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que guardavam os seus foros aos portuguezes, e sobre esta base é que se consumou a usurpação nas cortes de Thomar.

Argumenta-se também dizendo, que no poder absoluto estavam reunidos todos os poderes. Não estavam, elles não tinham mais poderes do que os seus antecessores. Portugal teve sempre um governo representativo nas suas cortes, ainda que esta representação fosse incompleta, e comquanto procedessem muitas vezes arbitrariamente, legislando com a formula despótica de motuo próprio, sciencia certa e poder absoluto ou livre vontade; estes casos são meros factos, não constituem direito.

O sr. Marquez de Vallada:—Apoiado, apoiado; d'isso gosto eu muito, ainda bem.

O Orador:—Pois que? Assim, logo que acaba o poder absoluto, é necessário annullar quanto se faz com violação das leis em prejuizo da nação. Se os portuguezes se sujeitaram ao despotismo hespanhol, em quanto não poderam resistir-lhe, fizeram bem; mas fizeram ainda melhor em 1640, quando, reanimados os brios nacionaes, enxotaram de sua pátria tão detestáveis tyrannos. Ora de mais a mais este contrato ó enormissimamente lesivo. Não se pôde bem taxar a enormidade da usura desde 1606 até ao reinado da senhora D. Maria I, porque o correio era administrado pelo correio-mór, e era do seu interesse occultar o seu rendimento. Devia comtudo ser muito grande pelas cautelas que na carta de venda se empregam para salvar a lesão enormíssima, pois diz que havendo-a lhe faz graça e mercê de mais valia. Condição nullae contra direito, condição de escandalosa prodigalidade.

Allega-se contra isto que é necessário attender ao valor do dinheiro n'aquelle tempo. Muito bem, vejamos portanto qual era esse valor n'aquelle tempo. No reinado do sr. D. Manuel valia o marco de prata 2$400 réis, e este preço alterou se tão lentamente que depois dos reinados do sr. D. João III, D. Sebastião e Cardeal D. Henrique, valia no tempo de D. Filippe 2$620 réis, isto é durante tres reinados tinha o marco de prata augmentado 220 réis, menos de 10 por cento. O certo é que o correio mór recebia os proventos na mesma moeda com que fez a compra, e por consequência para se fazer um calculo dos rendimentos não se pôde tomar outra base senão o augmento da moeda desde o tempo de Filippe II até á sr.a D. Maria I. No reinado de D. Filippe, como vimos, valia o marco de prata 2$620 réis.

Este preço é exacto, porque consta de uma lei d'este mesmo Filippe II, de 6 de outubro de 1612. Seis annos depois d'este contrato. Veja-se para prova a historia genealógica da casa real, tomo 4.°

Havia umas moedas que então corriam chamadas reaes simples, cerceadas e faltas de peso, e mandou-se á moeda que as recebeu como prata quebrada pelo preço de 2$620 réis o mareo.

No reinado da sr.a D. Maria II o mesmo marco de prata valia 5)5600 réis, por consequência augmentou mais de 100 por cento. Pois muito bem, calculemos os 70:000 cruzados que deu o correio mór, com outros 70:000 e mais 13:000, que é a differença que vae de um tempo a outro no valor da moeda, ou a relação que se dá. entre 2$620 e 5(5600 réis. Logo os 70:000 cruzados primordiaes representam no tempo da sr.a D. Maria I 153:000 cruzados, e esta quantia não rende senão 4:200(5000 réis. Ora, dando-lhe sua magestade 40:000 cruzados de renda, veiu o correio mór a receber um juro de 26 por cento, de sorte que em menos de quatro annos tinha embolsado o capital originariamente empregado. E se fizermos a conta em relação ao tempo presente, em que o valor da prata triplicou, desde Filippe II em que os 2(5620 réis representam hoje 7$860 réis, valor do marco de prata actualmente, ainda o dito correio mór tem continuado a receber 19 por cento. D,'onde resulta que em pouco mais de cinco annos os ditos 70:000 cruzados lhe voltam periodicamente a casa pelo valor que hoje teriam no acto do contrato.

Esta conta é, no meu entender, ainda favorável aos herdeiros do correio mór, porque não julgo que o marco de prata valha no commercio 7)5860 réis, mas dou-lhe este valor por me constar que na casa da moeda se cunham 8)5000 réis de cada marco. Erro financeiro se assim é, na minha opinião, por se dar um valor á prata que ella não tem, o que causa prejuizo ao estado e ao commercio, porque no estrangeiro não se importam com o valor que nós damos á moeda, o que lhe importa é-o seu toque c peso, e fazendo nós uma moeda com maior valor do verdadeiro, o pagamos na differença dos câmbios como acontece desgraçadamente, por termos que pagar os dividendos da nossa divida e o preço das mercadorias que importamos, porque a maior parte das transacções commerciaes que fazemos são com os estrangeiros, como se vê do prodigioso rendimento das alfandegas. Penso também que fora erro financeiro dar ás libras o valor de 4)5500 réis, quando em todas as praças o seu valor não chega a 4)5100 réis, salvo o caso de crise commercial, donde resulta que o cambio quasi constante de 51 '/2 nos obriga a pagar por cada libra 4)5660 réis, o que faz levantar o preço de todos os géneros.

No que tenho dito parece-me ter demonstrado com toda a evidencia que ha uma usura enormíssima n'esta pensão, como se patenteia da comparação do valor da prata hoje e no reinado da Senhora .D. Maria I, com aquelle que tinha quando se fez este contrato; e n'estas rasões é que se funda o meu voto.

A lesão enormíssima annulla todos os contratos, e as clausulas de D. Filippe II para o sustentar são tidas por nenhumas em direito.

Disse aqui hontem que este projecto podia ser alterado n'esta camará, porque estava no mesmo caso dos outros projectos que vinham da camará dos senhores deputados,

que nós podemos alterar, approvar e rejeitar; e que se a outra camará não aceita as nossas emendas fica a questão como estava, e regulando a lei anterior. Parece-me que não é assim; é muito differente « questão actual dos outros projectos de lei vindos da outra camará. N'estes o que disse o digno par é verdade, mas aqui, pela natureza do objecto, não se dá a mesma rasão, porque dizendo a camará dos senhores deputados—fica supprimida esta pensão, ainda que esta camará diga—restabeleça a pensão— não se segue d'aqui que o ministério deva ou possa paga-la, porque não tem dinheiro destinado para a pagar; e sendo o orçamento votado todos os annos, e não podendo applicar-se para esta despeza o dinheiro votado para os outros capitulos, senão por uma lei especial que auctorise a transferencia na forma do acto addicional, segue-se que o governo não pôde pagar esta pensão. E se a camará dos senhores deputados continuar a persistir na mesma opinião e a usar da mesma maneira, ou ainda mais simplesmente, se não metter esta verba no orçamento futuro, está* acabada a questão, e esta pensão não pôde mais pagar-se. Pois esta camará ha de dizer á camará dos senhores deputados —nós queremos que se pague esta pensão, votae fundos para ella? Se ella insistir em que seja supprimida, não pôde mais continuar, e por consequência está acabada a questão, e a pensão morre completamente. Portanto parece-me que a sr.a condessa de Penafiel, a quem muito respeito, deve ficar muito contente com a posse dos reguengos e terras de Penafiel que tem em seu poder, porque os bens da coroa não podem passar nunca para o dominio dos particulares, pela lei mental, e para ella muito menos, porque pela mesma lei, nunca podem passar para as mulheres. Estes são os principios de direito publico portuguez, e alem d'isso é também uma injustiça relativa, porque ha centos e centos de pessoas no mesmo caso e circumstancias, que compraram vários officio3 de escrivães de correição, provedorias e alfandegas á coroa ou a particulares, dos quaes uns foram extinctos, e d'outros foram os proprietários postos fóra d'elles, e pergunto se esta camará quer dar pensões a toda esta gente? Se porventura esta camará conceder está pensão de que se trata, parece-me que todos estes proprietários de officios públicos têem também direito para quererem indemnisações, salvo se temos uma lei para os fidalgos e outra para os mechanicos.

O sr. Presiãente: — Tem a palavra o digno par o sr. marquez de Vallada, que acaba de a pedir novamente.

O sr. Marquez ãe Vallaãa: — Disse que tomara nota dos diversos argumentos que empregou o orador que o precedeu, á proporção que s. ex.a foi fallando; mas permitta-lhe a camará e o digno par que não siga esses argumentos pela sua ordem, e que comece por felicitar o sr. barão de Villa Nova de Foscoa, e a si próprio orador, por ter em parte podido conduzi-lo ao grémio conservador. Folgou de uma declaração que ouviu ao digno par, e folgou pelo contraste que ella fazia com outra declaração de s. ex.a n'esta tribuna, não havia ainda muitos dias. O digno par levantou a voz n'esta sessão, e disse =os factos não constituem direito =. D'aqui os motivos de seus parabéns. (O sr. Barão ãe Villa Nova ãe Foscoa: — Isso é das leis.) De certo que é das leis moraes; mas como o digno par ainda ha pouco tempo _disse=que elle orador parecia não estar na Europa, porque não approvava os factos consumados, e não sabia que estávamos em uma revolução = e agora diz s. ex.a = que os factos consumados simplesmente são factos quando se não baseam no direito =. Também elle orador não quer que os factos consumados constituam direito, e para defender qualquer direito não ha de recorrer nunca aos factos consumados, nem aos precedentes; portanto estimou ouvir.estas doutrinas áo digno par. Mas s. ex.a foi mais adiante, condemnou as usurpações, que elle orador também condemna, e n'isto acompanha o digno par, ou antes s. ex.a é que o acompanha hoje, porque da sua parte sempre tem defendido essas doutrinas, e s. ex.a já tem sustentado outras oppostas inteiramente. Feita esta declaração, passará a examjnar rapidamente, e por assim dizer, em curto sum-mario, as doutrinas que s. ex.a apresentou, as proposições que defendeu, e os commentarios com que as acompanhou.

Disse o digno par que os contratos para serem legaes e respeitados carecem de ter sido feitos por pessoas hábeis para contratar, e que estejam na posse d'aquillo que contratam. Já se vê que quer dizer que tenham a consciência do que contratam para poderem ter liberdade de contratar, não fazendo porém em caso algum contrato lesivo. Foram as palavras de s. ex.a pouco mais ou menos. Perfeitamente quanto aos principios e quanto á doutrina em si, mas não quanto ás conclusões que s. ex.a tirou da principal proposição que estabeleceu, até porque ainda foi mais longe procurando demonstrar na defeza da proposição estabelecida, que o contrato de que a camará se occupa não está legal, por isso que uma das partes contratantes não era competente, pois que até nem possuía aquillo que concedia sem o poder conceder nem fazer transacção ou contrato algum, pois era um intruso, e s. ex.a declarou-lhe o nome, dizen do: era o rei Filippe II de Castella e I de Portugal (O sr. Conãe ão Taipa: — Foi o III de Castella e o II de Portugal). Muito bem, era um dos Filippes de Castella que se intitulava rei de Portugal, que reinava em Portugal antes da restauração da casa de Bragança na pessoa de el-rei o senhor D. João IV de saudosa memoria.

Disse s. ex.a que uma lei do tempo de um usurpador era impossivel reconhece-la, que não podíamos de maneira nenhuma respeita-la. Elle orador confessa que caiu das nuvens quando ouviu isto, e perguntará ao digno par se s. ex.a está resolvido a produzir o mesmo julgado, sobre todas as leis que estão nos grandes in fólios da nossa legislação, pois ainda não tinha ouvido similhante proposição, porque os Filippes de Castella reinaram em certo numero de annos,

e foram reconhecidos inclusivamente os titulos que deram durante o seu dominio antes da restauração. S. ex.a conhece perfeitamente a nossa historia, e não só a historia moderna, mas a antiga; s. ex.a mesmo se abrir os livros da nossa historia sabe que tudo isto é verdade. Por isso quiz o orador até certo ponto attribui-lo a lapso, mesmo porque podia ser uma d'essas asserções que, no calor da discussão, escapou, e por isso quando alguem pede a demonstração, o auctor não se encarrega da defeza por não saber onde ir busca-la. Neste caso porém não foi assim, porque todos ouviram o sr. barão de Villa Nova de Foscoa insistir n'ella umas poucas de vezes.

Disse s. ex.a que a familia dos Filippes tinha tyrannisa-do Portugal, e que a prova era que os portuguezes se tinham unido como um só homem por causa da oppressão que soffriam, e que tínhamos levantado o estandarte glorioso das quinas, proclamando a restauração do throno legitimo da casa de Bragança contra o jugo dos hespanhoes. Tudo isto é verdade, mas não sabe elle, orador, o que tinha com a questão. Todas essas censuras ao governo dos Filippes de Castella em Portugal tinham muito logar em occasião que fosse mais própria do que esta, mas n'este debate, n'esta questão da pensão á casa do sr. conde de Penafiel não vinha nada a propósito, porque se é para desconhecer um acto do governo daquelle tempo, s. ex.a devia primeiro declarar que não reconhecia lei alguma, nem acto algum d'esse tempo.

Disse s. ex.a que os empregos são de direito magestatico. Seguramente que está isso reconhecido; e dirá de passagem ao sr. barão de Villa Nova de Foscoa, que as idéas em que s. ex.a parece estar hoje, já elle, orador, as sustentou n'esta tribuna no primeiro discurso que teve a honra de proferir n'esta casa em 2 de agosto de 1854, occasião em que entendeu conveniente expor o seu programma de principios quando so tratava então de atacar direitos de propriedade, ao que sempre se tem opposto, por isso que se honra de pertencer ao partido conservador, que reconhece sempre os direitos de todos, e que não quer fazer mudanças de governo levado por mesquinhos interesses, como acontece com o partido revolucionário.

Quando pois pela primeira vez se apresentou n'esta tribuna a sustentar aquelles principios e idéas, teve também elle, orador, de combater alguns argumentos similhantes aos produzidos hoje pelo sr. barão de Villa Nova de Foscoa, que também se esqueceu de que Filippe II não era rei constitucional; que nesse tempo a forma de governo era inteiramente diversa. Se n'esses tempos os nossos reis convocavam cortes de vez em quando, a forma de governo era muito diversa, porque o rei legislava e fazia executar as leis.

Mas disse s. ex.a que era nullo tudo quanto os Filippes haviam feito, porque não tinham poder para legislar, e que de mais os bens da coroa não passam da successão. Pede licença a s. ex.a para lhe dizer que não lhe parece exacta esta sua apreciação em quanto ao negocio de que se trata, porque passam e passavam com confirmação regia. Por esta occasião dirigiu elle, orador, a s. ex.a um aparte, a que lhe respondeu com a lei mental, e disse — mas não pôde passar para senhoras. Seguramente quando ha a dispensa da lei mental conforme é a doação, e s. ex.a sabe o que são as doações de capellas; que haviam doações durante uma vida só; que se concediam também,durante mais uma ou duas vidas.

Pôde fallar n'este assumpto desasombrado porque não ha em sua casa nenhuma d'estas doações; abre o seu ar-chivo, examina a historia da sua familia, e nada de tal encontra, o que declara, para que o sr. barão de Villa Nova de Foscoa o o seu partido reconheçam como desasombra-damente entra n'este assumpto.

Existiam pois essas doações até que veiu a lei de 22 de junho de 1846, a qual foi largamente discutida e a final approvada, sendo por isso hoje uma lei do estado; s. ex.a deve saber que esses contratos foram respeitados pela nova lei e sempre o têem sido pelos tribunaes. Haja vista ao que aconteceu com a casa do sr. conde de Murça; lá tem os padrões de juros reaes que lhe foram conservados mesmo reconhecido o contrato oneroso, e não só esse cavalheiro e essa casa a que se refere, mas muitos outros foros foram conservados: ficaram alguns reduzidos á terceira parte, outros completamente extinctos e outros conservados, sendo pagos integralmente, o que s. ex.a talvez não saiba, pois não tocou n'esta espécie. Talvez que também s. ex.a ignore que a casa Penafiel percebe os foros competentes? Pôde ficar pois n'essa certeza, e elle orador lh'o assegura em presença dos jurisconsultos e pessoas que têem julgado o negocio no supremo tribunal de justiça.

S. ex.a deve saber que depois das leis da dictadura muitos foreiros deixaram de pagar os foros em virtude da permissão que havia; mas isso deu logar a demandas que levaram a questão ao supremo tribunal de justiça, e este alto tribunal negou a revista que fora interposta contra a decisão da primeira instancia e da relação. Esses foros são parte do preço d'esse contrato.

S. ex.a o sr. barão de Villa Nova de Foscoa apresentou uma larga dissertação sobre o valor e differença da moeda, e fez as contas; recorreu para isso á historia antiga.

Apontou o nosso historiador D. Antonio Caetano de Sousa, e pretendeu mostrar a differença da moeda. Não acompanhará a s. ex.a n'esta empreza de liquidação, porque não é aqui o logar próprio para a fazer, alem de elle orador se reputar incompetente para isso; mas dirá ao digno par ser obvia a differença que tem havido no valor do dinheiro, e diversas são as causas; mas limitando-se a dizer isto de passagem, por não poder, pela estreiteza do tempo, fazer n'esta camará uma prelecção de economia social e compa-