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DIARIO DO GOVERNO.

Da parte de Hespanha na confluencia dos dois Rios, existem edificios com grandes depositos de grãos; e como o Douro desde aquelle ponto começa a ser commum a ambos os Reinos basta atravessar qualquer dos dois Rios para se salvar o contrabando. Ha muitos annos que o Governo tem para alli mandado destacamentos de tropa para o impedir; mas os contrabandistas não poupam meios de seduzir esses destacamentos: e não tendo podido ganhar com dinheiro, os officiaes que alli têem estado, buscam tractar com elles, convidamos as funcções nas suas terras, e quando encontram algum mais escrupuloso em se arredar do seu posto, vem alli com suas familias visita-lo, armam partida de jogo, ou outra igual diversão, e durante ella conseguem o intento. O certo é que no dia 15 de Dezembro de 1837, me disse um contrabandista Hespanhol meu conhecido, que desde a colheita até então elle, só á sua parte, tinha introduzido em Portugal, cincoenta e quatro mil fangas de cereaes!

Já se vê que isto dá para seduzir alguma gente, não digo officiaes nem gente de caracter.

Torno a dizer, que tractar de evitar o contrabando pelos meios ordinarios, não me parece possivel; porque a Raia é immensa, e de facil transito por quasi toda ella, e as despezas necessarias para uma boa e efficaz fiscalisação, excedem em muito o lucro que o Reino, póde tirar de evitar o contrabando. Finalmente quando em Portugal houver fome, e o pão fôr cáro, ha de se ír buscar pão a outra parte; ou a população ha de diminuir.

Á vista disto proponho em additamento ao 3.° artigo, que logo que o Governo responder ao que nelle se requer, esta Camara nomeie unia Commissão especial, aonde cada um de nós possa alli expender as suas opiniões, a fim de se poder tirar algum proveito desta discussão.

O Sr. Trigueiros: — O meu Requerimento tem sortido metade do effeito que eu pertendia, porque chamou attenção dos meus nobres Collegas sobre um objecto, que eu julgo essencialissimo, e quando não produzisse outra utilidade, esta só seria de muita vantagem. Respondo agora áquelles nobres Oradores, que reputam a primeira parte do meu Requerimento, em que eu peço se recommende ao Governo a execução da Lei de 14 de Setembro de 1837, inutil pela insufficiencia da Lei. O que elles dizem, e pelas razões que o dizem, involve em si a maior censura que se possa fazer a uma Lei: pertendem os nobres Oradores que nada de bom se póde por ella fazer; mas eu entendo, que não ha Lei alguma, cujo objecto seja o bem publico, deixe de ter alguma cousa a aproveitar, e que esta que citei, tem cousas que executadas, podem ser uteis; e quando eu reclamo essa execução, isto não me parece inutil. Os nobres Oradores confessam que a relaxação na execução da Lei é grande. O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa disse, e com muita verdade, que ha homens que se fazem Lavradores para serem os primeiros Contrabandistas; mas ha um meio de poder evitar o contrabando na mão destes, e este meio aponta-o a Lei, exigindo uma severa fiscalisação da parte daquellas Authoridades perante quem se devem fazer os manifestos dos trigos de producção desses Lavradores: se essas Authoridades examinassem, como lhes cumpria, a verdade desse manifesto, que muitos desses homens fazem de muito maior porção de cereaes, do que os que realmente colhem, como manda a Lei, o Contrabando se difficultaria por esta parte; e quando eu reclamo a execução da Lei a tal respeito, não requeiro uma cousa inutil. Essas mesmas Authoridades devem passar guias para os trigos que transitam: estas guias devem ser passadas tão sómente segundo as forças do manifesto, e estas Authoridades devem vigiar que trigos não transitem sem guia; mas ellas as passam de maior porção que o manifestado, e nada lhes importa com a apprehensão dos trigos, que não vão munidos destas guias; logo quando eu reclamo nesta parte a execução da Lei, não reclamo uma cousa inutil. Eu lembrarei aos Srs. que acham, que é inutil essa recommendação, que, segundo me informam, em Celorico da Beira concorrem muitos Cereaes, e pão cozido a um mercado que ahi se faz; e não ha alli ninguem que ignore, que uma grande porção deste pão é estrangeiro, e será possivel deixar de dizer, que aquelles a quem cumpria vigiar sobre a sua apprehensão são relaxados no cumprimento dos seus deveres? E se o Governo punir essas Authoridades será inutil a minha recommendação (…), e mais portos do Sado, (…) pergunta a como está o trigo? Responde-se: o Portuguez a tanto, e o estrangeiro a tanto, e ignora a Authoridade que o trigo é Hespanhol? E então qual é a razão porque o Governo não ha de dar providencias? Qual é o Almocreve, que deixa de dizer em toda a Raia do Alentejo: = eu vou á Hespanha buscar trigo? = Não ha nenhum, que julgue util, ou necessaria esta negativa, e que não passe a Raia com recuas de bestas carregadas de trigo. Não ha Lei nenhuma, por pessima que seja, que não tenha sempre uma parte util, e que se não possa applicar com vantagem ao objecto que teve em vista; e quando eu peço que se execute, parece-me que o faço com Justiça. Cousas ha, que são de todos os tempos, de todos os homens, e que não pertencem a uma côr politica: o que eu requeiro não tem côr, tem só em vista o bem publico, e obriga-me a relaxação neste importante ramo de riqueza Nacional, particularmente da Provincia do Alemtejo, essencialmente agricola, e que me ha de agradecer, ter suscitado esta questão. Os Lavradores não podem vender um alqueire de trigo pelo preço que o vendem, e ainda menos um alqueire de milho. Os Rendeiros pagar suas rendas, e se os obrigam miseraveis ficam, e largam as terras, e nada faremos em seu favor? Estaremos nós aqui sempre para palavras? Parece-me que era já tempo de curar das cousas.

Conheço a difficuldade de evitar o Contrabando, o unico modo effectivo seria crear um Corpo da fiscalisação na nossa Raia; mas vejo que não ha meios de lhe pagar, e já disse quando motivei o meu Requerimento, que julgava inopportuno actualmente crear esses Corpos para quem a obediencia era essencial. Agora vou dar uma explicação ao meu nobre Amigo o Sr. Bergara. Elle vê bem, que estes Corpos de que eu fallo não são Corpos Militares, e regulares, Corpos que hão de estar sujeitos a Authoridade Administrativa, e que eu julgo por muito tempo ainda serão inuteis, por isso que eu vejo que pouco, ou nada se obedece ás Authoridades, e que se alguns homens são obedientes á Lei, e zelosos ao serviço publico o fazem por educação sua, e por principios proprios, e não por força da ordem publica; foi a estes Corpos que eu me referi, e não a Corpos Militares, cuja disciplina respeito, desejando continue.

Não havendo quem mais pedisse a palavra, quando o Sr. Presidente ia a propôr

O Sr. Vellez Caldeira observou, que esta questão não era tão simples como se queria inculcar; e por consequencia não havendo na Sala o numero legal de Senadores para tomar uma resolução, pedia que se addiasse a decisão do Requerimento.

O Sr. Trigueiros: — Então peço que o meu Requerimento fique addiado para quando estiver o numero legal. (Apoiados.)

A Camara annuiu addiando não só a votação deste Requerimento, mas igualmente todas as peças que se achavam para 2.ª leitura.

O Sr. Visconde do Sobral: — Pedi a palavra simplesmente para dar parte que a Deputação nomeada para participar a Sua Magestade que a Camara estava definitivamente constituida, tem preenchido a incumbencia que lhe foi dada. — O Sr. Conde de Avillez, nomeado Membro da mesma Deputação, preveniu-me de que por molestia não podia comparecer, razão porque não foi presente. — A Camara ficou inteirada.

O Sr. Presidente deu para Ordem do dia de Sexta feira, que designou para a primeira Sessão, as leituras que houvesse a fazer: fechou esta depois das duas horas da tarde.