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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 513

Alem d’isso, torno a insistir n’este ponto, o projecto ataca a liberdade de consciencia e o direito natural do patrio poder.

Este principio do projecto de lei é attentatorio e vexatorio, não só pelo que acabo de ter a honra de expor á camara, mas pelo prejuizo material que póde causar á familia.

Diz o sr. relator da commissão «pela lei os pães é que teem obrigação de sustentar os filhos, e não os filhos os pães». Concordo; mas vamos á vida real, vamos á pratica.

Como hontem já provei com exemplos, aos quaes acrescentarei agora mais um, succede muitas vezes os filhos ainda pequenos contribuirem efficazmente para o sustento dos proprios pães, trazendo, como membros da familia, o pão ao lar domestico.

Cito um exemplo passado perto de mim. Em Subserra ha um canteiro, que passa, o dia na pedreira, é pobre e deseja que o filho vá á escola.

Pois, sr. presidente, o que acontece? Esta creança tem de levar todos os dias o almoço ao pae, que trabalha a uma grande distancia da sua residencia, e depois, quando volta a casa, tem de ir buscar lenha para o serviço domiciliar; e esta creança, apesar da boa vontade dos pães, fica no fim do seu trabalho ás vezes tão fatigada que não póde concorrer á escola, que na aldeia está estabelecida.

O sr. ministro do reino diz «na lei está marcado que a obrigação de concorrer ás escolas é só até dois kilometros de distancia»; mas, sr. presidente, as leis não são sempre o que está escripto no artigo.

Assim como acontece com a carta, que tem sido modificada pouco a pouco pelo sr. presidente do conselho, assim acontece com as outras leis, modificam-se na conformidade de certas vontades auctorisadas.

Esta distancia póde ser contada de diversos modos, e não será sempre calculada conforme o espirito dos membros da nobre commissão desta casa.

Não tive tempo, sr. presidente, de estudar este negocio tão bem como queria; mas parece-me que em Inglaterra a frequencia obrigatoria não está estabelecida senão em alguns pontos do paiz e não é lei geral.

A respeito da Allemanha é certo, sr. presidente, que os allemães estão muito adiantados; mas nessa grande nação não encontro certas questões figuradas do modo tão agradavel como muitos julgam.

A Allemanha lucta hoje com uma questão socialista terrivel, que está incutindo pelos seus apóstolos desgraçados principies, e que mostra que se a instrucção lá tem produzido bons fructos, tambem esta quando não e acompanhada pela idéa religiosa dá fructos nocivos.

Disse-se hontem aqui, sr. presidente, que eu era reaccionario, e ao mesmo tempo que tinha a honra e a satisfação de ser abraçado por alguns membros desta casa, tambem ouvia de passagem alcunhar-me com similhante titulo.

Não sou reaccionario, e convido quem quer que soja a apontar nos meus actos, ou mesmo nas minhas palavras alguma cousa que o prove.

Quaes são as palavras reaccionarias que tenho proferido? Ignoro! Eu tenho defendido sempre1 idéas liberaes.

Posso não estar de accordo em certas doutrinas avançadas; mas as escolas liberaes têem-me admittido no seu gremio e não me consta que tenha dito cousa alguma, que obrigue essas escolas a votar-me ao ostracimo.

Custa-me estar respondendo a um homem tão illustrado como é o sr. relator da commissão; mas é em cumprimento do meu dever que o faço.

S. exa. desculpará o mal alinhavado das minhas idéas; porém, como fui obrigado a entrar no debate, e s. exa. respondeu ás minhas observações, devo tambem agora responder ao digno par.

Hontem s. exa., interpretando as minhas palavras severamente era relação ao celebre ministro da instrucção publica em França, mr. Duruy, disse que consagrava muito respeito a este illustre estadista. Eu, porém devo declarar que a escola, a que pertenço, ruão acceita a maior parte dos principios apresentados por aquelle ministro; embora conheça o seu merecimento e o desejo, que elle teve de acertar.

Sr. presidente, careço justificar as rasões por que me arredo das idéas d’aquelle estadista.

Houve uma questão em França em 1867 que chamou muito a attenção dos poderes publicos, qual foi a circular de 30 de outubro de 1867, estabelecendo o ensino secundario das donzellas de quatorze a "dezoito, annos, e commettendo este encargo aos tres mil professores habilitados dos oitenta lyceus, e dos duzentos e sessenta collegios existentes no imperio n’aquella epocha.

Esta questão foi muito discutida e todo o clero catholico atacou por este motivo mr. Duruy, e este, é curioso o facto, quiz justificar-se, allegando que a circular era a interpretação de lei anterior, e que tinha por fim executar a- lei de 10 de abril de 1867, quando, sr. presidente, essa mesma lei só regulava para o ensino primario!

Chamo a attenção da camara para este assumpto, a fim de que a camara possa avaliar bem o espirito de mr. Duruy.

O ministro citou tambem a lei de 15 de março de 1800; mas essa lei permittia abrir cursos publicos, depois do uma declaração do conferente, não seguida de opposição da parte do conselho departamental e realmente ainda aqui o ministro illudia os incautos, pois nada nesta lei era concernente aos cursos de donzellas, estabelecidos na famosa circular de 30 de outubro de 1867.

Mr. Duruy tambem invocou esta mesma lei de l5 de março de 1850, que attribuia aos conselhos municipaes, representantes legaes da familia, como elle dizia a nomeação dos professores; porém este direito não vigorava já, e por isso a garantia para a escolha, que elle pretendia achar nesta lei, não existia para melhor, poder desculpar no publico o acto ministerial.

Sr. presidente, vou ler á camara um trecho, que mostra bem o que se escrevia com relação ao principio sustentado na circular de 30 de outubro. «Resistimos, diz um eloquente escriptor, contra mr. Duruy na sua guerra declarada á religião e á mulher enrista e franceza!»

Um homem eminente que pertence ao clero, um homem que, embora bispo, é considerado com justiça como fazendo parte do verdadeiro partido liberal, d’esse partido liberal, que trouxe prosperidade e gloria á França, e não é a communa nem a demagogia; um homem, digo, que foi consocio de Montalembert, e que tem defendido, como este grande espirito defendia os bons principies, monsenhor Dupanloup finalmente diz o seguinte num folheto, que publicou a respeito da referida circular: « A imprensa incredula applaude e grita que as donzellas vão emancipar-se do jugo da fé, é por isso que eu neste momento levanto a minha voz mais quasi em defeza do lar domestico do que do altar, para conservar aos francezes companheiras dignas d’elles!»

Sr. presidente, não posso analysar agora todos os actos praticados por aquelle ministro, que foi do imperio desde 1863 até 1869; mas em relação a uma das suas principaes providencias apresentei o sufficiente e o escripto de Dupanloup falla mais alto do que muito que eu poderia observar.

Acrescentarei a narração de mais um faceto importante, para o qual peço a attenção da camara.

Em França, quando se tratam estas altas questões de interesse publico, todos dão o seu contingente, e, permittindo a lei de 1850, invocada por mr. Duruy, a abertura de conferencias, pediram mr. Laboulaye, pae do actual ministro de França em Portugal, e de Broglie-licença para este fim. Foi-lhes negada a auctorisação e ao mesmo tempo foi concedida a mr. Taine e Deschanel!

Quando um homem, como mr. Laboulaye, pedia auctorisação para abrir um curso de ensino, não se lhe devia ne-