O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 2585

CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 29 DE AGOSTO

PRESIDÊNCIA DO EX-m0 SR. VISCONDE DE LABORIM VICE-PRESIDENTE

c. i • j- (Conde de Linhares

Secretários: os d.gnos paresjConde da ponte_

(Assistiram os srs. ministros ãa guerra, fazenãa, marinha e justiça.)

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 29 dignos pares, declarou o ex.me sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

Não se mencionou nenhum expediente.

O sr. Visconãe ãa Luz: — É para mandar para a mesa um parecer das commissões reunidas de fazenda e obras publicas sobre o projecto de lei n.° 98 (leu).

Peço a urgência d'este projecto, pois é de tal importância que me parece que se v.t ex.a propozer á camará a dis-

Página 2586

2586

pensa da impressão, para entrar já em discussão, a camará não se negará a isto (apoiados). Assim se decidiu.

O sr. Conde da'Louzã:—É para mandar para a mesa um requerimento de João Veríssimo Máximo da Cruz, ca pitão de fragata da armada, pedindo que se lhe"mande contar ao posto de primeiro tenente a antiguidade de 4 de julho de 1833, para ser presente á commissão de marinha.

O sr. Presidente: — Será satisfeito o desejo do digno par.

O sr. Marquez ãe Vallaãa: — Sr. presidente, é unicamente para um requerimento. Peço que, visto estar a sessão a acabar, seja a ordem do dia o orçamento.

Vozes:—Já está dado.

O Oraãor:—Muito bem.

O sr. Margiochi: — E para mandar para a mesa um parecer da commissão de fazenda relativo ao projecto de lei n.° 99, que tem por fim declarar livres de direitos de consumo as hortaliças, legumes verdes, flores, hervas medici-naes, etc. Esta proposta é muito simples (leu).

Pediria a v. ex.a que propozesse á camará que declarasse este projecto urgente, e fosse dispensado o regimento para entrar já em discussão.

O sr. Presiãente:—Eu não posso inverter a ordem do dia sem consultar a camará.

O Oraãor: — Requeiro que se consulte a camará.

Senão consultaãa approvou a inãicação ão sr. Margiochi.

O sr. Conãe ãe Peniche:—Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento, solicitando do governo certos esclarecimentos sobre matéria que já apresentei aqui na camará. Se v. ex.* quer que leia, leio.

O sr. Presiãente:—E melhor para esclarecer a camará.

O sr. Conãe ãe Peniche:—Leu e mandou para a mesa:

«Requeiro que, com toda a urgência, se peça ao governo, pelo ministério do reino, que faça remetter a esta camará, da contadoria do hospital de S. José:

1. ° Declaração do individuo a quem foram carregados em responsabilidade, no livro respectivo de carga ao cobrador Luiz Francisco Trinité, os conhecimentos de foros relativos á importância referida no decreto de 30 de julho ultimo, em virtude do qual foi demittido da referida contadoria José Lourenço Domingues de Mendonça;

2. ° Certidão da existência da alludida responsabilidade, ou da sua transferencia ou annullação, designando-se n'esta duas hypotheses, a data, o motivo, e a disposição regulamentar que as legalisa;

3. ° Copia authentica do officio dirigido a José Lourenço' Domingues de Mendonça, quando empregado do dito hospital, acerca dos sobreditos conhecimentos, e o recibo da entrega do mesmo officio;

4. " O documento legal, próprio da contadoria do indicado hospital, e assignado pelo dito José Lourenço Domingues de Mendonça com o caracter official de empregado da dita contadoria, que constitua direito a favor do hospital para o tornar anteriormente a 30 de julho ultimo directa e immediatamente responsável pela quantia designada no decreto da sua demissão;

5. ° Copia da ordem dirigida ao dito José Lourenço Domingues de Mendonça, para entrar no cofre do hospital de S. José com a referida quantia, e do recibo da entrega da mesma ordem;

6. ° Certidão da instauração em juizo da respectiva acção judicial, contra o alludido Mendonça, pela distracção da quantia referida no decreto demissorio;

7. ° Declaração de estar ou não em juizo, no acto de se dar a conta ao governo, contra o individuo demittido, a competente acção, e na segunda hypothese a explicação dos motivos porque a acção se não propoz;

8. ° Copia dos termos de ajustamento da conta ao cobrador por foros em dezembro de 1860, e em agosto de 1861, de quaesquer officios dirigidos ao mesmo cobrador sobre conhecimentos não apresentados, e de quaesquer officios d'este a similhanto respeito;

9. ° Declaração de ter ou não dado parte de doente o dito José Lourenço Domingues de Mendonça em 2 de julho ultimo, se esta parte foi justificada legalmente;

10. ° Declaração de qual fosse a posição do mesmo indi-duo no serviço do hospital de S. José no 1.° de julho ultimo; se esta posição tinha por objectos trabalhos de fiscalisação e desde quando os exercia; se o serviço fiscal de que assim estava encarregado tinha relação com a botica, cozinha, dispensa e enfermarias do dito hospital, e do modo como foi desempenhado o mesmo serviço e as reclamações officiaes apresentadas contra esse" serviço;

11. ° Copia do relatório apresentado pela commissão de facultativos, creada em 4 de abril de 1860 para a revisão da tabeliã das dietas;

12. ° Copia de todas as recommendações e elogios que desde a admissão do ihesmo José Lourenço Domingues de Mendonça ao serviço do hospital em 1852, até 30 de julho de 1861 constem dos papeis officiaes da contadoria do hospital de S. José;

13. ° Nota da importância recebida de curativos de militares desde 15 de fevereiro de 1857, e se desde esta epocha foi ou não o dito Mendonça o encarregado do serviço relativo na contadoria e na secretaria da guerra;

14. * Nota das importâncias de foros recebidos por effeito de diligencias do dito Mendonça, e bem assim de quantos prasos, pelas mesmas diligencias passaram da situação de desconhecidos a correntes;

15. * Declaração de ter ou não sido encarregado José Lourenço Domingues de Mendonça, quando empregado da contadoria do hospital de S. José, de commissões extraordinárias de serviço assim dentro do hospital como fóra nas diversas repartições do estado;

16. ° Declaração de se ter ou não organisado na contadoria do hospital processo informativo sobre exposição da

commissão liquidatária do activo do mesmo hospital, creada em 12 de junho de 1856, acerca de quantias provenientes de prestações de egressos, recebidas de cofres públicos e não entradas no do hospital; se pelas ditas quantias havia responsáveis legaes, quem, e em que livros constavam essas responsabilidades, se foram estes ouvidos por escripto, e se se deu conta ao governo d'este negocio, e a quanto montavam essas responsabilidades;

17.° Copia da exposição da dita commissão liquidatária sobre importâncias de curativos de militares recebidas dos cofres públicos, e não entradas no do hospital de S. José.

Camara dos dignos pares do reino, em 29 de agosto de 1861» = Conãe ãe Peniche, par do reino.»

O sr. Presiãente:—Estes requerimentos costumam vo-tar-se logo. Vou portanto pô lo á votação.

Foi approvaão.

O sr. Marquez ãe Vallaãa:—Ê para pedir a v. ex.* que pozesse á discussão, antes de entrarmos na do orçamento, que se deve discutir mais largamente, o projecto de lei que o sr. visconde da Luz ha pouco mandou para a mesa, e que tem por fim a reconstrucção da ponte de Coimbra. É um negocio simples, que não pôde ter grande discussão, e por isso espero que a camará concordará.

Entrou em âiscussão.

parecer n."° 91

Ás commissões de fazenda e de obras publicas foi presente o projecto de lei, já approvado pela camará dos senhores deputados, cuja iniciativa foi do governo, pela qual é o mesmo auctorisado a fazer reconstruir a ponte de Coimbra por qualquer dos meios geralmente em pratica, administração, empreitada, ou empreza, auctorisando-se outro-sim para fazer face, quer ao juro e amortisação da quantia que se levantar, caso a obra seja feita por administração, quer para garantir um lucro, por certo numero de annos, caso se faça por empreza.

A necessidade de reconstruir a ponte de Coimbra tem desde muito tempo sido reconhecida elevando-a, e augmentando a sua secção de fluxo: uma ponte que era alguns mezes do anno não dá passagem por causa das cheias, uma ponte que em muitas occasiões impossibilita a nevegação, uma ponte que serve de barragem e por forma tal que as cheias do Mondego frequente vezes innundão e destroem as propriedades marginaes, não pôde ser tolerada em epocha alguma, e muito menos hoje que por toda a parte se trata de facilitar e auxiliar a viação publica.

Por estas rasões as vossas commissões são de opinião que este projecto seja approvado e convertido em lei.

Sala das commissões, 29 de agosto de 1851. =Visconâe ãe Castro = Barão ãe Villa Nova ãe Foscoa = Felix Pereira ãe Magalhães=Visconãe ãe Castellões=Visconâe ãa Luz = F. S. Margiochi = J. M. Balãy.

projecto de lei n.* 98

Artigo 1.' E o governo auctorisado a mandar reconstruir a ponte de Coimbra por administração, empreitada, ou empreza, com as obras accessorias necessárias de rectificação, e regularisação do alvco e margens do rio Mondego, junto da mesma ponte, depois de devidamente approvado o projecto d'estas obras.

Ait. 2.° O governo poderá decretar com applicação a esta obra.

1. ° Uma imposição de passagem na ponte depois de reconstruída, cujo máximo não poderá exceder o da tabeliã n.° 2 da lei de 22 de julho de 1850;

2. ° Uma imposição nos barcos carregados que navegarem sob a ponte, quer seja para montante, que seja para jusante, cujo máximo não excederá a 30 réis por cada 100 kilogrammas de carga.

Art. 3.' Ambos estes impostos, com a subvenção em dinheiro que for necessária, servirão de base para se contratar esta obra, adjudicando-se a quem a fizer pelo minimo da subvenção, e quando seja construída por administração ou empreitada, os ditos impostos somente se applicarão á amortisação do capital applicado a ella.

Art. 4.° O governo, em vista do projecto e orçamento approvado, proporá ás cortes as sommas necessárias para custeamento da obra ou para o pagamento da subvenção se for construída por empreza.

Art. 5.° Os dois impostos de que trata o artigo 2.° durarão somente, ou o tempo que for fixado no respectivo contrato, caso a obra seja construida por empreza, ou o tempo que for necessário para a amortisação do capital empregado na obra, caso seja construida por administração ou empreitada.

Art. 6.* Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das cortes, em 28 de agosto de 1861. = Gaspar Pereira ãa Silva, vice presidente = Miguel Osorio Cabral, deputado secretario = Antonio Carlos ãa Maia, deputado secretario.

Foi approvaão sem âiscussão, tanto na generaliâaãe, como na especialiãaãe.

Seguiu-se o parecer n.« 90

Foi mandado á commissão de fazenda o projecto de lei n.° 99, vindo da camará dos senhores deputados, que tem por fim isentar de direitos de consumo na alfandega municipal de Lisboa os legumes verdes, hortaliças propriamente ditas, flores, sementes, hervas e raizes medicinaes comprehendidas na classe 5.* da pauta da mesma alfandega: esta medida, que tende a aliviar os consumidores dos vexames de uma fiscalisação incommoda, não podia deixar de merecer a approvação da commissão, sendo por isso de parecer que o mesmo projecto de lei seja approvado por esta camará para subir areal sacção.

Sala da commissão, 29 de agosto de 1861. = Visconãe ãe Castro = Francisco Simões Margiochi= Visconãe ãe Cas-

tellões =Felix Pereira de Magalhães = Barão ãe Villa Nova ãe Foscoa.

projecto de lei n.° 99 Artigo 1.° São declarados livres dos direitos de consumo, a que estiverem sujeitos pela pauta da alfandega municipal de Lisboi, os legumes verdes, hortaliças propriamente ditas, flores, sementes, hervas e raizes medicinaes, comprehendidas na classe 5.* da mesma pauta. Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. Palacio das cortes, em 28 de agosto de 1861.= Gaspar Pereira ãa Silva, vice-presidente= Miguel Osorio Cabral, deputado, secretario = Antonio Carlos ãa Maia, deputado, secretario.

Posto a votos foi approvaão.

ORDEM DO DIA parecer N." 69 Senhores. — Foram presentes á commissão de fazenda os projectos de lei n.°" 70 e 71, vindos da camará dos senhores deputados.

O projecto de lei n.° 70 tem por fim auctorisar o governo a receber, durante o presente anno económico, as-contribuições e impostos directos e indirectos e demais rendimentos do estado mencionados no mappa que faz parte do mesmo projecto e avaliados na quantia total de réis 13.300:960)5907, e bem assim a arrecadar os rendimentos do estado que ficaram por cobrar em 30 de junho próximo pretérito, qualquer que seja o exercicio a que pertencerem, para o seu producto ser applicado ás despezas publicas auctorisadas por lei. Estabelecem-se também pelo mesmo projecto de lei as deducções a que ficam sujeitos os vencimentos de diversos servidores do estado e determina o modo por que o governo poderá apresentar, dentro do mesmo anno económico, a receita que lhe for mister realisar para occorrer com a devida regularidade aos encargos públicos.

O projecto de lei n.° 71 tem por fim auctorisar a despeza ordinária e extraordinária para o anno económico corrente na importância total de réis 14.416:701)5293, assim distribuidos: 4.079:515^280 réis para encargos da divida interna e externa; 2.231:208^682 réis para encargos geraes; 900:848)5736 réis para serviço próprio do ministério da fazenda; 1.438:700^360 réis para o ministério dos negócios do reino; 492:807)5543 réis para o ministério dos negócios ecclesiasticos e de justiça; 2.905:876^538 réis para o ministério da guerra; 984:170)5018 réis para o ministério da marinha e ultramar; 183:886(5028 réis para o ministério dos negócios estrangeiros; 1.845:579)5269 réis para o ministério das obras publicas, commercio e industria; e 74:108(5839 réis para despezas extraordinárias.

.É também auctorisado o governo a abrir créditos sup-plementares para as despezas dos diversos ministérios e da junta do credito publico, quando as quantias auctorisadas pelo mappa annexo ao mesmo projecto não forem sufficientes e'o bem do serviço publico o exigir, devendo poremos créditos supplementares ser restrictos ás despezas mencionados no artigo 2." do mesmo projecto.

Comparando a receita do estado auctorisada pelo projecto de ldi n.° 70 com a despeza de que trata o projecto de-lei n.° 71, resulta um âeficit de 1.115:740-5386 réis para o anno económico de 1851-1862, que comparado com o âeficit de 1.052:424(5324 réis do orçamento apresentado pelo governo em 7 de janeiro ultimo, dá uma differença de réis 63:316(5062 para mais.

Não se oceupará a vossa commissão em iriostrar a rasão-d'esta differença, porque é este o resultado das alterações propostas ao orçamento no parecer de 21 de março d'este anno da commissão de fazenda da camará dos senhores deputados e das resoluções tomadas pela mesma camará por occasião da discussão dos referidos projectos de lei. Tanto esse parecer como a nota d'essas resoluções foram já distribuidos pelos dignos pares.

Se a vossa commissão deplora que, no fim de tantas tentativas para restabecer o desejado equilibrio entre a receita e a despeza ordinária do estado, não se tenha chegado a esse grande resultado; se a vossa commissão reconhece que o âeficit que manifestam os dois referidos projectos de lei tem ainda de ser aggravado com as despezas das estradas e caminhos de ferro em construcção, com a compra do caminho de ferro do Barreiro já approvada por esta camará em sessão de 23 do presente mez, com as quantias extraordinárias ultimamente votadas pela camará dos senhores deputados para obras publicas durante este anno económico; não pôde a commissão deixar de reconhecer também que estas despezas altamente productivas contribuirão para que o augmento da receita das tres alfandegas, de Lisboa, Porto e municipal, venha attenuar esse âeficit, bem como tornar mais productivos diversos impostos calculados no orçamento pelo termo médio do que elles produziram nos últimos cinco annos. Não pôde a commissão deixar de esperar que o governo em vista das novas matrizes se achará habilitado para propor uma distribuição mais equitativa do imposto directo e mais conducente a equilibar a despeza com a receita publica.

Em conclusão, é a commissão de parecer que sejam approvados os projectos de lei n.°' 70 e 71, devendo restabe-lecer-se no mappa que faz parte do ultimo projecto a verba de 6:800)5000 réis da pensão dos herdeiros do conde de Penafiel, eliminada na camará dos senhores deputados. Propõe a vossa commissão esta alteração porque não lhe parece justo atacar contratos existentes, porque não lhe parece util adoptar resoluções que possam prejudicar o credito publico, ao qual estamos recorrendo e temos necessidade de continuar a recorrer se quizermos marchar pela estrada do progresso e da civilisação. Se esta proposta da vossa commissão for approvada, deverá ser restabelecida na despeza do respectivo ministério a verba necessária para pagamento da mesma pensão.

Página 2587

Sala da commissão de fazenda, 26 de agosto de 1861. =Visconãe ãe Castro=Felix Pereira ãe Magalhães=Barão ãe Villa Nova ãe Foscoa (vencido emquanto á pensão de 6:8000000 réis aos herdeiros do sr. conde de Penafiel) =Francisco Simões Margiochi.

Approvaão o parecer salva a ultima parte, passou-se ao projecto cujos artigos foram toãos approvaãos.

Entrou o ãiscussão o

PROJECTO DE LEI N.° 71

Artigo 1.° A despeza ordinária e extraordinária do estado para o anno económico de 1861-1862 é auctorisada na somma de quatorze mil quatrocentos dezeseis contos setecentos um mil duzentos noventa e tres réis (14.416:701(5293).

1. ° A junta do credito publico quatro mil setenta e nove contos quinhentos quinze mil duzentos e oitenta reis (4.079:5150280).

2. ° Ao ministério dos negócios da fazenda, encargos geraes, dois mil duzentos trinta e um contos duzentos e oito mil seiscentos oitenta e dois réis (2.231:208)5682).

Serviço próprio do ministério, novecentos contos oitocentos quarenta e oito mil setecentos trinta e seis réis (900:848,5736).

3. ° Ao ministério dos negócios do reino, mil quatrocentos trinta e oito contos setecentos mil tresentos e sessenta réis (1.438:7000360).

4. " Ao ministério dos negócios ecclesiasticos e de justiça, quatrocentos noventa e dois contos oitocentos e sete mil quinhentos quarenta e tres réis (492:807,5543).

5. ° Ao ministério dos negócios da guerra, dois mil novecentos oitenta e cinco contos oitocentos setenta e seis mil quinhentos trinta e oito réis (2.985:8760538).

6. ° Ao ministério dos negócios da marinha e ultramar, novecentos oitenta e quatro contos cento setenta mil e dezoito réis (984:1700018).

7. ° Ao ministério dos negócios estrangeiros, cento oitenta e tres contos oitocentos oitenta e seis mil e vinte oito réis (183:8860028).

8. ° Ao ministério das obras publicas, commercio e industria, mil e quarenta e cinco contos quinhentos setenta e nove mil duzentos sessenta e nove réis (1.045:5790269).

9. ° A despeza extraordinária, setenta e quatro contos cento e oito mil oitocentos trinta e novo réis (74:1080839).

Art. 2." E permittido ao governo abrir créditos supple-mentares para as despezas dos diversos ministérios e da junta do credito publico, quando as quantias que ficam auctorisadas no artigo precedente não forem sufficientes, e o bem do serviço publico o exigir. Estes créditos porém só poderão recair nas despezas seguintes:

§ 1.* Junta do credito publico: prémios de transferencias e differenças de câmbios.

§ 2.° Ministério dos negócios da fazenda: subsidios e mais despezas das cortes; restituições de direitos de tonelagem e de assucar; tabaco e arroz; juros por operações de the-souraria; despezas de fiscalisação nas alfandegas; quotas de arrecadação nas repartições de fazenda dos districtos e concelhos, e despezas com as matrizes, lançamento e repartição das contribuições.

§ 3.° Ministério dos negócios do reino: instrucção primaria; augmento da terça parte dos ordenados aos lentes e professores de instrucção superior e secundaria que a elle tiverem direito nos termos da carta de lei de 17 de agosto de 1853; differença no preço das forragens para as guardas municipaes, e despezas extraordinárias de saude.

§ 4.° Ministério dos negócios ecclesiasticos o de justiça: sustento de presos e policia das cadeias, vencimentos de magistrados que forem aposentados, augmento da terça parte dos ordenados dos magistrados a quem for conferida em virtude da carta de lei de 17 de agosto de 1853, despezas com as habilitações canónicas, expedição do bulias pontifícias, sagração dos prelados apresentados nas dioceses do reino e transporte de degredados.

§ 5." Ministério dos negócios da guerra: differença na compra de géneros para fornecimento do exercito, medicamentos e roupas para os hospitaes, augmento da terça parte dos vencimentos dos lentes e professores de instrucção superior que a elle tiverem direito nos termos da legislação em vigor.

§ 6.° Ministério dos negócios da marinba e ultramar: differença de preços na compra de géneros'para raçõe3, medicamentos e roupas para o hospital da marinha.

§ 7.° Ministério dos negócios estrangeiros: ajudas de custo de diplomáticos.

§ 8." Ministério das obras publicas, commercio e industria: differença entre o rendimento liquido da companhia dos canaes de Azambuja e o juro de 5 por cento correspondente ao capital ainda não amortisado, differença entre o rendimento liquido consignado á companhia viação portuense e os juros e amortisação garantidos na conformidade do seu contrato, serviço de correios e postas e despeza da commissão de pesos e medidas.

Art. 3.° Os créditos supplementares de que trata o artigo antecedente serão abertos por decretos, ouvido previamente o conselho d'estado. Estes decretos devem ser publicados na folha official e d'elles dará o governo conta ás cortes na sessão immediata.

Art. 4.* O governo remetterá ao tribunal de contas copias authenticas dos decretos pelos quaes abrir créditos supplementares, para por elles regular a fiscalisação que lhe incumbe.

Art. 5.° Cessa no anno económico de 1861-1862 a amortisação da divida externa, auctorisada por carta de lei de 19 de abril de 1855.

Art. 6.9 O numero actual dos officiaes supranumerários nos differentes corpos e armas do exercito será extincto progressivamente.

Art. 7.° Nenhum official do exercito ou empregado ci-

vil com graduação militar, que tenha direito á reforma, será reformado, addido a veteranos, collocado em praça sem accesso ou addido a ella, sem que na importância dos soldos, votada'pela presente lei para a totalidade d'estas classes, tenha vagado a quantia que tiver de resultar da nova collocaçâo.

§ 1.° A disposição d'este artigo é igualmente applicada aos officiae3 da armada e aos empregados com graduações militares dependentes do ministério da marinha que tenham direito á reforma.

§ 2.° Não se comprehendem na disposição d'este artigo as vacaturas que occorrorem pelo fallecimento dos officiao3 a que respeitam as disposições do decreto com força de lei de 23 de outubro de 1851.

§ 3.° A despeza com os officiaes dos batalhões nacionaes que foram reformados ou o vierem a ser, em virtude da carta de lei de 14 de agosto de 1860, constituirá uma verba sobre si e não será contada na somma destinada á reforma dos officiaes e empregados civis do exercito de que trata este artigo.

Art. 8.° O governo não poderá conceder dentro do anno económico de 1861-1862 a quaesquer lentes ou professores dependentes do ministério do reino, vencimentos de publicação sem exercicio que excedam as verbas incluidas na tecção 7.a do artigo 29.° do capitulo 4.° do orçamento do dito ministério, e a importância das vagas que occorrem nos vencimentos da mesma espécie em cada uma d'aquellas duas classes.

§ 1.° Igualmente não poderá conceder aos lentes e professores dependentes do ministério da guerra, vencimentos de jubilação sem exercicio que excedam a importância das vagas que occorrerem nos vencimentos da mesma espécie.

§ 2.° Na concorrência á jubiliação cm cada um dos ditos ministérios serão preferidos os lentes e professores segundo a antiguidade.

§ 3.° Estas concessões não obstam á concessão do augmento do terço do vencimento aos que continuarem no serviço do magistério nos termos da lei em vigor.

Art. 9.° O governo fica auctorisado para empregar na construcção ou no melhoramento dos quartéis militares quaesquer sobras que eventualmente aconteçam nos differentes capitulos do orçamento do ministério da guerra, reforçando com ellas a verba destinada a igual fim no artigo 63.° do mesmo orçamento.

Art. 10." Fica o governo auctorisado a pagar no anno económico do 1861—1862 a despeza que durante elle tiver de fazer-se com o lançamento e repartição das contribuições directas do anno civil de 1862 que pertencem ao exercicio de 1862-1863.

Art. 11.° Os empregados que faltarem ao exercicio das suas funcções, ainda que seja com licença, não gosarão de vencimento algum, salvo competindo-lhes por lei especial. No caso porém de moléstia legalmente justificada ou dedi-cença por este motivo serão integralmente abonados de todos os seus vencimentos.

Art. 12.° Fica revogada toda a legislação e quaesquer disposições cm contrario.

' Palacio das cortes, 20 de agosto de 1861.= Gaspar Pereira ãa Silva, vice-presidente = Miguel Osorio Cabral, de-¦ putado secretario=CTímcZio José Nunes, deputado secretario.

PROJECTO DE LEI N.° 70

Artigo 1.° As contribuições e impostos directos e indirectos e os demais rendimentos do estados mencionados no mappa que faz parto da presente lei, avaliados na somma total de treze mil e trezentos contos novecentos sessenta mil novecentos e sete réis (13.300:9600907 réis) continuarão a ser cobrados no anno económico de 1861-1862, em conformidade das disposições que regulam a respectiva arrecadação, e o seu producto será applicado ás despezas auctorisadas por lei.

Art. 2.° Continuarão igualmente a cobrar-se no mesmo anno os rendimentos do estado que ficarem por arrecadar em 30 de junho de 1861, qualquer que seja o exercicio a que pertencerem, applicando-se do mesmo modo o seu producto ás despezas publicas auctorisadas por lei.

Art. 3.° Os subsidios e vencimentos dos empregados do estado do qualquer natureza que sejam, os dos empregados de estabelecimentos pios subsidiados pelo governo e os dos individuos das classes inactivas de consideração no continente do reino e ilhas adjacentes, que se vencerem no anno económico de 1861-1862, ficam sujeitos a uma deducção que será determinada pela seguinte forma:

1. " Nos que excederem a 0000000 réis, 20 por cento;

2. " Nos que excederem a 3000000 réis e não passarem de 6000000 réis, 15 por cento.

§ 1.° São igualmente isentos de deducção, qualquer que seja a sua importância:

1. ° As gratificações inherentes a commando de corpos ou dc companhias;

2. ° As comedorias dos officiaes e empregados civis da repartição dc marinha embarcados;

3. ° Os prets, ferias e soldadas;

4. ° Os vencimentos dos patrões e remadores das alfandegas e de outras estações publicas;

5. ° As quotas dos empregados incumbidos da arrecadação e fiscalisação dos rendimentos do estado;

6. ° As gratificações e salários por trabalhos com as matrizes, lançamento e repartição das contribuições;

7. ° As gratificações dos officiaes das secretarias por in-demnisação dos lucros do Diário ão Governo.

§ 3.° Os vencimentos excedentes a 6000000 réis nunca podem ficar inferiores a 5000000 réis liquidos, e da mesma forma os que excederem a 3000000 réis nunca podem ficar inferiores a esta quantia.

Art. 4.9 As deducções auctorisadas pelo artigo 3.° formam receita do estado no anno económico de 1861-1862. i

Art. 5.° A dotação da junta do credito publico no anno económico de 1861—1862 é constituída nos rendimentos e pelo modo especificado no mappa a que se refere o artigo 1.°

Art. 4.° A importância das contribuições predial, industrial e pessoal pertencentes ao anno civil de 1861 será entregue á junta do credito publico, pela totalidade da cobrança que se for effectuando nos districtos de Lisboa e Porto; e bem assim lhe será entregue a começar somente desde a abertura dos cofres para a recepção da contribuição predial do referido anno, metade de todos 03 rendimentos que se cobrarem nos districtos de Aveiro, Beja, Braga, Castello Branco, Coimbra, Évora, Faro, Guarda, Leiria, Portalegre, Santarém, Vianna, Villa Real e Vizeu, á excepção dos que toem applicação especial, até se perfazer a dotação proveniente d'aquelles rendimentos' que para a mesma junta é estabelecida n'esta lei.

Art. 7.° As consignações destinadas á junta do credito publico e os demais rendimentos que lhe são votados para satisfação dos encargos a que fica obrigada, não poderão ser em caso algum' desviados pelo governo da sua applicação por qualquer pretexto que seja.

§ único. A junta do credito publico não poderá similhan-temente desviar quantia alguma dos fundos que receber, nem alterar a sua applicação.

Art. 8.° As contribuições publicas auctorisadas pela presente lei não poderão ser desviadas da sua devida applicação. O ministro ou ministros que o contrario fizerem serão processados como réus do crime de peculato e concussão.

Art. 9.° Ficam expressamente prohibidas todas as contribuições publicas, de qualquer titulo ou denominação que sejam, alem d'aquellas auctorisadas por esta lei; e as auctoridades e empregados que as exigirem incorrerão nas penas dos concussionarios. Exceptuam-se as contribuições municipaes, as côngruas dos parochos, as dos coadjutores e as contribuições locaes legalmente auctorisadas, com applicação a quaesquer obras ou a estabelecimentos de beneficência.

Art. 10.° É o governo auctorisado a representar dentro do anno económico de 1861-1862 a parte dos rendimentos públicos que mais convier, para realisar sobre a sua importância as sommas que forem indispensáveis, a fim de occor-rer com regularidade ao pagamento das despezas auctorisadas por lei.

Art. 11.° Poderá o governo applicar ás despezas geraes do estado as sommas que levantar sobre as inscripções pertencentes á dotação do antigo fundo especial de amortisação, e as receitas do mesmo fundo, sem prejuizo dos encargos legaes que têem de ser satisfeitos por esta dotação.

Art. 12." Fica igualmente auctorisado o governo a sup-prir, pelos meios estabelecidos no artigo 3." da lei de 5 de maio do 1860 e artigo 3.° da lei de 20 do mesmo mez e anno, a differença que houver entre as receitas geraes do estado que se realisarem no anno económico de 1861-1862 e as despezas auctorisadas para o mesmo anno na respectiva lei.

Art. 13.° Fica revogada a legislação e quaesquer disposições em contrario.

Palacio das cortes, em 20 de agosto de 1861.= Gaspar Pereira ãa Silva, vice-presidente = Miguel Osorio Cabral, deputado secretario = Cláudio José Nunes, deputado secretario.

O sr. Presiãente:—Para boa direcção dos trabalhos convém consultar a camará sobre a forma da discussão; se ha de ser por ministérios, se por capitulos, se por verbas. Se algum digno par quizer tomar a palavra, pode faze-lo e depois consultarei a camará.

O sr. Margiochi:—Parece-me que a votação da lei que acaba de ser lida, deve recair sobre cada uma das verbas nella mencionadas, isto é, na verba designada para ajunta do credito publico, para encargos geraes, e para cada um dos ministérios e para a despeza extraordinária, quando não houver proposta que altere a somma indicada para qualquer d'essas verbas de despeza. Seria uma tarefa inútil e enfadonha, e para que não temos tempo, oceupar-se a camará de votar cada uma das numerosas quantias que som-madas dão em resultado as sommas votadas na outra camará para os capitulos de despeza a que alludi. Peço pois a v. ex.a que se digne pôr á votação se as despezas devem ser votadas pelo modo que proponho (apoiaãos), ficando salvo o direito a qualquer digno par fazer uma ou mais propostas tendentes a alterar essas verbas.

Consultada a camará, assim o decidiu.

O sr. Marquez ãe Vallada:—Creio que acamara acaba de decidir que a votação fosse por ministérios. A conclusão do parecer que está em discussão, diz o seguinte (leu).

O sr. J. F. ãe Soure: — Peço a palavra.

O sr. Ministro ãa Fazenãa (A. J. â'Avila): — Peço também a palavra.

O Marquez ãe Vallaãa: — Parece-me que so deveria ter em vista esta circumstancia, para cmando se votar, tratar-se d'este assumpto especialmente. É esta a única parte em que ha discordância no parecer da commissão, que no mais approva completamente o projecto. Por emquanto limito-me a fazer esta observação, reservando-me para na discussão ouvir o sr. ministro dos negócios da fazenda. (

O sr. Presiãente:—O digno par, o sr. Soure, quer já usar da palavra, ou quer ouvir antes o sr. ministro?

O sr. J. F. Soure:—Ouvirei primeiro o sr. ministro.

O sr. Ministro ãa Fazenãa:—Eu achava "que para melhor e mais regular ordem dos trabalhos se devia começar a discussão pelo orçamento da receita, que é o projecto n.° 70 (apoiaãos). Assim se simplificaria mais o trabalho, principalmente tendo em vista que a illustre commissão de fazenda approva todo o orçamento, menos a parte a que alludiu o sr. marquez de Vallada, e que se refere ao orçamento da despeza, que é o projecto n.° 71. Seria pois mais regu-

Página 2588

2588

• lar e mais simples começar pelo orçamento da despeza e peço por isso a v. ex.a que ponha primeiro á discussão, o projecto n.* 70.

O sr. Presidente: — A camará ouviu a proposta do sr. ministro da fazenda: os dignos pares que a approvam tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Abriu-se portanto a discussão sobre o projecto n.° 70. O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, não é possivel tratar tão largamente, como desejaria trata-la, e como tenciono faze-lo n'outra occasião, a parte do orçamento que diz respeito á questão da reforma das cadeias. Vem aqui uma verba de 30:293^200 réis; esta é a que votámos para a policia das cadeias e sustento dos presos. A este respeito queria eu dizer ao sr. ministro da justiça, que conhece perfeitamente os progressos que tem feito o systema penitenciário, e não pôde por isso deixar de conhecer a necessidade de augmentar esta verba, e tratar franca e rasgadamente da reforma,das cadeias. Já por outra occasião aqui n'esta tribuna me comprometti a tratar d'cste assumpto; mas quando tivermos tempo, pois seria pouco prudente, seria uma verdadeira estultícia, attendendo ao adiantamento da sessão e ao cançasso dos espiritos, o virmos hoje inaugurar uma discussão tão digna de ser tratada amplamente e com todos os necessários desenvolvimentos. S. ex.a sabe perfeitamente que se têem reunido congressos em Bruxel-las, em Francfort e em outros paizes civilisados da Europa, para se tratar d'esta importante questão, d'este negocio tão momentoso. As capacidades mais notáveis têem dirigido as suas vistas para esta questão, a fim de introduzirem na reforma das cadeias os melhoramentos que demandam as luzes do século, e sobre tudo os principios da moral em que se fundam todas as verdadeiras reformas, e especialmente estadas cadeias; e finalmente tudo o que a boa rasão e a boa politica aconselham n'um assumpto de tão grave importância até nas suas relações com a sociedade, objecto que todo o homem d'estado, todo o homem que ama verdadeiramente o progresso moral e material, não deve nunca afastar de seu espirito, para conseguir que se realiscm ambos os progressos, e se coadunem perfeitamente um com o outro, como succederá Bempre que se não desvairem nem nos principios, nem nos fins, as pessoas que têem a seu cargo levar a effeito essa reforma.

Sr. presidente, ha uma rasão, alem de outras que me obrigou a tomar a palavra, para em curto summario fazer algumas observações. Eu tenho a honra de pertencer a uma commissão que foi nomeada para propor ao governo a reforma das cadeias. Foi o meu amigo o sr. Antonio José d'Avila quem referendou o decreto para a nomeação d'esta commissão, quando s. ex.a era ministro da justiça. Esta commissão não tem adiantado os seus trabalhos de modo tal, que possa habilitar o governo a aproveitar os esclarecimentos que lhe prestassem os membros da commissão, e o motivo da demora, é o haver uma outra commissão que foi encarregada da reforma do código penal, e Ber preciso que estas duas reformas marchem a par.

Aqui vejo eu n'esta casa sentado nos bancos superiores, um illustre cavalheiro, o meu nobre amigo, o sr. Mello e Carvalho: s. ex.a é um jurisconsulto de primeira ordem e faz parte d'essa commissão; um outro illustre cavalheiro que se não senta n'esta casa, mas que é uma das illustra-ções do nosso paiz, o sr. doutor Levy Maria Jordão, também é membro d'ella, e outro cavalheiro a quem eu muito respeito. Estou certo, e sei que os trabalhos d'essa commissão já vão muito adiantados, e confio, assim como confiava já antes de saber qual era a ordem que segue em seus trabalhos, confiava na illustração de ss. ex.as que esses trabalhos poderiam habilitar o governo, prestando um grande serviço ao paiz. A commissão de qu e eu faço parte, entendeu que devia esperar, depois de uma sessão em que se discutiram pontos importantes, nos quaes eu tomei parte, como bem pôde dize-lo o sr. Sequeira Pinto, a commissão entendeu, repito, que devia esperar que aquella que tinha sido encarregada pelo governo, da reforma do código penal adiantasse os seus trabalhos. Eu sei que já alguns d'elles foram apresentados ao governo, e sei que fazem honra aos illustres jurisconsultos que foram encarregados de os apresentar (apoiados).

Eu quero esperar que ss. ex.as os srs. ministros estejam para novembro n'estas cadeiras, que o sr. Avila, o sr. Carlos Bento e o sr. Moraes Carvalho continuem a fazer parte do ministério, pois me parece se acham em luta e vacillan-tes. (O sr. Ministro da Justiça: — Peço a palavra.)

Peço pois ao sr. ministro, e espero que s. ex.a attenda a esta minha pretensão, que para a sessão seguinte faça da sua parte quanto poder, e pôde muito, para que um projecto d'esta ordem seja discutido: porque o governo pôde faze-lo perfeitamente, pois sempre tem poder para isso todo ó governo que possue maiorias tão grandes como tem o governo. Peço-lhe que faça discutir as suas propostas tendentes ao fim que levo dito, que as faça passar com aquelles melhoramentos que a discussão dictar, e que os hom ens públicos aceitam sempre, quaes são os melhoramentos di-ctados pela experiência e pela boa rasão, e que são o resultado do profundo estudo e conhecimento das cousas. Espero pois que o sr. ministro tome nota d'este meu pedido, e que não terei de lhe fazer censura alguma para a sessão seguinte. Aguardo essa occasião, e estimarei bastante te-la para tratar com o sr. ministro da justiça e discutir com s. ex.1, porque gosto de o fazer com homens que discutem as questões no campo dos principios, como s. ex.a costuma fazer. Embora eu discorde de s. ex.a em muitos pontos importantes, não posso deixar de dizer que o sr. ministro trata estes negócios com dignidade e delicadeza.

O sr. Ministro da Justiça (Moraes Carvalho): — A verba que vem no orçamento, e á qual o digno par se referiu, é

unicamente applicada ao sustento dos presos e á policia das cadeias; e mesmo o digno par vê perfeitamente, que militada como é, não podia abranger a reforma das cadeias. Eu concordo perfeitamente com s. ex.a, em que é necessário tratar d'este objecto quanto antes, porque é d'aquelles que mais devem concorrer para a moralidade; mas também devo dizer que este objecto não tem sido descurado pelo governo, pelo contrario, depois que entrei no ministério tratei logo de apresentar um projecto á camará dos srs. deputados, para se estabelecer uma prisão pelo systema celular, e posso dizer ao digno par que pela commissão encarregada de reformar e confeccionar o código penal, já foi apresentada a primeira parte d'esses trabalhos, os quaes na verdade são dignos das illustrações que compõem aquella commissão. Esta commissão adoptou o principio celular como devendo ser a base do nosso systema penitenciário. Como já disse, eu apresentei um projecto, mas não em toda a extensão, para a definitiva reforma das cadeias, porque entendi que era de absoluta necessidade dar principio, posto que ainda por muitos annos nos acharíamos na necessidade de nos servir das cadeias que ora temos. Portanto é indispensável que este mesmo systema, que tem sido tão applaudido pelos congressos de Francfort e Bruxellas, a que o digno par se referiu, se comece a estabelecer entre nós, e se faça quanto antes uma prisão celular que possa servir de norma e de exemplo para todas as outras que se deverem estabelecer.

Escuso de fazer elogios á commissão a que o digno par se referiu; os seus membros são bem conhecidos para merecerem a attenção e respeito de todos, mas devo dizer que o trabalho completo do systema penitenciário cellular depende muito d'esse trabalho apresentado pela illustre commissão ; e depois o governo não ha de despresar as luzes da commissão nomeada pelo meu collega o sr. Avila, quando foi ministro da justiça.

O sr. Mello e Carvalho:—Sr. presidente, começo por agradecer mui cordealmente as expressões benévolas que me dirigiu o digno par o sr. marquez de Vallada, cuja amisade devidamente aprecio; essas expressões porém, permitia-se-me que o diga, na parte que me respeitam, são mais devidas á urbanidade de s. ex.a do que a mérito meu; mas foram bem cabidas, são merecidos e devidos os louvores dados ao sr. dr. Levy Maria Jordão pela sua erudição, zelo, assiduidade que tem desenvolvido n'este importante trabalho da revisão, ou antes confecção do novo código penal portuguez, e bem assim ao sr. José Antonio Ferreira Lima, distincto magistrado e benemérito juiz da relação de Lisboa.

Tendo pronunciado estes dois nomes tão justamente acolhidos, permitta-se me, para que não falte ao reconhecimento de animo agradecido, que faça menção de outros, que tão sabia como efficazmente tem procurado auxiliar com suas luzes, interesse pela sciencia e aperfeiçoamento de penalogia a commissão. Refiro pois os nomes bem conhecidos pelos seus trabalhos scienficos dos srs. A. Bonne-ville de Marsangg, conselheiro da relação imperial de Paris, condecorado com varias ordens honorificas por diversos monarchas estrangeiros em reconhecimento do seu eminente merecimento; Mittermaier, conselheiro privado do gran-duque de Baden, professor na universidade de Hei-delberg; Ortolan, professor na faculdade de direito de Paris; Molinier, na de Toulouse; Hans, professor na universidade de Gand e membro da commissão de revisão do código penal da Bélgica; Eduardo Calmelo, advogado na re-j lação de Paris; Bassolini, professor na faculdade de direito | de Modena; Carlos Levita, professor na universidade de Giessen; Hermann Schletter, professor na de Leipzig. Todos estes distinctos jurisconsultos têem visto, examinado e apreciado a parte geral e philosophica do código penal portuguez e feito suas observações, de que a commissão dará conta opportunamente.

Devo aqui declarar que aos trabalhos, dedicação e decidido amor pela sciencia do sr. Bonneville de Marsangg se deve em grande parte o conhecimento d'este trabalho da commissão. Este distincto jurisconsulto e que justamente pôde ser contado entre os primeiros criminalistas, deu-se ao trabalho de estudar a lingua portugueza, e traduziu para francez os dois relatórios da commissão e os annotou, Ambos correm impresos na Revista critica de legislação e de jurisprudência, tom. 17, pag. 56, 119 e 500, e tom. 18, pag. 123.

Na Allemanha com as suas observações tem também feito conhecer este mesmo trabalho o nunca assas louvado profundo jurisconsulto, o sr. Mittermaier, que tem uma parte tão importante nos códigos criminaes de Allemanha. O sr. Levita dedicou-se igualmente ao estudo da lingua portugueza para melhor comprehender no original as prescripções legislativas e os seus motivos, tanto pôde o amor das sciencias, e o desejo de ser prestavel ao verdadeiro progresso moral e intellectual, e á causa da humanidade.

Sinto grande satisfação em pronunciar os nomes de todos estes eminentes caracteres, e tanto mais pronuncian-do-os na camará dos dignos pares do reino, que sabe apreciar o merecimento e prestar respeito a quem o merece: é também um sincero testemunho de gratidão pelo valioso auxilio que tem dado á commissão e a tão importante assumpto. A influencia de um código penal sobre a moral, sobre os costumes, sobre a segurança, sobre a ordem publica, sobre a propriedade, a industria, finalmente sobre a prosperidade geral, é tão profunda como para assim dizer incalculável. Espero ter occasião em ,que possa desenvolver mais detidamente este meu pensamento.

Em quanto ao systema de prisões, cuja reforma é uma das nossas primeiras necessidades, considero-o não só complexo, como com diversas relações, devendo attender-se a cada uma d'ellas, sem o que as melhores disposições de

um código penal, por melhor elaborado que seja serão improfícuas, principalmente quando as penas na sua máxima parte se reduzem a prisão, e a melhorar o condemnado. O systema cellular adoptado pela commissão, assim como a creação de colónias agrícolas tem merecido dos homens doutos e mais competentes, elogios, que também não approvam o systema mixto. A commissão nos seus relatórios pjocura justificar esta sua preferencia, no que está accorde também o muito digno e illustrado ministro da justiça. Este objecto, sendo como é da mais subida importância não pôde ser tratado por accidente; quando venha a ser impugnado, o que não é de esperar, terá o seu desenvol-mento não só pela sua natureza, como pelas doutrinas de escriptores que mais detidamente se tem oceupado d'esta matéria.

A commissão propõe o complexo de todas estas medidas, porque não podia deixar de o fazer, e espera apresentar 03 seus trabalhos até outubro ou novembro, e talvez já os teria apresentado se não fossem as grandes demoras que tem havido na imprensa; mas com isto não pretendo fazer censuras a ninguém.

O sr. conselheiro administrador geral da imprensa nacional tem-se prestado da melhor vontade, mas a affiuencia de trabalhos quando o parlamento está aberto e muitos outros negócios tem feito talvez com que não tenha podido dar o desejado andamento e expediente, não obstante as minhas reiteradas recommendàções; devendo porém declarar que não tem havido regularidade da parte da mesma imprensa em se me remetter as segundas provas, o que digo com sentimento pelo cuidado que tomo, e que é devido em tão grande assumpto. E de esperar porém que agora affluindo á imprensa menos trabalhos, o expediente seja mais prompto e regular, pelo menos assim o espero e confio do digno conselheiro administrador geral d'aquelle estabelecimento, attendendo mesmo que fará um bom serviço ao paiz no zelo que empregar a este respeito, e é n'este presupposto que digo que a commissão apresentará estes seus tão difficeis como importantíssimos trabalhos no tempo indicado, sem tomar sobre mim a responsabilidade por actos que ine sejam estranhos.

É preciso também dizer, que a commissão nomeada para a revisão do código penal encontrou se em circumstancias de apuro; limitou-se a uma simples revisão, teria sim muito menos trabalho, mas deixaria defficiente e incompleto o systema tal qual está e não satisfaria as idéas do século, as prescripções da sciencia e ás necessidades da sociedade; emprehendeu portanto um trabalho completamente novo debaixo de um outro systema e direcção de idéas, como a camará terá occasião de vêr.

Espero e confio que os tachygraphos tomariam principalmente nota das expressões que proferi com relação aos illustres caracteres estrangeiros que nos têem auxiliado para que se saiba que a camará dos dignos pares sabe fazer-lhes justiça, e que tem por elles a devida veneração.

O sr. Marquez de Vallada: — Apenas farei pequenas observações sobre o que disse o sr. ministro da justiça e o digno par o sr. Mello e Carvalho.

Sr. presidente, eu felicito-me de ter provocado esta discussão, que produziu a promessa que acaba de fazer o digno par, promessa que sendo feita no parlamento tem um muito maior valor do que áquellas que se fazem em particular, e que por isso com dobrada rasão espero ver cumprida. Parece-me ter ouvido dizer ao sr. ministro da justiça, que espera apresentar na próxima sessão, ao corpo legislativo um trabalho que tem por base o systema cellular. Eu estimava, sr. presidente, que se inaugurasse uma discussão franca e larga sobre este importantíssimo assumpto, desejava mesmo que a imprensa o tomasse em toda a consideração, e emittisse a sua opinião, e desenvolvesse, desejo que a tal respeito sejam todos ouvidos, e na ultima estação desejo que nas camaras a matéria se trate largamente e com toda a madureza de que o objecto é credor. Eu não desejo que se apresente um projecto d'estes para se discutir em uma ou duas sessões, e á pressa; não, senhores, quero que se estabeleça essa qualidade de prisões como ha n'outros paizes, mas quero também que se discuta o melhor systema a adoptar, porque ha auctores que votam pelo systema cellular puro, ^outros querem-n'o modificado, outros preferem o mixto. É portanto para se investigar qual dos methodos convirá mais ao fim que se tem em vista, que eu quero uma discussão e larga. A propósito d'isto lembrarei que pedi ao governo remetesse aqui uma estatistica criminal, que me é muito precisa para me servir na argumentação que em occasião opportuna hei de fazer, e para servir igualmente de base ao que terei de propor; e com quanto os srs. ministros saibam, e todos nós, quanto é perigosa e quasi sempre fundada em dados inexactos a confecção de uma estatistica, comtudo ellas sempre ministram algumas bases que podem ter sua utilidade, e por isso peço ao governo que logo que esteja feita a que eu pedi, haja de a mandar a esta camará.

O digno par o sr. Mello e Carvalho, tocou de passagem nas colónias agrícolas, estabelecimentos reconhecidamente úteis, e sobre esta matéria espero também que o governo, na seguinte sessão apresentara algum trabalho, porque tenho a convicção de que nas nossas colónias, ricas como são, podemos não só melhorar o individuo, mas também o território, do qual uma mui grande parte está inculta. Limi-to-me por agora a estas ligeiras observações, e em occasião opportuna melhor as desenvolverei.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscoa: — Como se trata de um objecto importante, foi por isso que eu pedi a palavra para dar um esclarecimento á camará, que poderá aproveitar á commissão se o julgar conveniente. Ha vinte e tantos annos que o sr. José Antonio Guerreiro, sendo ministro das justiças, nomeou uma commissão, á qual encarre-

Página 2589

gou do exame das cadeias, e de indicar e propor o que entendesse ser mais conveniente para melhorar o estado delias. A commissão aceitou esta incumbência, e procedeu a todos os exames e indagações convenientes para ver os defeitos que havia, occupando-se d'este trabalho com todo o zelo de que eram capazes todos os membros que a compunham. Na secretaria respectiva ha de estar o relatório que se fez em resultado d'esse exame, e ali se indicavam todos os melhoramentos que era possivel fazerem-se nas cadeias, tendentes a dar-lhes luz, ar e salubridade, melhores com-modos, e mesmo policia, porque nada d'isto havia n'ellas, como o pede o bem da humanidade e da civilisação. Nós vimos masmorras na torre de Belém, nas quaes os presos estavam com agua até á cintura até que vasava a maré! E foi nossa resolução, logo que tal vimos, recommendar energicamente ao governo que immediatamente mandasse entulhar aquelles calabouços, que eram uma verdadeira tortura igual á dos tempos bárbaros! Nós vimos todas as cadeias minuciosamente, examinámos detidamente os segredos que n'ellas havia, os castigos que se davam, e em geral quanto n'ellas se praticava; e indicámos os melhoramentos que era indispensável se fizessem com toda a prom-ptidão, sem comtudo propor novas construcções por não gravar o thesouro; mas o facto foi, que nada se fez. Esse relatório, repito, foi remettido pela commissão á secretaria das justiças, e deve existir no seu archivo, e talvez as observações e circumstancias que n'elle se referiram possam dar alguma luz ao trabalho que a commissão, agora nomeada, está encarregada de fazer; e muito estimarei eu que ella seja mais attendida do que aquella o foi.

O sr. Mello e Carvalho: — É unicamente para dizer que, com quanto as cadeias em Portugal não tenham as condições que devem ter, comtudo, o sentimento de humanidade também tem tido seu progresso e desenvolvimento. As prisões são más, é verdade, mas os presos não são mal tratados, soffrem os incommodos filhos das circumstancias, mas não da má vontade dos homens: não se tem podido acudir conjuntamente a tudo, é pois de esperar que em breve ellas melhorem e satisfaçam aos seus fins, muito se tem já feito em algumas d'ellas em proveito dos presos.

Esses segredos e calabouços de que fallou o digno par, com relação a outros tempos, já não existem ha muito, e em muitas localidades os presos são soccorridos regularmente, deixando-se-lhes inteiramente o producto dos seus trabalhos, o que se deve felizmente ao systema liberal. É certo que em algumas prisões faltam as condições necessárias, e parecerão talvez mais próprias para guardar ani-maes, do que para reter e melhorar homens. Não sei se no juizo de alguém commetterei alguma inconveniência; mas em honra e credito de quem o digo, não terei duvida em referir um dito todo inspirado pelo elevado sentimento de humanidade, de compaixão e dor para com os infelizes, a quem a sua má sorte ali reclusou: um personagem da mais alta e subida posição entre os homens, visitando uma cadeia em certa occasião disse: que a pena de morte só se justificava pelo estado em que estava aquella prisão, porque seria melhor morrer do que viver n'ella (apoiados). ¦ O sr. Margiochi: — Antes de se discutir este artigo é que me parece que se deve votar a ultima parte do parecer da commissão de fazenda que altera em parte o orçamento vindo da outra casa.

O sr. Presidente:—Vae votar-se. Approvado.

Os artigos 2.°, 3.°, 4.°, 5.", 6° e 7.° approvaram-se sem ãiscussão. Artigo 8.°

. O sr. J. F. de Soure:—Parece-me que ha aqui um erro typographico, que seria bom corrigir, para não passar ao authographo (leu). Eu creio que em logar de publicação ha de ser de jubilqção: mas é preciso emendar este erro. (O sr. Presidente:—É de redacção.) Não, senhor, é um erro typographico, mas que é necessário corrigir.

O sr. Secretario (Conde ãe Peniche):—Segue-se agora a conclusão do parecer (leu).

Osr. Melloe Carvalho (sobre a orãem):—Declaroav. ex." e á camará, porque poderão faltar votos de alguns dignos pares, que não posso votar n'esta questão por motivos pessoaes.

O sr. Presiãente: — Está em discussão.

O sr. J. F. ãe Soure:—Eu peço licença para declarar n'esta camará, que, apesar de professar o maior respeito á pessoa de que se trata, e ter a maior consideração pelas suas qualidades, não posso approvar o parecer. Hei de justificar o meu voto, que deve ser em todas as questões determinado por principios e regras geraes, e sem attenção a nenhumas considerações pessoaes. Tem vindo mais de uma vez a esta casa esta questão, mas parece-me que ainda não assumiu a forma que traz agora; eu tinha esta idéa, tratei de ver se estava illudido, procurei na secretaria esclarecimentos, e todos que me foram dados me convenceram que a questão que se tem aqui apresentado tem sido muito diversa da que agora está para se resolver. E por isso que peço á camará que primeiro que tudo resolva uma questão prévia, e vem a ser: se esta casa se julga competente para tomar a iniciativa de concessão de pensões. Se a camará resolver que o é, ainda desejo que a camará resolva se ella pôde usar d'este direito na lei do orçamento, quando a outra casa não usou da iniciativa, e quando a outra casa não destinou verba alguma para fazer face a essa despeza.

Em poucas palavras, porque a camará ha de estar cansada e não desejo tomar-lhe tempo, eu direi em que fundo a minha duvida a respeito de pensões. Todos sabem que se discutiu por muito tempo, se acaso em virtude de uma disposição da carta constitucional, quando trata das attribuições do poder executivo, se ainda, digo, na camará dos senhores deputados era licito tomar a iniciativa a respeito de

pensões, ou se isso só competia ao governo, não podendo aquella camará senão rejeitar ou approvar.

Tivesse comtudo, ou não tivesse direito, creio que desde que o systema constitucional está estabelecido entre nós ainda d'elle não fez uso tomando a iniciativa sobre pensões, não obstante pertencer-lhe exclusivamente a iniciativa sobre o imposto, em que aquella concessão a final se traduz. Mas por ora o que peço só, é que se fixe a competência, e depois d'ella fixada a este respeito, veremos se é no orçamento, não tendo sido votada verba alguma na camará do3 senhores deputados para esta despeza, se é aqui que nós deveremos usar do direito da iniciativa.

O sr. Presiãente:—Queira mandar a sua proposta para a mesa.

O Oraãor:—A minha proposta é a seguinte:

«Proponho que esta camará resolva se é competente para tomar a iniciativa sobre pensões: resolvida afiirmativãmente se pôde usar d'este direito no orçamento. = Soure.»

Resolvido affirmativamente, que esta camará pôde usar d'esta iniciativa no orçamento, eu não desejo cercear as attribuições d'esta camará, assim como também não quero que ella as amplifique alem d'aquillo que é determinado na lei.

Leu-se a proposta na mesa.

O sr. Marquez ãe Vallaãa:—Sobre a ordem.

O sr. Presiãente:—Antes de consultar a camará se ad-mitte esta proposta á discussão?

O Oraãor:—Sim, senhor.

O sr. Presiãente:—Tem a palavra.

O Oraãor:—Sr. presidente, estou maravilhado com a proposta do sr. Soure. S. ex.a, como par do reino, tem direito para mandar propostas para a mesa; mas permitta-me o digno par que lhe diga não ser esta a occasião própria. Em primeiro logar porque não se trata de uma pensão, trata-se de votar uma verba de .despeza, a qual não é senão a confirmação de um contrato feito ha muitos annos: em segundo logar, porque, considerada como tal, quando tratarmos da matéria era a occasião de suscitar uma discussão tão larga como lhe parecesse melhor sobre esse contrato, em tanto quando podemos discutir um contrato.

Eu por mim não me parece que se possa propor esta questão previa, se a camará dos pares pôde ter a iniciativa sobre pensões, porque também não me parece que se possa votar agora, e só pôde ter por fim impedir a discussão da ultima parte do parecer de que nos occupamos. Não percebo, provavelmente por minha ténue intelligencia, e pouca pratica dos negócios públicos, de que s. ex.* tem muito mais, porque tem mais annos do que eu; mas não percebo que vantagens pôde produzir a sua questão previa. Eu con-sidero-a igual a uma proposta que fizesse outro digno par em resposta á de s. ex.*, per exemplo, para que o orçamento não venha á camará do3 dignos pares, pois que se não podermos fazer alterações á lei da receita e despeza dp estado, é uma ociosidade e uma impertinência vir cá o orçamento. Os corpos deliberantes reunem-se para deliberar, e quando deliberam é porque têem a consciência da deliberação que tomam, alem disso devem ter a liberdade da deliberação, porque sem isso não ha deliberação. E eu pergunto, é ou não é uma deliberação a que a carta exige de nós assim a respeito do orçamento, como de quaesquer outras leis? Se são, a proposta do digno par não tem nenhuma utilidade pratica, a não ser a de estorvar a nossa deliberação.

Foram estas as rasões que actuaram sobre o meu espirito quando pedi a palavra para dizer a v. ex.* que não percebo como havemos discutir esta questão previa. O digno par pôde propor o que quizer para a camará discutir, mas n'esta occasião não me parece opportuno uma discussão puramente doutrinal, e votarei por isso contra a oppor-tunidade da questão previa, e também votarei contra a apreciação em que se baseia, porque não temos aqui uma pensão, trata-se unicamente de um contrato. Esta questão já foi tratada em outra parte, e vi no Diário ãe Lisboa que a senhora condessa de Penafiel tanto tinha entendido que esta verba de despeza lhe não pertencia que ainda não se tinha habilitado. Isto não é exacto, mas quando fosse, os corpos deliberantes deliberam pelos conselhos dos seus membros, e não pelas apreciações dos particulares; não temos portanto nada com a apreciação que fez a senhora condessa de Penafiel, e não é exacto porque e3ta senhora requereu a confirmação e encarte. S. ex.* sabe muito bem que antigamente a habilitação tinha logar na conformidade da ordenação do reino, mas hoje requer-se pelo juiz de direito da primeira vara; ali começa a habilitação, o delegado do ministério publico impugna sempre e appella ex-officio, e depois vae para a relação.

Consta-me que a habilitação da senbora condessa de Penafiel tem seguido todos estes tramites, e por consequência a apreciação que se quiz fundar na falta de habilitação caiu por terra.

Eu digo isto de passagem para responder ás observações que fez o sr. Joaquim Filippe de Soure, mas por emquanto julgo dever ficar por aqui; verei como v. ex.a conduz, como director dos trabalhos a questão, e depois pedirei a palavra.

O sr. Presiãente: — Permitta-me v. ex.a: eu tencionava propor á camará a indicação do digno par; se ella fosse admittida á discussão, é quando me parece que tinham logar as sabias reflexões de v. ex.*; mas agora que tem seguido esta ordem, darei a palavra ao sr. Soure. .

O sr. Soure:—Parece-me que a questão prévia está já em discussão, porque o digno par que se sentou-agora, acabou de a discutir; não sei se o podia estar, mas de facto o está, porque a camará assim o tem consentido, ouvindo com toda a attenção o digno par que combateu a minha proposta.

Diz s. ex.* «não se trata de pensões»; pois então que ó o que estamos a discutir; que diz o parecer da commissão (leu).

Então quem é que lhe chama pensão, 8ou eu ou é a commissão? Ainda mais: «se esta proposta da vossa commissão fosse reprovadas (continuou lenão).

Sr. presidente, eu proponho que esta camará fixe a sua competência sobre a iniciativa de pensões; este é o ponto cardeal, o ponto único da questão; e eu saio da questão prévia, mas esta hei de sustenta-la com o próprio parecer da commissão na mão. Sou eu que lhe chamo pensão, ou foi a commissão que assim denominou? (O sr. Marquez de Vallada:—Eu responderei.) A pensão pôde ser d'esta e d'aquella natureza. Eu direi que ella é de natureza diversa d'aquella que o digno par indica. Isso é para quando tratarmos da discussão sobre o merecimento da pensão. É por isso que eu na questão prévia só peço á camará que fixe definitivamente a sua competência sobre a iniciativa defensões (O sr. Marquez de Vallada: — Sobre a ordem). E ou não iniciativa de pensão o que propõe a commissão? Ninguém dirá que não, porque ella não veiu da camará dos srs. deputados nem do executivo, e portanto a iniciativa é d'esta camará que parte (O sr. Barão de Villa Nova ãe Foscoa: — Apoiado). E onde é que está a inopportunidade da questão prévia? É uma questão meramente de principios, sem applicação a ninguém, e por isso tanto mais digna, tanto mais opportuna e bem cabida. Eu não dou direito ao digno par, nem a qualquer, para se referir a mim; e notando que eu apreciei ou aprecio uma cousa d'esta ou d'aquella maneira por motivo que não seja o que aqui dou.

O sr. Marquez de Vallaãa:—Não foi isso; eu referi-me ao Diário ãet Lisboa, onde se lê um discurso do sr. José de Moraes. É conveniente que o digno par quando se referir a mim, saiba que eu respondo pelas minhas opiniões, mas não consinto que se me torça o sentido d'ellas (O sr. Filippe ãe Soure:—Em que torci eu o sentido?) Na errónea apreciação das minhas palavras: eu referi-me á apreciação do digno par sobre a palavra pensão, e disse o que n'outro logar se tinha passado, referi-me ao Diário e disse, que na outra camará se tinha dito assim; portanto, embora eu não mereça ao digno par a sua attenção, é preciso que quando me quizer responder, ou a qualquer individuo, s. ex.* attenda primeiro ás palavras que se empregam em linguagem intelligivel. Eu costumo ser franco e claro; costumo sempre responder pelas minhas opiniões e sustentar os meus argumentos; peço pois ao digno par que me attenda quando me quizer responder.

O sr. Filippe ãe Soure:—Eu não duvido de que entendesse mal o digno par, que não percebesse que s. ex.a se referia á apreciação do que se disse na outra camará, não ouviria bem, entretanto declaro que não li o tal discurso do sr. deputado José de Moraes; o que eu tenho lido para este caso, são as peças justificativas que apresenta a pessoa que se diz senhora ou proprietária da pensão. Não sei o que se passou em outro logar, não offendi ninguém, o que fiz, o que faço e o que sempre farei é defender a minha opinião com aquella energia de que sou capaz; o que hei de sempre fazer é servir-me doi meus argumentos para sustentar qualquer opinião que tenha. Eu ouvi por duas vezes fallar em apreciação, e como se disse que era inoppor-tuna a minha proposta, e que isto não era uma pensão, foi a isso que eu me referi, e refiro ainda sustentando que sempre assim se lhe tem chamado, e que ainda hoje lh'o chama a illustre commissão; é pois,uma pensão, agora a natureza que ella tem, isso é que tem logar a discutir-se quando tratarmos do seu merecimento e da origem ou direito em que se quer fundar.

Eu não disse que esta camará não podia fazer alteração alguma; enganou-se o digno par, perdoe-me que lh'o diga, o que eu digo é que se não podem destruir as disposições da carta, que marcam em certo3 casos a exclusiva competência de iniciativa na outra camará, o que o digno par também não pôde é destruir o artigo da carta, que manda apresentar na outra camará as propostas do governo antes de virem aqui; eis ahi o ponto, eis ahi o que faz com que eu peça á camará que fixe de uma vez a sua competência n'estas matérias de pensões, pois que não se trata de outra cousa. Se porém se entende que se trata aqui de uma cousa diversa, então proponho que esta ultima parte do parecer volte á commissão para ser reformada de modo que venha depois dizer-se-nos qual a natureza desta proposta e sua denominação (apoiaãos).

O sr. Marquez de Vallaãa:—Tudo isto é sobre a ordem, mas sobre a ordem digo eu que nunca achei mais justas as apreciações que fez um illustre sábio da epocha presente, entrando na academia das sciencias. Disse elle =que uma das primeiras necessidades do século era reformar a(gram matica, e conhecer bem a intelligencia das palavras. =È uma verdade. O digno par, sr. presidente, cuidou que tinha pul-verisado de todo as rasões que eu apresentei quando disse, que isto não era uma pensão, e então veiu com os argumentos mais fortes que podia apresentar, insistindo sempre em que é a commissão que assim denomina a cousa, cha-mando-lhe pensão. É verdade, mas s. ex.* creio que sabe que a lei de 22 de junho de 1846 foi a que tratou da reforma da lei dos foraes, reformando o decreto de 13 de agosto de 1832, e que ahi se trata largamente de foros, censos e pensões. Aqui está como é preciso que se conheça que não nos devemos extasiar diante das palavras; o que é necessário é que saibamos dar-lhes aquelle sentido que ellas devem ter, conforme mesmo a occasião em que são empregadas. Lembra-me agora uma celebre discussão que houve entre um cavalheiro, que dizia a outro que não podia comprehender como elle tinha escripto duas vezes no mesmo documento e na mesma pagina a palavra concelho com c, e conselho com s.

Página 2590

¦2590

Se aqui está benii dizia o primeiro, então está mál lá mais abaixo! Respondia o segundo, pois não sabe que também se escreve censo com c, e senso com s? Pois nas leis eleitoraes não se diz pagará um tanto de censo ? E não se diz que os homens de reflexão e estudo são homens de senso? Esta a resposta que tomo a liberdade de offerecer a s. ex.a Assim é que as palavras que materialmente parecem idênticas têem significação diversa; portanto a palavra pensão, no sentido em que eu a tomei, no sentido em que seguramente a tomou a illustre commissão, não pôde de modo nenhum ser o mesmo que lhe deu o digno par,' olhando só para as letras com que se escreve; e por isso eu disse e digo, que não se trata de pensões da natureza d'aquellas que se concedem ás viuvas dos militares, dos desembargadores e dos beneméritos da pátria, em qualquer ramo em que se tenham distinguido. Não 6 d'essas; isto ó • uma pensão, ou encargo pelo qual o estado se acha pensionado; até se diz, posto que talvez não seja com bastante propriedade, mas diz-se: eu estou muito pensionado, esou-com certos ónus; é ónus é seguramente isto com que o estado se acha sobrecarregado. Eu tenho empregado a mesma palavra pensão em varias escripturas onde se diz: ficando livre de qualquer ónus ou pensão; s. ex.a sabe isto perfeitamente, porque até succede que ainda ha pouco se passou quasi entre nós um caso d'estes. (O sr. Soure:— Entre nós não.) Foi entre pessoa que s. ex." conhece muito de perto. (O sr. Soure: — Apoiado.) Lá está isto escripto (é no arrendamento de uma propriedade do Alemtejo), precisamente : ficando livre ãe qualquer ónus ou pensão. Será pois isto uma pensão igual a estas de que s. ex.a está persuadido que se trata n'este parecer, por não poder haver outras? Diga-o a consciência da camará c de todos nós. Não é de certo, não o foi, não o podia ser, não o foi nunca.

Parece-me ter provado que não me extraviei, e que pelo contrario procurei demonstrar quanto era exacta a minha apreciação. Pedi pois a palavra sobre a ordem por julgar inopportuna a proposta do digno par para uma questão previa, ou questão de direito constitucional. Tratemos d'essa questão, julguemo-la relativamente ao nosso direito; mas faça-se tudo no seu logar próprio, na occasião mais opportuna, não nos queiramos agora servir de uma insidia parlamentar por questão de palavra. (O sr. Margiochi:—Peço a palavra.) Todos temos mais ou menos recorrido a esses meios, e não por mal, mas antes de boamente, só porque não queremos que passe um projecto, uma medida qualquer, ou uma certa proposta. Eu declaro que assim tenho procedido quando me tem parecido que um certo projecto é inconveniente. N'estes casos, quando vejo que não posso atacar de frente, vou torneando, e a experiência tem-me dado a conhecer, desde certo tempo, que todas as cousas que se querem conseguir hão de sempre ser procuradas por via de rodeios, e nunca se deve ir ataca-las de frente.

Vae-se melhor quando se segue um caminho embora mais longo, comtudo mais seguro. A experiência é que me tem feito attender a isto.

Feita esta digressão, que me parece permittida, julgo que tenho dito de mais sobre a ordem, e portanto não quero commetter um excesso que porventura poderia condemnar nos outros; ficando por. consequência outra vez por aqui, reservo-me comtudo o direito de tornar a pedir a palavra, conforme a direcção que se der a este negocio. Mas parece-me ter demonstrado sufficientemente que o digno par, o sr. Soure, não coinprehendeu, a meu ver, bem o sentido da palavra pensão; e como a questão era esta, julgo que estive no bom terreno, dizendo ao digno par que não era opportuna a sua proposta.

Aguardarei agora as rasões apresentadas por parte da commissão.

O sr. Margiochi:—Sr. presidente, darei breves explicações a respeito do assumpto que nos oceupa. A commissão de fazenda escreveu no parecer que se discute a palavra pensão, em logar da palavra compensação, aos herdeiros do conde de Penafiel inserta no orçamento do estado. Parece-me que não vale a pena disculir agora se a commissão fez bem ou mal em escrever pensão e não compensação; porque declaro que a palavra pensão foi escripta no parecer no sentido da verba a que allude ser uma despeza onerosa para o estado, isto é, a commissão empregou esse termo no sentido que lhe deu o digno par marquez de Vallada nas considerações que acaba de fazer. A pensão de que se trata não tem a natureza das pensões de iniciativa do governo approvadas pelas cortes para remunerar os serviços de empregados beneméritos. A pensão dos herdeiros do conde de Penafiel é o resultado de um contrato feito pelo estado com um particular. Assim o têem entendido tanto as cortes como os tribunaes. Discutir se a palavra pensão foi bem ou mal empregada pela commissão, parece-me uma questão pouco própria d'esta camará, porque uma discussão de tal natureza parece-me mais própria de uma academia.

A commissão de fazenda, ou a camará que approvar o seu parecer, não toma a iniciativa sobre uma pensão. A própria commissão diz que deve ser restabeleciãa a verba para pagamento d'essa pensão ou compensação inserta no orçamento do estado para pagamento dos herdeiros do conde de Penafiel, verba que fora eliminada na camará dos senhores deputados. Vê-se pois que a commissão ou que a camará dos pares, se approvar o restabelecimento da verba para pagamento d'este encargo, não toma a iniciativa sobre pensões; porque n'esse caso não faz mais do que restabelecer uma verba inserta na proposta feita pelo governo. Parece-me que não pôde ser negado a esta camará o direito de fazer uma alteração d'esta natureza em uma proposta do governo. Se esta camará não tem a iniciativa sobre impostos, parece-me que tem incontestável direito de restabelecer uma verba de despeza resultante de um contrato. Seria coarctar as attribuições d'esta camará, seria

annullar as suas prerogativas, admittir doutrinas que pu-zessem em duvida o que nunca lhe foi contestado com algum fundamento n'esta casa ou fóra delia.

Em conclusão parece-me, sr. presidente, que para aproveitar o tempo não devo dizer cousa alguma mais acerca de um assumpto que me parece claro, porque seria difficil ou impossível que o parlamento continue a estar aberto. A commissão não faz questão de uma palavra, mas sustenta uma idéa. Se a palavra pensão não agrada, não tem duvida em a substituir pela palavra compensação, ou por qualquer outra que pareça mais apropriada para exprimir o nosso pensamento. Trata-se de um direito, e este é — que a commissão julga justo e conveniente sustentar pelas rasões que expoz no seu parecer.

O sr. J. F. ãe .Soure:—Não desejo demorar muito a discussão. Diz-se pelo lado contrario: «Não é pensão, é compensação; se é pensão, é uma pensão como áquellas de que falia o decreto que providenciou a respeito dos foros.» O que eu digo aos dignos pares é que uma pensão como encargo sobre a receita do estado não pôde ter a significação que ss. ex.as lhe querem dar, porque a natureza é diversa. Mas diz-se: é compensação, é foro, pois se a camará assim o declarar retiro a minha proposta.

A maioria d'esta camará está até certo ponto compro-mettida n'esta questão pelas suas votações anteriores; mas o que eu desejo é fundamentar o meu voto, e deixar bem consignadas as minhas opiniões, porque a camará pôde en-volver-se em graves difficuldades para o futuro dando este passo; e por isso quero entrar na questão quanto antes para deixar bem claramente expendidas as minhas idéas sobre os pontos capitães. Se não querem que lhe chamem pensão, chamem-lhe o pagamento de uma divida sagrada, chamem-lhe foro, que eu retiro logo a minha proposta; tudo está em a commissão alterar o termo. (O sr. Margiochi:—Está alterado.) Eu não tenho em vista declinar a questão, porque sei que o resultado ha de ser opposto ás minhas idéas.

Agora, a respeito da apreciação da iniciativa que fez o digno par que acabou de fallar, a isso me opponho eu. Na camará dos srs. deputados é que o governo apresentou, como lhe cumpria, o orçamento do estado; o que para aqui veiu foi apenas uma copia d'elle para simples conhecimento d'esta casa, e o orçamento official aqui é este que forma o projecto de lei, e que foi approvado na camará dos srs. deputados, e por ella remettido para aqui; portanto a camará dos pares não pôde estabelecer uma verba nova de despeza, porque necessariamente se lhe ha de applicar um imposto para occorrer a essa despeza, que é o que prescreve o acto addicional muito claramente. Se a camará o fizer sáe das suas attribuições.

O orçamento official para esta camará é o que vem approvado da outra casa; tudo o mais desappareceu, como des-appareceu o orçamento do anno passado, porque nenhum pôde durar mais de um anno, e os impostos do mesmo modo; portanto não se venha argumentar d'esta forma. Isto não são questões de palavras, são questões de idéas, e idéas muito graves, sobre as attribuições dos poderes públicos; o que quer dizer restabelecer uma verba no orçamento que foi mandado a esta mamara? Não sei. O que sei é que o governo o que mandou foi uma copia do orçamento que apresentou á outra camará; mas isso não é apresentado offi-cialmente e como proposta de lei, nem o governo, ainda que quizesse, o podia fazer, porque lh'o veda a lei fundamental; apresenta-se na outra camará, e de lá é que vem para esta official e constitucionalmente; esta é quo é a questão. O orçamento legal é este que veiu da outra camará, podemos discuti-lo e altera-lo, mas em conformidade da lei fundamental.

Vamos pois á questão sem intuito nenhum partidário nem politico, porque para mim não pôde ser indifferente a questão das attribuições dos corpos políticos, e por isso as quero claramente definidas como estão na lei fundamental do estado. Se a commissão retira a palavra pensão, eu retiro também a proposta.

O sr. Tavares Proença:—Estou admirado de ver que a camará se entretenha com uma questão meramente de palavras, que todos nós entendemos perfeitamente bem; e noto que isto aconteça depois de se ter votado o orçamento geral do estado, sem merecer uma única observação com relação qualquer verba d'elle!

Sr. presidente, eu entendo que, quando o digno par o sr. Soure contestou a esta camará o direito de ter a iniciativa sobre pensões, entendeu áquellas pensões que se davam ou deveriam dar segundo o regimento das mercês: e que o digno par o sr. marquez de Vallada entende que esta pensão de quo tratámos deriva não de mercê, mas ãe jure in re; e que havia ahi uma propriedade que foi vendida e o vendedor, em vez de receber o preço de contado, recebeu uma pensão ou prestação perpetua, que é o sentido da palavra.

Mas como a commissão de fazenda declara, que retirava do parecer a palavra pensão, para a substituir por prestação ou outra similhante, a questão fica não valendo nada, e é para lamentar que com ella se tenha gasto tanto tempo. Agora pelo que respeita á questão de doutrina, isto é, ter ou não ter esta camará iniciativa sobre pensões, entendo que emquanto áquellas pensões que derivam do direito de propriedade, e que se estabelecem por contratos e pertencem ao direito civil, essas creio não virão aqui porque o seu conhecimento e decisão pertence aos tribunaes, salvo alguma vez para'confirmar algum contrato feito pelo governo: em quanto porém ás pensões graciosas, ou feitas em remuneração de serviços, e que podem ser determinadas por uma lei, eu não sei bem se a respeito d'essas é procedente a doutrina do digno par o sr. Soure, para não poder essa lei ter iniciativa n'esta casa; e para o dizer com

toda a franqueza devo declarar que a não acho verdadeira. —Sr. presidente, esta camará não tem o que não tem. Não pôde nesta camará haver a iniciativa sobre recrutamento, nem sobre impostos, e não vejo outra excepção para outros quaesquer objectos. Ora, o conceder uma remuneração por serviços feitos ao estado será recrutamento? De modo nenhum, nem também ô sobre impostos; mas pôde succe-der, dizem, que para pagar uma ou mais pensões se careça de levantar meios e crear algum imposto, e careça muito embora, que não é objecção.

Um projecto de lei que augmente a despeza} e que começa n'esta camará, ha de ir á outra camará, e ae lá for também approvado, e depois obtiver a sancção real, é uma lei, e o governo tem obrigação de inserir averba que ella exige no orçamento do estado, e de propor os meios para pagar esta como todas; é então o governo que exerce a sua iniciativa sobre impostos na outra camará, e porque não seja n'esta, ou não possa começar aqui nenhum projecto de recrutamento ou impostos, não vejo a rasão de sermos tolhidos de votar verbas de despeza ou pensões, e muito menos privados de restabelecer esta verba que se chama pensão, e que aliás ó o cumprimento de um contrato oneroso que foi feito e sanecionado por uma lei. Não estamos pois inhibidos n'esta casa de votar pensões, mesmo no sentido do digno par. Cada uma das camaras tem a mesma attribuição, e comtudo declaro que não gosto de ver exercer por ellas esta iniciativa, salvo em raras excepções, porque pôde ter inconvenientes, porque só o governo, e mais que ninguém, é o verdadeiro avaliador dos serviços sobre que deve recair uma gratificação, melhor do que qualquer individuo qne tenha assento nas camaras; todavia casos pôde haver a respeito dos quaes as camaras até por acclamação decretem uma remuneração a tal individuo, por seus notórios e importantes serviços. Não pôde pois entrar em duvida que ha competência tanto n'esta casa como na outra para fazer uma proposta n'este sentido, com quanto eu não deseje ver exercer n'isto este direito, pelas rasões que já ad-duzi. Mas eu concedo ao digno par o sr. Soure, que esta camará não tenha a iniciativa sobre pensões, e sendo assim, pergunto a que vem esta questão prévia do s. ex.a para a questão de que agora nos oceupâmos? Creio não importar nada, pois que esta questão não é a concessão de uma pensão da classe do regimento das mercês, esta questão é a do pagamento de um fôro (por lhe chamar assim), que a nação tem sobre sua obrigação o pagar, por isso que em certa epocha quem governava o paiz entendeu que devia comprar a propriedade de um emprego a quem considerou seu proprietário, que n'outra epocha, mais remota, outro soberano entendeu que podia vender, e vendeu a propriedade d'esse* emprego por boa quantia e para despezas da nação (apoiados).

Tinha eu ouvido lá fóra uma palavra por onde entendi que uma questão previa seria aqui annunciada, e presumia que poderia ser outra, mas não esta; isto é, se esta camará tinha competência para decidir sobre o direito civil que deriva de contratos solemnes com individuos, que de certo não tem; e note-se mais, aqui não ha um simples contrato, ha um contrato firmado por uma lei ou decreto vigente, e por esta circumstancia é claro que o governo devia apresentar este encargo no orçamento do estado, como todos que achou auctorisados por lei. Penso também que o orçamento não dura só dentro do anno económico, dura até ser satisfeita a verba que se manda pagar; o decreto de 1797 determinou para sempre esta prestação ou pensão, e este decreto é tanto uma peça legislativa como o é uma lei agora passada em ambas as camaras, porque o poder legislativo então era de quem o passou, e vigora emquanto não for revogado.

O sr. J. F. de Soure: — Isso pôde ser perigoso o susten-tar-se.

O Orador: — O que pôde ser perigoso é se hoje se eliminar uma verba qualquer do orçamento com base em uma lei, e amanhã muitas verbas similhantes pelo voto de uma camará sem a outra, ou assim mesmo se augmentem as verbas do orçamento; e são obvias as considerações sobre os inconvenientes que resultariam, e o pondera-los nos levaria longe.

Mas, sr. presidente, não só nós não tomámos iniciativa alguma sobre esto negocio, que nem a camará dos srs. deputados a tomou, e quem teve essa iniciativa se ha alguma foi o governo, que propoz no orçamento do estado esta verba de despeza a qual a camará dos senhores deputados rejeitou.

Não me persuado que seja a discussão do orçamento o modo mais curial de eliminar ou alterar verbas de despeza que estão consignadas em lei, e não foi assim n'outra occasião que se aggrediu esta pensão na outra camará, pois que a respeito d'ella a questão não é nova, e é velha, e ve-j lho sou eu também n'esta casa; quiz-se então mudar-lhe a natureza de pensão perpetua para vitalícia, e mudar-lhe o assentamento da repartição do correio para o thesouro, mas para isso propoz o ministro um projecto especial que veiu a ser rejeitado n'esta camará; mas a pensão (entenda-se no sentido que lhe dá o sr. marquez de Vallada) continuou na mesma natureza que tinha e sem alteração' a ser paga como d'antes emquanto viveu quem a possuía.

Ora, eu peço ao digno par que me diga se a rejeição que então aqui se fez d'aquelle projecto foi uma iniciativa d'esta camará? Eu creio que um voto negativo não è uma iniciativa; era então um projecto para que fosse vitalícia esta pensão, que foi rejeitado, e a pensão continuou no teor em que estava. E agora não é um projecto, mas uma cousa a que damos a mesma importância, vêm uma votação da camará dos srs. deputados que elimina a mesma pensão, e se nós votarmos que não se elimine o resultado será igual ao que se seguiu da rejeição d'aquelle projecto. N'um caso e

Página 2591

•outro, nem tilesse tempo, iBffitn «gora, não «rsames de iniciativa alguma « em todos -os casos se rejeitamos um projecto ou proposta o resultado disso é ficaram as cousas no statu quo anterior á proposta» Eu peço licença ao digno par para observar que uma rejeição tão longe está de ser iniciativa, que é o inverso e o contrario d'ella. Se ha ou houve iniciativa foi na camará dos srs. deputados; e nós, approvando ou rejeitando a resolução dos srs. deputados, não usamos de iniciativa alguma. Então sim, haveria iniciativa c'esta camará se primeiro aqui tivesse lembrado a proposta daquella eliminação. Portanto não vejo bem o alcance da questão previa do digno par; pois que em ambos os casos, ou esta camará tenha ou não tenha a iniciativa sobre pensões, mesmo daquellas que entendeu o digno par, não vejo a applicação que possa ter a sua questão previa a um assumpto que teve iniciativa na outra casa. A camará dos pares pôde fazer emendas e alterações quantas quizer nas propostas da camará dos srs. deputados e rejeita-las ou approva-las.

Ora se nós podemos em geral fazer quantas alterações quizermos e que entendermos, em todos os projectos que vierem da outra casa, inclusivamente nos que versarem sobre impostos e recrutamento, que n'ella têem a iniciativa, isso só e nada mais, não posso admittir que não possamos tocar n'esta votação, que lá rejeitou a verba proposta pelo governo, nem fazer uma emenda restabelecendo a mesma verba. Pois podemos alterar e modificar as disposições de todos os projectos que aqui vierem, e não podemos tocar também n'esta arca santa? Parece-me que podemos tocar tanto n'este projecto como em todos os outros.

Em consequência, pela minha parte entendo que a camará dos pares é muito competente para votar sobre esta questão, e tenho muita pena que nos occupemos com estas pequenas questões e de si manifestas; emquanto n'este momento mesmo acaba de votar-se o orçamento geral do estado sem uma reflexão nem palavra, havendo ahi tanto para chamar a attenção de todos os homens públicos, e também dos srs. ministros, sobre as despezas impostas ao paiz.

Eu não tive tempo de examinar este orçamento, cujo volume não recebi, e apenas agora mesmo, e rapidamente, pude ver aqui no meu banco, onde me foi entregue o relatório e parecer da nossa commissão de fazenda, e vejo que apresenta um deficit de 1.152:0000000 réis e um augmento de 63:0000000 réis que ainda lhe fizeram os srs. deputados, alem do que propoz o governo. E um deficit grande só para as despezas ordinárias do estado, e muito grande me parece para os nossos meios, e este deficit ainda será augmentado pelas despezas supplementares; mas alem d'esta despeza ordinária nós já temos noticia, e estão votadas muitas verbas de despezas extraordinárias de muito grave importância que têem de ser fornecidas pelo credito. A commissão apresenta a esperança de que a receita avultará para fazer face a todas estas despezas e encargos. Eu estimarei muito que o sr. ministro esteja também possuído da mesma esperança, de que a receita publica augmentará para se equilibrar com estas despezas e encargos importantes, que resultam dos créditos extraordinários. (O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.) Ora quando tinhamos 'aqui objecto para meditar largamente e passa rapidamente Vem esta pequena questão occupar-noi! Que até para mais já é caso julgado mais vezes n'esta camará, e eu pelo menos já aqui votei n'ella uma vez.

O sr. Presidente: — O sr. ministro da fazenda pediu a palavra; mas eu não posso deixar de dar uma satisfação á camará. A ordem da discussão está perfeitamente confundida; parece-me que esta pedia que o sr. Soure retire a sua proposta, e se a retira vamos á questão chamada—pensão ou ónus, como quizerem; e depois d'isso só decidido é que têem logar as observações do digno par. Parece-me que esta é a ordem (O sr. Tavares de Almeida: — Peço a palavra). Permitta-me o digno par que diga isto para mostrar que esta era a ordem da discussão.

O sr. Tabares de Almeida: — Perdoe v. ex.a, mas não mereço nenhuma censura, estive na ordem; effectivamente v. ex.* não pôz á votação a admissão á discussão da proposta do sr. Soure; foi s. ex.a mesmo que o reconheceu, mas disse, que estando se já discutindo podia continuar a mesma questão prévia.

Ora eu entendi que assim como o digno par, auctor da proposta, a tinha discutido, depois o sr. marquez de Vallada discutiu a mesma questão; dando-me v. ex.a a'palavra, eu também tinha direito de a discutir. Também não discuti senão a questão previa; esta questão era e é se esta camará tem iniciativa sobre pensões, e se podia fixar uma verba para satisfazer essas pensões. Portanto tratei das attribuições d'esta camará, sobre ter ou não ter essa iniciativa, procurei mostrar que a camará tinha essa iniciativa, e que ainda que a não tivesse não era tolhida de tratar a questão principal; não tratei de outra questão, salvo alguma ou outra consideração incidente para a minha argumentação. Então como diz v. ex.a que eu fallei da questão principal? Se fallei do contrato foi unicamente para definir como entendia a palavra pensão, não citei nenhum dos seus trechos ou textos, mas era preciso fallar do contrato para explicar o sentido próprio daquella palavra no parecer da commissão; e por isso permitta-me v. ex.a que diga que a discussão esteve nos seus termos.

O sr. Presidente:—Mas v. ex.a terminou por me pedir uma explicação e fallou na questão do orçamento.

O Oraãor:—Foi uma referencia incidente.

O sr. Presidente:—Mas eu não sabia isso.

O Orador:—Eu vou repetir o sentido das minhas palavras. Dizia eu que era esta questão previa uma questão de palavras e insignificante em que nos entrelinhamos; emquanto a camará tinha passado em silencio o grave objecto do orçamento do estido, sem a menor discussão, o

qual •s.presetítava fundamentos par» muitas considerações; e sentia que assim succedesse. Eu não discuti o orçamento, nem podia discuti-lo, e só disse o que me era necessário para fazer sentir a comparação; e que era objecto de muita attenção pelas grandes despezas que apresentava, e fiz votos pelas esperanças que tinha a commissão de que ellas haviam de achar no futuro uma receita publica para lhes fazer face, e que oxalá o sr. ministro da fazenda tivesse igual confiança no preciso augmento. O orçamento já está votado, ninguém se oceupa mais d'elle, mas podia eu fazer a comparação entre o silencio da camará sobre um negocio tão importante, e a longa discussão que tem agora havido a respeito de uma questão de menos transcendência.

O sr. Ministro da Fazenãa:—Eu peço á camará que me permitta tomar-lhe ainda alguns minutos para responder ao digno par o sr. Proença, em relação mesmo á observação com que s. ex.a acabou o seu discurso, observação que é de uma alta importância.

Notou s. ex.a que era de estranhar o tempo que se gastava com a questão de que a camará se está oceupando, sobre o restabelecimento ou não restabelecimento de uma pequena verba do orçamento, quando, havendo tanto que examinar no mesmo orçamento, nem ao menos se deixava consignado o reparo que s. ex.* entende que se deve fazer em relação ao ãeficit do thesouro. Ora a resposta que immediatamente occorre para esta observação, aliás muito at-tendivel, é que o orçamento da receita está calculado em relação ao rendimento do thesouro nos annos anteriores, não se tendo calculado inteiramente com o augmento que ha de resultar da reforma do systema tributário, e com o que já tem logar nos rendimentos das alfandegas, que são calculados para o orçamento, segundo o costume, pelo termo médio dos últimos cinco annos, quando o anno de 1860-1861 deu sobre o rendimento do anno de 1859-1860 um augmento que orçou por 650:0000000 réis. (O sr. Tavares ãe Almeiãa: — Estimo isso muito.) O imposto dos direitos de mercê está calculado no orçamento em 45:0000000 réis, e estou persuadido de que elle ha de produzir mais de 100:0000000 réis. Eu espero pois, que á medida que se forem pondo em execução as novas leis, e se removerem os inconvenientes, que nos primeiros tempos não podem deixar de apresentar, o augmento da receita ha de ser sen-sivel, o que ha de tranquiílisar necessariamente os receios do digno par, ainda que continue algum augmento de despeza, em consequência das obras de viação publica, que estão por terminar; mas isto não pôde acontecer sempre, porque não se pôde estar constantemente augmentando a despeza do thesouro. (O sr. Proença: — Bem, muito bem, estimo ouvir o sr. ministro dizer que não se ha de estar sempre a augmentar a despeza, que se não pôde estar sempre a augmentar.)

Eu sinto, sr. presidente, que não seja agora possivel oceupar mais detidamente a attenção da camará com esta questão, porque eu teria muito gosto em entrar com mais desenvolvimento em algumas considerações a este respeito: eu queria fazer com que víssemos a nossa questão financeira de uma maneira mais favorável: eu desejava chamar sobretudo a attenção da camará para a facilidade com que se estão pondo em execução algumas das disposições do novo systema tributário, que inspiravam sérios receios; fallo da instituição dos grémios para a contribuição industrial que está produzindo os melhores resultados em Lisboa, no Porto, em Coimbra, e em geral em todas as terras nota veis. Ainda hontem se reuniram na capital dez grémios, e a promptidão e interesse, com que concorrem os industriaes que os compõem, fazem com que os trabalhos corram perfeitamente, e se reparta a contribuição de um modo que satisfaz a todos, a ponto que não me consta que tenha havido reclamações até agora.

Sr. presidente, seja-me permittido dizer alguma cousa sobre a questão que se ventila. Eu não quero entrar na questão de direito, a minha opinião sobre esta matéria é conhecida, mas eu queria unicamente chamar a attenção da camará para a situação em que estamos collocados hoje. Este assumpto, sr. presidente, já aqui veiu em 1853; então veiu debaixo da forma do projecto de lei que foi modificado n'esta casa: voltou á outra camará, e lá foi approvada a resolução aqui tomada. Hoje o caso é diverso: a questão está envolvida com o orçamento, e se a camará votar o additamento proposto pela illustre commissão de fazenda, tem de voltar á outra camará o orçamento da despeza: o da receita não, porque esse já aqui está approvado: o da despeza tem de ir á outra camará, que talvez se não conforme com a modificação aqui feita.

Dada esta hypothese tem de haver commissão mixta, e então o que succede? A minha opinião é, e foi sempre, que a lei do orçamento não se pôde sujeitar ás regras estabelecidas para a factura das outras leis. E quando não, veja-se o que acontecerá, dada a bypothese»da necessidade da commissão mixta. Essa commissão faz um projecto de lei sobre o assumpto em que não concordaram as duas camarás, e pôde comprehender n'esse projecto toda a matéria análoga ao mesmo assumpto. Quer dizer, que em relação ao orçamento se pôde formar um projecto que com-prehenda todo o orçamento, projecto, que ha de ser submettido á discussão de ambas as camarás, e que se não for approvado não pôde ser apresentado de novo n'esse anno. É o que determina expressamente no artigo 7.° § 4.° a lei de 27 de junho de 1849, que regula este assumpto.

Pergunto se esta disposição pôde ser applicavel á lei do orçamento, que é uma lei que ha de necessariamente ser votada todos os annos? Não pôde ser. Entretanto a camará, se approvar o additamento da illustre commissão, vae levantar esta grande questão, que ha de trazer apoz si outras questões de extrema grandeza. Não seria pois mais prudente evitar este perigo, que o é, votando o projecto de

lei como veiu da outra camará, e deixando a questão que diz respeito aos herdeiros do sr. conde de Penafiel, cuja memoria ninguém respeita mais do que eu, para ser tratada quando estiverem habilitados os mesmos herdeiros para receberem esta pensão? Porque o facto é que ainda não ha ninguém habilitado para a receber, e se ha alguém que se julgue com direito a ella pôde vir deduzi-lo pelos meios competentes, que lhe fica sempre o direito salvo para isso (muitos apoiaãos), e verificado esse direito o governo virá pedir os meios necessários para satisfazer este encargo.

Em conclusão pois digo, que para evitar graves questães me parece melhor votar o projecto como veiu da outra camará, deixando este additamento para ser tratado em occasião opportuna; não ficando por esta decisão prejudicado o direito que os herdeiros do sr. conde de Penafiel julguem ter á pensão, que este fruiu, e que poderão deduzir nas estações competentes. Lembro este alvitre com as melhores intenções e no intuito de cortar questões gravissimas, que não me parece conveniente levantar nas actuaes circumstancias (apoiaãos).

O sr. Tavares ãe Almeiãa:—Sr. presidente, o nobre ministro que acabou de fallar, dividiu em duas partes as suas observações, e eu serei brevíssimo respondendo a cada uma d'ellas. Lisonjeio-me de que a observação que fiz incidental á questão de que tratamos, desse occasião ao sr. ministro para se explicar, e a satisfação que eu recebi estou certo de que ha de abranger mais pessoas.

Eu não podia fazer observações e discutir em detalhe o orçamento, porque ao começar a discussão tinha eu apenas entrado n'esta casa e n'esse momento mesmo é que tinha recebido os dois projectos de lei sobre a receita e despeza, que pela escassez do tempo deram em resultado não se dizer nada, e a final estão já approvados!

Sr. presidente, eu nunca tive o orçamento original do govorno, li estes projectos com a rapidez com que se podem ler estas cifras, que n'elles se contem, e vendo a quanto montava o ãeficit foi a isso que me referi incidentalmente, notando que é aqui mesmo que se diz que esta cifra ainda se elevará a mais, por que ainda havemos de ter os créditos supplementares. Nestas circumstancias reflecti também que tendo noticia de importantes verbas de despeza extraordinária que não entram aqui, e verbas que hão de trazer encargos, todavia não me era possivel tratar de tal assumpto por não estar habilitado, nem o poderia estar de hoje para amanhã.

Ora a cousa mais importante que tem os governos representativos, consiste em zelar os nossos direitos da nossa segurança pessoal e os da nossa bolsa: em quanto á bolsa estamos reduzidos a esta ceremonia; de ver o orçamento á ultima hora — vae para a commissão, no dia seguinte apre-senta-se o parecer, mandase imprimir, chega na véspera do dia em que tem por força de ser discutido pró forma,, e n'esse mesmo dia é approvado e vae ser uma lei.

Eu tive poucos minutos para poder fazer alguma observação sobre o tal orçamento; felizmente fiquei mais esperançado, estimando muito ter dado occasião ás explicações satisfactorias que o nobre ministro se serviu dará camará; e o paiz não deve ficar menos agradado, sendo todavia para sentir que s. ex.a não.tivesse dado essas explicações, que verdade é, ninguém lh'o tinha pedido: s. ex.a não podia deixar de saber que muita gente tem estado apprehensiva sobre o estado da fazenda publica, e nobre ministro diz muito bem que a despeza sempre crescente deve ter um termo; eu digo o mesmo, e reconhecendo que o governo felizmente está tendo credito dentro e fora de paiz, não posso deixar de obervar que o credito é a persuasão que tem o capitalista dos meios que tem a nação para satisfazer aquillo que deve, porém por mais honesto que seja um governo, desde que o dinheiro se persuadir que a nação não tem meios para satisfazer-se os encargos o credito desapparece.

Vemos uma despeza successivamente crescendo, mas ha de ter necessariamente um limite, e não pôde ser sempre assim, que leva ao precipício; e pondo agora isto de parte, lisongeio-me de ter chamado o sr. ministro a fazer essa declaração.

Vamos á segunda parte da oração. Disse ex.a — o sr. ministro entende que se levanta aqui uma questão gravissima, restabelecida que seja a verba da pensão — e eu entendo que isto é uma questão simplicíssima; s. ex.a entende que rejeitado o orçamento dos senhores deputados n'esta parte, que traz aqui um embaraço e a necessidade de uma commissão mixta, e eu entendo que não traz nada d'isso, como não trouxe aquelle projecto que queria fazer temporária esta mesma pensão. A commissão mixta milita quanto ambas as camarás julgam importante tratar de um certo objecto, e que uma das camarás rejeita certos artigos d'esse projecto; este não é o caso, e portanto não tem logar a commissão mixta. (O sr. Ministro ãa Fazenãa: — Por força que a ha de haver). Sabe v. ex.a que da outra casa veiu a esta um projecto para esta pensão se pagar, não pelo correio, mas pelos encargos geraes, e por um titulo de renda vitalícia, e que esse projecto rejeitou-se aqui; pergunto, tem o conde de Penafiel um titulo de renda vitalícia ou tem só aquelle que tinha para ser, como até aqui, pago pelo correio? Pois se da outra vez não houve commissão mixta e tudo ficou como estava, porque é que agora hão de haver todas essas difficuldades? S. ex.a ha de consultar os procuradores fiscaes da coroa, se lhe restam duvidas; mas para mim é um caso de simples intuição, que a rejeição da verba não embaraça o orçamento nem traz commissão mixta — uma alteração qualquer no que existe legalmente approvado só por uma das camarás, em que a outra se não conforma, deixa as cousas e hão de ficar como estavam.

O sr. Ministro ãa Fazenãa: — Peço ao digno par que se convença que está enganado a este respeito. O orçamento com este aditamento da commissão de fazenda por força que

Página 2592

2592

ha de ir á outra camará, porque importa uma alteração, a qual, se a outra camará não approvar, tem necessariamente de proceder-se a uma commissão mixta.

O sr. Marquez de Vallada:—Desejava perguntar ao sr. ministro da fazenda, se, quando se trata de um acto de justiça e de reconhecer um direito, é conveniente dizerem os homens encarregados de manter a justiça e o direito de todos, que não ha tempo. (O sr. Ministro de Fazenda:—-Não disse tal.) Mas disse que tinha de ir á camará dos senhores deputados, o que me parece que importa o mesmo. E qual é a rasão por que não ha de ir? Esta observação de s. ex.a de certo que tem algum fim, porque 3. ex.* não costuma dizer palavras sem um sentido qualquer, porque s. ex.a é um homem de muito talento, e por isso mesmo que tem.talento, não ha de fugir á responsabilidade das suas palavras. A traducção do que s. ex.a disse, ó o seguinte: «Olhem os dignos pares que o projecto tem de voltar á outra camará; e eu, sem emittir opinião, direi que se é um acto de justiça, deve ir, embora se diga que estamos no fim da sessão». É isso mesmo que eu lamento; ó por esse mesmo motivo que me restringi quanto pude quando tratei das prisões; e que me callei sobre o muito que tinha que dizer quando se tratou do ministério do reino.

Sr. presidente, acaso temos nós culpa de que o orçamento venha tão tarde, e que o governo não tenha força na sua maioria para obstar a que se perca o tempo com questões pequenas, ficando as mais importantes de parte? Esperam ss. ex.a! regenerar o paiz deixando discutir as questões religiosas? A culpa, sr. presidente, não é portanto da camará dos pares; se nós não discutimos o orçamento não é nossa a responsabilidade, é do governo. Conheço os desejos do nobre ministro, mas o governo tem a responsabilidade dos seus actos; de que lhe serve a maioria que tem, se não lhe Serve para aproveita-la e dirigi-la em bem do paiz? (O digno par não viu nenhum dos seus discursos.) O sr. Proença:—Isto é tarde. Só peço a v. ex.a e ao sr. ministro que attendam uma só observação: se o restituir a verba 'da pensão é uma alteração que ha de ir á outra camará, depois a uma commissão mixta, vejam bem aonde isto nos pôde levar! Desde que no orçamento a camará dos srs. deputados votar a reducção de um ordenado qualquer estabelecido por lei, ou fica logo reduzido por evitar embaraços, ou se esta camará, por fazer justiça, rejeita a reducção, volta á outra casa, que presiste no dito dito: nomeia-se a commissão mixta, que portanto não vem a um accordo, c os empregados ou uma classe de empregados hão de ficar sem o seu ordenado legal, ou retribuídos péssima e injustamente! Isto não pôde ser. Eu entendo esta verba e cada uma das verbas do orçamento como um projecto isolado; cada verba é uma espécie, a divergência que haja n'ella não affecta o todo, e rejeitada a innovação n'uma verba milita o direito anterior, e não tem effeito a alteração feita por uma só camará.

O sr. Margiochi: — Parece-me que, se e3te projecto de lei tiver de voltar á camará dos senhores deputados, e que se esta não concordar na alteração que a.commissão propõe, os negócios públicos continuarão quasi da mesma maneira ; porque o governo já está auctorisado por lei a pagar a despeza do anno económico corrente em conformidade da ultima lei da despeza. Se não for approvado o projecto de lei que está em discussão, acontecerá, como em outros annos, não haver este anno lei especial de despeza. Ha n'isto menos inconveniente do que serrno3 obrigados á ultima hora, em que o parlamento está aberto, a approvar tudo que nos quizerem apresentar.

O sr. Visconde de Castro (sobre a ordem): — Maudo para a meia um parecer da comínis-jào. Agora direi que a hora está muito avançada, e qir. h.i diversos pontoj importantes sobre que agora se tem falindo. Parece-me que era melhor continuar amanhã esta discussão.

O sr. Presiãente: — A próxima sessão terá logar amanhã, e a ordem do dia será a continuação da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram mais ãe seis horas e meia ãa tarãe.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 29 de agosto de 1861

Os srs. Visconde de Laborim; Marquezes, de Vallada, de Vianna; Condes, de Alcáçovas, do Bomfim, de Linhares, da Louzã, de Peniche, da Ponte, dá Ponte de Santa Maria; Bispo de Beja; Viscondes, da Borralha, de Castellões, de Castro, de Fornos do Algodres, da Luz, de Sá da Bandeira; Barões, da Vargem da Ordem, de Fpseoa; Mello e Carvalho, Avila, Pereira Coutinho, Sequeira Pinto, F. P. de Magalhães, Costa Lobo, Margiochi, Almeida Proença, Aguiar, Soure, Pinto Basto, Reis e Vasconcellos, Baldy, Sebastião José de Carvalho.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×