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DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA DOS SENADORES

9.ª Reunião Preparatoria, em 31 de Janeiro de 1839.

(Presidia o Sr. Visconde de Semodães.)

MEIA hora depois do meio dia estavam reunidos 33 Srs. Senadores.

O Sr. Presidente: — Tenho a declarar ao Senado que o Sr. Senador Macedo (com quem hontem estive), apesar dos muitos desejos que tem de comparecer, não póde vir estes dous ou tres dias por ter um olho inflammado.

O Sr. Bergara: —Tenho a fazer igual declaração a respeito dos Srs. Conde das Antas, e Raivoso; o primeiro continua incommodado a ponto de se lhe lazer uma junta de facultativos, e o segundo tem sido accommetido de sezões.

O Sr. Secretario Trigueiros: — Em consequencia da deliberação desta Assembléa, dirigi-me hontem a casa do Sr. Senador Leitão, a fim de o desanojar, e lhe fiz presente a commissão de que ia incumbido.

A Reunião ficou inteirada de todas estas participações.

Leu-se e approvou-se a Acta da precedente

Mencionou-se um Officio do Sr. José Nogueira Soares, Senador eleito por Penafiel, participando molestia, e que se apresentaria com a brevidade possivel. — A Reunião ficou inteirada.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Sr. Presidente, em minha íntima consciencia, e com a mais profunda convicção, intendo que sem fixarmos o que devemos reputar totalidade de Senadores, estamos como o gigante da Fabula subindo e descendo o rochedo sem que possamos parar: tudo quanto fazemos, tudo quanto dizemos é circulo vicioso em quanto não soubermos a gente com que devemos principiar os nossos trabalhos, e em minha profunda convicção (repito) fixar a verdadeira totalidade dos Membros desta Casa, é a questão previa, sem decidir-se a qual eu não posso, nem devo, nem quero entrar em trabalhos alguns. Vou portanto apresentar um Requerimento a este respeito, e desde já peço a V". Ex.ª queira propôr á Reunião a sua urgencia. — Leu então o seguinte

Requerimento.

«Proponho com urgencia que antes de todos os trabalhos se discuta a questão previa, em quanto ao modo de entender, e fixar a totalidade dos Membros deste Senado. = Barão da Ribeira de Sabrosa.»

O Sr. Bergara observou que havendo-se resolvido em uma das precedentes Reuniões, que antes de se discutir o Parecer da Commissão de Poderes se tractasse da questão previa indicada pelo Sr. Barão, intendia que para haver coherencia (estando dado para Ordem do dia o referido Parecer) devia reputar-se ocioso o Requerimento que se acabava de lêr.

O Sr. Cordeiro Feio disse que a questão sobre a intelligencia da palavra totalidade, que se acha no Artigo 40 da Constituição, é de que tractava o Requerimento proposto, era uma questão de interpretação constitucional, que só pertencia ás duas Camaras, e não á minoria da dos Senadores. Proseguiu manifestando que, em vez de discutir a questão oferecida á sua consideração, o Senado devia fazer todos os esforços para se constituir com o numero exigido na Constituição, e que como um dos meios de obter esse fim, elle (Orador) apresentava um Requerimento que lhe parecia dever merecer a approvação dos Srs. Senadores presentes. — Leu então, e mandou para a Mesa o seguinte

Requerimento.

Proponho— 1.° Que se chame o Sr. Barão de Perafita, como primeiro Substituto pelo 9.° Circulo, a Feira, em logar do Sr. Barão do Almargem, que declarou por ora não poder vir: e que se ri do proceda por em quanto a nova eleição pelo 14.º Circulo, a Guarda, por onde o dito Sr. Barão do Almargem, poderá tomar assento nesta Causara como Senador Substituto, logo que se apresente.

2.° Que se chame o Sr. Barão de Albufeira, como primeiro Substituto do 10.° Circulo, Coimbra, em logar da Sr. Marquez de Saldanha que está fóra do Reino; e que por ora se não proceda a nova Eleição pelo 20.° Circulo, Santarem, por onde o dito Sr. Marquez de Saldanha tomará assento nesta Camara, como Senador por alli eleito, logo que se apresente.

3.° Que se chame o Sr. Manoel de Serpa Machado, como terceiro Substituto pelo 13.º Circulo, Lamego, em logar do Sr. Duque de Palmella, que se acha fóra do Reino, e que por ora se não proceda a nova Eleição pelei 11.º Circulo, Arganil, por onde o dito Sr. Duque da Palmella entrará nesta Camara como Substituto, em logar do Sr. Trigoso, que falleceu.

4.° Que se responda ao Sr. Bento Pereira do Carmo, que a Camara não póde acceitar a sua escusa, e que espera do seu patriotismo, que elle não quererá privar esta Camara das suas luzes, e pezar sobre os seus Concidadãos que o elegeram, obrigando-os ao penoso trabalho da novo Eleição.

5.° Que por ora senão proclamem Senadores individuos que não estejam em Lisboa, é que mesmo se não designem já os Circulos que devem representar os Senadores que se proclamarem quando tiverem sido eleitos por muitos Circulos, a fim de que essas designações não obstem a providencias futuras que talvez poderão ser necessarios. = José Cordeiro Feio.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — (Sobre a Ordem.) Este Requerimento não póde ser discutido, em quanto se não decidir da urgencia daquelle que eu primeiro apresentei; quando aquelle fôr discutido, eu provarei que S. S.ª propõe uma série de infracções da Constituição, contra as quaes eu fallarei, e espero que o Congresso não admitta, porque entende ainda melhor do que eu essas materias.

Fazendo-se segunda leitura do Requerimento do Sr. Barão do Ribeira de Sabrosa, disse

O Sr. Cordeiro Feio: — Sr. Presidente, eu não posso approvar que se tracte primeiro que tudo do Requerimento que acaba de lêr-se; e a razão é a que ha pouco disse, pertender-se por elle interpretar um Artigo Constitucional. Sr. Presidente, quando eu vir que se não póde constituir o Senado sem esgotar outros meios, então, e só neste caso extremo, talvez me decida a sahir por uma porta qualquer, porque reconheço que a primeira necessidade é constituir o Senado: mas por agora não o posso fazer, porque entendo que esses meios não estão de todo esgotados; e são estas as fortes razões que eu tenho para desejar quê se tracte primeiro que tudo do meu Requerimento.

O Sr. Presidente: — Eu devo propôr á consideração do Senado os Requerimentos que forem primeiro mandados para a Mesa, e foi o do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa aquelle que se leu antes; se elle se não approvar, então passar-se-ha ao do Sr. Cordeiro Feio. (Apoiado.)

O Sr. Luiz José Ribeiro declarou, que votaria segundo a ordem da discussão; que approvando-se o Requerimento do Sr. Feio, votava contra o do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, e por elle unicamente no caso de vêr que não havia outro meio de poder constituir o Senado.

O Sr. Bergara, para provar que já estava vencida se tractasse da materia do Requerimento do Sr. Barão, leu parte da Acta da Reunião de 16 do corrente. E propondo o Sr. Presidente se se passaria já á discussão delle, resolveu-se affirmativamente. Teve logo a palavra para o sustentar

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Repetirei aqui o que talvez já dissesse em outro logar. Não ha ninguem que saiba lêr em Portugal, ou pelo menos que se dê á leitura de jornaes, que não saiba que este Senado esta reunido contra o meu voto: toda a gente sabe que no Congresso Constituinte eu fui um dos Membros da Commissão de Constituição, e que alli de acôrdo com os meus Collegas (ou antes

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com a maioria delles) eu propuz um Senado vitalicio; esta que tão perdeu-se no Congresso; appareceu outra para um Senado mixto, votei ainda por ella, mas perdeu-se tambem; finalmente, tractou-se do Senado como está organisado, e eu votei contra. Mas nem por isso, vencido em opinião naquelle logar, deixo de reconhecer hoje como uma necessidade publica (reclamada pelas circumstancias do paiz, pelos males que havemos soffrido, e por aquelles que eu antevejo) que o Senado se constitua: é nosso rigoroso dever empregar todos os meios, plausiveis, quando falharem os legaes, para constituir esta Camara. E que meios são estes, Sr. Presidente? A legalidade, e a par com ella a utilidade. Que nos resta? O justo a par do necessario. Encaremos a questão por qualquer lado. Eliminando os Senadores do Ultramar, (Senadores que ainda não vivem, não palpitam) não fazemos injuria nem á Lei nem aos homens; não á Lei, porque quando disse metade da totalidade não podia comprehender nella entes que não existiam; não aos homens, porque no dia de hoje ninguem vê um Senador Ultramarino. Não só elles não existem, mas até se deve, presumir que, na maior parte das Provincias do Ultramar, ainda se não procedesse á Eleição. Desviar disto è metaphysica politica e a metaphysica, sé alguma cousa vale em theologia, hoje em politica faz muito pouca fortuna. Mas nós, ligados ao rochedo, quereremos expôr o paiz só pela gloria de dizer = havia na Constituição a palavra totalidade, e nós entendemos que um certo numero de homens que não existiam deviam formar parte dessa totalidade? Eu digo que não, e que a inversa é a verdadeira. Quanto á utilidade, não é necessario expender muitas razões para aprovar. É de summa utilidade que o Senado se constitua; a Camara dos Srs. Deputados tem de suspender os seus trabalhos em quanto não tiver logar essa constituição: e, se ella o fizer, donde hão de vir os meios para pagar aos órfãos, ás viuvas, ás classes activas, e reformadas? Á miguelista? Eu não os quero: e esta é uma das razões porque eu desejo que o Senado se constitua, como uma das partes do Corpo Legislativo, para poder ajudar a Corôa, e a outra Camara; e nem uma nem outra podem occupar-se dos importantissimos assumptos que lhe são attribuidos, sem que o Senado tenha existencia, esteja constituido. Entendo que o meio, proprio de o conseguirmos já é a eliminação, ou antes abstracção, dos Senadores do Ultramar; se a fizermos; poderemos constituir-nos, no caso contrario Caveant Consules.... Se no meu Requerimento ha uma aberração da Lei, no que foi lido depois ha mil, e mil vezes maiores: primó, porque aberra da Lei das Eleições; secundo, porque lia applicação do methodo injuria pessoas que já existem. Se chamamos todos os Substitutos de um Proprietario só porque não compareceu, se elle vier depois, e disser — aqui está o meu mandato, eu sou Senador por tal Circulo — havemos de dizer-lhe que entre, e o Substituto chamado por nós ha de sahir! Se admittirmos a Proposta do Sr. Feio, esta póde ser a consequencia. Alguns Senadores ha de quem o Senado não tem noticia, que estão em paizes estrangeiros, e para quem está em paiz estrangeiro até a Ordenação - concede maior lapso de tempo; ora as Côrtes foram convocadas no principio de Novembro para se reunirem em 9 de Dezembro, era possivel que nos paizes onde estão os Senadores á que alludo, ainda se não soubesse; um barco de vapôr arribado, ou uma embarcação affastada da derrota por algum temporal dos que nas Costas do Reino costuma haver tudo isto era possivel que fizesse com que lá não chegasse a noticia da Eleição; e então haviamos de excluir estes ausentes? Por minha parte, digo que não, porque entendo que isso seria apartar-nos inteiramente da Lei sem motivo. Insisto por tanto na necessidade de que o meu Requerimento se approve, aliàs parece-me que não teremos Senado.

O Sr. Cordeiro Feio: — Todas estas razões que apresentou o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, eu as approvo; e quem póde deixar de reconhecer, a necessidade de nos constituirmos? Mas tirar dahi a illação de que nós em minoria interpretamos a Constituição, dizendo qual é o numero de Membros necessario para constituir o Senado, isso que eu não sei como se possa fazer. — Diz o Sr. Barão que actualmente se não deve contar com os Senadores do Ultramar, porque não existem. Eu leio um Artigo do Regimento que adoptamos, e vejamos se se conta com gente que ainda não existe; é o 1.° e diz assim =...A Sessão preparatoria começará logo que estejam reunidos a metade e mais um dos Membros que devem compôr a totalidade da Camara... = Podem estar ou não estar, mas é por isso mesmo que se determina que seja metade e mais um. Deviam nomear-se 70 Senadores que, com outros tantos Substitutos, são 140; e não é este numero sufficiente para haver 36 a fim de constituir a Camara? Sem duvida, porque 36 é a quarta parte; e para a haver, é que se mandam eleger os Substitutos, porque se senão contasse com certas faltas, bastaria que a Constituição dissesse que se reunissem os dous terços ou os tres quartos. — Ora se nós começâmos a interpretar assim o Artigo da Constituição, fundados no mesmo principio poderemos tambem dizer que se não contem os Senadores de Braga porque não estão eleitos, visto que não devemos contar -com os que não existem; podia acontecer que se annullassem algumas Eleições, e não se contava tambem com os Membros desses: Circulos: de fórma que seguindo a regra que se quer applicar ao Ultramar, podia dar-se a hypothesis de que meia duzia de Senadores se julgassem legaes para constituir a Camara! Eis-aqui um absurdo, se se admittisse o principio do Sr. Barão. — A maioria da totalidade, que é bem expressa, é a maioria da totalidade dos Membros da Camara: tanto a Constituição como a Lei das Eleições, o que quer é ter o maior numero de Membros possivel. Note-se bem que no caso da renovação da Camara dos Senadores, apesar de se fazer nova Eleição, a Lei determina que compareçam os ultimos Membros do Ultramar em quanto não chegam os novamente nomeados; e isto porque quer que estejam todos. Portanto, entendo que nós nem temos direito nem estamos em circumstancias de eliminar os Senadores do Ultramar.: devemos fazer por nos constituir, irias por modos legaes. Voto contra o Requerimento.

O Sr. Trigueiros: — Votei na Reunião passada que se tractasse deste assumpto, porquê via que era necessario acabar com esta questão; entretanto, o votar que ella se discutisse não é votar, sobre o numero de Membros com que: se deve constituir á Camara dos Senadores. Eu nem estou preparado para a discussão nem, quando o estivesse, poderia dizer muita cousa, por; isso, serei breve. — Abundarei nas razões do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, quando elle me demonstrar que não temos outro meio de nos constituir, para evitar os males que elle pondera, e que eu receio tambem; nesse momento, que ainda não chegou talvez, eu votarei pela sua opinião porque estou pela regra de que a salvação do Povo é a primeira Lei do Estado: entretanto estou persuadido com o Sr. Feio, que os meios se não acham esgotados. — Quando o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, sustentando o seu Requerimento, disse que a Lei não podia contar com entidades não existentes, creio que se não fundou perfeitamente no sentido da mesma Lei, porque esta não falla das Eleições existentes, falla do numero legal que prescreve a Lei das Eleições. A mim parece-me que se formos applicar o argumento do Sr. Barão, tanto quanto elle o póde ser, e até aonde elle póde ser levado, chegaremos áquillo a que o Sr. Feio com razão chamou absurdo. Com effeito abstrahindo dos Senadores do Ultramar, porque não sabemos que existam, e dos de Braga (e esses com mais razão) porque sabemos que não existem, podemos ampliar o argumento applicando-o igualmente a outros Circulos, e leva-lo á tal ponto, que tiremos a conclusão de podermos constituir-nos com tres Membros! Se é valido o argumento para os do Ultramar, tambem o ha de sei para os de Braga, porque não têem existencia; ou então não póde ser poderoso acolá falhando aqui. Parece-me que nós caminhâmos mal querendo descontar, para nos constituirmos, aquelles Senadores que não existem e nos faltam, despresando aquelles que nos sobram quando tratemos de fixar o numero legal; eu me explico: não existem os do Ultramar, quer-se o desconto, mas existem Proprietarios é Substitutos em numero maior do que é necessario para constituir a Camara, e não os temos em conta; de sorte que descontâmos o que não temos, e não contâmos o que temos!! Não entendo este modo de pensar, e creio que á consequencia que se pertende tirar da não existencia dos Senadores do Ultramar se não comprehende nos principios. Concluo que me não parece seja forte, o argumento da não existencia ou impossibilidade de comparecimento dos Senadores do Ultramar, porque nós representâmos esses Estados, que hão de observar as nossas Leis e não os excluimos dessa obrigação, e porque se essa razão é forte para elles, forte ha de ser tambem em relação aos outros Circulos aonde não existem Senadores: repito que não entendo se devam descontar aquelles que não temos sem attenção aquelles que poderiamos ter; e que a Lei suppõe nos sobram mesmo admittida a probabilidade dessa falta.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Por bem combinadas que pareçam as razões dos nobres Senadores não abalam as minhas opiniões: vou mostra-lo. — Sr. Presidente, a Constituição exige que as Camaras legislativas, para deliberar, tenham presentes metade da totalidade de seus Membros: porém a maioria legal é metade e mais do numero que existe; não existem senão os Senadores que estão eleitos, logo não se póde contar com outros: o contrario seria dar vida ao que não existe, isto fôra um milagre, e estes não os vejo eu ha muito tempo. Pois nós queremos persuadir-nos que ha um Senador por Macáo, quando devemos presumir o contrario?! Não sabemos que alli houvesse Eleições, ou antes sabemos que as não houve; (Apoiado) faltam-nos quatro Membros, e queremos esperar pelos Senadores ultramarinos! Tudo que não fôr referir a maioria legal deste Senado áquillo que já existe, trará comsigo o absurdo (em que eu não quererei cahir) de que o andamento da Lei fundamentando Estado está dependente da vida ou da morte de alguns Senadores. Se ámanhã a cholera-morbus fizesse uma viagem a Portugal, se atacasse uns poucos de Membros eleitos, para esta ou para a outra Camara, segundo os principios que eu combato, — Adeus Corpo Legislativo; adeus Throno (talvez). Ora isto é um absurdo: e as unicas pessoas que se não persuadem são aquellas que se não querem persuadir... Existem Proprietarios? Tanquam non esse. Existem Substitutos que não querem vir? Tanquam non esse. E havemos de ficar á espera de que o rheumatismo faça menos estragos para nos podermos constituir? Eu que sou provinciano, desejo contar corri os meus lares, e declaro que, se isto se demorar até á canicula, vou-me embora, por que não vejo outro modo de constituir o Senado, — ou esperar até esse tempo, ou adoptar a maioria que proponho.

O Sr. Trigueiros: — Com quanto eu respeite muito as opiniões do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, tenho infelizmente a declarar, que ellas me não convencem, porque apenas tocou em um dos meus argumentos, despresando os outros. S. Ex.ª insistio na sua resposta particularmente, dizendo, que da minha opinião se não podia seguir, senão um absurdo porque a Lei não póde contar com o que ainda não existe. Eu, porém, torno a repetir, que quando a Constituição fallou no numero que deveria haver para constituir a Camara, se quiz referir ao numero, que se achasse exarado na Lei das Eleições; Darei as razões que tenho para assim interpretar a Lei. Quando a Lei quiz que na maioria se comprehendesse metade, e mais um do numero total.... teve-o em vista assim; porque entendeu, que as nossas deliberações deviam ser muito meditadas, e tractadas com muita sisudeza, e que estas haviam de obrigar todo o Paiz, e que para ellas se tornarem legitimas, devia ser ouvida, pelo menos, metade e mais um dos Senadores do numero legal da Representação geral, sem excepção de um só; por quanto, posto que as nossas possessões Ultramarinas, não possam ser aqui representadas de prompto, pelos seus especiaes Representantes, os Seus interesses, comtudo, não deixam de ser considerados aqui pelos outros Senadores; porque nós não somos só Senadores de um, ou outro ponto do Paiz, somo-lo de todo, e com obrigação de considerar, e attender ás precisões de todos elles; assim como todo o Paiz, sem exceptuar o Ultramar, fica obrigado a respeitar as nossas decisões. (Apoiado.) O Sr. Senador porém, não respondeu ao meu argumento, isto é, á conclusão que eu tirava do seu; por quanto, se elle é forte a respeito do Ultramar; porque o não ha de ser tambem a respeito de Braga? Quanto porém aos outros argumentos, de que o Sr. Senador se servio, esses não me pertence certamente a mim o responder-lhe; porque, torno a repetir, se alguem fôr capaz de me demonstrar, que não é possivel constituir o Senado de outra maneira então serei eu o primeiro a estar pôr esses principios, ainda que contra a minha convicção juridica; mas farei esse sacrificio: — apesar de querer eu que o Senado se Constitua só, e uni-

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camente empregados todos os meios legaes; mas em quanto um só dos possiveis, e ainda não esgotados, nos restarem; não mudarei de opinião. Tenho respondido.

O Sr. Leitão: — O meu estado de saude não me permite ser muito extenso: com tudo, julgo necessario fazer algumas reflexões nesta questão, porque ella, a meu vêr, é muito importante. — Tracta-se de saber como se poderá actualmente constituir o Senado, isto é, de saber qual e o numero de Senadores, que no momento presente, nas actuaes circumstancias, se deve julgar ser a totalidade dos Membros desta Camara. É esta precisamente a questão; porque diz a Constituição, que se não poderá tomar resolução alguma, sem estar presente a maioria da totalidade dos seus Membros. Temos pois que examinar qual é o numero. Uns Srs. dizem que esta totalidade é de 71 Membros, e outros querem que seja de 64; porque, dizem estes, se deve abater ao numero de 71, os 7 que hão de ser Eleitos pelas Possessões Ultramarinas, devendo, por conseguinte, contarão unicamente agora com 61 para se formar a totalidade. Eu não posso, Sr. Presidente, deixar de seguir a opinião de que se não póde contar actualmente com os 7 Senadores, que se hão de nomear pelo Ultramar, e para assim pensar, fundo-me em principios de Direito; porque realmente a questão o é de Direito. Eu não fallarei nas razões de conveniencia publica, em que tocou o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa porque acho desnecessario faze-lo, e tambem porque todos nós estamos conformes a esse respeito, e certos da grande conveniencia que ha em Constituir o Senado quanto antes. (Apoiado.) Sr. Presidente, Membros de uma corporação qualquer, são as partes integrantes dessa corporação: — mas não e possivel considerar como partes integrantes de uma corporação entidades, que não só não existem actualmente, mas que até não deviam nem podiam existir. Não é possivel considerar como partes integrantes deste Senado, Senadores que ainda não foram Eleitos, que não o podem ser, nem o devem ser no momento actual; porque é claro, que elles o não podem ser, sem que se receba a ordem para as Eleições, e ha Provindas no Ultramar, aonde de certo se não recebeu ainda essa ordem; e outras haverá em que mesmo esta Lei, ainda não seja Lei, por não ter sido ainda alli publicada, como é por exemplo Timor. (Apoiados.) Não é pois possivel fazer parte desse todo Senadores, que ainda o não são, e que só o virão a ser em uma certa época. — Disse porém o meu nobre amigo, o Sr. Secretario Trigueiros, que se se lhe mostrasse que não havia outro meio para poder constituir o Senado, elle então, fazendo um sacrificio (mas contra a sua convicção), votaria pelo numero menor. Respondendo, digo que eu o não faria, uma vez que tivesse á certeza de que para constituir o Senado de outro modo, se alterava o principio que a Constituição estabelece, e que deve sempre respeitar-se. (Apoiados.) Faço-o porém assim, porque estou persuadido, que a minha opinião é conforme aos principios de Direito. — Quando uma Lei estabelece qualquer disposição, que deve ter logar passado um certo termo, essa disposição não tem effeito nem execução, senão passado esse termo. Qualquer obrigação, qualquer direito dependente de um termo, não tem effeito senão depois de ter passado esse termo. Estes principios são de Direito, e applicação delles ao caso presente, é de palpavel evidencia; porque esse termo está, pela natureza da cousa, envolvido na disposição da Lei = in re ipsa dilationem = e acha-se comprehendido no sentido das palavras que se lêem na mesma Lei. Se pois não póde ter effeito, como queremos nós dar-lho agora?

Eis aqui pois o principio de Direito, que ou julgo applicavel exactamente ao caso presente; é este argumento a que eu queria ouvir dar resposta, isto é, desejava se me mostrasse, ou que o principio é falso, ou que a applicação não é exacta: logo que isto se me mostrar, eu não terei dúvida em mudar de opinião. —Tenho pois mostrado qual é o argumento principal que eu tenho, para dizer que se não póde contar actualmente com os Senadores, que hão de ser Eleitos pelas Possessões Ultramarinas. Agora, em quanto á applicação que se tez dos Senadores que não existem em Portugal, eu responderei que ha muita differença entre logares que não existem, e logares que estão vagos: eis aqui a resposta. (Apoiados,) Os logares desses Senadores, que sendo Eleitos, morreram, ou deixaram de ser Senadores por motivos de doença, ou por quaesquer outros, devem reputar-se vagos, porque se fez a Eleição competentemente; mas os logares dos Senadores do Ultramar ainda não existem, porque ainda não tem effeito a respeito delles, a disposição da Lei. Tenho por tanto respondido ao argumento principal, que se tem produzido contra a opinião que sustento; mas quereria vêr agora responder ao meu argumento. — Peço a V. Ex.ª desculpe o não me estender mais, porque não posso, nem mesmo julgo ser necessario. (Apoiado.)

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Em resposta ao illustre Secretario direi, que pelo que pertence a Braga, ainda não fixei a minha opinião; por quanto o Senado ainda não disse que esses Eleitos não eram Senadores: — quando o disser eu verei então como hei de pensar.

O Sr. Trigueiros: — Como o Sr. Senador Leitão pediu a resposta aos seus principios, isto é, de que a Lei não podia vigorar a respeito do Ultramar, por não ser ainda lá conhecida: — eu responderei a S. Ex.ª, dizendo, que quando a Constituição exigiu metade do numero legal do numero marcado na Lei das Eleições, foi por que já preveniu que poderiam faltar alguns Senadores, e foi tambem por essa razão que se mandou eleger um numero de Substitutos, igual ao dos Proprietarios. Em quanto porém ao modo como S. Ex.ª respondeu ao meu argumento relativamente a Braga, direi, que o modo porque o Sr. Senador o fez envolve muita metaphysica; porque eu não sei bem distinguir a differença da não existencia dos Senadores do Ultramar, da não existencia dos Senadores por Braga: embora uns não existam, porque não foram Eleitos, e os outros, porque a Eleição não vigorou. O que eu sei, e o que é uma verdade, é que os não ha em Braga; mas no Ultramar ainda póde admittir-se a supposição de que os haja, e o argumento do nobre Orador, pelas suas mesmas razões, póde ser em meu favor. Confesso pois que as razões apresentadas pelo Sr. Senador não me fazem pezo, e que as acho metaphysicas em demasia para as comprehender. Agora repito, que eu quereria antes fazer uma ferida na Lei, do que perde-la, e destrui-la.

O Sr. Conde de Villa Real: — Sr. Presidente, eu faço ampla justiça aos illustres Senadores que têem fallado nesta questão, e concórdo perfeitamente com elles no desejo de vêr constituida esta Camara, preferindo entre os dous modos propostos o que sustentou o Sr. Manoel Duarte Leitão, e o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — mas não creio que mesmo adoptando-o nós possamos conseguir aquelle fim, de um modo satisfatorio. — Toda esta discussão versa sobre a interpretação ou he um Artigo da Constituição, ou sobre a interpretação da Lei Eleitoral: cada um de nós tem, certamente, o direito de dizer a sua opinião sobre este assumpto.

Mas de facto o que se está procurando é fugir a novas Eleições neste momento: Ora, eu acho que são inevitaveis em muitos Circulos, e que será indispensavel fazer com que se proceda a ellas, e assim cessará toda a difficuldade. Devem ser 61 Senadores não contando os de Braga: destes 61 ha 15 Circulos por onde devem entrar Substitutos, por terem sido os Proprietarios eleitos por varios Circulos; — mais 8 por se haverem escusado os Proprietarios, e que estão ausentes. Apesar de haverem tomado assento alguns Substitutos, ainda faltam Senadores nesta Camara por differentes Circulos, e não ha nenhum por Braga, nem por Alemquer, nem por Arganil. Temos nós direito de excluir esta Representação? Não, por certo: logo deve proceder-se immediatamente á Eleição daquelles Circulos que não estão aqui representados. Não posso deixar de apontar a este respeito o que se pratica em Inglaterra, paiz que deve servir de modêlo em quanto a principios de Liberdade Constitucional, e ao par do qual, oxalá que nós estivessemos nesse ponto. (Apoiados) — Alli, logo que se dá uma vagatura, immediatamente se manda proceder a nova Eleição; e em quanto isto senão imitar entre nós, terão muita razão os povos em se não julgarem representados na sua totalidade. Esta circumstancia é essencial, porque devemos concordar que a nossa força não nos vem do numero de 30, 40, ou 70 Senadores, só procederá de ser a nossa legalidade reconhecida por todos; e sem esta legalidade nada podemos contar com o apoio da Nação. (Apoiados.) Da falta desse apoio resultará o discredito, do qual se seguirão consequencias que até podem conduzir ao despotismo. (Apoiados.) É pois minha opinião, que ainda que esta questão se decida por um modo, ou por outro, não se solve a difficuldade mesmo pelo que toca ao numero dos Senadores: a razão é clara porque é indispensavel que haja sempre um numero de Senadores maior do que a Constituição exige, para se achar supprida a falta daquelles que não poderem comparecer por incidentes inesperados, como molestia, ou outros, como acontece por exemplo com o Sr. Raivoso, que já aqui veio, e em que senão se apresentou hoje, é certamente porque a sua doença lho prohibiu absolutamente. É pois indispensavel que estejamos em numero sufficiente para que o impedimento de um ou outro, não suspenda os trabalhos desta Camara. Já se insinuou que convinha que nos constituissemos por causa dos receios do que possa sobrevir de fóra desta Camara. Não desejo que influam no meu voto, porque entendo que não ha força que possa competir com as das Camaras, uma vez que ellas estejam legalmente constituidas; (Apoiados.) Sr. Presidente, se ha seis semanas que estamos reunidos, se se tivesse mandado proceder a algumas novas Eleições, teriamos agora aqui o numero competente para nos constituirmos; e sem isto se fazer, torno a repetir, não podemos sahir com legalidade dessa questão. — É esta a minha opinião.

O Sr. Vellez Caldeira: - Como o nobre Conde que acaba de fallar fez justiça aos sentimentos de todos os que aqui se acham reunidos, reconhecendo que desejam observar, e manter illesa a Constituição do Estado nada direi, senão que as palavras que algum de nós solta no calor da discussão, como absurdo, e outros assim, não trazem de modo algum um ataque pessoal aos Membros que não são da nossa opinião. (Apoiados.)

A questão de que se tracta presentemente não é de interpretar um Artigo da Constituição: esse Artigo é claro, e essa materia está decidida; agora só se tracta de verificar qual é essa maioria requerida pelo mesmo Artigo. O nobre Conde quando tractou disto, fallou sómente sobre cousas que nada tinham com a questão; tractou unicamente da vantagem de novas Eleições: poder-se-hia ter mandado proceder a ellas, mas isso não faria com que agora estivessem já aqui os novos Membros, e poderia haver os mesmos inconvenientes; mas isto nada vem para o caso.

Sendo principio indubitavel que a nossa força provêm da nossa legalidade, tambem é indubitavel que nenhum de nós quer atacar essa legalidade; e depois do modo por que o meu honrado Collega e Amigo o Sr. Manoel Duarte Leitão mostrou que era legal o constituir-se a Camara sem entrarem em conta os Senadores pelo Ultramar, escusado é dizer mais nada; os outros Senadores de que se tem fallado, esses já foram Eleitos, e já foi reconhecida a existencia dessas Eleições, isso já não tem applicação ás nossas decisões. — Nós o que dizemos é que ha Circulos aonde ainda não houve essas Eleições, nem alli podia ter chegado o conhecimento da Lei, porque ainda lá não podem ter chegado as Ordens; e segundo se pensa o ultimo navio que sahiu (que foi o Brigue D. Pedro) arribou ao Rio de Janeiro — A Constituição diz, que são necessarios metade e mais um dos Senadores para nos constituirmos, isto é, dos Senadores Eleitos; logo era necessario que os do Ultramar estivessem Eleitos, e elles não estão. — Esta decisão é importante, não a paralisemos se o numero presente é legal (segundo a minha opinião) com elle podemos tomar decisões, agora se o não é, então não podemos.

O Sr. Trigueiros: — Eu pediria que a votação fôsse nominal quando se tractor de votar, porque a materia é muito transcendente. (Apoiado.)

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Eu estranho ouvir expender ao nobre Senador a idéa de que nós poderiamos chamar os Substitutos daquelles Senadores que foram eleitos por differentes Circulos, sem primeiro fixar aquelle que o Proprietario deve representar. Em quanto a mim tal collocação seria uma infracção da Lei, e mui flagrante; porque a Lei diz que o Senador representará primeiro o Circulo da sua naturalidade, depois o da sua residencia, e finalmente aquelle aonde obtiver maioria de votos. Por exemplo, o illustre Senador per tende que o meu nobre Amigo o Sr. Marquez de Saldanha, havendo sido eleito por differentes Circulos, tendo porém muito maior numero de votos em Coimbra do que em outro qualquer 7 poderia representar um destes, e não Coim-

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bra. Eu entendo exactamente o contrario, e hei de votar neste sentido O Sr. Marquez de Saldanha deve representar Coimbra, porque é o logar que a Lei lhe dá, e nós não podemos tirar-lho sem violar a Lei. Nem eu entendo que se possa ser tão escrupuloso na observação da Lei um dia, ou n'um certo ponto, e tão indifferente n'outro. - Ouvi dizer que não estão ainda esgotados todos os meios, quando pelo contrario está Junta preparatoria reune-se ha quarenta e dous dias sem avançar um só passo, porque apenas tem recolhido algumas Certidões de doentes. Se nós houvessemos de discutir, e votar com Certidões de doentes, já estavamos em numero; mas com baixas ao hospital não se vai á guerra. E se continuarmos nesta paciente resignação, perguntando todos os dias se apparece alguem nos Barcos de Vapôr, poderemos esperar até á vinda do anti-Christo. Esta organisação do Senado está dando, não ao Povo Portuguez, porque esse tem visto peiores cousas, mas aos Estrangeiros um quadro pouco recommendavel em quanto ás nossas luzes, ao nosso patriotismo, ou á nossa Constituição. Se não nos constituirmos brevemente, a Camara dos Sr. Deputados não póde começar os seus trabalhos, a Corôa póde vir a carecer de meios de occorrer aos seus encargos; o ultimo emprestimo finda no fim deste mez, e depois;... com que se ha de pagar o pret aos Soldados, o soldo aos Officiaes, e os ordenados aos Empregados Civis? E por esta occasião lamentarei diante dos meus illustres Amigos e Collegas os Srs. Ministros d'Estado, que de tão grandes emprestimos nem um mez sómente chegasse ás viuvas, e reformados da guerra da Peninsula. O illustre Senador, o Sr. Duarte Leitão, mostrou com a luz da razão que abstraindo nós dos Senadores do Ultramar, nenhuma violencia faziamos á Constituição, e ninguem lhe respondeu ainda, todos os seus argumentos estão de pé; e repetir que não temos ainda esgotado todos os meios, é pertender que nós estejamos aqui sem fazer nada até ao dia do juizo. Um illustre Senador recêa que não possamos reunir nem 33 Senadores: mais um motivo para que o illustre Senador approve o meu Requerimento, porque se é difficil reunir 33, mais difficil será reunir 36. Portanto não vejo que estejam rebatidos nem os argumentos produzidos pelo Sr. Duarte Leitão, nem aquelles que eu pude apresentar a favor do meu Requerimento. Olhem os illustres Senadores para as circumstancias do Paiz, olhem para o Thesouro, considerem a situação em que ficará o Ministerio sem Orçamento sanccionado, e votem como entenderem.

O Sr. Cordeiro Feio: — Parece-me, Sr. Presidente, que o nobre Barão da Ribeira de Sabrosa, quando disse que não havia escrupulos em atacar a Lei, se referia á Proposta que fiz para que fôssem chamados os Substitutos dos Senadores ausentes, que se acham tora do Reino, procedendo-se neste chamamento de maneira que aos ditos Senadores ausentes se conserve uma Cadeira vaga, d'entre as muitas que lhes pertencem, para que possam tomar assento nesta Camara logo que se apresentem. Esta Proposta, ou Requerimento, que tive a honra de fazer, longe de atacar a Lei é, pelo contrario, a execução da propria Lei Eleitoral, na parte que diz respeito a constituir o Senado, para cuja constituição unicamente estamos authorisados, e não para interpretarmos Artigos e Artigos fundamentaes da Constituição, como o nobre Barão pertende no seu Requerimento. Com effeito, Sr. Presidente, o Artigo 80 da Lei Eleitoral lixa um dever a todos os Senadores, que é o de se apresentarem aqui no dia designado, e este dia acha-se marcado na Constituição, é o dia 2 de Janeiro; e pelo Artigo 12.° a mesma Lei manda eleger tantos Senadores Substitutos, quantos os Proprietarios para o fim unico de constituir o Senado. Á vista destes dous Artigos da Lei, quem poderá duvidar que a Lei authorisa os Senadores Substitutos a tomarem assento nesta Camara, quando os Proprietarios não comparecerem, e a sua presença fôr necessaria para constituir o Senado? E sendo esta a minha Proposta, é evidente que longe de ser uma violação da Lei, é pelo contrario o cumprimento da Lei, e tão necessario e sagrado que elle é indispensavel para constituir e dar andamento aos Corpos Legislativos. A circumstancia feliz de ficar ainda uma Cadeira para os Senadores, cujos Substitutos peço que sejam chamados, ainda sustenta muito mais a minha Proposta, e já mais tal circumstancia se póde allegar com razão, para a contrariar, chamar-lhe violação da Lei. Agora, Sr. Presidente, não se tracta de designar os Circulos que os Senadores ausentes devem apresentar, pois isso seria tractar de um objecto que póde succeder não vir a ter logar se elles aqui não comparecerem: quando os Senadores se apresentarem, então, e só então, é que á vista da Lei se deve vêr quaes os Circulos que cada um deve representar, e á Camara, quando tiver o numero legal para deliberar, é que pertence o decidir os casos duvidosos, e não se deve agora tractar deste objecto, e muito menos empecer por sua causa o constituir-se o Senado. Neste procedimento, longe de fazer-se injuria aos Senadores ausentes, pelo contrario a Camara mostra por elles grande deferencia, quando lhe deixa uma Cadeira, para quando comparecerem, pois é para mim incontestavel que a Camara tem o direito de preencher todos os logares vagos.

Agora pelo que pertence á outra asserção, de que ainda ninguem respondeu aos argumentos do muito digno Senador o Sr. Duarte Leitão, direi que os argumentos são em termos tão juridicos que eu os não pude entender; mas é certo que toda a questão se reduz a examinar se para fixar a maioria da totalidade se deve contar com o numero dos Senadores que a Lei marca e manda eleger, ou sómente com os Senadores que de facto se acham eleitos. Pela primeira hypothesis será representada a Nação pela maioria dos seus Representantes, e é esta a intelligencia natural e obvia; e no 1.º Artigo do Regulamento que a Camara adoptou provisoriamente, lá se acha uma determinação similhante, mandando contar o numero dos Membros de que a Camara se deve compôr e portanto não póde ser absurdo, como S. Ex.ª diz, e com os Membros do Ultramar, posto que ainda não estejam eleitos, porque d'esses Senadores do Ultramar tambem o Senado se deve compôr, muito embora ainda não estejam eleitos. Em quanto á segunda hypothesis, isto é, contando-se sómente com o numero dos Senadores efeitos, a maioria deste numero de certo não representa a maioria da Nação, o que bastava para rejeitar tal hypothesis, pela qual tambem se não deveriam contar com os Senadores do Circulo de Braga, que tambem não existem, e tambem se não deviam contar com todos aquelles que pertencessem aos Circulos cujas Eleições fôssem annulladas, o que a verificar-se em grande numero de Circulos, e viria a Camara a constituir-se com uma pequenissima parte daquelles Senadores que pela Lei são determinados, o que certamente não póde admittir-se, aliàs a Nação diria que esta Camara não está legal, que a minoria de seus Membros não podia decidir uma questão de tanta transcendencia; e bem conheceis que pessimos resultados daqui podem resultar. Voto contra o Requerimento.

O Sr. Ministro da Guerra: — Pedi a palavra quando o meu nobre amigo, o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, no seu discurso alludio á desigualdade dos pagamentos relativamente aos empregados activos e aos reformados, classe esta que não merece ao Governo menos consideração do que a qualquer dos honrados Membros desta Reunião. Sr. Presidente, se a Camara dos Senadores estivesse já constituida, ser-me-hia mui facil responder de um modo que estou certo que o nobre Barão, cujos sentimentos conheço de muito perto, não deixaria de votar as sommas indispensaveis para as despezas do Estado, ficando ao mesmo tempo persuadido que os actos do Governo (na parte de que fallo) não mereciam a sua censura. Como não estamos constituidos, não direi mais nada sobre este assumpto; mas tal incidente não podia deixar de ser respondido, assegurando eu aos nobres Senadores, que neste momento o Governo se occupa em melhorar a sorte das classes não activas; mas tantas são as despezas a seu cargo, que tom sido impossivel fazer até agora cousa alguma em seu favor.

Era minha intenção não sustentar opinião alguma sobre a questão em que actualmente a Reunião se acha empenhada, porque ainda que tenho a honra de ser Senador Eleito, sou igualmente Ministro, e não queria dar a entender que o Governo tinha mais desejos de que a questão se decidisse desta ou daquella fórma: mas o dever que tenho, como Membro do Senado, de fazer com que antes de tudo se olhe para a Lei, obriga-me a dizer ainda algumas palavras. — Direi pois, sem fazer novas profissões de fé, e conforme com os desejos de todos os que se interessam no bem do paiz, que uma das primeiras necessidades publicas é que a Camara se constitua, E como quereremos nós obter este fim, por uma Lei que façamos? Não. Mas a que existe precisa interpretação? A mim não me cumpre interpreta-la, principalmente depois de ter ouvido fallar Magistrados habilissimos, e cujos talentos não só eu, mas a Nação inteira respeita: mas em fim já que a maioria parece propender para a necessidade da -interpretação, é preciso vêr bem quaes são as suas vantagens, e desvantagens; ainda que certamente não serei eu quem faça decidir a questão, direi, que quando a Constituição marcou que as deliberações do Senado só podessem ser tomadas por metade da totalidade de seus Membros, parece-me que nisto não houve uma idéa vã, houve um conceito muito determinado. A meu vêr o motivo disto é que a Lei suppoz que, para cada uma das Camaras deliberar, era preciso mais alguma cousa do que a formação da Mesa, e as Eleições das Commissões; e antevendo talvez que varios impedimentos diminuiriam o numero de Membros, exigiu para o andamento dos negocios a maioria do numero total. Trago isto para dizer que sempre que não decidirmos isto pelo Regimento que adoptámos, entramos n'uma interpretação de Lei r e era isto a que eu queria fugir. — Aqui terminarei, para que quando eu votar se saibam as razões que moveram a minha convicção.

O Sr. Castro Pereira: - Tenho ouvido nesta grave questão, de uma e outra parte, os mais habeis e intelligentes dos meus. Collegas, que a têem tractado de uma maneira que pouco deixa a desejar, e no fim de tudo ainda não sei como hei de votar, porque não desejava que esta Reunião desse o máo precedente de tomar sobre si o que se reputa interpretação (e eu chamarei só intelligencia) de Lei. Por um lado, é claro, e todo o mundo sabe que metade de 71 são 35, e por consequencia que a maioria daquelle numero são 36: esperando pois que haja presentes 36 Senadores a Camara póde constituir-se, e não ha questão, por que as Eleições tomadas por aquelle numero ninguem diz que sejam illegaes. Por outro lado, o que eu ouvi ao meu illustre amigo, o Sr. Leitão, esclareceu-me sobre o verdadeiro modo de dar apropriada intelligencia á Lei; a cujo respeito confesso que não se produziu razão alguma que abalasse os argumentos do nobre Senador. — Quanto aos meios propostos pelo Sr. Feio para supprir a falta de Membros do Senado, rejeito-os porque ha uma Lei que determina o methodo das preferencias, e por que estou persuadido que, mesmo adoptando-se aquella Proposta, ficâmos na situação em que até agora temos estado; não poderemos constituir-nos, e com a falta desse constituimento, poremos em embaraço a Camara dos Srs. Deputados. É preciso sahir disto: estamos perto de 36, em tres ou quatro dias talvez appareça mais algum Senador: portanto pediria que esta questão se addiasse, ao menos até depois de ámanhã; então com mais conhecimento de causa poderei por-me no caso de votar: hoje não o posso fazer, não obstante o que tenho ouvido; conheço a minha incapacidade, mas fallo com franqueza.

O Sr. Cardoso da Cunha: — Não presumo ter a vaidade de poder accrescentar cousa alguma por parte dos Srs. Senadores que têem sustentado que sem tocais no Artigo da Constituição, a maioria da totalidade dos Membros desta Camara é 33, e não 36. Sobre este ponto apoio o que disse o Sr. Leitão, e não sei se mais alguns Srs. que tractaram a questão pelo lado da conveniencia publica, entretanto não posso deixar passar a idéa de que o Artigo 40 da Constituição é violado quando se resolva que a maioria são menos de 36 Membros. O Artigo não falla em numero, não o fixou; se o tivesse fixado, se tivesse dito precisamente tal numero, era evidente que nós o violariamos se tomassemos esse numero para menos. A fixação delle foi reservada para a Lei Eleitoral, tanto a respeito desta como da outra Camara: é por tanto essa Lei a que devemos interpretar para o caso presente, é a que nos deve servir de guia nesta questão: e então está demonstrado a todas as luzes que não é possivel que as Eleições se tenham concluido em algumas possessões, (em Timor, por exemplo) e que portanto os Senadores por ellas senão devem contar, por isso que os não ha. — Não tendo em vista accrescentar cousa alguma aos argumentos e razões apresentadas pelos meus illustres amigos, não tenho a refutar as contrarias, porque julgo as primeiras subsistentes.

Entretanto, ouvi o Sr. Conde de Villa Real fallar genericamente sobre a conveniencia, de

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mandar proceder a novas Eleições; eu apoio o nobre Conde, na idéa que emitto, mas Como a não levou a effeito, porque não apresentou Requerimento para esse fim, eu pediria, a S. Ex.ª quizesse manda-lo para a Mesa, aliàs eu farei. — Nada mais direi porque tinha pedido a palavra, unicamente para o que acabo de dizer, e não para fallar precisamente na questão sustentada pelos nobres Senadores, que partilham a minha opinião.

O Sr. Bergara observou, que a idéa apresentada pelo Sr. Cardoso, só poderia tomar-se em consideração, depois de decidido o Parecer da Commissão de Poderes (Apoiado.)

O Sr. Conde de Villa Real disse, que não havia apresentado o Requerimento de que fallára o Sr. Cardoso, porque julgava que o mais opportuno momento de decidir aquelle ponto, era posteriormente á resolução do Parecer da Commissão de Poderes, dado para Ordem do dia que entretanto ainda repetia, que todos conheciam a necessidade de haver no Senado 36 Membros (ao menos), para tractar de quaesquer questões, para que no Paiz se conhecesse, que a Camara estava legalmente constitui da.

Entrando em discussão o addiamento proposto pelo Sr. Castro Pereira, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: = É com muita magoa minha, que me vejo obrigado a combater o addiamento, que propoz o meu nobre amigo e parente; mas no estado da discussão, não posso deixar de o fazer. — Propõe-se o addiamento quando, se apresenta materia nova, ou quando essa materia, não sendo nova, tem sido pouco agitada; mas sobre materia de que nos ternos occupado alguns dias, sobre a conveniencia da qual todos temos formado a nossa opinião, um addiamento não me parece senão um termo de dilação, só proprio a dar ao Paiz, o mesmo escandalo que temos dado. Respeitando, como respeito, a opinião de todos os nobres Senadores, digo que cada um de nós já tem o seu Parecer feito; assim me ensina a experiencia, dos Corpos Legislativos, em que não sou inteiramente novato. Se 48 dias nos não trouxeram os Senadores necessarios para constituir a Camara, como deveremos esperar que elles cheguem daqui a tres?

Quazi todos os que têem sido chamados, respondem que estão doentes, e este termo é o mais vago que ha sobre a terra, porque o homem que está doente, nem sabe quando estará melhor, ou, se o sabe, não o quer dizer.

Por tanto, se ainda esperamos, não fazemos senão produzir a mesmo questão, sem a podermos decidir: se a não decidirmos hoje, não se poderá tambem decidir depois d' amanhã, nem talvez daqui a muitos dias. Se os contribuintes no fim de Janeiro não quizerem pagar, o Governo ha de ser obrigado a recorrer a um meio, porque o Thesouro não se póde fechar, ou então virão aqui os Ministros (como devem vir) e dirão: = Srs. Senadores, fecharam-se as portas do Thesouro, porque não ha com que pagar, e as das Contadorias porque ninguem lhes paga; uns não recebem, outros não pagam, porque nem a pagar nem a receber têem direito. = E nós! Nós estamos á espera dos Senadores do Ultramar......Rejeito o additamento.

O Sr. Castro Pereira: — Eu creio que me expliquei com bastante clareza. Quando disse que propunha o addiamento, disse logo que o pedia principalmente porque o a minha ignorancia me não deixava ainda fixar uma idéa para votar com conhecimento de causa sobre este assumpto: é certo que um motivo tão indiferente, como é a ignorancia de um dos mais insignificantes membros desta Assembléa, não vale a pena de addiar a questão, porque eu se tiver a minha opinião formada sobre a questão, posso votar, e no caso contrario posso retirar-me. Mas digo que receio muito o precedente de votar uma questão tão delicada, e comprometter assim, para o futuro, cousas importantissimas: estamos cheios de scismas já politicos, já religiosos; e seria bem fatal que ainda se levantasse outro a respeito da legalidade dos representantes da Camara dos Senadores. Comtudo, torno a repetir que as razões produzidas pelo Sr. Leitão são para mim de tanta monta que, no caso de se rejeitar o addiamento, talvez me determinem a ficar, e votar na questão principal.

Julgando-se discutida a questão do addiamento, foi posto á votação, e rejeitado. — Consecutivamente foi julgada discutida a questão principal.

O Sr. Presidente disse que se ia votar nominalmente sobre o quisito seguinte: — A Camara dos Senadores julga-se constituida, abstrahindo os sete das Provincias ultramarinas, com trinta e tres Membros?

Disseram que sim

Os Srs. A. Pacheco Telles,

A. J. Braamcamp,

B. Barão da Ribeira de Sabrosa,

do Tojal,

Basilio Cabral,

B. A. Zagallo,

J. Cardoso da Cunha,

J. S. de S.F. Albergaria,

J. F. Pinto Basto, Junior,

M. A. Vellez Caldeira,

M. D. Leitão,

Visconde de Beire,

do Sobral,

J. M. M. de Bergara:

e disseram que não

Os Srs. Barão de Fonte Nova,

de Argamassa,

de Villa Nova de Foscôa,

de Villar Torpim,

Conde de Avillez,

do Bomfim,

de Villa Real,

Duque da Terceira,

F. Pereira de Magalhães,

J. Salinas de Benevides,

J. Cordeiro Feio,

L. J. Ribeiro,

Marquez de Fronteira,

P. J. Machado,

Visconde de Geraz do Lima,

de Sá da Bandeira,

de Samodães,

V. P. do R. C. Trigueiros.

Ficou portanto rejeitado o quisito por 18 votos contra 14.

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa, como Relator da Commissão de Poderes, apresentou o seguinte

Parecer.

A Commissão de Poderes examinou a Acta de Ponte Delgada, a qual achou regular.

Parece á Commissão que deve ser proclamado Senador o Sr. João Soares de Sousa, Ferreira de Albergaria, que obteve maioria absoluta por aquelle Circulo.

Casa da Commissão, em 21 de Janeiro de 1839. = Manoel Duarte Leitão = João Cardoso da Cunha Araujo = José Cordeiro Feio = Basilio Cabral = Barão de Villa Nova de Foscôa.

Ficou sobre a Mesa, unindo-se ao principal Parecer ácerca da validade das Eleições

O Sr. Presidente disse que a seguinte Reunião deveria ter logar na proxima Quarta feira (23); terminando esta pouco antes das tres horas do tarde.

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