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DIARIO DO GOVERNO.

Vê-se por tanto, que estamos na divida de todos estes dividendos, divida que é certamente muito grande, mas não insolúvel, se por ventura não desanimarmos. O estado das Finanças e do Paiz, sei que não é o mais lisonjeiro; mas tambem não é tão atterrador como já se tem figurado. Quaes hão de ser os meios de que se deva lançar mão para pagar os dividendos em Inglaterra, isso não posso eu declarar agora aqui, porque confesso que, sendo a materia muito delicada, melindrosa e difficil, não quiz confiar só em mim; e para achar esses meios nomeei uma Commissão, sem duvida, composta das maiores notabilidades conhecidas no Paiz por sua honradez, saber e intelligencia na materia a fim de que examinando o estado desta divida, propozesse ao Governo o que julgasse conveniente, para este depois propôr ás Camaras os meios de occorrer a este encargo da Nação: a Commissão de que acabo de fallar tem trabalhado, e trabalha constantemente; a historia das nossas transacções, e todos os Documentos que lhes são relativos, estão concluidos, e até impressos pela maior parte: não posso comtudo dizer neste momento o estado preciso dos trabalhos da Commissão, porque sendo composta de individuos em quem o Governo depositou inteira confiança, não tinha logar perguntar-lhes qual era o adiantamento dos seus trabalhos, como pedia o interesse que o Governo tem de os apresentar ás Camaras. Eis aqui o estado em que se acha este negocio.

Pelo que me respeita a mim, direi que tinha pensado neste assumpto: nunca fui financeiro, nunca soube nada de similhantes operações; sei apenas os principios por que se governa uma casa, e entendo que por elles, mutatis mutandis, se governa tambem um Reino, com as differenças de uma grande ou pequena familia, differenças essenciaes que se notam entre uma e outra cousa: entretanto, como comecei, não tenho deixado de occupar-me da materia, consultando aquellas pessoas que me parece poderem auxiliar-me com suas luzes. Consultei a agencia de Londres, atesta da qual se acha um homem que está ao facto do negocio; disse-lhe que elle devia tambem consultar a opinião dos maiores possuidores de fundos Portuguezes em Inglaterra, porque julguei muito conveniente que, não podendo nós agora pagar, qualquer medida que antecipadamente tivesse a sancção da maior parte dos possuidores, na pratica daria melhores resultados; e pensei deste modo, porque os fundos se acham reconcentrados em tres ou quatro mãos: tenho recebido sobre isto diversas communicações, que hei de fazer presentes á Commissão de Fazenda da Camara dos Srs. Deputados, de que tenho a honra de ser Membro. Devo confessar que tenho, visto alguns planos a este respeito, apresentados por diversas pessoas que têem estudado a materia; e, em summa, para satisfazer aos desejos do Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa, o que posso dizer é, que tanto a Commissão aqui, como a que está em Londres, como eu, como ambas as Camaras, o que desejamos todos é achar meios de vencer esta difficuldade. (apoiado.)

É preciso que eu declare agora que o deficit que apresenta o Orçamento, é um deficit virtual e não real, ou seja considerado de 38 para 39, ou de 39 para 40, como é minha intenção propôr na outra Camara, e creio que não haverá duvida em discutir o mesmo para os dous annos economicos. Disse que o deficit que apresenta o Orçamento é virtual, porque tudo está nelle calculado para os quadros effectivos das Repartições, como se vê nos Ministerios da Guerra, e Marinha, onde apparecem despezas para quadros que não existem completos, e verdadeiramente se acham ahi incluídas grandes quantias; porque o Ministerio da Guerra calculou a despeza necessaria para um Exercito de 29 mil e tantos homens em 3:397 contos de réis; e o Ministerio da Marinha apresenta um Orçamento calculado sobre o armamento de 22 embarcações em 1:190 contos; mas, Sr. Presidente, nós nem temos 29 mil homens no Exercito, nem no serviço da Marinha se empregam 22 embarcações. Portanto, havendo a fazer muitas deducções, já se vê que em relação ao anno financeiro, que está quasi findo, e para o qual apresentei o Orçamento, o deficit é virtual em parte, e sómente em parte real assim como para o anno subsequente, se as Camaras convierem em que o mesmo Orçamento fique regulando de 39 para 40. Só seria real e não virtual este deficit se as Camaras dos Srs. Deputados e Senadores não tiverem a coragem necessaria, para levar a mão da refórma onde é necessario que ella chegue; porque não é impossivel que Portugal iguale a sua receita á sua despeza; mas é condição para isso levar a refórma ao interior das Repartições, principalmente daquellas que são conhecidamente as que absorvem os fundos do Estado: (Apoiado) é preciso levar esta refórma ao Exercito, e suas dependencias. Eu sou franco, não quero lisonjear classe alguma; é preciso que a todos se pague em dia; mas para se obter esse fim tambem é preciso que ninguem vença senão o que deve vencer, e que á sombra (por exemplo) do Exercito se não coma o que senão deve comer.... Em todas as Repartições ha que reformar, e na minha igualmente.

Se pois o deficit que apresenta o Orçamento não é real, mas virtual, já se vê que o nosso mal não é tão grave como parece á primeira vista; quer dizer, que podemos cubrir o deficit presente, e que com os excedentes que tem a Junta do Credito Publico, e com o que deve resultar de um ajuste com os Contractadores do Tabaco (que se não effectuou por circumstancias extraordinarias), que produzirá 100 contos, e da Junta poderão vir 150, e talvez 200 (se se reformar a Lei sobre a transmissão das heranças): vê-se, como dizia, que não estamos tão faltos de recursos como se tem figurado.

O que resta é providenciar ácerca da divida estrangeira, a quem não tenho pago porque não tenho tido dinheiro; mas eu sou o primeiro a declarar que não é possivel achar possuidores de fundos com mais generosidade que os Inglezes. A este respeito o Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa tocou n'uma idéa sobre que, em grande parte, estamos de acôrdo. Eu entendo que difficilmente acharemos os meios necessarios para pagar de um jacto os dividendos em Londres; mas entendo tambem que se dissermos aos portadores Inglezes: = nós não temos quanto é preciso para vos pagar de relance o semestre vencido, e o que se ha de vencer; mas temos quanto é necessario para vos satisfazer o pagamento de uma metade, quarta ou quinta parte, e depois veremos o resto; = estou persuadido, e até me parece poder affiançar que elles se hão de dar por muito satisfeitos. O Sr. Barão o que diz é que se não tivermos meios para pagar tudo, dêmos aos portadores a certeza de que temos o necessario para lhes pagar uma parte: esta é tambem a minha opinião.

Não digo por ora mais nada, em consequencia do meu estado de saude; com tudo se se exigir mais alguma explicação, estou prompto a da-la.

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — Esta idéa não é minha, é verdadeiramente uma proposta de muitos individuos que eu conheço, e que são possuidores de Bonds. E como eu julgo que isto é de muita vantagem para a Nação, foi o motivo por que quiz aproveitar esta occasião para a offerecer ao Sr. Ministro da Fazenda, para a tornar na consideração que merecer.

Julgando-se o §. 13.º discutido, posto á votação foi approvado.

Seguiu-se o

§. 14.° Para provêr ás despezas e encargos do Estado com bem entendida economia, a Camara votará os recursos necessarios; não podendo deixar de lamentar o concurso de circumstancias, que occasionaram a continuação da percepção de tributos antes de votados pelas Côrtes.

Por esta occasião, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Vou pedir um esclarecimento ao Sr. Ministro dos Negocios da Fazenda, para satisfazer aos meus Constituintes; e será a repetição, se não das mesmas palavras, ao menos das mesmas idéas, que eu tive a honra de emittir no Congresso Constituinte relativamente ao imposto sobre bacalhau. Sr. Presidente, todos sabem que a Provincia de Trás-os-Montes é uma Provincia que não tem portos de mar, e que o bacalhau é o principal sustento dos seus habitantes, não só na quaresma, mas em todos os dias de abstinência. E sendo este o seu especial alimento, elles o comem por um muito alto preço. A mim não me pêsa o ter concorrido para se augmentar o imposto sobre o bacalhau; porque votei contra este imposto, assim como contra o do arroz, e assucar; e votei contra, por vêr que estes generos chegam muito caros não só á Provincia de Trás-os-Montes, mas tambem á da Beira-Alta, e tanto, que em Bragança, no mez de Agosto proximo passado, vendia-se o bacalhau a 100 réis, e o arroz a 120. Sou pois obrigado a pedir a S. Ex.ª o Sr. Ministro dos Negocios da Fazenda, que tenha a bondade de nos dizer, se será possivel passarmos sem a continuação do imposto sobre o bacalhau.

O Sr. Tavares d'Almeida: — É hoje a primeira vez que eu entro nesta Camara, e não sei por isso o que se tem vencido, e addicionado a este respeito: direi com tudo que eu hei de Votar aquelles tributos que se julgarem necessarios para manter as despezas a que o Estado é obrigado; porque sem tributos não póde viver a sociedade civil. Neste objecto Ira um contracto entre os governantes, e os governados, é uma cousa a que se chama o pacto — dó est facias. Os póvos pagam, mas têem o direito de exigir (e eu o exijo em nome de meus constituintes) que se lhes dê segurança. Sr. Presidente, todo o fim da Sociedade é a segurança interna e externa: eu não fallarei na segurança externa do Paiz, tocarei só na segurança interna: — acabo de chegar das Provincias, e posso asseverar, que o estado d'ellas é muito lamentavel. Nas Provincias não ha segurança nem tranquillidade; e alguma que ha, é comtudo muito menos do que a que em outro tempo havia. Isto não póde, nem deve continuar assim; e apesar de que eu hei de votar pelas despezas necessarias para os encargos do Estado, exijo como condição, que o Governo faça com que as Leis sejam mantidas em toda a parte. Talvez que para se conseguir este fim não seja bastante a Legislação actual, e que o Governo ache embaraços no systema da administração da Justiça; porque eu creio que os Juizes Ordinarios taes como estão, são uma calamidade e os Jurados insufficientes para a repressão dos crimes: mas se assim é, diga-nos o Governo o que será preciso fazer de novo, ou alterar no systema judiciario, no dos Jurados; ou em fim o que precisa para nos dar a segurança de que carecemos. Sem esta condição eu hei de ser difficil em dar o dinheiro que elle pedir.

Em quanto porém á ultima parte do paragrafo, que diz assim: (leu); — confesso que não sei o que querem dizer estas palavras, concurso de circumstancias? Ha nellas para mim um enigma, e eu peço ao Sr. Relator da Commissão me queira dizer o que significam, para poder votar com conhecimento de causa.

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — É verdade que se votaram esses tributos por uma necessidade; mas a causa que motivou essa necessidade, é que é o objecto da questão. O que porém se diz neste paragrafo, é que se lamentam as circumstancias, sem fazer referencia ao motivo que originou essas circumstancias. Mas, esta questão foi debatida na outra Camara, e lá obteve o Ministerio um Bill de indemnidade e por isso não acho logar agora para se entrar de novo nella; (apoiados) porque, se não fôsse esta razão, tambem eu teria que dizer.

O Sr. Ministro da Fazenda: — Devo satisfazer á pergunta do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa.

O Congresso Constituinte entendeu, que devia dotar a Junta do Credito Publico, por isso lançou mão do direito sobre o bacalháo, que a Junta começou a cobrar dous mezes depois da publicação da respectiva Carta de Lei, nos sete que decorreram até Janeiro passado. O seu Orçamento mostra, que este imposto addicional é um dos melhores rendimentos da Junta; por quanto o direito sobre as transmissões das heranças, no primeiro Semestre do anno financeiro actual, rendeu dez mil réis: não quero com isto dizer que a Lei não venha a produzir um resultado efficaz; mas ella precisa ser reconsiderada e modificada para o effeito de se pôr em andamento, porque é necessario que a Camara saiba que aquella Lei não está em execução, em parte por falta dos Administradores de Concelho. Mas, pondo isso de parte, porque agora não vem para o caso, digo que a Junta do Credito Publico foi excellentemente dotada pela Lei que impôz tributos a alguns generos, tanto assim que no Orçamento do anno actual vem essa renda calculada em 360 contos, e não ha duvida nenhuma, segundo o meu modo de pensar, que no anno futuro (se por ventura continuarem estes impostos addicionaes nos generos estrangeiros) ha de render os 360 contos. Em vista do que, a Junta entendeu que em tempo conveniente devia fazer subir á Presença de Sua Magestade, pela Secretaria a meu cargo, uma Consulta pedindo a continuação daquelle imposto; Consulta que o Governo não podia resolver; mas que tendo em consideração a necessidade em que estamos de dar meios á Junta para a dotar, assim como a de manter os tributos vo-

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