonias deveriam, pelo menos, dar para as reparações dos seus edificios. Pois não é assim, porque nem para os quartéis, nem para as residencias do governador, nem para as igrejas, nem para telheiros, nem para edificio de qualidade alguma, e estes 1 .000:000$000 réis foram despendidos em restaurar os estragos ordinarios causados pelo correr do tempo.

Acrescentando sempre, para não ser accusado de hyperbolico, que se fizeram 3 kilometros e 250 metros de estrada em Lourenço Marques.

Sr. presidente, o dinheiro despendido em reparos desta natureza, seria pago pelas colonias, se ellas não entendessem, como assim se lhes dá a entender, que a metropole quer tomar sobre si encargos que do modo algum lhe deviam pertencer. Esta questão das colonias tem-me dado que pensar.

Durante muitos annos ninguem se occupava das colonias; mas, desde que o continente africano começou a ser devassado pelos exploradores estrangeiros, e que as diversas nações mostraram desejos de obter ali possessões, nós, come é proprio dos povos meridionais, impulsivos e irreflectidos, possuimo-nos de subito enthusiasmo pelas colonias daquella parte do mundo, começámos a fazer logo planos grandiosos, que custam muito dinheiro, e que só se poderiam realisar se contrahissemos emprestimos enormes.

Agora pergunto eu á camara, embora me accusem de rude, pretencioso e ignorante: ha algum d'esses colossaes programmas, que tenha a qualidade comesinha, mas serviçal, do senso commum?

Se se lêem os artigos dos jornaes, as discussões das sociedades, os discursos e relatorios, o que é que se concluo de tanta estrophe, antistrophe e epodo?

Conclue-se apenas que é preciso gastar muito e muito dinheiro.

Um pais como o nosso, sr. presidente, que é pobre; pobre de capitães, tanto que não tem podido ainda saldar o seu deficit, pobre de braços, pobreza esta ainda aggravada pela emigração annual de 12:000 homens para o Brazil; um paiz que não tem ainda para o pão quotidiano da civilisação, como é que pode ocorrer as despezas necessarias para melhorar desde já todas as suas colonias com a viação accelerada, seccando-lhes os pantanos, beneficiando o clima, etc.?
E as nossas tradições gloriosas e a nossa honra nacional! Dizem os alvitristas pindaricos.
Mas, eu não creio que as nossas tradições gloriosas nos obriguem a fazer disparates. Antes não ter tradições assim gloriosas.
Não creio tão pouco que a honra nacional consista em ter a fatuidade icaria de emprehender commettimentos superiores as nossas forças.
Mas será este enthusiasmo que ora se manifesta pelas colonias, cousa solida e mocissa, ou um brinquedo de talco e lentejoulas? Eu tenho minhas duvidas a este respeito.
Para que d'elle se possa dar uma prova, proponha-se ao paiz um imposto exclusivamente destinado a despezas coloniaes.
Uma proposição d'esta ordem seria realmente a verdadeira pedra de toque para aquilatar o enthusiasmo que ha pelas colonias.
Eu tenho outro facto que me faz crer ser este enthusiasmo não mais que o enthusiasmo da palavra.
Nós somos a unica nação em que o nosso exercito não é obrigado a servir nas colonias.
Como é que o nosso exercito do ultramar, composto como é, quasi exclusivamente de pretos e degredados, ha de desempenhar o serviço para que é destinado? Todavia, sr. Presidente, tendo meditado sobre tudo isto, e procurando algum meio de applicar e dar uma direcção proveitosa a este enthusiasmo, ainda que o julgo mais fictício do que real, lembrei-me de que seria conveniente, em logar de disseminar estes mil contos, que periodicamente votamos, por aquella grande vastidão da Africa, que pode considerar-se uma gota de agua que se lança na Sahara, lembrei-me que seria incomparavelmente mais acertado concentrar esta despeza numa das nossas colonias. E procurando eu qual seria a possessão a que mais aproveitasse o emprego d'esta verba, diria que Angola, a que das nossas possessões está mais adiantada, mais rica e mais perto de nós.
O emprego do pequeno capital de que podemos dispor, a uma só possessão, de certo nos daria mais profícuo resultado do que nos dá, dividindo o por Angola, Moçambique, Lourenço Marques, Cabo Verde e S. Thomé e Principe, dando a cada uma d'estas possessões 100:000$000 réis, que se evaporam sem que d'elles haja o menor fructo. senão

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vejam-se esses dados que nos ministra o relatorio do governo que precede este projecto.

Pois e possivel, por exemplo, podermos fazer desseccar um pântano em Africa com 5:000$000 réis? Se assim continuámos, os pantanos é que nos hão de desseccar a nós.

Eu vou citar um exemplo illustrativo e hodierno, procurado em uma nação estrangeira, e podia tambem recorrer á nossa historia a colher documentos approbativos d'este procedimento por que estou pugnando; o que arruinou Portugal foi a tendencia para abarcar aquillo com que não podia; mas já disse um philosopho que a experiencia aproveita aos individuos, mas nunca ás nações. E assim parece, porque nós continuamos no mesmo systema que nos arruinou.

Póde-se, é verdade, objectar que, se fossemos a applicar esta somma toda que se pede neste projecto, sómente a beneficiar a provincia de Angola, ficavam as outras colonias sem melhoramentos nenhuns. A esta observação respondo que, quem tem esperado até agora póde esperar mais algum tempo, e quando Angola desse resultados fecundos, então seria occasião de chegar a sua vez ás outras colonias. Ninguem é obrigado a fazer o que não pode. Nós não podemos fazer nada, é preciso convencermo-nos disto, se quizermos melhorar todas as nossas colonias ao mesmo tempo. Já será um esforço heróico para uma nação pequena como a nossa, conseguir o desenvolvimento de Angola na escala que possa essa colonia emparelhar com a do Cabo da Boa Esperança.

Só assim é que não será dinheiro perdido o que se vae gastar no ultramar; só assim é que poderemos ter uma colonia nas condições de attrahir os nossos emigrantes. E nesta occasião direi que é opinião minha, que por mais tropeços que queira pôr á emigração, nunca a poderão impedir. A emigração está no caracter portuguez. O portuguez foi sempre aventureiro, viajante, emigrante, é isto o que mostra a nossa historia. Apenas expulsámos os mouros fomos logo para Africa, e depois disso temos andado sempre vagueando.

Não podemos nunca contrariar esta tendencia natural dos nossos conterrâneos. O mais que é possivel fazer nesta parte é procurar dar direcção á emigração; e se nós com o dinheiro que se vae gastar com as colonias, applicando-se só a Angola, podessemos dar a esta provincia um desenvolvimento capaz de attrahir para ali os nossos emigrantes, teriamos feito já um não pequeno serviço.

Ainda que não considere prejudicial para o paiz a emigração para o Brazil, entendo todavia que seria mais conveniente que os nossos nacionaes emigrassem para territorio que fosse do dominio portuguez. Mas ia-me esquecendo do exemplo que me propuz adduzir em favor da minha opinião de nos limitarmos, por emquanto, a Angola.

A Hollanda é um paiz que deveriamos imitar no que diz respeito a negocios coloniaes. Geralmente não gosto de invocar os exemplos das nações estrangeiras, porque raras vezes se dá um parellilismo de circumstancias tal que permitta applicar os actos das nações estrangeiras ao que é preciso executar entre nós. Comtudo, em relação á Hollanda podemos apresentar o seu exemplo como argumento concludente de analogia. Aquelle paiz tem uma população quasi igual á nossa, é um pouco inferior; como se tem sabido administrar melhor que nós, o rendimento do seu orçamento eleva-se a 36:000:000$000 réis, quando a nossa receita não excede a 25.000:O0O$000 réis.

Ora, sr. presidente, que é o que tem feito a Hollanda? Mediu as suas forças:

Quid valcant humeri, quid ferre rceusent.

Assentou o seu dominio colonial no archipelago malaio, concentrando todos os seus esforços em Java, Sumatra, e algumas ilhas adjacentes. O resultado é que a Hollanda domina num a população de 18 milhões de orientaes, e percebe das suas colonias um rendimento liquido de 6.000:000$000 réis. Esta nação que está em circumstancias analogas á nossa, devia ensinar-nos a proceder sob o mesmo plano.

Eram estas as considerações que eu tinha a apresentar á camara. Quanto a mim, este dinheiro que o parlamento vota para obras publicas no ultramar é como agora se dispende, de todo perdido. Deita-lo aqui no mar ou ir deita-lo ao ultramar não tem differença alguma; a questão é de distancia. E a rasão deste nosso insensato procedimento está na natureza d'aquelle enthusiasmo de que no principio fallei.

Em relação a esse enthusiasmo pelas nossas colonias, divido eu o paiz em tres classes.

A primeira pertence a grande maioria dos cidadãos, os que não se importam com as nossas possessões e nada sabem a seu respeito.

A outra classe chamo eu a dos declamadores, para quem as colonias constituem um thema de declamação, uma figura de rhetorica, como poderiam ser as barbas de D. João, de Castro ou a espada do condestavel, porem elles importam-se, para utilidade pratica e de nossos dias, tanto com as colonias como com as ditas barbas e a dita espada; todavia, esta classe é a mais importante, e, por assim dizer, está dando o diapasão para se discutirem os assumptos coloniaes; é a que influe nas resoluções legislativas e nos actos governativos.

A terceira classe é diminutissima, compõe-se dos homens que entendem das colonias, e desejam fazer alguma cousa em seu favor, mas, ao mesmo tempo, não esquecem os recursos e as possibilidades da metropole. E o prudente juizo destes que deveria predominar. Mas num paiz como o nosso, onde palavras espumosas produzem a embriaguez do champagne, creio que esses homens, francos na puridade, não ousam levantar a sua voz contra o alarido feito pelos declamadores, pelos que excitam e lisonjeiam a opinião nestes assumptos.

E talvez não façam mal. Pregariam no vasio, e seriam esmagados pela atmosphera creada pelos que curam mais dos applausos que das colonias. Quanto a mim, sr. presidente, que sou por dever de officio obrigado a estudar e a emittir o meu voto sobre estas questões, não reclamo nem posso reclamar para mim outro merito senão o de expor o meu pensar lisa e abertamente.

Portanto, cumpre-me dizer que sei perfeitamente que estas minhas palavras hão de ter o mesmo resultado que os 800:000$000 réis que vamos votar com applicação ás colonias.

O sr. Conde de Cavalleiros:- Não pedi a palavra para discutir o projecto, porque me falta a indispensavel capacidade, mas para fazer pequenas reflexões ao nobre ministro da marinha.

O projecto reduz-se simplesmente a votarmos 800:000$000 réis para a continuação das obras de todas as nossas colonias.

Ora, sr. presidente, o anno passado auctorisou-se um emprestimo de 1.000:000$000 réis, empregou-se esse dinheiro, e supponho que hoje não existe nada.

Qual é o relatorio, a declaração e a explicação que tem vindo ao parlamento sobre similhante negocio? Não me consta cousa nenhuma; o que me consta, e eu já o disse aqui noutro dia, é que o sr. ministro de então contratou com varios officiaes portuguezes o irem elles dirigirem as obras das nossas colonias, e arbitrou-lhes ordenados excessivos, que tenho ouvido calcular em 500$000 réis mensaes a uns e 700$000 réis a outros!

Isto ainda não é nada, o mais é os adiantamentos que se fizeram a esses officiaes, que se diz que receberam réis. 10:000$000 e 12:000$000! Será isto verdadeiro? Será falso? O governo que responda, que é o meio de nos desenganar se estamos illudidos.

Pergunto: qual é a lei que auctorisou o governo a fazer este contrato, a dar estes excessivos ordenados e estes

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adiantamentos? os quaes, se esses officiaes não se demorarem no ultramar e vierem para Portugal; serão pagos pela sexta parte do ordenado; quer dizer, que são precisos trinta annos para o thesouro ficar embolsado!

Por consequencia 40 por cento dos 1.000:000$000 réis estão gastos com o pessoal! Hoje pedem-se mais 800:000$000 réis, quero dizer, 400:000$000 réis vão para o pessoal; e, se assim continuar todos os annos, é necessario uma verba importante para estas obras. E qual ha de ser o resultado? O resultado ha de ser em meia duzia de annos estar a nação empenhada, comprometida e as colonias não terem senão uma obra muito pequena aqui e ali.

Peco ao sr. ministro o favor de satisfazer um requerimento que fez ha dias o sr. Vaz Preto, e do mandar publicar no Diario do governo, se as camaras estiverem fechadas, a resposta á pergunta, de s. exa.

Naquelle requerimento pede o digno par que se declare quaes foram os contratos, os ordenados e os adiantamentos que se fizeram, e quaes as leis que os auctorisaram.

Peço isto, não como opposicão, mas como amigo, porque a opposicão continua a dizer o que eu já referi, e muito mais; tem direito para o dizer, e o governo pode justificar-se publicando os documentos officiaes relativas a este assumpto.

O sr. Ministro da Marinha: - Apoiado.

O Orador: - O governo tem meio de nos confundir com essa publicação, e nós folgaremos muito de ser bem confundidos e de saber a verdade.

Sr. presidente, eu quereria que o exercito portuguez estivesse sempre prompto em armas para defender o paiz, e ir para toda a parte onde fosse mandado.

O que eu não queria ver o governo era na dependencia do quero ou não quero dos officiaes do exercito.

Ora, se isto não é bom pelo lado da disciplina, pelo lado do serviço tem inconvenientes; creio, comtudo, que mais conviria corpos formados no ultramar, porque as tropas europeas, não estando acostumadas aos climas daquellas terras, pouco tempo depois de terem, ali chegado, teem de voltar á patria cheias de enfermidades, e esses militares virão para aqui pedir esmola, porque não teem ninguem que os proteja, e nós não podemos fazer da nação um asylo de reformados.

O serviço nas nossas colonias, pelo systema seguido, não se póde fazer com os soldados de Portugal, porque, a continuar esse systema, em poucos annos teremos todos reformados. Mas poderiam acclimatar-se em alguma parte das nossas colonias, formando corpos de exercito em pontes onde o clima seja melhor, e successivamente ir passando para outros pontos, de gradação em gradação, até chegarem ao clima mais insalubre, sem que houvesse perigo nenhum.

Esta independencia que alguns officiaes julgam ter, sobretudo os das armas scientificas, que custaram muito dinheiro ao paiz para imporem encargos tão pesados, quando se trata de ir servir para as colonias, é que se não póde tolerar.

Por esta occasião permitia-me o sr. ministro da marinha que lhe diga, que sou contrario a todos os navios de ostentação, a todos os pimpões grandes e pequenos, que só servem para embaraçar consideravelmente o serviço da marinha.

Se é verdadeira a noticia que eu li, de que o governo inglez anda comprando navios para fazer a guerra, se é que a faz, o que eu não creio, e quizesse comprar o nosso Pimpão, eu votaria que os 600:000$000 réis que elle custou, fossem empregados em canhoneiras que fossem fazer serviço nas nossas colonias, e nos deixássemos destas veleidades guerreiras, que fazem com que todos se riam, porque não estamos á altura de metter medo a ninguem.

Sr. presidente, eu tambem queria que o sr, ministro da marinha, e s. exa. ha de admirar-se talvez de eu lhe pedir tanta cousa, mas isso é filho da confiança que o seu caracter me inspira, e de que s. exa. deseja acertar, e tem recursos para isso.

Tambem eu queria, repito, que s. exa. não consentisse que nenhum navio mais saia de Lisboa, levando praças de guarnição que tenham o tempo de serviço vencido. Este peditório não é impossivel de satisfazer.

É na verdade vergonhoso que saia um navio para fora da barra levando cincoenta ou sessenta homens com o tempo de serviço vencido, porque isto póde comprometter muito a disciplina, sem que se lhes possa applicar o castigo merecido, porque essas praças dizem "nós já não somos militares.

Agora, attendendo á rapidez a vapor com que temos de trabalhar, convido os meus amigos e collegas a que façam opposição ao governo, mas não systematica, porque respeito muito os cavalheiros que ali se sentam nas cadeiras ministeriaes; podemos divergir, sem ofender.

Discutamos, pois, tudo quanto vier a esta casa, embora lá fora se tirem as illações que quizerem; embora nos chamem chancella, ou impedidores dos negocios publicos, façamos o nosso dever, e deixemos o mais.

Eu torno a repetir os meus pedidos ao sr. ministro da marinha, e não me atrevo a exigir resposta; mas espero que s. exa. m'os. satisfaça, não havendo inconveniente do serviço publico, que julgo não haverá, mandando publicar no Diario do governo os documentos que pediu o sr. Vaz Preto, porque esses documentos servem para justificar o governo o os officiaes, e ao mesmo tempo confundir a opposição, que é aquillo que eu mais gostaria ver.

O sr. Ministro da Marinha: - Sr. presidente, a camara, se não ficar satisfeita com as rasões que hei de offerecer em resposta ás observações do digno par, ha de, todavia, ficar satisfeita pelo pouco tempo que hei de occupar a sua attenção.

Antes do continuar nas minhas considerações, devo rectificar uma inexactidão, que foi proferida por um digno par, não de certo por falta de conhecimento da materia que discutia, mas porque a rapidez da palavra nos leva muita vez a dizer cousas que não quiséramos dizer.

Em primeiro logar devo affirmar ao digno par o sr. Costa Lobo, que não pedi 1.000:000$000 réis, como se entende das palavras que s. exa. proferiu, pedi unicamente réis 800:000$000, como só vê do projecto de lei em discussão.

Em segundo logar permitta-me o mesmo digno par que lhe observe que não foi no ultimo anno que o parlamento auctorisou o emprestimo dos 1:000:000$000 réis, a que s. exa. se referiu, e sim em 1876, tendo deste modo decorrido um periodo muito mais longo do que s. exa. suppunha.

Este emprestimo de 1.000:000$000 réis que o governo foi auctorisado a contrahir, em virtude da carta de lei de 12 de abril de 1876, tem uma historia que se póde dizer em poucas palavras.

O sr. ministro que naquelle tempo geria a pasta da marinha e ultramar, o sr. Andrade Corvo, pediu ao parlamento auctorisação para contrahir um emprestimo de réis 5.000:000$000, para serem exclusivamente empregados na execução e conservação do obras nas provincias ultramarinas da Africa oriental e Occidental.

A camara dos senhores deputados concedeu a auctorisação pedida, e depois vindo o projecto á camara dos dignos pares, esta camara entendeu que era melhor dividir em periodos e series este emprestimo, sendo a primeira de réis 1.000:000$000, devendo o governo pedir successivamente ao parlamento as series subsequentes.

Diz-se na lei, em virtude da qual o meu antecessor trouxe esta proposta á camara, o que vou ler.

(Leu.)

Por consequencia o caminho que o governo tinha a seguir era o de pedir ao parlamento que renovasse a aucto-

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risação dada pela primeira vez em 1876, e isto foi o que se fez.

Agora dizem os dignos pares que o dinheiro proveniente do emprestimo que o governo foi auctorisado a contrahir, devia ser applicado unicamente a obras de immediato e reconhecido interesse publico, e que não devia ser desviada qualquer verba para obras de reparações e concertos de edificios publicos.

Permittam-me os dignos pares que lhes diga, acatando as suas opiniões, que me não parece que os governadores das nossas possessões de Africa tenham dado má applicação a algumas verbas, mandando fazer as obras de reparação que julgam essenciaes nos edificios do governo.

S. exas. De certo não desejam que os edificios doestado, como são os palacios dos governadores, as igrejas, os hospitaes, as alfandegas e os aquartelamentos militares se deixem arruinar e cair por falta de concertos que numa dada occasião podem custar 1:000$000 réis, e que mais tarde se não poderão fazer com 20:000$000 ou 30:000$000 réis.

Quero suppor que tenha havido excesso na applicação de algumas verbas, e creiam os dignos pares que o governo ha de empregar todos os meios ao seu alcance, para que as reparações que se houverem de fazer sejam só as de absoluta necessidade.

E a proposito disto, cabe-me responder tambem a uma referencia do sr. conde de Cavalleiros e ao que disse o meu amigo o sr. Vaz Preto: "Onde estão os relatorios? Onde estão os documentos?"

Devo lembrar á camara que, alem dos esclarecimentos que se podem encontrar no relatorio que precede esta proposta de lei, já os ultimos, que o governo teve á sua disposição, foram publicados nos Diarios da camara dos senhores deputados, sessões de 5 e 6 de abril.

Fiz ali transcrever na sua integra todos os officios e mappas que tinham vindo das provincias ultramarinas com respeito a esta questão, e procedendo assim, devem os dignos pares reconhecer que não tenho desejo de occultar cousa alguma que possa servir de esclarecimento a esta ou á outra camara.

Se s. exas. quizerem ver o que se disse na outra casa do parlamento nas sessões de 5 e 6 de abril, podem ler os Diarios que tenho aqui.

Alem dos documentos então publicados, e que são um relatorio e contas do director das obras publicas de Moçambique, e um relatorio o mais circumstanciado possivel, respectivo á provincia de Angola, recebi hoje de Moçambique dois officios que me apressei em trazer á camara; e tenho a satisfação de dizer aos dignos pares que elles não faliam de obras de reparo; um refere-se a uma ponte caes, e outro a uma estrada que se inaugurou no dia 18 de fevereiro.

(Leu.)

Por consequencia, já posso additar ás informações que dei na camara dos senhores deputados estas que chegaram hoje a respeito de obras publicas no ultramar; e se na proxima sessão legislativa eu ainda tiver a honra de ser ministro, hei de apresentar ao parlamento, o mais detalhadamente possivel, todas as informações que não me canso de pedir.

Quanto ao requerimento feito pelo sr. Vaz Preto, declaro a s. exa. que já tenho aqui na minha mão as tabellas dos quadros e vencimentos do pessoal de obras publicas na provincia de Moçambique; igualmente as que se referem á provincia de Angola e ao pessoal destinada ao estudo e construcção do caminho de ferro de Ambaca; finalmente, as de Cabo Verde e S. Thomé e Principe.

Resta-me trazer á camara os esclarecimentos acerca, das verbas que, na occasião da partida, foram adiantadas aos diversos funccionarios.

O sr. Vaz Preto: - E a lei em que se fundou o governo para as adiantar?

O sr. Ministro da Marinha:- S. exa. sabe que não tinhamos outra lei em que nos fundássemos senão a de 2 de abril de 1876.

Mas, o que posso dizer a v. exa., relativamente ao preço elevado por que foi contratada uma grande parte do pessoal destinado a essa expedição, é que houve da parte dos meus antecessores, e dos funccionarios que se occuparam de angariar estes engenheiros, o maior escrupulo em obter o pessoal o mais barato possivel.

Nas condições que precisa ter um engenheiro para dirigir obras e trabalhos daquella importancia, nunca se póde conseguir que fossem para a Africa em condições normaes.

Ora, nós não temos direito, nem o podemos ter para obrigar estes funccionarios a servir no ultramar.

Não é um serviço militar extraordinario, que se possa ordenar por ordem superior, como já succedeu em circumstancias extraordinarias com um batalhão da metropole; se queremos pois, e se necessitámos desses serviços, temos de os pagar.

Sabe v. exa. quanto se chegou a pedir?

Chegou-se a pedir 18:000$000 réis por anno, baixando-se depois o ordenado, é verdade, a 12:000$000 réis annuaes com uma pensão para a viuva no caso de morrer por lá o engenheiro, ou 20:000$000 réis por uma só vez.

Reconhecida a necessidade destes serviços, o que havia de o governo fazer?

Um dos maiores desperdicios que poderia commetter seria o ter contratado a esmo o pessoal que se lhe offerecia, sem cuidar se elle era ou não devidamente habilitado, attendendo unicamente á modicidade do preço.

O governo não fez isso, e fez muito bem, preferindo antes contratar pessoal mais caro, mas á altura do fim para que era destinado.

Não são pois exageradas as compensações que se dão a um pessoal desta ordem, engenheiros que se resolvem a percorrer o interior da Africa, e a fazer os seus estudos e trabalhos em condições climatéricas as mais deploráveis. Condições de tal ordem, que o primeiro digno par que tomou a palavra neste debate disse que nós não poderiamos nunca desseccar os pantanos da Africa, mas que seriam os pantanos que nos desseccariam a nós.

Tudo isto é aggravado ainda pelas difficuldades da vida naquellas paragens, onde as necessidades as mais elementares se não podem satisfazer, onde tudo falta, e onde mesmo para haver os soccorros indispensaveis para combater as febres e as doenças proprias do clima, foi necessario organisar um serviço especial de saude.

Se tudo isto é verdade, poderemos estar a clamar todos os dias contra estes ordenados, que se para nós são relativamente grandes, não o seriam para a Inglaterra, que paga largamente todos os seus serviços tanto da metropole como das colonias, nem o seriam para a França, que despende liberalmente com os seus empregados coloniaes, até mesmo com aquelles que vão para a melhor das suas possessões, Argel, que tem excellente clima, onde ha uma rede de óptimos caminhos de ferro, onde ha communicações telegraphicas, serviço regular de correio, emfim as commodidades da metropole, da qual mesmo não fica muito inferior no seu desenvolvimento moral e material.

É que nós, sr. presidente, estamos costumados a pagar pouco, muito pouco. Damos a um bispo que vae para Angola 1:900$000 réis, julgando que elle vae encontrar ali os benesses e pé de altar do tempo em que naquelle paiz se baptisavam de uma vez centenares e centenares de escravos, pelo que os prelados recebiam os devidos emolumentos.

É preciso attender a que os funccionarios que vão para o ultramar expõem-se a arriscar a vida nessa campanha, e a prova é que já têem vindo muitos doentes e até ultimamente, e infelizmente, o proprio engenheiro chefe, que chegou aqui cheio de febres e mortificado pelas epedemias de Africa. Outros, têem-se visto obrigados, para poderem

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continuar a trabalhar, a irem procurar allivio ao bondoso clima de Mossamedes.

Quando o governo não póde obrigar ninguem a ir fazer estes serviços, que tenho fé hão de utilisar a nossa Africa, a qual, parece-me se a benificiaremos devidamente, ha de ser um dia um grande recurso para a metropole, talvez em tempo muito proximo. Com que fundamento pois se accusa o governo pelos contratos que tem feito para mandar bons funccionarios para as nossas possessões? Note a camara que não me estou defendendo, mas expondo a rasão e a verdade. Os meus antecessores lutaram com grandes dificuldades para encontrarem gente nas condições precisas ao serviço que se tem de fazer nas colonias.

Assim mesmo na minha opinião, contrataram relativamente barato em vista dos pedidos que primeiramente tinham sido feitos.

A camara póde fazer o que quizer, mas acredite que é mais facil criticar do que executar.

Não conheço nada tão difficil como executar. Ha leis que á primeira vista nos parecem perfeitamente correntes, mas quando chegamos á pratica achamos o nosso caminho tão eriçado de dificuldades, que temos muita vez de retroceder e muitissimas de parar.

Temos ainda muito que fazer; se bem que estejamos bastante adiantados, é necessario caminhar mais e com persistência; para isso é preciso que empreguemos tanto quanto possivel os esforços de que póde dispor cada qual dentro da sua capacidade intellectual e material. Este é o dever do governo, é o dever de todos nós.

O governo póde não satisfazer a vontade dos mais escrupulosos no rigoroso cumprimento do dever que lhe impõe a sua grande responsabilidade, mas BC alguma vez es juizes fossem chamados aos bancos dos réus, haviam de confessar que não teriam feito melhor, sobretudo se não tivessem aprendido com os primeiros que antes, á forca de trabalho, encontraram a resolução de muitos problemas.

Desejava responder uma por uma ás reflexões apresentadas pelo digno par. Vi que o meu illustre amigo o sr. Costa Lobo, á falta de documentos que infelizmente não posso fornecer, comquanto tenha a melhor vontade de o fazer, se referiu ao que dizem os jornaes.

Não serei eu quem negue a auctoridade ao jornalismo.

É uma fonte perenne de muito conhecimento util, informador avido, embora ás vezes imprudente; mas tambem, quantas vezes victima na sua sinceridade de correspondentes sem consciencia, principalmente quando escrevem de paizes longínquos.

Vou dar-lhe uma prova bem recente.

O governador geral de Moçambique, que é um cavalheiro digno de todos os respeitos, pois acaba de ser victima de uma noticia menos exacta, que a respeito delle se publicou em alguns jornaes do Lisboa.

Aquelle digno magistrado visitou, não ha muitos mezes, os diversos districtos da sua provincia. N'esta visita foi, como devia ser, comprimentado por autoridades e particulares em toda a parte onde chegou.

Pois de lá veiu para os jornaes uma noticia que elle immediatamente se apressou em desmentir num officio que tenho presente.

E eu folgo de ter esta occasião de perante o parlamento fazer justiça áquelle nobre caracter, noticiando o seu desmentido.

A noticia e, pouco mais ou menos, que aquelle digno funcionário, na visita que fizera aos seus districtos provinciaes, tinha sido recebido pelos régulos, z que delles recebera valiosos presentes.

Este funccionario que viu o desfavor da noticia, apressou-se a declarar positivamente ao governo, que não tinha recebido nenhum dos presentes que lhe quizeram fazer, que elle acintemente não quiz acceitar, para que se não disse-se que o fim da sua visita fora no intuito de receber presentes fosse de quem fosse.

Eu poço sempre aos dignos pares que, pela sua posição e suas pessoas, dão auctoridade ás palavras que proferem, que tenham sempre o maior cuidado com as noticias que vem das colonias. Eu declaro que tenho chegado a pasmar de ver muitas vezes o que dizem os jornaes, perfeitamente em desaccordo com o que dizem os governadores nas suas informações officiaes.

O digno par o sr. Costa Lobo disse ha pouco, que se tivéssemos de consultar o paiz sobre se deseja conservar as suas colonias, s. exa. tinha a certeza de que o paiz inteiro seria desfavoravel a essa idéa, ou, pelo menos, indifferente.

Se s. exa. consultasse apenas a opinião dos que desconhecem completamente o que são as nossas colonias, qual a sua importancia passada, presente e futura, de certo que a sua opinião lhes seria indiferente, ou antes, não teriam opinião; mas se s. exa. consultasse os que têem conhecimento dellas, mais ou menos immediato, ou mais ou menos perfeito, a opinião seria muito favoravel.

Eu conheço um pouco o digno par, e creio que s. exa. é dos que teem opinião favoravel á conservação das nossas colonias; se não tem, eu desejaria que s. exa. tivesse a coragem de vir ao parlamento propor a questão previa: deve ou não Portugal conservar as suas colonias intactas?

Não desejo continuar, para não cansar a camara. Creio que terei dito o que é preciso sobre este projecto, que eu tive a honra de adoptar, e a camara de certo conhece as dificuldades com que luta o governo na metropole para administrar dignamente as colonias.

Um dos meus maiores empenhes, e certamente do pagamento ao votar esta auctorisação está na construcção do caminho de ferro de Ambaca. É um melhoramento que, quando chegar a conseguir-se...

O sr. Costa Lobo: - E quando chegará a conseguir-se?

O sr. Ministro da Marinha: - Eu respondo ao digno par, e tanto mais facilmente quanto é certo que s. exa. aconselhou o governo a concentrar todos os seus recursos em Angola.

Se o sr. Costa Lobo quizer ter a bondade de ir aturar-me por alguns momentos ao ministerio da marinha, lá poderá ver que tambem desejo cuidar das obras publicas de primeira necessidade.

E quando o digno par me fazia esta recommendação, perguntava eu a mira mesmo o meio pratico de obter esse resultado. Perguntei-o já na secretaria ao engenheiro que do ultramar regressou a Lisboa por doença; e, apesar de ser domingo, lá estivemos hontem com os mappas diante de nós, estudando o assumpto.

Sabe v. exa. o que me espantou? Foi que em Loanda, quando áquelle engenheiro chegou, tivesse procurado trabalhadores, e, depois de fazer os possiveis esforços, apenas encontrasse oitenta carregadores; quando depois se internou para os trabalhos que foi fazendo, a muito custo em quatro concelhos do interior não chegou a obter quinhentos obreiros.

Por consequencia, a primeira cousa que o governo tem a estuda: para poder dar ás obras daquella provincia o desenvolvimento que o digno par aconselha, é a maneira de encontrar trabalhadores.

Convem conhecermos as circumstancias especiaes das nossas possessões. Nós não temos possessão alguma onde desde já possamos dar grande desenvolvimento aos trabalhos que tão necessario é levar a eifeito; a unica, onde se nos offerece maior facilidade, é a Africa orientai.

E sabe s. exa. por que? Porque temos ali o recurso cos trabalhadores da Índia e...

(Aparte do sr. Costa Lobo.)

Creio que o digno par não quererá que desprezemos, a provincia de África oriental, que, na minha opinião, é muito

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mais rica do que a de Angola. Eu desejo sinceramente engrandecer a provincia de Angola, eleva-la até onde for possivel...

(Aparte do sr. Costa Lobo.)

Um dos trabalhos que convinha organisar lá era a telegraphia. O engenheiro director quiz estabelecer uma linha telegraphica, que fosse era grande parte pela margem do Quanza.

Sabe v. exa. a como elle avaliou os postes? A 16$000 réis cada um, por causa dos transportes; isto na Africa, onde toda a gente diz que ha as melhores florestas e onde realmente as ha.

Veja o digno par como por lá se encontram dificuldades com que de certo se não contava.

Ajude-me com as suas luzes que do coração lho agradeço. A pasta que me foi distribuida não é uma pasta politica.

Tenho só e exclusivamente o desejo de fazer administração, de ajudar a fazer administração colonial, é este o meu unico empenho, e por mais que o digno par o sr. Costa Lobo se apresente como meu adversario, não o é, porque o não póde ser.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Este projecto, como disse o meu amigo o sr. Thomás Ribeiro, não foi da iniciativa de s. exa., mas isso não impede que eu peça a s. exa., porque é hoje da sua responsabilidade esta medida, algumas explicações sobro a auctorisação que se pede no projecto em discussão. Serei breve no que tenho a dizer, e pouco tempo tomarei á camara.

Pedem-se aqui 800:000$000 réis (alem da quantia que já se havia votado), para obras que se vão fazer no ultramar. Eu tenho muita consideração pelo sr. ministro da marinha, presto homenagem ao seu merito e á sua intelligencia, e acredito que s. exa. ha de procurar sempre corresponder ao que se espera da sua muita capacidade. Independentemente destas particularidades, tenho porem a notar que este systema de beneficiar as provincias do ultramar não me parece o melhor, e é isso o que me leva a fazer algumas considerações contra o projecto.

Sinto que não esteja presente o sr. ministro da fazenda, porque desejava referir-me a umas palavras proferidas por s. exa. Comtudo, como está presente um membro do governo, espero que serão communicadas as minhas palavras ao sr. ministro a quem me quero referir, a fim de que elle saiba a minha opinião nos negocios da administração publica, opinião que é tambem de pessoas muito competentes.

Num discurso pronunciado na camara dos senhores deputados, ao qual já tive occasião de alludir, faz-se ver o pouco cuidado com que se tem vigiado o emprego dos dinheiros publicos. A este respeito fez o sr. Barros e Cunha declarações importantes, como já aqui disse.

Á vista de factos taes como aquelles que s. exa. referiu, não posso deixar de recommendar aos srs. ministros que tenham o maior cuidado nos negocios publicos e vigiem que os dinheiros, que se levantem por meio de todos estes emprestimos que aqui se votam para obras publicas, sejam bem applicados, como já aqui o fiz sentir, porque de contrario virão a realisar-se as prophecias do sr. Barros e Cunha.

É para isto que eu chamo a attenção da camara e do meu amigo o sr. Thomás Ribeiro, e confio que s. exa. ha de ser o mais escrupuloso possivel em procurar que as sommas que se pedem neste projecto não sejam empregadas senão no que for strictamente de utilidade das colonias.

O mesmo queria dizer ao sr. ministro da fazenda se s. exa. estivesse presente, visto que hontem disse que tambem precisava levantar capitães, necessidade que eu não contesto.

(Entrou- o sr. ministro da fazenda.)

Vejo entrar o sr. ministro da fazenda, e é agora occasião de perguntar a s. exa. se depois do discurso proferido na camara dos senhores deputados pelo sr. Barros e Cunha, discurso de que o sr. ministro da fazenda tem conhecimento, e do qual já aqui li um trecho á camara, o sr. ministro tem verificado se são verdadeiras aquellas accusações e tomado todas as medidas necessarias para evitar os desvios de fundos que tem havido em algumas obras e ar sua má administração.

É isto o que eu queria perguntar a s. exa., e estimo muito que chegasse nesta occasião.

Eu entendo que o nosso paiz deve melhorar e progredir; mas receio que as despezas, votadas para esses progressos e melhoramentos,- sejam mal applicadas, como se vê pelo discurso do sr. Barros e Cunha, o que cumpre evitar. Isto é que eu desejo que o governo tome em consideração, e que adopte como verdadeiro principio da sua administração, a boa gerencia dos dinheiros publicos. Por isso desejo que o sr. ministro da fazenda me diga, se á vista da discurso que foi pronunciado na outra camara pelo illustre deputado, a que ha pouco me referi, s. exa. tem já dado as providencias necessarias para conhecer da verdade daquellas asserções, e para evitar que continuem a repetir-se actos d'aquella natureza.

O sr. Palmeirim: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir.

O sr. Sousa Pinto:- Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir.

O sr. Presidente: - Vae ler-se um officio do ministerio do reino, que acaba de ser recebido na mesa, acompanhando um decreto.

Um officio do ministerio do reino, remettendo o autogrado do decreto datado de hoje, pelo qual Sua Magestade El-Rei houve por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias até ao dia 24 do corrente mez inclusivamente.

Para o archivo.

O sr. Presidente: - A camara fica inteirada de que as côrtes geraes e ordinarias são prorogadas até ao dia 24 do corrente.

O sr. Visconde de Fonte Arcada:- Quando eu mo dirigi ao sr. ministro da fazenda, perguntando a s. exa. se já tinha providenciado para que tivessem a applicação devida as despezas que são aqui votadas, foi porque julguei que s. exa. me poderia informar a tal respeito. O nobre ministro acaba, porem, de me dizer particularmente, que isto não era com elle, e sim com o seu collega das obras publicas; mas permitta-me s. exa. que lhe diga que esto assumpto deve interessar ao governo em geral.

O sr. Vaz Preto:- Folguei de ouvir o sr. ministro da marinha, e como desejo ser justo, não posso deixar de louvar s. exa. não só pelos seus bons desejos e esforços para serem aproveitados os trabalhos dos governadores lá fora, como pelo desejo de dar publicidade a todos os seus actos.

Depois de agradecer a s. exa. as explicações que acaba de dar, farei algumas observações.

Começarei por pedir a s. exa. que mande publicar os documentos a que ha pouco se referiu o sr. conde de Cavalleiros e que eu tinha pedido. Este pedido tem a vantagem de dar publicidade a factos que lá fora se não conhecem, assim como tambem é de muita conveniencia para o governo poder confundir aquelles que se referem a esses factos.

Ha sempre em assumptos desta ordem vantagem na sua publicidade. O sr. ministro da marinha declarou que- estes 800:000$000 réis que se pedem pertencem a uma serie que a camara já votou. Parece-me que s. exa. está enganado a este respeito. Effectivamente o seu collega dos negocios estrangeiros, que exerceu a pasta da marinha, pediu 5.000:000$000 réis para estas obras, mas a camara dos dignos pares não lhe votou senão 1.000:000$000 réis.

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Portanto, este novo pedido do sr. ministro do marinha não tem nada com o pedido anterior. Eu desejava que s. ex.1 me desse uma explicação a respeito da somma dos réis 800:000$000, isto é, se esta quantia, ha de ser distribuida pelas differentes provincias do ultramar, proporcionalmente ás sommas que ellas tiverem de pagar para o encargo desse emprestimo. Neste caso perguntarei se ellas já pagaram os juros dos 1.000:000$000 réis que a metropole lhe adiantou e que foram tão mal gastos?

Seja pagou o ultramar o encargo dos 1.000:000$000 réis nós não podemos negar o que pede o sr. ministro, porque não fazemos dispendio com as colonias, são ellas que pagam, e portanto quando ellas pagam os seus melhoramentos não têem nada a objectar, antes pelo contrario, temos obrigação de concorrer com todos os nossos esforços para que as colonias progridam e se desenvolvam. Os melhoramentos que se fizeram pôde-se dizer que foram mais locaes que geraes. Isto o que prova é que não tem havido pessoa competente para dirigir os trabalhos, que não se teem zelado os interesses das colonias, nem se tem satisfeito ás intenções da metropole; por consequencia deve haver mais fiscalisação da parte do governo, devendo dar ordens terminantes a este respeito e marcar inclusivamente as obras ás quaes devem ser applicadas aquellas sommas.

Há uma declaração do sr. ministro que me fez bastante impressão. S. exa. disse que os engenheiros teem encontrado grandes difficuldades para poderem levar a cabo qualquer melhoramento, por isso que não teem trabalhadores ou só se podem encontrar por um preço enormissimo.

A conclusão que eu tiro é que os serviços que não se podem agora fazer, devem ser adiados para melhor epocha, e portanto acho desnecessario o pedido de 800:000$000 réis.

O que o governo tem a fazer já é empregar meios para que nas noa sãs colonias se obtenham braços que não sejam exorbitantemente caros.

Não só não ha braços, mas o peior ainda é que os que ali ha são mal empregados pelos directores. Não sou eu que o digo, é o proprio sr. ministro que o confessa, mostrando que se pediram 1.000:000$000 réis que foram gastos em obras para que não eram destinados. Alem disto poucas obras se teem feito no ultramar e a prova é a leitura que o sr. ministro fez de dois officios, em que se diz que foram apenas começadas uma ponte e uma estrada, ambas ellas orçadas em pouco.

Os esclarecimentos que lhe mandaram os seus empregados são tão concisos, tão pouco explícitos, que nem se declara se ha probabilidade de que essas obras em breve se concluam ou se ha falta de braços. Emquanto a estes pontos, o sr. ministro ficou sabendo o mesmo que eu sei. Apenas temos a perspectiva de uma ponte e de uma estrada, sem nos constar quando deverão ficar terminadas.

Outro ponto importante, sobre o qual me parece que fallou já o sr. Costa Lobo, é a divisão das sommas que são votadas para o ultramar.

Segundo os apontamentos que tenho, a divisão faz-se proporcionalmente por differentes provincias, o que significa que só muito pouco vem a caber a cada uma dellas. Eu achava mais acertado fazer um plano geral de melhoramentos no ultramar, e que primeiramente se attendesse aos de maior urgencia, e depois de concluidos, se passasse a tratar de outros, no que, de mais a mais, se evitariam grandes despezas com o pessoal, chamando só o que era necessario numa provincia, e não procurando obte-lo para todas as provincias simultaneamente.

Vou concluir as minhas reflexões, dirigindo uma pergunta ao sr. ministro. Eu desejava que s. exa. me dissesse se o director das obras publicas de Angola regressou em virtude de lhe permittir o seu contrato, no caso de estar doente, e se elle tem de entregar alguma indemnisação em virtude de não poder satisfazer ás condições estipuladas.

Faço esta pergunta em harmonia com as observações expostas pelo sr. conde de Cavaleiros, nas quaes se mostra que, tendo-se abonado enormes adiantamentos, póde o paiz perde-los todos. Por consequencia, preciso saber quaes as garantias que o governo tem para que o paiz não fique prejudicado.

O sr. Ministro da Marinha: - Sr. presidente, das palavras do digno par e meu amigo, o sr. Vaz Preto, referindo-se á resposta que dei com respeito ás series do emprestimo, vejo que não me expliquei bem.

Eu não disse que o governo já estava auctorisado para contrahir este emprestimo, se o estivesse não viria novamente pedir auctorisação, mas o que indiquei foi que o parlamento havia reconhecido a necessidade della, quando votou a lei de 12 de abril de 1876, como claramente se vê deste paragrapho da citada lei, que passo a ler.

(Leu.)

A camara reconheceu que os 1.000:000$000 réis eram sufficientes, e consignou esse reconhecimento neste paragrapho. Por consequencia, não ha uma auctorisação formal do parlamento para este emprestimo, mas uma auctorisação moral, como disse, e uma indicação para pedir esta segunda serie.

S. exa. pergunta-me se o ultramar pagou já os encargos da primeira serie.

O ultramar é obrigado a pagar os encargos do emprestimo, como se vê deste artigo.

(Leu.)

Portanto, quando o parlamento votou esta auctorisação não foi para que ficassem a cargo da metropole os respectivos encargos, mas sim sobre o ultramar.

Perguntado sobre este ponto, eu devo declarar francamente ao digno par, que teem havido algumas faltas no pagamento, mas por caso de força maior.

As seccas que houve em Angola teem feito com que os seus rendimentos diminuissem, e não está na previdência humana obviar a estas circumstancias excepcionaes.

Isto não obsta, porem, a que a provincia pague integralmente os seus encargos, logo que as circumstancias melhorem, porque os rendimentos de que dispõe chegam para isso e para muito mais.

Por esta rasão toda excepcional, apesar da lei ordenar que o pagamento se faça de prompto, entendeu o governo que o não devia exigir.

Com relação a Moçambique aconteceu o mesmo, mas por causas diversas.

O governo seguindo as indicações dos principios da sciencia economica, entendeu dever fazer uma modificação nas pautas daquella provincia, diminuindo os direitos.

Por consequencia, como era natural, os rendimentos provenientes desses direitos diminuíram no primeiro momento, mas essa diminuição, segundo os mesmos principios economicos, ha de ser compensada por um proximo augmento de receita.

Eis o que se me offerece responder sobre este ponto, nada dizendo sobre Cabo Verde e S. Thomé e Principe, porque essas provincias estão no seu estado normal.

O digno par, e meu amigo, lembrou um expediente que lhe foi suggerido por uma reflexão minha. Disse s. exa. que, se na provincia de Angola não havia braços sufficientes para se poderem emprehender as obras, seria melhor adia-las por algum tempo.

Eu devo, porem, responder a s. exa., que apenas soube desta difficuldade, mandei officiar ao governador geral, para que procurasse, por todos os meios á sua disposição, trabalhadores que fossem para as obras publicas, e que me dissesse com a maxima brevidade se sim ou não os encontrava.

Eu não creio que a vida das nações se possa comparar á vida dos ministros, e por isso entendo que não nos devemos apressar nem precipitar, quando podemos pausadamente chegar aos fins que temos em vista, portanto, não

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tenho pressa, nem me fascina a ambição de resolver todos os problemas.

Trabalhar para isso é tudo quanto prometto á camara.

Se eu entender que o adiamento de qualquer das obras, que se teem emprehendido, nos dá vantagem, não terei duvida em acceita-lo como uma necessidade; mas, cumpre-me dizer, que não me parece invencivel a falta de trabalhadores.

A auctoridade que póde faltar ao director das obras publicas, sobeja ao governador geral, por essa rasão appellei daquelle para este funccionario, e espero obter resultado.

Temos montada a machina, e é preciso que lhe demos trabalho.

O pessoal está contratado por tres annos, e se o quizessemos dispensar do serviço, tinhamos de lhe dar uma indemnisação.

Quanto á concentração dos trabalhos, já disse o que me pareceu conveniente, e agora só me resta responder a uma consideração feita pelo sr. conde de Cavalleiros, que eu não tinha ouvido; refiro-me aos adiantamentos e á vinda do engenheiro.

O engenheiro, director das obras publicas de Angola, veiu doente.

Quando algum funccionario publico adoece no ultramar, e a junta de saude, que é o tribunal competente, diz que se não póde conservar na colonia porque periga a sua vida, ninguem póde contrariar-lhe a opinião e a decisão.

Tambem me cumpre dizer que; não houve inconveniente na vinda deste engenheiro, porque trouxe os seus estudos para uma parte do caminho de ferro de Ambaca, e, como os dignos pares sabem, não são só os estudos technicos que podem determinar a directriz de um caminho de ferro, ha rasões economicas e commerciaes a que é preciso attender, e por isso, vindo a Lisboa para se tratar, aproveitou a occasião para elucidar a junta e o governo, sobre a melhor directriz de uma linha férrea tão importante, como deve ser a de Ambaca.

Quanto aos adiantamentos feitos, posso asseverar á camara que foram calculados de forma que, ainda os que parecem maiores, no fim de tres annos hão de estar integralmente pagos á fazenda publica.

Calculou-se de forma que estes adiantamentos successivos serão pagos á fazenda publica dentro de tres annos, ficando assim o estado completamente desaggravado.

Tenho concluido por agora.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, poucas palavras direi.

Das declarações do sr. ministro, conclui eu que estes encargos, em logar de serem pagos pelas colonias, serão pagos pela metropole.

Portanto, sr. presidente, eu voto contra o projecto, porque entendo que podem salvar-se as colonias, mas é forçoso que se salve a metropole, e para isto é necessario organisar a fazenda publica, de forma que desappareça o déficit que hoje existe.

Sobre este ponto nada mais direi. Agora, quanto ao engenheiro que veiu do ultramar, desejaria saber se elle vence estando aqui.

O sr. Ministro da Marinha:- Vence.

O sr. Vaz Preto: - O que se segue é que póde dar-se o caso de procederem todos pela mesma forma.

O sr. Visconde da Praia Grande:- Peço a palavra.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu desisto da palavra, porque o sr. visconde da Praia Grande vae dar explicações a este respeito.

O sr. Visconde da Praia Grande:- Sr. presidente, direi apenas duas palavras, como relator da commissão da marinha e ultramar, com respeito ao projecto que se discute.

A discussão já vae longa, e não admira que a haja quando se trata, como se faz neste projecto de lei, de conceder ao governo uma somma de alguma importancia; não estranho portanto que alguns dignos pares tenham pedido explicações que os habilitem a votar com confiança esta concessão, explicações que o sr. ministro da marinha deu com a elegancia e lucidez com que s. exa. costuma fallar.

Não as darei eu, que o não posso fazer tão bem coma s. exa., nem é essa a tarefa de que eu tenho de me desempenhar como relator da commissão, que não tratou (por que não era esse o assumpto de que tinha de occupar-se) de examinar os contratos que se fizeram com o pessoal technico, nem as condições desses contratos, nem se os vencimentos estipulados são exagerados.

A commissão não podia entrar nestas questões, mesmo porque alem dos esclarecimentos que acompanham o projecto e que estão impressos com o parecer que se discute, não foram apresentados outros á commissão, nem era preciso que o fossem, aquelles sendo OH unicos necessarios para provar que a somma levantada em virtude da lei vetada em 1876 estava gasta, e que portanto novos recursos eram precisos para continuar as obras publicas no ultramar.

A commissão viu unicamente que em consequencia de uma lei que passou nesta casa em 1876, foi o governo auctorisado a gastar 1.000:000$000 réis em obras publicas nas provincias de Africa e que essa mesma lei lhe impunha o dever de pedir nos annos seguintes o que carecesse para proseguir nas obras que tivesse emprehendido.

O ministro (o sr. Andrade Corvo) que apresentou esta proposta pediu 5.000:000$000 réis; a proposta fora approvada na camara dos senhores deputados, mas nesta casa aquella verba foi reduzida a 1.000:000$000 réis, auctorisando-se o governo a pedir todos os annos a somma necessaria para a conclusão das obras; nem outra cousa podia ser, porque a camara comprehende perfeitamente que réis 1.000:000$000 apenas permittiam o começo de obras importantes, quando são divididos por quatro provincias.

Com aquella primeira somma de 1.000:000$000 réis organisaram-se as expedições do pessoal das obras publicas, e nesta parte se ha alguma responsabilidade, a quem ella menos póde caber é ao actual sr. ministro, porque foi no tempo dos seus antecessores, os srs. Corvo e Mello e Gouveia, que se organisaram estas expedições, partindo a de Moçambique ainda durante o ministerio do sr. Corvo, e as de Angola, S. Thomé e Cabo Verde no tempo do ministerio do antecessor do actual ministro.

Ora, sr. presidente, os 1.000:000$000 réis estão gastos e o governo não póde por consequencia continuar as obras sem novo subsidio, e por isso o sr. Mello e Gouveia fez ao parlamento o pedido de mais 1.000:000$000 réis que o seu successor reduziu a 800:000$000 réis e de que trata este projecto, que a commissão da marinha e ultramar recommenda á camara para ser convertido em lei.

E o que podia o governo fazer em taes condições? devia resignar-se a inutilisar os trabalhos feitos? devia desperdiçar aquelles 1 .000:000$000 réis, não vindo a pedir nova auctorisação que o habilite a continuar as obras? por certo que não; o governo faz o que deve e o que não póde deixar de fazer.

E quererá a camara dos dignos pares assumir a responsabilidade de inutilisar todos esses trabalhos feitos e perder as sommas despendidas, negando o auxilio que o governo pede?

Tambem me parece que não póde ser, e que esta camara não póde deixar de approvar este projecto de lei como lhe propõe a sua commissão de marinha e ultramar.

Alem disso, sr. presidente, o projecto apresentado pelo sr. Andrade Corvo em 1876, não era para sobrecarregar a metropole com o encargo de pagar o juro do emprestimo, para que pedia auctorisação, o juro e amortisação devia e deve ser pago pelas verbas que nas nossas possessões ultramarinas são destinadas a obras publicas, e s. exa. calculou que os rendimentos dariam para isso; circumstancias, porem, occorreram em Angola, e em Moçambique, que não

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têem permittido até agora que estas provincias satisfaçam as sommas que deviam dar para o pagamento dos juros do emprestimo.

É sabido por todos que em Angola a falta de chuvas nos ultimos annos tem feito diminuir consideravelmente os rendimentos publicos, e que em Moçambique as novas pautas teem tambem affectado consideravelmente a receita publica, como muito bem explicou o sr. ministro da marinha.

Mas estas causas são accidentaes, devem cessar; em Angola já caíram algumas chuvas que nos dão esperanças de boas colheitas, e vindo ellas, os rendimentos devera subir á altura que já attingiram e a mais.

Em Moçambique, como todos sabem, datam de muito tempo os embaraços financeiros; a guerra chamada do Bonga fez gastar avultadas sommas e causou sensivel diminuição de receita publica numa parte importante da provincia.

O governo entendeu que devia decretar umas pautas mais liberaes, para chamar o commercio estrangeiro aos seus portos; essas pautas decretaram-se; o effeito immediato foi a diminuição da receita, como sempre acontece quando se dão estas mudanças de systema economico, mas é de esperar que este mau effeito seja de pouca duração; que o commercio afflua e que os augmentos dos valores da importação e exportação compensem a diminuição dos direitos que devem pagar.

Em todo o caso, sr. presidente, é uma experiencia a fazer; o governo calculou que as nossas colonias africanas, que tanto carecem de desenvolver os seus recursos, podiam pagar os encargos que trazia o emprestimo necessario para emprehender as obras publicas.

Circumstancias muito excepcionaes não permittiram que no anno passado as esperanças do governo se realisassem, mas nem por isso devemos parar no caminho em que entrámos, perdendo o que está feito, como teria de acontecer se não fosse approvado o projecto em discussão.

Tenhamos paciencia para esperar, e ver se as colonias correspondem ao que dellas se diz; esperemos tres annos, porque por esse periodo, nos disso o sr. ministre, foi contratado o pessoal technico, a quem deveriamos indemnisações se o despedíssemos agora.

Se os nossos esforços não derem resultados que correspondam aos sacrificios feitos, se as provincias ultramarinas não tomarem o desenvolvimento que se espera e não poderem pagar os encargos aos emprestimos, tomemos então outro rumo, mas antes disso parece-me que a camara tomaria uma grande responsabilidade, negando esta auctorisação ao governo, que na minha opinião lhe deve dar.

O governo tem que cumprir os contratos com os empregados, portanto não se justificará por modo algum a negação do voto desta camara a esta auctorisação, o que seria ainda um desperdicio.

Sr. presidente, o debate já vae longo; não quero tomar tempo á camara, nem mesmo podia dizer cousa alguma com relação aos contratos feitos, aos adiantamentos e mais pontos a que os dignos pares se teem referido.

Emquanto ao vencimento que se deve abonar aos empregados das obras publicas que venham ao reino por motivo de doença, eu vou ler á camara o artigo do contrato, de que eu não tinha conhecimento quando hoje entrei nesta "camará, e que é um dos documentos que s. exa. o sr. ministro mandou para a mesa, e que um digno par, e meu amigo, aqui me trouxe.

Este artigo responde completamente á pergunta do digno par, o sr. Vaz Preto.

(Leu o artigo 5.° ao contrato.}

Sr. presidente, s. exa. o sr. ministro disse-nos que uma das maiores dificuldades com que o director das obras publicas em Angola tivera de lutar para dar começo ás obras publicas era pela falta de trabalhadores; é necessario vencer essa difficuldade, indo-os buscar onde os houver, mas que não sejam europeus, porque estes está provado que não resistem ao clima quando se empregam em trabalhos braçaes; é necessario procura-los nos trópicos.

Parece-me que não se dá a mesma escassez de trabalhadores em Moçambique.

S. exa. o sr. ministro leu aqui hoje um officio que dá parte da inauguração dos trabalhos para a construcção de uma ponte e de uma estrada naquella provincia. Eu felicito s. exa. por esta noticia e pela modicidade do custo dessas obras; na verdade 355 metros do ponte por réis lO:OOO$OOO é obra baratissima e que revela a abundancia de braços.

Ora, parece-me, sr. presidente, que, pelo que tenho dito, tenho feito o que em mim cabe para remover as duvidas dos dignos pares que hesitam em approvar este projecto. Não acompanharei s. exas. em todas as suas considerações; não devo tomar tempo á camara, que tem de se ocupar de outros assumptos, nem eu o saberia fazer.

Terminarei, sr. presidente, como principiei, pedindo á cromara que vote este projecto; que não assuma a responsabilidade de frustrar os esforços que o governo tem feito para dar desenvolvimento ás obras publicas do ultramar; o governo tem fé; não lha entibiemos. Esperemos.

Esperemos que os engenheiros acabem os tres annos do seu contraio; esperemos a ver se as provincias do Africa podem pagar os encargos contrahidos, e quando chegar esse. epocha vejamos o que se fez; examinemos minuciosamente tudo que nos parecer que carece de exame; censuremos o que acharmos mau; sejamos então rigorosos e inexoraveis, e se nos convencermos que os resultados não pagam os sacrificios feitos, tomemos outro caminho, tentemos outro systema, e, como diz o digno par, o sr. Vaz Preto, não matemos a metropole para salvar ou não salvar as colonias.

(Entrou o sr. ministro do reino.)

O sr. Presidente:- Está presente o sr. ministro de reino, vae entrar em discussão o parecer n.° 319.

Leu-se na mesa e entrou em discussão.

É o seguinte:

Parecer n.° 319

Senhores. - A commissão especial eleita para dar parecer ácerca do projecto de lei eleitoral, vindo da camara dos senhores deputados sob o n.º 319, e que teve origem na proposta n.º 1-C apresentada pelo ministerio transacto em 7 de janeiro do anno corrente:
Considerando que por elle se estabelecem regras ampliando as presumpções legaes de capacidade para o exercicio do suffragio politico;
Considerando que pelas presumpções ahi estabelecidas se reconhece capacidade eleitoral em todos os cidadãos portugueses que sabem ler e escrever e bem assim em todos os chefes de família, alargando-se por este modo a base fundamental do nosso systema constitucional e representativo:
Considerando que pelo alargamento do voto e suffragio nas condições indicadas não se despreza, antes se reconhece, a necessidade que ha de se exigirem do eleitor garantias efficazes de independencia, intelligencia e moralidade, para poder intervir directamente na designação e escolha dos representantes geraes da nação em côrtes;

Considerando que do alargamento do suffragio resulta, como consequencia natural, a necessidade de se augmentar o numero de deputados, a fim de que o corpo representante seja, quanto possivel, a imagem fiel e o reflexo do corpo representado, e de se modificarem as circumscripções ou divisões territoriaes para a eleição, a fim de tornar a uma mais acessível ao eleitor, e o acto eleitoral mais facil e mais praticável;

Considerando que as mais providencias contidas no projecto sujeito ao vosso exame, relativas á eleição e á escolha dos membros das commissões recenseadoras, assim como ao modo destas funccionarem, têem em vista preencher as omissões, resolver as duvidas que na pratica têem dado occasião a providencias varias e ás vezes encontradas, facilitando assim amplamente aos interessados meios do ré-

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clamarão contra quaesquer irregularidades attentatorias da legalidade e da sinceridade da verificação da capacidade eleitoral do eleitor;

Considerando que, nos expostos termos, as providencias contidas no projecto, se forem, approvadas pela vossa sabedoria, constituirão um sensivel progresso social pelo alargamento da esphera da liberdade politica, a qual serve de baluarte e de trincheira protectora da liberdade civil e dos direitos individuaes do cidadão, e serão ao mesmo tempo um ponto seguro de partida para novos e successivos progressos sem que por isso corram risco a ordem e a tranquillidade publica, ou possam ser ameaçadas as bases fundamentaes das nossas instituições constitucionaes:

Por isso a vossa commissão é de parecer que o projecto vindo da camara dos senhores deputados é digno da vossa approvação.

Sala da commissão, em 11 de abril de 1878.= Conde do Casal Ribeiro = Visconde da Praia Grande = Visconde de Bivar = Conde de Cabral = Diogo Antonio C. de Sequeira Pinto = Augusto Cesar Cau da Costa = Barros e Sá, relator.
Projecto de lei n.° 319

Artigo 1.° São eleitores e para .isso considerados como tendo a renda do artigo 5.°, n.º 1.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, os cidadãos portuguezes de maior idade que souberem ler e escrever, ou forem chefes de familia.

§ .unico. São excluídas de votar as praças de pret não mencionadas no decreto de 30 de setembro de 1852, artigo 6.° § 2.° n.° 4.°, e ficam igualmente subsistindo as exclusões estabelecidas pelo artigo 9.° do referido decreto e mais legislação em vigor.

Art. 2.° O direito de votar, originado no facto de saber ler e escrever, só póde ser reconhecido quando a inscripção no recenseamento eleitoral. Seja solicitada, até 14 de fevereiro pelo interessado, em petição por elle escripta e assignada, e reconhecida por tabellião nos termos prescriptos no artigo 2:436.° § unico do codigo civil.

§ 1.° Se contra qualquer inscripção no recenseamento solicitada em .conformidade do que dispõe este. artigo, houver reclamação fundada em que, o cidadão inscripto não sabe ler e escrever, a commissão recenseadora pôde mandar avisa-lo para que, no praso de tres dias, compareça perante ella para escrever e assignar um protesto contra as allegações da referida reclamação, a qual será julgada fundada se o cidadão inscripto depois de avisado não comparecer ou se recusar a escrever e assignar o protesto.

§ .2.° Os avisos a que se refere o § precedente serão feitos pelos officiaes da administração do concelho ou pelos regedores de parochia ou por empregados da camara municipal, que esta ponha á disposição da commissão do recenseamento.

§ 3.° Das decisões das commissões recenseadoras sobre as reclamações de que trata o § 1.° podem ser interposto s todos os recursos facultados pela legislação vigente.

Art. 3.° É chefe de familia, para os effeitos desta lei, aquelle que ha mais de um anno viver em commum com qualquer seu ascendente, descendente, tio, irmão ou sobrinho, ou com sua mulher, e prover aos encargos da familia.

§ l.° Presume-se que é chefe da familia o ascendente, tio ou irmão mais velho na ordem indicada.

§ 2.° A reclamação e recursos contra a presumpção estabelecida no § anterior só podem ser apresentados por membros da familia, e provados com declarações dos outros membros da mesma familia.

Art. 4.° Para complemento da quantia necessaria* para .qualquer cidadão ser considerado eleitor, ser-lhe-hão levadas em conta todas as contribuições directas, geraes do estado, districtaes, municipaes e parochiaes, em que elle se achar collectado.

§ unico. São consideradas contribuições directas geraes do estado as que como taes são incluidas no orçamento geral do estado.

Arti. 5.º O continente de Portugal, as ilhas adjacentes e as provincias ultramarinas dividem-se para a eleição da camara dos deputados nos circulos constantes do mappa junto, que faz parte integrante d'esta lei.

Art. 6.º Quando se proceder á organização do recenseamento supplementar, depois da promulgação d'esta lei, as commissões recenseadoras dos concelhos ou bairros em que a nova circumscripção tornar inconveniente a actual divisão das assembleas eleitoraes, farão nova divisão d'estas, segundo as regras estabelecidas no artigo 20.º e § unico da lei de 23 de novembro de 1859.

Art. 7.° A nova divisão dos circulos em assembléas eleitoraes é applicavel o disposto nos artigos 21.°, 22.°, 23.° e 24:° da lei de 23 de novembro de 1859, em tudo que não for contrario á presente lei.

§ unico. Em todos os actos relativos a esta divisão serão respectivamente guardados os prasos estabelecidos no artigo 19.° e §§ da presente lei, e alem d'isso praso analoga ao comprehendido entre as duas datas exaradas no artigo. 17.° § 3.° e artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859.

Art. 8:° A eleição das commissões de recenseamento effectuar-se-ha no dia 7 de janeiro.

§ 1.° Se a proposta de que trata o artigo 24.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852 for approvada por tres quartas partes dos membros presentes, observar-se-ha o que dispõe o mesmo artigo § 1.°, para o caso de ser approvada pela maioria dos membros presentes mas por menos das tres quartas partes.

§ 2.° Se a proposta for approvada sómente por metade dos membros presentes, ficarão eleitos os primeiros quatro na ordem da proposta, sendo presidente o primeiro delles. Os outros tres serão eleitos pela metade dos membros presentes, que houverem rejeitado a proposta, observando-se ácerca da eleição o disposto no referido artigo 24.°, § l.º.

§ 3.° A quarta parte do numero dos membros presentes,, da assembléa, não incluindo o presidente, quando este numero não for múltiplo de 4, é a quarta parte do múltiplo de 4, immediatamente inferior, sommada com a unidade. Da mesma maneira se contará em todos os casos similhantes.

§ 4.° Qualquer cidadão eleitor do concelho póde protestar contra a validade da eleição de que trata este artigo.

§ 5.° Os protestos poderão ser feitos tanto por escripto. como verbalmente, e deverão ser apresentados em acto continuo ao da eleição.

§ 6.° Na acta da eleição se fará menção dos protestos, apresentados, e ácerca delles poderá a assembléa allegar o que se lhe offerecer, transcrevendo-se na acta a resposta, que der.

§ 7.° Para a conclusão destes trabalhos a assembléa reunir-se-ha, sendo preciso, no dia immediato ao da eleição, sem dependencia de nova convocatória.

Art. 9.° Sempre que a eleição for impugnada, nos termos do artigo antecedente, o presidente da camara municipal, deixando ficar copia da acta, remetterá a original com os protestos ao governador civil do districto, até ao dia 9 de janeiro.

Art. 10.° O governador civil, logo que receba a acta da eleição impugnada, deferirá o negocio ao conhecimento do conselho de districto, o qual o resolverá até ao dia 14 de janeiro.

§ unico. Para este caso o conselho de districto será constituido pela forma determinada no artigo 268.° do codigo administrativo.

Art. 11.° Se o conselho de districto annullar o acto eleitoral, fixará dia para a nova eleição, o qual não passará alem do dia 22 de janeiro.

Art. 12.° A resolução do conselho de districto será communicada ao presidente da camara municipal no dia immediato áquelle em que for proferida.

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Art. 13.° As commissões recenseadoras installar-se-hão dia 25 de janeiro.

Art. 14.° Até ao dia 15 de fevereiro estará organisado o livro do recenseamento geral.

Art. 15.° Para todas as operações e actos subsequentes se observarão os prasos fixados na lei de 23 de novembro de 1859 e decreto de 30 de setembro de 1852.

Art. 16.° Contra a inscripção ou exclusão de qualquer cidadão, indevidamente feita no recenseamento, póde qualquer eleitor do circulo reclamar perante a respectiva commissão, e recorrer desta para o juiz de direito competente, assim como deste para a relação do districto e desta para o supremo tribunal de justiça, ainda que não fosse parte na reclamação ou recursos anteriores.

§ unico. Os processos de reclamação e de recurso não serão entregues ás partes, mas sim enviados officialmente ao juiz ou tribunal de recurso.

Art. 17.° Da decisão do conselho de districto, a que se refere o artigo 10.°, cabe recurso, sem effeito suspensivo, para o supremo tribunal administrativo.

§ 1.° Se o conselho de districto não tomar resolução até ao dia 14 de janeiro, considera-se indeferida a reclamação.

§ 2.° O recurso contra a decisão do conselho de districto ou contra a falta de deliberação, póde ser apresentado por qualquer cidadão eleitor do concelho ao governador civil, o qual, dentro de vinte e quatro horas, depois de ter recebido a petição de recurso, a enviará officialmente com o respectivo processo ao tribunal superior, onde será julgada no praso improrogavel de quinze dias contados do dia em que tiver dado entrada.

§ 3.° No dia em que o processo der entrada na secretaria do supremo tribunal administrativo, o presidente ordenará a distribuição, e o mandará logo com vista ao ministerio publico, que no praso de tres dias dará a sua resposta escripta.

§ 4.° Voltando o processo com a resposta do ministerio publico, o relator o examinará em outro igual praso, e na primeira sessão seguinte fará o relatorio do processo em .audiencia publica, para ser na mesma sessão julgado em conferencia.

§ 5.° A decisão do supremo tribunal administrativo será tomada em accordão devidamente enunciado e fundamentado, e terá força executiva, sendo este independentemente do decreto do governo, e no dia immediato, communicado á respectiva camara municipal por copia authentica, e publicada na folha official.

Art. 18.° Se contra as eleições repetidas das commissões .de recenseamento houver protestos, seguir-se-ha o processo prescripto nos artigos 8.°, 9.°, 10.°, 11.°, 12.° e 16.°, salvo o disposto nos §§ seguintes.

§ 1.° Guardar-se-hão no processo prasos analogos aos estabelecidos para o primeiro processo.

§ 2.° Os protestos oppostos ás eleições repetidas não teem effeito suspensivo.

Art. 19.° Quando em virtude das decisões proferidas sobre os recursos e protestos de que tratam os dois precedentes artigos, houver de repetir-se o acto eleitoral, não se considerarão invalidadas as operações do recenseamento até então praticadas, e a nova commissão funccionará sómente em todos os actos da sua competencia, que posteriormente hajam de ser desempenhados até ao fim do anno.

Art. 20.° Oito dias depois da promulgação da presente lei reunir-se-hão as commissões recenseadoras e darão principio á organisação do recenseamento supplementar dos cidadãos não inscriptos, que por effeito da presente lei são eleitores.

§ 1.° O recenseamento supplementar será organisado no praso de doze dias a contar da data em que finalisar o praso estabelecido neste artigo.

§ 2.° As petições de que trata o artigo 2.° serão apresentadas até ao penúltimo dia do praso estabelecido no § precedente.

§ 3.° As copias do recenseamento supplementar serão affixadas nas portas das igrejas no praso de tres dias a contar da data em que terminar o praso estabelecido no § 1.°

§ 4.° Para as operações e actos subsequentes observar-se-ha o que dispõem os artigos 11.° §§ 1.° e 2.°, 12.°, 13.° 14.°, 15.°, 16.° e 17.° da lei de 23 de novembro de 1859, guardando-se prasos analogos aos estabelecidos nesses artigos.

Art. 21.° Terminando em 30 de junho ou posteriormente a esta data o ultimo dos prasos a que se refere o artigo precedente, considerar-se-ha definitivamente concluido o recenseamento supplementar com a observancia do disposto nesse artigo.

§ unico. Não se verificando a hypothese para a qual se legisla neste artigo, é applicavel ao recenseamento supplementar a disposição do artigo 18.° da lei de 23 de novembro de 1859.

Art. 22.° O recenseamento supplementar, definitivamente concluido, será considerado para todos os effeitos como additamento ao recenseamento que vigorar no dia immediato ao daquella conclusão.

Art. 23.° A nova divisão dos circulos em assembléas eleitoraes, a que procederem as commissões recenseadoras, modificada em conformidade com as decisões das reclamações, e com as dos recursos que lhes forem apresentadas dentro dos prasos assignados para a formação e conclusão do recenseamento supplementar, considerar-se-ha provisoriamente feita no dia em que for concluido esse recenseamento, e servirá para a eleição que porventura tenha logar antes de terminar o ultimo praso estabelecido no artigo 7.° § unico.

Art. 24.° Depois da promulgação da presente lei, proceder-se-ha á eleição dos deputados pelas provincias ultramarinas para a futura legislatura.

Art. 25.° É auctorisado o governo a reunir em um só diploma e a codificar nelle todas as disposições em vigor relativamente á eleição dos deputados.

§ unico. A execução da presente lei não fica dependente do uso da auctorisação concedida neste artigo.

Art. 26.° Ficam por esta forma alterados o decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852 e a carta de lei de 23 de novembro de 1859, e revogados o decreto de 18 de março de 1869 e a demais legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 9 de abril de 1818.= Joaquim Gonçalves Mamede, presidente - Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, deputado secretario.

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Mappa dos circulos eleitoraes do continente do reino, ilhas adjacentes e provinciaes ultramarinas

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O sr. Conde de Rio Maior:- Sr. presidente, o mundo caminha, e assim como nas sciencias physicas e naturaes todos os dias se fazem novas descobertas, assim tambem nas sciencias moraes e politicas convem estudar e observar, porque o estudo e a observação trazem constantemente a estas sciencias novos e uteis aperfeiçoamentos.

Não sou d'aquelles que não querem reformas, acceito-as quando ellas exprimem a satisfação de grandes necessidades sociaes. Não quero que ellas venham do alto das barricadas, como em França em 1848 e em Hespanha depois da revolução de setembro, entendo que os homens de estado as devem preparar pausadamente, meditando-as, para serem applicadas em tempo opportuno com prudencia e reflexão. Não quero tambem reformas como simples questão de effeito, como acontecia no reinado de Napoleão III, que em cada anno inventava um programma, levando a sua oratoria até ao ponto de acclamar um vez do alto do throno em um discurso celebre a indispensabilidade de, na proxima legislatura, pôr a cupula do edificio! Eu quero, sr. presidente, as reformas como na Inglaterra, como lá se fazem e se preparam. Vou mais longe, estimo e desejo até o periodo de agitação popular, para lembrar e exigir do poder as reformas, justificando a sua necessidade; porem ao mesmo tempo entendo que é indispensavel respeitar a constituição, e que a reforma não deve trazer como consequencia, risco para o nossa estado politico, convindo faze-la dentro de certos limites.

É preciso, não me cansarei de o dizer, que as reformas só se realisem depois de profundamente meditadas e estudadas pelos parlamentos e pelos poderes publicos que teem de intervir. É preciso que os homens de sciencia, no silencio do gabinete pensem no assumpto e escrevam, tomando por esta forma uma parte indirecta, mas activa, na elaboração, das leis.

A Inglaterra é, como sempre, exemplo frisante a este respeito, quando foi a sua ultima reforma eleitoral em 1867, homens eminentes, espirites altamente esclarecidos entraram na luta das idéas, publicando largos trabalhos e obras de grande tomo ácerca da materia.

E se, porventura, os escriptos dos sabios muitas vezes exageram o problema, e vão alem do que rasoavelmente se póde ir no presente, isto não significa indifferença pelas considerações philosophicas daquelles notaveis engenhos, e que os seus escriptos passem desapercebidos e como estranhos ao combate.

As profundas theorias, e a exaltação quasi romântica de Stuart Mill, Hare e Lorimer são popularissimas; todavia, qualquer que seja o respeito pelos talentos brilhantes, a frialdade pratica do legislador não curvou a cabeça perante elles, e a lei foi votada nos limites do possivel, sendo responsavel o parlamento perante o paiz, do bill que lhe cumpria examinar.

Disse aqui o sr. Carlos Bento que uma sessão legislativa muitas vezes se illustra por ter votado uma lei, e tal é o alcance dessa providencia, que fica marcando epocha na historia. Pois, sr. presidente, apesar dos portuguezes fallarem sempre no dia de amanhã, é facto que votámos as reformas mais importantes com uma rapidez pasmosa, os pares do reino levantam-se e sentam-se sem cessar para approvar uma serie de leis que alteram profundamente a nossa organisação politica e financeira, e os projectos collocam-se pelo seu numero de ordem, uns atrás dos outros, e passam nos nossos parlamentos com uma pressa admiravel! (Apoiados.) Não ha tempo, quasi, de pensar e meditar sobre elles.

Lembra-me o que aconteceu a respeito da abolição da pena de morte.

Como passou nas côrtes esta lei? Não julgue a assemblea que eu choro a pena de morte; mas confirmo o facto da importancia deste projecto e a maneira breve como foi approvado. As côrtes votaram de inspiração, e o enthusiasmo exautorou o patibulo.

Recordo-me ainda, passado algum tempo, depois de ter sido sanccionada a lei, encontrei um magistrado, que tinha elevado cargo na jerarchia judicial, contou-me que se via muito embaraçado, porque acabavam do lhe pedir officialmente da Bélgica esclarecimentos, relatorios e os dados estatisticos que tinham motivado a resolução das côrtes, e que elle não sabia o que havia de mandar, pois de tudo nada achava. "Tenha talvez de inventar, acrescentou elle, porque se lá sabem como se votou, julgar-nos-hão mal".

Trago isto, sr. presidente, para provar que nós decidimos as questões mais graves, ou pela generosidade natural do coração portuguez, ou pela indolencia com que encarámos a materia, ou pelo desejo de governar espectaculosamente, muito embora o systema seja perigoso.

Mas, para que meditar os problemas, para que adia-los, até estar a opinião prudentemente formada?

Descobriu-se em Portugal, ha um tempo a esta parte, que na abdicação do paiz, perante um partido, estava a grande arte de conciliar a democracia com o regimen autoritário.

Que importa concessões excessivas? Cá está para nos proteger o sr. presidente do conselho, com todo o seu poder paternal, e se votarmos leis, que representem os principios mais avançados, responde s. exa., como nossa suprema garantia, pela ordem publica nas ruas! Nas ruas, pois, a confusão das idéas cada dia é mais completa.

E se as despezas forem excessivas e a bancarrota nos ameaçar Ateremos os grandes alvitres; pesquizaremos talvez, permitta-me a camara uma agradavel recordação, novas aguas de Bellas, como no projecto n.° 306, e acharemos - quem sabe! - importantes e excellentes bases para futuras operações financeiras, que nos hão de salvar do abysmo! Poderemos levantar sempre, quaesquer que sejam as dificuldades, pela iniciativa deste salutar governo, não digo alguns contos de réis, porem milhares de contos. Não tenhamos receio a este respeito, e estejamos certos de toda a protecção por parte do gabinete.

Sr. presidente, os chefes de familia, os cidadãos sabendo ler e escrever são chamados a votar pelo projecto de lei, mas quaesquer que sejam as duvidas a respeito de tão grande alargamento do suffragio, a sabia organisação dos circulos, que os ternos de 4:000 até 11:000 fogos, garante ao governo a victoria do candidato ministerial.

Diz-se: "a organisação dos circulos funda-se nas condições de população, riqueza, superficie, usos e costumes, facilidade de communicação e trato social entre os differentes povos".

Qualquer que seja a valia do systema, e eu não quero discutir o mappa dos circulos, pois não estou neste momento habilitado para isso, basta-me para o apreciar com justiça as queixas levantadas contra elle por parte dos deputados da opposição. O bello ideal do mappa tem nestas queixas a sua mais eloquente resposta.

O que é indispensavel, sr. presidente, é garantir a independencia moral do eleitor. Eu desejaria que o governo apresentasse neste projecto de lei melhores e mais amplas garantias do eleitor ficar livre da tutela administrativa. Organisado como está o nosso systema eleitoral, tanto o escrivão de fazenda como o administrador do concelho continuam a ser as molas reaes, as grandes machinas de guerra, de que o governo se ha de servir para dispor dos votos á sua vontade e prazer.

É facto, mesmo agora, perante este projecto, o ministerio tem quasi a certeza de fazer triumphar na uma os seus candidatos, e por isso elle está ufano, e pouco lhe importa com a nova lei. O futuro do paiz encerra-se na vida do actual governo. Que importa o resto?

Não o nego, a presente reforma, depois da discussão na camara dos senhores deputados, está melhorada, mas, apezar disso, considero-a deficientissima quanto á possivel influencia do ministro sobre o voto do eleitor; debaixo deste ponto de vista havia muito a regular.

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Diz-se, o fim capital do projecto não é a revisão e a reforma de toda a nossa legislação eleitoral; rias principalmente o alargamento do suffragio, o augmentar embora á imagem do governo - o numero dos circules eleitoraes, e resolver a interpretação de algumas disposições da legislação vigente; porem eu entendo, trata-se de reformar, convinha manter, e muito mais do que se faz no projecto, a independencia do eleitor, era este o ponto capital.

Não neguem os ministros a sua responsabilidade, ella é todo do governo. O actual gabinete é o responsavel pelo mappa dos circulos, pelo grande abandono em que fica o eleitor na presença da corrupção do voto. Eu sei, o governo diz ter herdado o projecto, a iniciativa da proposta não é sua, mas o estudo na commissão, a responsabilidade das modificações feitas, finalmente, a approvação é deste ministerio, e não daquelle de que foi presidente o sr. duque d'Avila. Porem, devo declarar, embora eu acompanhasse a situação transacta, que prestou bons serviços á familia e á religião, e procurou impedir o augmento desregrado da despeza, administrando perfeitamente os negocios publicos, se este projecto tivesse vindo á discussão, existindo ainda esse ministerio, a minha voz havia de levantar-se como hoje, para fazer opposição á lei.

Sr. presidente, o governo, assim como na questão da reforma da camara dos dignos pares, repete que a questão não é constitucional, e em 1872 no artigo 15.° da sua reforma da carta, sustentou que a constituinte tinha de votar sobre serem considerados eleitores os chefes de familia, e os que soubessem ler e escrever. Quer dizer, nesta questão como na outra tem o governo em duas epochas, não muito remotas, duas opiniões differentes!!

Mas, srs. ministros, quaes são as vossas opiniões? Pedieis hontem a pena de morte, e no dia seguinte não tinheis a coragem de a executar! Pedieis a reforma da carta e tremendo diante da vossa obra, não levaes por diante o vosso projecto! Dizieis, que havia um saído positivo no orçamento do estado de mais de 20:000$000 réis, e hoje apresentaes um déficit de 4.000:000$000 réis ou 5.000:000$000 reis! Querieis muitos caminhos de ferro, affirmando haver para elles recursos financeiros, e ires annos depois, no mesmo dia 1 de abril, vindes aqui dizer-nos que não tendes meios para construir mais de um caminho de ferro! Esta declaração foi feita pelo sr. presidente do conselho, e s. exa. acrescentou: "que me importam as contradicções, quando ellas são em vantagem dos negocios publicos!" Srs. ministros, não vos importam as contradicções? Pois bem, nós honra-mo-nos da nossa lógica!

Em negocios de administração, que fizestes vós? Fizestes crua guerra aos vossos adversarios, porque procuravam sensatamente que os dinheiros publicos fossem poupados; e hoje o que acontece?

Não tendes revogado nenhuma das passadas resoluções, todas as portarias estão de pé! Finalmente o governo, como ia o disse, declarou constitucional em 1872 o que hoje assegura poder fazer em sessão ordinaria.

Mas, sr. presidente, os srs. ministros e a maioria aborrecem estas apreciações.

Ouvi, senhores, o que escrevia mr. Duvergier de Hauranne sobre o assumpto identico: "Quando ume, nação, diz elle, não consente que lhe fallem do seu futuro, quando ella prefere fechar-se dentro de muralhas bem cerradas, e limita a sua vista ao horisonte estreito de cada dia, não admira que os espiritos se apaguem, e todos sejamos asphixiados pelo ar corrupto de tão cruel prisão".

Era isto o que dizia um dos publicistas mais distinctos que tem escripto em França sobre estas graves questões.

Sr. presidente, os inglezes quando tratam de uma grande reforma, não se prendem com idéas abstractas. Os inglezes perguntam How it works como funcciona a lei, quaes são os seus resultados?

Não tratam de um bill, como se isso fosse uma peca litteraria, de effeito artístico, examinam a utilidade e consequencias!

O direito eleitoral é um direito natural, um direito positivo, como o direito de propriedade, e o direito de cada um publicar a sua opinião.

As leu; reconhecem estes direitos, mas não podem crea-los, o que não significa historicamente fallando que este direito existisse antes de haver assembléas representativas, do mesmo modo que a propriedade não existiu emquanto o homem não tomou posse da terra.

Incontestaveis estes direitos, não podiam todavia dispensar os facto materiaes que lhes deram origem.

Isto não quer dizer que o direito de votar seja uma liberdade absoluta e primordial, como a liberdade de pensar ou de andar, que se exerce naturalmente, e cujo direito é inviolavel, existindo no estado natural e tendo a sua origem na consciencia individual.

Por isso mesmo, sr. presidente, este direito tem só o seu desenvolvimento numa sociedade politicamente adiantada, devendo estar sujeito a certas regras e restricções necessarias para o seu livre exercicio.

Sr. presidente, em todos os discursos que pronuncio, ou para melhor dizer, nas observações que apresento, procuro sempre escudar-me com opiniões auctorisadas.

Tenho aqui a opinião de Royer Collard, diz elle: "O direito é anterior, as capacidades são as condições em que se exerce o direito, que a todos é commum".

Portanto, ar. presidente, assim como eu rejeito a doutrina do direito eleitoral ser um privilegio, rejeito tambem o principio delle ser um direito inseparável na naturesa humana. Está sujeito a certas prescripções e regras. O poder politico é colectivamente a garantia necessaria dos direitos e interesses privados; mas como é que esta garantia não será inseparável dos direitos que desejo proteger?

Na verdade todos os cidadãos teem direitos a fazer valer, deveres a cumprir, interesses privados, ligados aos geraes, devem portanto pode-los defender, e ter influencia nos negocios publicos; mas nem todas as nações estão suficientemente maduras para este systema, para executar os preceitos democraticos sem restricções.

Eu hesito, se o principio estabelecido no projecto póde ser de grande vantagem para a democracia. Quem o entender assim engana-se completamente, porque chamados ao collegio eleitoral os representantes da ignorancia e da inércia, os progressos da democracia serão apparentes, e quem aproveita immediatamente é o poder autoritário, e mais tarde a demagogia.

Devem pois ser excluidos aquelles que não comprehendem o alcance e a totalidade, devem ser excluidos os proletários.

O suffragio universal está julgado pelo que se passou em França no reinado de Napoleão III, e posteriormente sob uma constituição republicana.

O numero de votos de maioria é sempre o mesmo, quando qualquer dos partidos dominantes precisa consultar a vontade popular a favor das suas idéas!

A lei civil tem os seus interdictos, e porque não os ha ter tambem a lei politica?

Diz Stuart Mill, os governos populares são os que educam e elevam mais o povo, e por isso lhes sou affecto; assim este grande espirito entende que o suffragio deve ser como o premio, a recompensa do progresso intellectual e moral do homem, sendo a sociedade politica como uma escola permanente e o poder o premio da provada capacidade.

O minimo dos requisitos para o eleitor gosar dos seus direitos é, segundo Stuart Mill, saber elle ler, escrever e contar, contentando-se Mill só com isto por se poder provar mais facilmente.

A democracia ingleza admitte o suffragio viril manhood suffrage em opposição ao suffragio fundado no imposto rating suffrage; mas julga dever elle ter condições.

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Bem vê a camara, as minhas auctoridades não são suspeitas.

O grande perigo é uma classe esmagada pela outra. Não quero agora discutir a questão de serem representadas as minorias, esse ponto não está em discussão e teem sido expostos muitos e differentes systemas; ha o systema de representação pessoal, o voto cumulativo, a representação proporcional, o voto ininonimal etc., mas deixemos as theorias, não estão ellas em discussão, e resumamo-nos nos principios práticos que fundamentam o nosso voto sobre as novas classes eleitoraes estabelecidas pelo projecto.

Não nego a vantagem de alargar, talvez, um pouco o suffragio; mas tambem a sociedade precisa assegurar suficientemente o seu bem estar.

Não se julgue que a extenção do direito de votar e o amplo estabelecimento da igualdade eleitoral é a melhor maneira de o paiz ter representadas todas as opiniões.

Pelo contrario, eu vejo a Inglaterra, onde todas as idéas são largamente representadas, ha ali as eleições dos condados, das villas, das universidades, havia- até 1867 os burgos podres, contra os quaes muito se fallou, que a final foram cendemnados, não deixando, por isso, de terem de lá saído Burke, Sheridan, Canning, até mesmo o proprio M. Lowe.

N'esta diversidade de methodos e maneiras está o motivo por que em Inglaterra todas as idéas generosas e grandes teem echo no parlamento.

Não é o suffragio universal que as garante.

Em 1867, não o nego, abaixou-se muito o censo do eleitor inglez; porem estabeleceram-se varias garantias utilissimas, regras que na sua essencia, no seu espirito eu desejara ver quanto possivel aqui admittidas, em relação ao direito de votar dado aos chefes de familia.

Podem em Inglaterra usar d'esse direito todos os - householders - residentes nas villas ou aldeias, que pagam directa ou indirectamente o imposto dos pobres com relação á casa onde moram, os - lodgers - inquilinos que pagam pelo menos 10 libras de aluguer.

Nos condados os - frreholders-fazendeiros, que teem uma renda de 40 libras, e os - copyholders - pequenos rendeiros, possuindo pelo menos 5 libras de rendimento; igualmente são chamados a votar, como nas villas, todos os que pagam o imposto dos pobres na rasão de 12 libras de renda.

As villas de menos de 10:000 habitantes perderam o direito de eleger deputado.

Isto comprehende se, mas dar indistinctamente voto a todos os chefes de familia, como se propõe por este projecto de lei, não me parece conveniente, e francamente no estado em que as cousas politicas se encontram entre nós, eu receio muito desta disposição, que, quanto a mim, só póde concorrer para fazer triumphar no futuro a demagogia.

É contra isto que eu me pronuncio, sr. presidente.

Do que nós carecemos é de garantir a liberdade eleitoral da pressão de certos influentes; porem pelo artigo 1.° do projecto a unica cousa a que se póde chegar é a dar mais alguns passos para alimentar a progressão de certas idéas avançadas, com as quaes não concordo.

Era isto que tinha a dizer, e agora vou concluir por uma declaração.

Em vista da pouca publicidade das nossas sessões, pois o Diario da camara só é publicado muito tarde, e quando já no publico não dispertam a attenção os assumptos de que aqui tratamos, em vista da maneira por que a maioria se tem conduzido com relação á minoria, não transigindo com ella em cousa alguma; em vista da declaração do governo, de que ha de prorogar successivamente as camaras quanto for necessario para que fiquem approvadas todas as leis, o que ha de succeder por força, pois tem grande maioria; em vista destes factos e de todas as circumstancias já longamente apontadas, eu declaro, de ora avante que serei o mais parco e breve possivel nas minhas considerações, limitando-me quasi a declarar só o modo por que voto.

Faço esta declaração perante o paiz, que ha de ainda um dia pedir estreitas contas aos vencedores de hoje, e applicar-lhes severamente a antiga palavra: Vae victoribus!

Disse.

O sr. Conde da Torre (sobre a ordem): - Mando para a mesa um parecer da commissão dos negocios externos.

Lido na mesa foi a imprimir.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. presidente, eu .não conhecia esta lei, recebi-a agora e por isso peço a v. exa. que recommende a quem faz a distribuição dos projectos que faça essa distribuição a tempo.

Nada mais tenho a acrescentar.

O sr. Marquez de Sabugosa: - Sr. presidente, admira-me e surprehende-me que se não levante nenhuma voz por parte do governo ou da commissão para defender este projecto. Parece-me que elle é de tal importancia, que não deveria merecer este abandono.

Sr. presidente, disse eu aqui ha poucos dias que no meu espirito existe a apprehensão de que a verdadeira expressão de voto se realisa melhor pela eleição indirecta, escudada pelo voto universal.

Não cansarei agora a camara, expondo mais largamente esta minha opinião. Inicio-a apenas para dizer que sendo isto uma apprehensão minha, acceito comtudo o principio da eleição directa como constitucional, porque está consignado no acto addicional á carta, e tem por assim dizer, a opinião do partido liberal.

Quizera eu, e parecia-me que se poderia fazer, tratando-se da reforma da lei eleitoral, que se experimentasse a representação das minorias. Esta experiencia que de maneira nenhuma atacava os principios, se não desse completamente a verdadeira expressão da vontade nacional, seria todavia, segundo o meu modo de ver, um correctivo ao abuso da auctoridade, á coacção exercida sobre o eleitor.

Não creio que houvesse o minimo inconveniente em ensaiar nesta occasião um systema que está adoptado em alguns paizes e que outros procuram, como a Inglaterra, ensaia-lo em mais larga escala do que aquella em que já existe.

Não era muito fora da ordem esta experiencia, tanto mais que este principio existe nas commissões de recenseamento, e que já foi apresentado em côrtes um projecto neste sentido pelo ministerio do sr. bispo de Vizeu.

Para o systema da eleição directa, a que estamos acostumados, este projecto traz comsigo já um melhoramento porque dá mais extensão ao voto; não tanto como á primeira vista parece, porque o facto é que, infelizmente, o numero dos que sabem ler é muito pequeno, e os chefes de familia já estavam comprehendidos no censo de 100$000 réis de rendimento estabelecido na lei actual, mas sempre significa um melhoramento, visto que reconhece um bom principio.

Sr. presidente, este projecto que, como acabo de dizer traz comsigo um melhoramento, não é devido á iniciativa do actual governo, mas sim á de v. exa., que foi quem o apresentou ao parlamento com estes dois principios - o alargamento do voto aos que sabem ler e escrever e aos chefes de familia.

Sr. presidente, eu pronuncio-me pelo alargamento do voto, mas o que eu não desejava era que as eleições podessem ser prejudicadas na sua liberdade pela pressão da auctoridade, que póde exerce-la por esta lei.

Eu desejava que o governo não tivesse tantos elementos para poder fazer a pressão eleitoral, como os que resultam das leis que se teem votado este anno que, quasi todas, representam uma arma eleitoral, mais ou menos disfarçada. (Apoiados.)

A reforma administrativa, o imposto do real de agua, a lei em discussão, a reforma da instrucção primaria que está para se discutir, são outras tantas armas de que a aucto-

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ridade póde servir-se para exercer pressão sobre o eleitor.

Agora peço ao sr. ministro do reino que me diga: qual a interpretação que s. exa. dá á phrase da lei que diz: maioridade legal?

Eu creio que s. exa. lhe dá a interpretação mais seguida hoje entre nós, mas, como a carta constitucional marca vinte e cinco annos, e como o acto addicional diz apenas idade, legal, no que parece ter havido consciencia da parte do legislador em marcar como idade legal o que a lei civil designasse, e havendo differentes opiniões a este respeito, até em documentos officiaes, eu desejava que o sr. ministro me dissesse qual é a interpretação que s. exa. lhe dá, porque della depende a maior ou menor amplitude ao direito de votar.

Sr. presidente, não me alargando em mais considerações, e acompanhando o sr. conde de Rio Maior nas suas opiniões e nas considerações feitas por s. exa. para fundamentar o seu voto, direi que o que ha de bom nesta lei deve-se a v. exa., sr. presidente, porque foi iniciativa sua, e por consequencia eu voto o projecto na generalidade, mas não posso approva-lo na especialidade, e muito principalmente na parte que diz respeito á circumscripção eleitoral, que não é a mesma que foi proposta por v. exa.

Eu não tenho confiança no governo, e por uma rasão muito facil de explicar; é porque o meu voto significava confiança, e se eu avaliar este mappa, por todas as outras leis que se teem votado este anno, sobre certos assumptos não posso ter senão rasões de desconfiança.

(S. exa. não reviu o seu discurso.)

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): - Pergunta-me o digno par o que entendo por maioridade legal? Segundo a carta e segundo o acto addicional a maioridade era aos vinte e cinco annos; mas, depois de vigorar o codigo civil, a jurisprudencia esteve incerta por algum tempo. O sr. bispo de Vizeu expediu em 1869 uma portaria na qual declarava que, para os actos eleitoraes, se devia considerar a maioridade legal aos vinte e cinco annos. Em 1870 o sr. duque de Loulé expediu uma circular aos governadores civis, dizendo que a maioridade legal se devia contar aos vinte e um annos e ordenando áquelles magistrados, que quando fosse necessaria a sua intervenção, votassem sempre neste sentido.

Veiu depois o actual projecto, e a camara dos senhores deputados, querendo talvez evitar esta questão, deixou á jurisprudencia o resolve-la como entendesse.

Eu sei que em Lisboa e no Porto, cujos governadores civis consultei, a base do recenseamento tem sido a maioridade aos vinte e um annos. É o que se pratica e está sanccionado pelo supremo tribunal administrativo, que, nos recursos submettidos ao seu julgamento, decidiu que a maioridade legal era aos vinte e um annos. Essa é tambem a minha opinião; mas contando-se a maioridade aos vinte e cinco annos, torna-se preciso estipular isso na lei.

Creio, pois, que não ha inconveniente algum em se conservar sem alteração o que o projecto dispõe a este respeito.

O sr. Marquez de Sabugosa:- É opinião do governo que a maioridade legal se deve contar aos vinte e um annos?

O sr. Ministro do Reino:- É a minha opinião, é a do governo, é das auctoridades; e para mudar agora esta jurisprudencia será necessaria uma disposição que o determine; de outra forma, eu não quereria contrariar a pratica seguida, nem a circular expedida aos governadores civis pelo sr. duque de Loulé.

O sr. Marquez de Sabugosa: - Estimo ter convidado o governo a fazer esta declaração. Ficamos sabendo a sua opinião sobre esta questão, que a camara dos senhores deputados, conforme disse o sr. ministro do reino, deixou duvidosa, pois nada decidiu em definitivo sobre a idade legal.

O sr. ministro do reino declara agora que a maioridade legal é de vinte e um annos; é esta a opinião que estava sendo seguida geralmente: por consequencia, ainda mesmo que não se insira na lei nenhuma disposição a este respeito, fica a opinião parlamentar e a declaração do governo. Entendo que o sr. ministro só por si não podia fazer mais do que fez o sr. duque de Loulé quando recommendou ás auctoridades que a idade legal era a vinte e um annos, e que assim o deviam entender com relação áquelles que tivessem de votar.

Agora que se trata de fazer uma lei eleitoral é a occasião propria para definir este ponto.

O sr. Presidente: - A sessão é amanhã ás duas horas da tarde. Fica inscripto o digno par, o sr. marquez de Vallada, para usar da palavra sobre a materia em discussão.

A ordem do dia é a continuação da que vinha para hoje, e mais o parecer n.° 333, que tem relação com as emendas apresentadas ao codigo administrativo.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 15 de abril de 1878

Exmos. Srs. Duque d'Avila e de Bolama; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Monfalim, de Sabugosa, de Vallada; Condes, de Cabral, de Cavalleiros, do Farrobo, da Fonte Nova, de Linhares, da Ribeira Grande, de Rio Maior, da Torre, do Bomfim, da Louzã; Viscondes, de Alves de Sá, de Bivar, de Fonte Arcada, de Porto Covo, da Praia, da Praia Grande, do Seisal, da Silva Carvalho, de Soares Franco; Barão de Ancede; D. Affonso de Serpa, Ornellas, Mello e Carvalho, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Montufar Barreiros, Larcher, Martens Ferrão, Mamede, Braamcamp, Reis e Vasconcellos, Vaz Preto, Franzini, Menezes Pitta, Eugenio de Almeida, Pinto Bastos, Fontes Pereira de Mello, Andrade Corvo.

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