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582 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

publicamente de não ter elle creado o Supremo Conselho de Defesa Nacional e acceita-o agora como um cilicio cingido aos rins, que lhe lembre, picando-o quando for novamente Ministro da Guerra, que commetteu um erro e que deve só fazer o que lhe prescreva o Supremo Conselho de Defesa Nacional?

Ao que obriga a concentração liberal! O arrependimento é a caracteristica d'este Governo, o amoravel bordão a que se encosta o romeiro carregado de antigos peccados, que é o Sr. Presidente do Conselho.

Eu sou um correligionario do Sr. Sebastião Telles; mas prefiro a attitude clara, de desassombro na opposição e de coherencia com os seus actos, do Sr. Pimentel Pinto, meu adversario politico e com cuja obra militar não concordo, mau grado reconhecer as suas altas qualidades militares e de homem publico.

Ao que obriga a transigencia, essa famosa concentração liberal, que é, pessoal e politicamente, dos factos mais extraordinarios acontecidos n'esta estranha politica portugueza.

Não é só isso, porem, que me causa admiração no Parecer.

Lêem-se n'elle affirmações destoantes da doutrina das bases ou que, pelo menos, d'ellas não transparecem.

Segundo o Parecer, por esta proposta, pela creação do novo orgão superior de guerra, acaba a hesitação no commando e diz-se que o pessoal do Supremo Conselho de Defesa Nacional será o encarregado de dirigir as operações e o que melhor conheça os planos de defesa.

São as palavras com que, nos livros e relatorios militares francezes, se justifica a creação do Conselho Superior de Guerra, de onde sae o alto commando.

Mas onde, nestas bases, ha prescripções que se refiram, como em França, ás relações entre o Conselho e os altos commandos militares, os com mandos das altas unidades?

De França é, como se vê do Parecer, o figurino adoptado.

Procurei em Lauth a organização do Conselho Superior de Guerra, pelo qual foi modelado o nosso Supremo Conselho de Defesa Nacional.

É incompleta a informação.

Só num livro, recentemente publicado este anno, pelo general Bonnal, é que encontro bem definida essa organização, de que darei um leve esboço, cingindo me ás suas informações quasi textualmente.

Em França, o Conselho Superior de Guerra, foi propriamente organizado em 1882, escolhendo-se os generaes tidos como mais illustres para formarem esse conselho, independente do comité de defesa.

Foi reconstituido em 12 de maio de 1888 por Freycinet, Ministro da Guerra, tomando então uma grande expansão.

O Ministro devia consultá-lo sobre questões de disposições essenciaes de mobilização e planos de concentração, organização geral do exercito, estabelecimento de linhas estratégicas, methodos geraes de instrucção, creação ou suppressão de praças fortes, defesa de costas, medidas podendo affectar a commissão do exercito e as condições presentes para o seu emprego. O conselho foi composto de 12 membros, 4 de direito (o Ministro, o Chefe de Estado Maior General, os Presidentes dos comités de artilharia e engenharia) e 8 membros nomeados por decreto especial, uns e outros com residencia em Paris.

Breves dias após, Freycinet assignou um outro decreto dispondo que os membros do Conselho Superior de Guerra podiam ser encarregados de missões especiaes, e dirigir as grandes manobras de muitos corpos do exercito e tomar o commando de corpos do exercito em tempo de paz; e por decreto de 2 de março de 1889 Freycinet resolveu que os membros do Conselho Superior de Guerra designados para o commando de um exercito teriam a inspecção permanente das tropas, estabelecimentos, fortes e praças, comprehendidos no territorio dos corpos d'esse exercito.

Durante o seu Ministerio, em 1899, Gallifet reduziu o Conselho de Guerra a seis ou oito membros, comprehendendo o Ministro, o chefe do estado maior, relator, e os generaes nomeados para commandar um exercito em tempo de guerra. Esses generaes foram postos á frente de um corpo de exercito e deixaram Paris.

Quando o general André foi Ministro da Guerra, derrogou o decreto de Gallifet, restabeleceu o Conselho de Guerra quasi nas condições de 1888 e 1889, augmentou-lhe o numero e os seus membros voltaram a Paris. Em 1903 fixou o numero dos membros em 13. sendo elle mesmo presidente, o chefe de estado maior do exercito, um general de divisão, vice-presidente, e dez generaes de divisão titulares, com as attribuições de 1888, entre outras com o direito de exigir que o Ministro consultasse sobre as medidas que pudessem affectar a constituição do exercito. Apesar d'isso o general André não consultou o conselho sobre o serviço de dois annos e os generaes não protestaram. O vice-presidente é o generalissimo: inspecciona por ordem do Ministro, tal ou tal corpo de exercito, e dirige desde 1900 as grandes manobras de muitos corpos de exercito reunidos. Aos membros do Conselho Superior de Guerra são confiadas inspecções, que não começam antes do mez de junho e acabam em agosto, referindo-se especialmente á mobilização e instrucção dos regimentos.

Com esta organização, claramente definida, comprehende-se que se estabeleça unidade no commando, que não haja hesitação, que o pessoal seja o encarregado de dirigir as operações de guerra e o que melhor conheça o plano de defesa.

Mas onde está, nas bases do projecto, sombra vaga de disposição que justifique as palavras do parecer?

São ellas tão vagas e injustificadas como as de se dizer que um organismo analogo nos seus intuitos ao que existe em Franca e Romania tem produzido fecundos resultados. Em França, não. Alguns numeros da France Militaire d'este anno publicam artigos dos gene-neraes Lamiraux e Prudhomme, mostrando que o Supremo Conselho não realiza a sua missão. Para esse assumpto, chama o capitão Jibé a attenção do Parlamento. O notavel escriptor militar Bonnal diz que as manobras do exercito, inauguradas em 1900, teem sido julgadas fracas sob o ponto de vista de direcção exercida pelo alto commando, que é recrutado n'esse Conselho Superior de Guerra. E tanto este escriptor como o general Zurlinden, nos seus trabalhos de agora, modernos, indicam pontos fracos d'essa organização e até modificações a introduzir. Não são, pois, um dogma, como deve concluir-se do parecer, os fecundos resultados colhidos em França.

Não o são como o não é — até parece ironia! — o dizer-se que pela organização proposta se simplificam os serviços. Simplificam ? Eu quiz fazer um eschema dos organismos que formam o orgão superior de guerra e n'elle se integram. Tenho-o aqui. Se cada um dos Dignos Pares o pudesse examinar, veria que tem a forma, com o seu tronco e ramificações, de uma arvore genealogica. O tronco é o Supremo Conselho de Defesa Nacional: d'elle se geram duas secções, a do exercito e da armada; sobrevêm um neto, que é a commissão superior de estudos da defesa nacional: desdobra-se em dois bisnetos, que são o conselho general do exercito e o conselho general da armada: desata-se em dois terceiros netos, que são as duas commissões de estudo junto de cada conselho, e multiplica-se ainda em quartos netos, que são as quatro secções appensas. Parece um autem genuit biblico! Em que é que ha simplificação de serviços? E a que é que fica reduzida, perante orgão de uma simplificação tão complicada, a situação do Ministro, especificada nas bases I e IV da proposta de lei?