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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 515

meu credo de conservador liberal, e de respeitador da religião do estado.

Entendo, sinceramente o digo, que o principio da instrucção obrigatoria, como está na lei, é altamente vexatorio para o povo, para o pobre pae de familia, que muitas vezes carece de empregar nos trabalhos dos campos os seus filhos. Isto justamente na idade em que a lei exige que elles frequentem a escola de instrucção primaria, sob pena de multas em que o desgraçado chefe de familia incorreria, até mesmo pela sua ignorancia da lei e das suas prescripções.

O digno par que encetou o debate, já nos edificou com a prudencia que lhe é propria, e propria do seu caracter sisudo e respeitador das boas conveniencias, a respeito da maneira pela qual alguns d’esses professores de instrucção primaria comprehendem o seu sacerdocio! e ensinam ás creanças o respeito devido a Deus, á familia, ás leis do estado e ás auctoridades que a sociedade impõe; não fallando agora na singular maneira como, segundo disse o digno par, alguns professores explicam aos seus alumnos os limites geographicos de Portugal!

Quero crer que isto é apenas uma excepção infelicissima.

No mesmo discurso a que alludo, ouviu hontem a camara, o como muitas vezes succede emigrarem familias inteiras para irem proceder longe de suas casas a trabalhos agricolas, taes como mondas e colheitas da azeitona ou vindimas, isto com o fim de reunirem os parcos meios de subsistencia que lhes são indispensaveis á vida.

Pergunto ao coração bondoso de v. exa. - será justo e benéfico que o desgraçado pae ou tutor d’esses menores, quando regresse á terra natal de qualquer d’essas excursões, tenha de pagar uma multa, para elle pesadissima, por seus filhos terem faltado á escola mais das quarenta vezes em seis mezes, que a lei permitte ou tolera, lei que mui provavelmente o desgraçado pae não conhecerá na maior parte dos casos?

Sr. presidente, muito se tem fallado aqui em Inglaterra, a respeito desse ensino obrigatorio; mas eu creio, e affirmo, que não ha nenhuma similhança entre a lei que discutimos e a lei ingleza; nem poderia haver similhança, porque as circumstancias, costumes e estado de civilisação entre os dois paizes são inteiramente diversos.

Aproveito esta occasião para pedir licença ao digno relator da commissão de lhe offerecer um livrinho summamente interessante que possuo, e que, revestindo a fórma de uma narração agradavel e singela, dá apesar d’isto importantes esclarecimentos ácerca das escolas primarias e outras instituições de beneficencia em Inglaterra. Intitula-se este livro La vie de village en Angleterre.

Sr. presidente, em Inglaterra a iniciativa particular toma grande parte, se não monopolisa tudo quanto diz respeito a instrucção primaria e estabelecimentos de beneficencia; até mesmo a hospitaes, casas de asylo, gabinetes, e livrarias publicas e gratuitas para o povo.

Em Inglaterra, sr. presidente, as auctoridades locaes pela maior parte das vezes precedidas e outras vezes poderosamente coadjuvadas pela iniciativa particular dos ricos e caridosos habitantes das villas e aldeias, e pela dedicação de muitas pessoas philanthropicas e caritativas de ambos os sexos, propagam e desenvolvem, sem intervenção alguma do poder central, a instrucção primaria, e a isto é que eu chamo liberdade bem entendida para o bem do povo, e isto é que eu desejaria ver introduzido, nos nossos costumes, para maior vantagem das boas relações que muito convem existam sempre entre as differentes classes da sociedade.

Sendo, como é, a caridade a mais notavel das virtudes portuguezas, muito facil se nos torna imitar os inglezes neste seu systema pratico de propagar a instrucção popular.

Se é ser retrogrado reclamar o respeito de todos á religião do estado, á constituição e ao Rei, declaro, sr. presidente, que sou um grande reaccionario! Mas estimo tanto como os mais exaltados, a liberdade do ensino; e julgo-me sinceramente liberal, não só por convicção propria, como por tradição, pois que meu pae, avô, tios e parentes, tudo sacrificaram, até mesmo alguns a vida nas prisões e campo de batalha, para implantar n’esta terra esta carta constitucional, que todos nós aqui defendemos! (Muitos apoiados.}

Sr. presidente, como quasi todas as questões de que nos occupâmos n’esta casa, esta da instrucção publica é essencialmente politica.

Ora, na politica como aliás em tudo, existem modas! Algumas destas modas, a meu ver, extremamente perniciosas para o bem da sociedade, introduziu-as o imperio francez, cujo resultado foi funestissimo a essa tão sympathica nação.

Citarei só duas para amostra — suffragio universal e principio das nacionalidades.

Outras dessas perniciosas modas que em nada admiro, são de origem allemã, taes são o serviço militar e a instrucção obrigatoria. Basta a palavra obrigatoria, quando se não trate do cumprimento de um dever, para a cousa ser repugnante.

Os beneficios que trouxeram á França os seus novos principios, todos os conhecem. A perda de duas bellas provincias, a enorme contribuição de guerra que pagou e que bastaria para aniquilar para sempre uma nação menos patriotica, trabalhadora, corajosa e economica do que essa generosa França, que hoje se acha republicana, declarando muitos dos seus mais illustres homens d’estado, que defendem a republica, não por convicção de ser este o melhor dos governos, mas apenas pela rasão de ser na actualidade o unico regimen que garante a permanencia da ordem publica e põe termo á guerra civil!

A Allemanha, sustentando um exercito enorme á custa dos maiores sacrificios, hasteia constantemente a bandeira da guerra, e obriga as outras nações a conservarem armadas esquadras e exercitos formidaveis, emquanto os seus mestres de escola, considerando-se como os verdadeiros vencedores de Sadowa e da França, espalham profusamente o socialismo pela Allemanha! Quem duvidar medite certo artigo ultimamente publicado na Revista aos dois mundos «Le socialisme en AAllemagne».

Sr. presidente, não desejo, conhecendo que as mesmas causas produzem os mesmos effeitos, ver seguir em Portugal as novissimas modas estrangeiras, a que acabo de referir-me. Digo isto, porque ouvi a um illustre amigo e sustentaculo d’esta situação politica, repetir em publico que «as nações pequenas não tinham civilisação propria, e que elle esperava nos chegasse brevemente do estrangeiro o necessario para a verdadeira reforma administrativa do paiz»; (não sei se disse tambem reforma politica).

Seria acaso a republica a panacea?

Este cavalheiro, a que alludo, é ministerial, e foi um dos que mais contribuiu, pela sua eloquente palavra, a derribar o ministerio a que v. exa. dignamente presidia.

Nenhum escrupulo tenho em fazer aqui esta citação, porque se me engano e involuntariamente transtorno as palavras e pensamento do orador a quem alludi, elle tem tribuna publica onde póde reclamar.

Sr. presidente, eu já disse, e não me canso em repetir, sou monarchico e conservador liberal, amante e respeitador das nossas instituições, do nosso Rei e da nossa constituição, que tanto sangue e sacrificio nos custou. (Muitos apoiados.)

Quero tambem ver respeitada dignamente a religião do estado, que todos nós jurámos manter; e admittindo a reforma da carta, entendo que essa reforma só póde ser feita em conformidade com as regras que determina a propria carta, isto com prudencia e circumspecção, em harmonia com o progresso das idéas e modificação dos costumes; mas não posso ver a sangue frio a falta de respeito que quoti-