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DIARIO DO GOVERNO.

que necessitam providencia especial a este respeito.

Mas o Projecto em discussão não póde fazer mal a nenhuma Provincia, se em reprimir o contrabando dos Cereaes ha algum mal; quem produz esse, é a Legislação existente, que e toda repressiva, e não o Projecto que só contém algumas medidas complementares.

O illustre Senador devia, por bem do seu Paiz, se é consciencioso o que diz (e o é sem dúvida, porque elle não é capas de dizer cousa diversa do que sente) devia, digo, ter apresentado um Projecto excepcional para a sua Provincia, e eu o apoiaria, para que alli não tivesse logar uma repressão absoluta, se elle me convencêra da inteira necessidade de ír buscar fóra do Reino, o que sóbra entre nós.

Eu não tomei a mim fazer uma Lei de excepção tomei a mim fazer executar a que já existe; isto é, procurei que a Lei de repressão do contrabando dos Cereaes, fôsse uma Lei que afectivamente prevenisse esse contrabando, que ella não permitte: repito portanto que não e o meu Projecto que vai fazer o mal a essas Provincias, é a Legislação que já existe; se é boa ou má não sei, mas ninguem se queixou della até hoje, e dura desde 1820, o Aviso da Regencia desse tempo é o mais terminante, e o mais explicito possivel, entretanto as Provincias do Norte lá ficaram silenciosas, não disseram nada desde que se publicou o anno de 20 até á Lei de Outubro de 37, ainda que essa Legislação toda confirma a antecedente, e tracta da expressão deste contrabando esmeradamente. E como se levantará o clamor dessas Provincias contra um Projecto que não é cousa nova, e no principio, mas que tende sómente a que se execute o principio adoptado, e o que dispõe a Legislação de toda essa serie de annos? Poucas Leis modernas ha entre nós, cuja utilidade não seja controversa, excepto esta, que já conta 19 annos de existencia. Portanto está demonstrado que a Commissão redigindo este trabalho não andou de leve, fizeram-se as diligencias que já referi, e os factos que aqui se apresentaram provam que o Paiz desejava a medida em segundo logar, quiz-se saber do Ministerio, se as Leis vigentes eram ou não profundas, e a parte em que o não eram; o Ministerio respondeu que essas Leis se não podiam executar; e em terceiro logar, as cartas que tem vindo a differentes Membros desta Camara, a mim, ao Sr. Bergara, ao Sr. Castro Pereira, etc. mostrou a necessidade de fazer uma Lei que leve effeito o pensamento, de quem promulgou as existentes. É depois de tudo isto a nossa propria experiencia, que eu quero contar por alguma cousa.

O Sr. Castro Pereira: — O Sr. Senador Trigueiros notou que eu apoiasse o Sr. Miranda: se S. Ex.ª se tivesse opposto á discussão desta Projecto, eu certamente não o apoiaria; mas não devia o Sr. Trigueiros estranhar que eu o apoiasse quando elle pedia esclarecimentos, entendendo eu, como entendo, que os que temos a tal respeito não são bastantes: já quando o Sr. Trigueiros apresentou o seu Requerimento, eu em logar de me oppôr á sua pertenção, expliquei-me a este respeito bem clara e terminantemente, e muito me lisonjeio de o ter feito assim, vendo-me hoje apoiado pelo meu illustre amigo e patricio o Sr. Miranda, cujas luzes suo reconhecidas por todos, sendo o mesmo, além disto, um grande proprietario junto da Fronteira; muito me lisonjeio, repito, de vêr a minha opinião de então ampliada e desenvolvida pela authoridade do Sr. Miranda. Este nobre Senador o que deseja, e o que eu desejo igualmente, é que, antes de se concluir esta Lei, se peçam mais esclarecimentos, porque de certo no meu modo de pensar não temos os precisos, tendo-se limitado o Governo a remetter os que lhe dera a Administração geral da Alfandega de Lisboa. Ninguem présa mais do que eu os bons serviços, honroso zêlo, e rara capacidade, do Administrador da Alfandega de Lisboa; porém elle não póde referir-se senão ao que lhe dizem os Administradores das pequenas Alfandegas, que pela maior parte são homens ignorantes, e que muitas vezes nem sequer sabem explicar o que estão vendo: tomando pois em consideração este negocio em geral, e com relação ás differentes Provincias, a Lei é necessaria, e não póde nenhum homem sensato oppôr-se a ella; com isto animam-se os Lavradores de Cereaes, e os Proprietarios de terras; mas duvido muito que com os meios que o Projecto apresenta, se possa evitar o contrabando nem na Provincia de Trás-os-Montes, nem mesmo nas da Beira e Minho.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Serei breve, e farei a possivel diligencia para pôr termo a esta longa discussão, e tirar d'ella algum proveito. — Que é de absoluta necessidade uma medida forte, que ponha termo ao escandaloso contrabando de Cereaes que se está fazendo a todo o momento, e por toda a parte, creio que ninguem o poderá duvidar de boa fé. — Se a doutrina consignada no Projecto, que se nos apresenta, será sufficiente para evitar esse mal, é uma questão diversa, em que eu por agora não entro; porque estou persuadido que ella não produzirá os effeitos salutares que o seu illustre auctor teve em vista; no entanto reconheço que se deve tomar alguma medida forte a este respeito; e parecendo-me defectivas as que está enunciadas no Projecto, quando se tractar da discussão em especial, talvez que me resolva a offerecer-lhe algum additamento.

Não me farei cargo de analysar miudamente as asserções produzidas por alguns dos nobres Oradores, a maior partes das quaes nem vieram a proposito, nem me pareceram exactas. É um facto publico e notorio, que todas as semanas esta entrando embarcações carregadas de generos Cereaes procedentes do Algarve, quando aliàs eu sei que aquella Provincia não produz os generos Cereaes necessarios para o consumo de seus habitantes, persuadindo-me, por tanto, que todos esses generos Cereaes que entram pelo Téjo, vindos daquellas paragens, não são generos de produção nacional. Consta-me, vagamente, que em Mertola se fazem glandes depositos de Cereaes hespanhoes, que d'alli passam para o Algarve, e de lá para aqui, como generos de producção nacional. (Apoiados.) É por essa e outras causas similhantes que eu julgo o projecto deficiente, e tenho tenção de lhe addicionar alguns artigos. — O contrabando principal de Cereaes, que se faz nas immediações de Lisboa, é pela foz do Téjo, e pelos portos annexos, como são: Cascaes, Ericeira, Paço d'Arcos, armazens collocados ao Sul do Téjo, etc. segundo é voz constante. Estes males precisam de remedio prompto e efficaz, até onde fôr possivel; e por isso me parece perdido todo o tempo que se gastar para decidir se o Projecto é ou não util, ou se ha de ser admittido á discussão. Sr. Presidente, as calamidades publicas, que nos opprimem, provêem mais dos defeitos dos homens, do que dos defeitos das cousas, ou das Leis. Se todos os homens fôssem justos, imparciaes, e tolerantes, tudo iria bem; mas nos estamos, desgraçadamente, muito distantes d'essa época feliz, por tanta gente desejada. Pelo que me respeita, declaro que não teria duvida alguma em viver com todo o descanço (se podesse) em um paiz aonde não houvesse Leis algumas, com tanto que fôsse governado por bons homens, e que deixaria sem grande saudade o labyrintho das Leia para quem o quizesse desintrincar. Porém como isso não é possivel, irei appellando para as Leis, já que isso está em uso, desejando muito que ellas sejam fortes e efficazes, para serem bem executados; devendo accrescentar que, no meu entender, as Leis não sendo acompanhadas, passo e passo, da sancção penal, não produzem effeito algum. Só por cates meios se poderá reprimir em parte esse escandaloso trafico, contra o qual todo o mundo se queixa.

Os productos agricolas têem augmentado em Portugal talvez mais d'um terço ha poucos annos a esta parte, pelas causas que geralmente são conhecidas. Tendo augmentado a producção, e ficando estacionado o consummo, d'ahi vem necessariamente um excedente que concorre para a diminuição dos preços, por ser maior a quantidade dos generos offerecidos á venda, do que a necessidade de os comprar. Nesta abundancia de producção, em que eu vejo um melhoramento, quer alguem vêr uma desgraça, só parque os generos Cereaes não podem obter os altos preços, que obteriam se a producção fôsse escassa. — Eis-aqui porque eu tenho dito, e o torno a repetir, que duvido muito que todos os lavradores (e os que se cobrem com esse nome) conheçam os verdadeiros meios para remediar os males de que se queixam. Além das causas que acabo de enunciar ha outras (e não são as menores) que concorrem para o apuro em que se acham os productores agricolas. Existe actualmente um desequilibrio entre o baixo preço dos productos Cereaes, e o alto preço dos salarios, o qual, quanto ás péssimas estradas, e á falta de segurança nas vias de transito, concorre poderosamente para o apuro em que, se acham os lavradores, sem quererem vêr as verdadeiras causas d'elle; porém eu jamais consentirei em que se commetta a grande injustiça de violentar os consumidores da Capital a repararem á sua custa males para que não deram, nem podem vir a dar causa.

O baixo preço dos generos Cereaes não prova que a Agricultura está em decadencia, como alguem pretende: prova o contrario. Eu já aqui disse em outra occasião e não me cançarei de o repetir, que o signal caracteristico do progresso da industria é quando os productos chegam á perfeição, e se vendem pelo menor preço possivel é os Cereaes, que são producto da industria agricola, não podem nem devem ser excluidos desta regra geral. Conheço que me affastei alguma cousa da questão principal, do que peço desculpa; mas creio que não perderia de toda o tempo, rectificando factos que se devem encarar pelo seu verdadeiro lado. Concluo declarando que approvo o Projecto, e voto pela sua admissão.

O S. Bergara: - Eu estou persuadido que impossivel prohibir-se absolutamente o contrabando na raia pela sua grande extensão, e, pelo principio de Commercio que vem a ser, que quando o genero está caro em Hespanha para lá se manda, e tem sido não só os Cereaes mas tambem o azeite; agora importam Cereaes para Portugal porque no paiz limítrofe está mais barato este genero. As bellezas deste Projecto são as penas que se impoem Authoridades; estas penas é que vão evitar o abuso: oxalá ellas se appliquem. (Apoiados.)

Em todas as terras da raia se apregoa o pão hespanhol pela rua, sem que a isso Authoridade alguma se opponha e quando alguem faz o seu dever (como o Administrador da Alfandega de Elvas, que suspendeu um dos Empregados por abusar do seu emprego) tractam logo de o intrigar, e de menoscabar o seu credito.

Eu concordo no pensamento do Sr. Trigueiros e tenho tenção, quando o Projecto se discutir em particular, de fazer extensiva a responsabilidade até ás Authoridades Militares. Concluo declarando serem verdadeiras as cartas a que alludio o nobre Senador que deu logar a eu pedir a palavra, e tomar algum tempo á Camara para declarar que voto pelo Projecto na sua generalidade.

Julgando-se a materia sufficientemente discutida, o Sr. Presidente poz á votação o Parecer das Commissões sobre o Projecto do Sr. Trigueiros, e ficou approvado na sua generalidade.

Tendo dado para Ordem do dia a discussão do Parecer da Commissão de Fazenda sobre varias emendas proposta ao Projecto sob e a creação do Tribunal de Contas, e, havendo tempo, a do Regimento, fechou esta Sessão depois das tres horas e meia.